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CAPÍTULO V – METODOLOGIA DA PESQUISA

V.6 Ensaios de depuração de dados

Após consecução do resultado a partir dos dados brutos recolhidos, pretendia-se ainda efetuar ensaios em que as variáveis da investigação seriam estruturadas não mais a partir dos dados brutos recolhidos, mas sim a partir de dados arbitrariamente depurados mediante critérios previamente estabelecidos: (a) em relação à variável orientação ideológica, mediante exclusão dos partidos políticos que em tese obtiveram menor precisão na classificação de sua orientação ideológica na pesquisa ABCP 2010; (b) em relação à variável formalização do OP, mediante exclusão dos OPs de menor valor relativo em comparação com o valor monetário total do respetivo orçamento. Esse último ensaio, contudo, não foi possível realizá-lo, pois houve dificuldade em se conhecer o valor exato de determinados OPs. Já o primeiro ensaio, feito sobre a variável orientação ideológica, foi realizado a contento. Ambos os ensaios [a realização do primeiro e a frustrada intenção em relação ao segundo], são a seguir relatados.

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V.6.1 Ensaio de depuração dos dados relativos à variável explicativa

A variável explicativa, ideologia partidária dos partidos políticos brasileiros, não é parametrizável estatisticamente, eis que ao assumir três valores nominais possíveis, E, C ou D, não está sujeita, em si, a avaliação em função de medidas de tendência central ou de dispersão. Mas não se pode dizer a mesma coisa em relação à pesquisa que lhe deu origem. Essa variável, sabe-se, foi construída com base em fonte secundária (Tarouco & Madeira, 2015). Essa fonte secundária foi apoiada sobre avaliações subjetivas [expert survey], que são naturalmente sujeitas a dispersão que, por sua vez, poderia trazer alguma imprecisão à presente investigação. No caso, a dispersão nas avaliações dos especialistas pode ser bem percebida no resultado do Expert Survey ABCP 2010 que indica, para cada partido político, o desvio padrão - DP e o coeficiente de variação - CV correspondente. Como se pode ver na Tabela VI.12, os valores de desvio padrão variam desde 0,40 (PCO) até 1,65 (PT do B). Os valores de coeficiente de variação variam desde 0,12 (DEM) até 0,51 (PC do B). Quanto maior o valor dessas medidas de dispersão, maior é a dispersão das notas atribuídas ao partido em relação à média dessas notas, o que significa maior divergência, entre os entrevistados, quanto à atribuição de valores ao respetivo partido. Isso significa, por exemplo, que houve maior convergência entre os entrevistados em torno da avaliação sobre a orientação ideológica do PCO, ao qual corresponde o menor desvio padrão (0,40) e que obteve média 1,1 no expert survey, razão pela qual foi aqui classificado como partido de esquerda. No outro extremo da escala, o desvio padrão de 1,65 revela que houve maior divergência entre os entrevistados em relação ao PT do B, que no expert survey obteve a média 4,7 e com isso foi aqui classificado como partido de centro. Tal divergência sugere que pode ter havido entrevistado que lhe tenha atribuído valor correspondente a partido de esquerda, assim como pode ter havido entrevistado que lhe tenha dado nota que o classificaria como partido de direita.

Embora indiretamente, uma maior quantidade de respostas “não sabe” para determinada questão pode ser também considerada como um bom indicador de divergência de opiniões no expert survey, na medida em que sugere maior probabilidade de que possa ocorrer imprecisão na resposta dos entrevistados sobre a referida questão. Veja-se, por exemplo, o caso do PTC na Tabela VI.2, que traz o resultado do Expert Survey ABCP 2010. Por ter obtido média de 5,1 valores, esse partido foi posicionado muito próximo da classificação correspondentes aos partidos de direita, bem próximo aos de centro. No entanto, obteve também 27 respostas “não sabe”, um dos mais elevados naquela pesquisa. Esse maior número de entrevistados que

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disseram não saber a orientação ideológica do PTC no contínuo esquerda - direita sugere que pode também haver, em tese, alguma indecisão ou imprecisão na resposta dos entrevistados que atribuíram valores à inclinação ideológica daquele partido. Outro indicador dessa provável imprecisão na classificação da orientação ideológica do PTC é o desvio padrão das respostas obtidas em torno da média, que foi de 1,43 valores, também um dos maiores daquele expert survey. Aliás, das duas medidas de dispersão mostradas naquele estudo, é justamente o desvio padrão que guarda maior correlação com a quantidade de respostas “não sabe”, como se demonstra nos gráficos abaixo, em que são ilustradas as medidas de dispersão CV e DP [ao longo da circunferência] e a quantidade de respostas “não sabe” [ao longo do raio] para cada partido.

10Figura V.1 – Depuração da variável explicativa: relação entre a resposta “não sabe” [dimensão radial] e o coeficiente de variação [dimensão circular]

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11Figura V.2 – Depuração da variável explicativa: relação entre a resposta “não sabe” [dimensão radial] e o desvio padrão [dimensão circular]

Elaboração própria

Como se pode perceber no primeiro desses dois gráficos acima (Figura V.1), a ocorrência de resposta “não sabe” [valores medidos ao longo dos raios do círculo] encontra-se dispersa para uma diversidade de valores diferentes de coeficiente de variação [valores medidos ao longo da linha da circunferência]. A mesma coisa não ocorre no segundo gráfico (Figura V.2), em que há maior concentração de respostas “não sabe” [valores medidos ao longo dos raios do círculo] justamente nos setores do círculo que correspondem aos maiores valores de desvio padrão [medidos ao longo da linha da circunferência].

Em razão dessa convergência entre os valores de desvio padrão em torno da média atribuída pelos observadores externos no Expert Survey ABCP 2010 e a quantidade ali apresentada de respostas “não sabe”, é que aqui se resolveu adotar esses valores de desvio padrão como critério para este ensaio de depuração da variável explicativa desta investigação.

Assim, com o objetivo de minimizar eventuais imprecisões decorrentes de divergências nas avaliações subjetivas do expert survey, apresenta-se a seguir, a título de ensaio, cenário resultante da depuração da variável explicativa por meio da exclusão de partidos sobre os quais houve maior discordância dos entrevistados, que são aqueles que obtiveram maiores valores de desvio padrão em torno das respetivas médias. Para isso, reordenou-se a classificação

0 5 10 15 20 25 30 35 000 0,59 0,64 0,68 0,69 0,69 0,72 0,74 0,77 0,78 0,81 0,84 0,87 0,89 0,96 1,08 1,11 1,15 1,18 1,29 1,32 1,32 1,39 1,41 1,43 1,59 1,65

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de Tarouco e Madeira (2015), Tabela VI.2, de acordo com os valores de desvio padrão de cada partido político, do que resultou a Tabela VI.12. Na sequência, de forma arbitrária, foram excluídos os nove partidos localizados no terço superior da escala crescente de valores de desvio padrão, vale dizer: excluiu-se, nessa depuração, um terço dos partidos. Em seguida, foi novamente construída a variável explicativa, mas dessa feita já depurada somente para efeito deste ensaio. A partir daí, conforme descrição no capítulo empírico, com obediência ao mesmo método antes utilizado, foi construído novo cenário, com novo estabelecimento de associação entre ideologia partidária [agora depurada em função do DP] e formalização do OP.

V.6.2 Ensaio [frustrado] de depuração dos dados relativos à variável explicada

Pretendia-se ainda, também a título de depuração, desprezar OP’s cujos valores monetários registados em LOA foram considerados meramente simbólicos. Como OP de valor meramente simbólico, entendia-se o OP cuja proporção em relação ao valor total do orçamento correspondente ficasse abaixo do nono decil na listagem dessas proporções organizadas em ordem decrescente. Acontece que, com a análise das LOAs no desenrolar da pesquisa empírica, a constatação de algumas inconsistências impossibilitou a segura identificação e isolamento desses OPs simbólicos. Como exemplo dessas inconsistências, pode-se citar a LOA do ano de 2012 do município Rio de Janeiro.46 Ali, o projeto denominado "Infraestrutura viária...", de

classificação orçamentária 1503.15.451.0200.1741, que possui um determinado valor foi dividido em dois produtos (3733 e 3754), sendo que apenas o segundo deles refere-se a OP. Não se desdobrou, entretanto, o valor, de sorte que não foi possível detetar o valor formalizado de OP para esse produto 3754, correspondente a substituição de passarela na Av. Brasil, naquela cidade. Em casos assim, embora seja possível afirmar com segurança que existe OP formalizado, torna-se impraticável saber a proporção entre o valor monetário do OP e o valor monetário do orçamento. Esse tipo de inconsistência, que se repetiu nessa e em outras LOAs do município, impediu que se isolasse OPs meramente simbólicos ou de pequeno valor relativo. Além disso, muito embora o ciclo do OP [aí compreendida a priorização, feita pelos cidadãos, de ações a serem inseridas no orçamento público] não tenha sido objeto dessa pesquisa, a constatação dessa suspeição de que o valor de OP formalizado em LOA acaba por distorcer o

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conceito de OP como política pública destinada à concretização de obras e serviços públicos priorizados pelos cidadãos tornou inviável a utilização de valor de OP neste estudo. É o caso, por exemplo, do município de Recife, que tem por prática o registo em LOA, a título de OP, de projetos abrangentes e vagos, com valores relativamente altos. Cita-se, como ilustração, a LOA de 2014 daquele município,47 em que há registo de OP com valor superior a um bilhão e

seiscentos milhões de reais, equivalentes a mais de 30% do valor total do orçamento do ano, a título de “urbanização de áreas de risco” ou de “requalificação de espaços de interesse público”, dentre outros, situação repetida nas demais LOAs de Recife. Assim como no caso do Rio de Janeiro, pode-se dizer com certeza que em Recife há OP formalizado, porém não seria plausível levar em conta o valor monetário registado em OP como critério para classificação dos OPs quanto à proporcionalidade desse valor em relação ao do orçamento como um todo. Desse modo, para a construção da segunda variável, que é a formalização do OP em determinado ano em cada um dos 26 municípios estudados, bastou-se a constatação da existência ou inexistência de registo de algum valor monetário, sob o rótulo OP ou equivalente, na Lei Orçamentária Anual do mesmo município em cada um dos oito anos compreendidos pela pesquisa, com o que se frustrou a realização do ensaio com depuração dos dados concernentes à variável formalização do OP.