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CAPÍTULO VI – TRATAMENTO DOS DADOS E SÍNTESE DOS RESULTADOS

VI.5 Síntese dos resultados da investigação

Desta investigação, observados os parâmetros nela definidos, aí compreendidos os métodos aplicados e os dados utilizados, resultaram duas proposições cuja certeza pôde ser afirmada com margem de segurança superior a 95%: (i) A orientação ideológica do partido ao qual encontrava-se vinculado o prefeito das 26 capitais estaduais brasileiras durante o período de 2008 a 2015 exerceu influência sobre a formalização do OP. (ii) Foram os governos vinculados

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aos partidos de esquerda os que mais privilegiaram a formalização do OP nas LOAs das 26 capitais estaduais brasileiras durante o período de 2008 a 2015.

Foram, portanto, atingidos os objetivos específicos pré-estabelecidos e, em decorrência, o objetivo geral. Os objetivos específicos eram: (a) apresentar uma classificação dos oito períodos de governo, de 2008 a 2015, das 26 capitais estaduais brasileiras de acordo com a categoria de orientação ideológica do partido do prefeito [E, C e D]; (b) apresentar uma classificação dos oito períodos subsequentes de governo [2009 a 2016] das 26 capitais estaduais brasileiras de acordo com a existência ou não [S ou N] de OP formalizado nas suas respectivas leis orçamentárias. O primeiro deles, objetivo específico (a), foi alcançado com a apresentação da Tabela VI.4, que contém a classe da orientação ideológica dos partidos no governo das capitais, contruída a partir de fonte primária [dados do Tribunal Superior Eleitoral] e de fonte secundária [Tarouco & Madeira, 2015], fonte secundária essa que foi duplamente validada: validada internamente pelos autores, mediante comparação e conformidade com outros estudos e validada também nesta tese, por apresentar resultados convergentes com estudo ainda mais recente [BBC Brasil, 2017]. O segundo, objetivo específico (b), atingiu-se com a apresentação Tabela VI.5, que contém informação sobre a existência ou inexistência de OP formalizado nos períodos de governo estudados e que foi construída a partir de dados coletados em fontes primárias: LOAs referentes aos oito períodos de governo das 26 capitais estaduais. Mais adiante, a partir da concatenação dos dados contidos nessas duas tabelas e aplicação do teste qui-quadrado, pôde-se alcançar o objetivo geral da pesquisa: conhecer se houve [ou não] influência da categoria da orientação ideológica dos partidos sobre a formalização do OP, o que se concretizou no Tópico VI.3.4, em que se constatou, com margem de segurança ótima, a existência de influência. Como foi constatado que a orientação ideológica demonstrou influência sobre a formalização do OP, caberia então apontar, dentre as três categorias de orientação ideológica aqui estabelecidas [esquerda, centro ou direita], qual mais privilegiou a formalização do OP. Pôde-se então ainda cumprir, já em caráter complementar, um terceiro objetivo específico (c), que era o de conhecer qual categoria de orientação ideológica [E, C ou D] mais contemplou a formalização do OP nas 26 capitais estaduais brasileiras durante os oito períodos de governo estudados. Isso foi feito no Tópico VI.3.5, em que se testou as hipóteses alternativas, oportunidade em que se constatou que foram os governos de esquerda que mais privilegiaram a formalização do OP.

Com o atingimento do objetivo geral da investigação, que era o de conhecer se houve [ou não] influência da orientação ideológica sobre a formalização do OP, constatou-se, no Tópico VI.3.4, que sim, ou seja, que houve influência. Frustrou-se, com isso, a hipótese básica,

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segundo a qual não haveria tal influência. Inaplicáveis, pois, ao caso específico dessa tese, algumas das teorias utilizadas na justificação dessa hipótese básica, segundo as quais, por exemplo, (a) os partidos políticos brasileiros estariam ultimamente mais voltados à fisiologia do que às crenças e valores característicos dessa ou daquela inclinação ideológica, ou de que (b) não obstante ser originalmente política pública criada e praticada por governos de esquerda, modernamente o OP seria caracterizado como uma prática transnacional e suprapartidária, ou ainda de que (c) políticas públicas idealizadas e executadas por determinados partidos, dentre elas, por exemplo, o OP, acabam sendo copiadas e praticadas por outros de crenças e valores diversos, de sorte que a disseminação de tais práticas por partidos distribuídos por todo o espectro ideológico culmina por fazer com que se dilua a identificação que possuíam tais políticas públicas com essa ou aquela orientação ideológica. A interpretação subjetiva da pesquisadora sobre a não validação da hipótese básica é apresentada na conclusão.

Mas a refutação da hipótese básica abriu caminho para que pudessem ser testadas as hipóteses alternativas, segundo as quais uma das três categorias de orientação ideológica empiricamente trabalhadas [esquerda, centro e direita] mais teria realizado a formalização do OP. Nesse teste das hipóteses alternativas, descobriu-se que foram os partidos de esquerda os que mais favoreceram a formalização do OP.

E os resultados da pesquisa [que são interpretados ou explicados logo na sequência deste capítulo], segundo os quais a categoria de orientação ideológica do partido do prefeito realmente influenciou a formalização do OP, e de que são os partidos de esquerda que mais realizaram essa formalização, foram ainda em seguida ratificados por ocasião de outros testes dessas hipóteses, tópicos VI.4.4 e VI.4.5, feitos posteriormente à depuração da variável explicativa, ratificação essa que conferiu maior segurança ao desfecho da investigação.

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INTERPRETAÇÃO DOS RESULTADOS E CONCLUSÃO

Esta investigação foi motivada a partir da dúvida sobre a existência de influência de orientação ideológica partidária sobre a formalização do OP em lei orçamentária anual –LOA de municípios brasileiros, capitais dos estados, no período de 2009 a 2016. Estabeleceu-se então, como objetivo geral, conhecer se existiu a referida influência sobre a existência ou inexistência de formalização de OP nas leis orçamentárias desses municípios, especificamente da categoria da orientação ideológica, esquerda - centro - direita dos partidos políticos que comandaram o Executivo. Após revisão da teoria e sua análise, formulou-se a hipótese de trabalho segundo a qual não existiria tal influência, isto é, de que a categoria de orientação ideológica do partido do chefe do Executivo municipal, o Prefeito, não possui influência sobre a formalização do OP na lei orçamentária – LOA das capitais brasileiras. As razões que levaram à formulação dessa hipótese fundaram-se em teorias segundo as quais ter-se-ia transformado o OP, desde os primeiros anos do século XXI, em uma prática administrativa suprapartidária, utilizada por governos de várias partes do mundo, independentemente de inclinação ideológica (Wampler (2008) e Sintomer et al., (2012)). Formulou-se ainda mais três hipóteses alternativas para a eventualidade de que a hipótese básica fosse empiricamente refutada, ou seja, para o caso de constatação de que existe influência da ideologia sobre a formalização do OP: (i) é a esquerda quem mais formaliza o OP; (ii) são os partidos de centro que mais formalizam o OP; e (iii) é a direita quem mais contempla a formalização do OP.

Observadas as delimitações no espaço, no tempo e metodológicas e em contrariedade à teoria a princípio adotada como referência, refutou-se, neste estudo, a hipótese básica ao, empiricamente, mostrar-se que a inclinação ideológica influenciou a formalização do orçamento participativo na lei orçamentária anual dos municípios estudados. Confirmou-se, em contrapartida, a primeira das hipóteses alternativas com a constatação empírica de que foi a esquerda que mais formalizou o OP na LOA.

É certo que os municípios estudados, que constituem as 26 capitais estaduais, estejam bem distribuídos pelas cinco grandes regiões em que foi dividido o território brasileiro, Norte, Nordeste, Centro-Oeste, Sudeste e Sul, diferenciadas em seus perfis de natureza geográfica, económica, cultural, social, educacional, etc. Malgrado, todavia, o fato de serem municípios relevantes em muitos aspectos, não se pode conferir a essas 26 capitais o atributo da representatividade do universo dos municípios brasileiros para efeitos da presente investigação, de modo que possibilitasse ampliar os resultados obtidos com este estudo no espaço e no tempo

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a ponto de, por exemplo, afirmar que seriam os partidos de esquerda que mais contemplam a formalização do OP no Brasil. Isso porque só se poderia atribuir caráter indutivo aos resultados desta pesquisa se a amostragem usada tivesse sido definida de forma aleatória. Nesta investigação, todavia, a amostra foi arbitrariamente tomada, tanto em relação ao espaço, quanto em relação ao tempo, pelas razões apresentadas no capítulo metodológico. Não há segurança, portanto, para propormos inferências que extrapolem o espaço e tempo aqui estudados.

Levando-se em conta os parâmetros delimitadores desta investigação, pode-se afirmar que de seu resultado, em linhas gerais, emergiram duas proposições: (i) a orientação ideológica influencia na formalização do OP, e (ii) é a esquerda que mais privilegia a formalização do OP. Abaixo, essas proposições passam a ser subjetivamente interpretadas pela pesquisadora

Em relação à primeira dessas proposições [a orientação ideológica influencia na formalização do OP], que resultou da refutação da hipótese básica de trabalho, pode-se deduzir que teria contribuído para sua confirmação:

1) A possibilidade de que os políticos brasileiros, quando eleitos, atuem orientados pelas respectivas inclinações ideológicas partidárias. Sendo assim, haveria uma convergência dessa hipótese alternativa [confirmada] com perceções teóricas que defendem que inclinação ideológica partidária [esquerda, centro e direita] influencia políticos eleitos. Tal influência seria, para Sartori (1982), uma característica de sistemas democráticos representativos, uma vez que a “sociedade é ideologizada” (Sartori, 1982: 163). Com entendimento no mesmo sentido, Porta (2003) observa que a orientação ideológica é um traço marcante de partidos políticos, uma vez que a ideologia teria a “função fundamental para a organização” de partidos (Porta: 2003). Assim, no sistema partidário do Brasil, haveria partidos com inclinação ideológica partidária definida, que orienta a atuação dos políticos, ao contrário do afirmado por Mainwaring (2001).

2) Outra possibilidade a ser observada, a partir da confirmação da proposição de que a orientação ideológica influencia na formalização do OP, seria de existir no Brasil uma preocupação mais acentuada com conteúdos materiais. Com isso, haveria uma convergência dessa primeira proposição com o entendimento de Inglehart e Welzel (2009) sobre a inaplicabilidade da teoria desses autores em sociedades que não podem ser consideradas pós- materialistas, como o Brasil, por exemplo. Esses autores propõem que há uma diminuição significativa da influência da ideologia partidária e dos próprios partidos sobre as pessoas que vivem em sociedades pós-industriais ou pós-materialista, nas quais a ênfase da participação política estaria em valores de autoexpressão, por exemplo, praticada pelos próprios interessados sem a intermidiação de partidos. Nessas sociedades, as necessidades materiais já estariam

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superadas. Mas no Brasil, no entendimento desta pesquisadora, a carência material está longe de ser superada e a participação no OP poderia significar para o cidadão a possibilidade de ter atendimento para alguma necessidade material, portanto o Brasil não se enquadraria nos moldes desenhados por Inglehart e Welzel (2009).

Por sua vez, em relação à segunda proposição, que resultou da confirmação da primeira hipótese alternativa de trabalho, pode-se inferir que pode ter concorrido para a constatação de que é a esquerda que mais formaliza o OP:

A) Primeiramente, pode-se sugerir que a esquerda que mais formaliza o OP em decorrência de ainda existir, de forma saliente, uma convergência dessa prática institucionalizada com governos de partidos de esquerda, conforme já observado por Santos (2003), Wampler e Avritzer (2004), Fung e Wright (2001), dentre outros. Sendo assim o OP poderia ser ainda considerado um “processo de democracia direta, voluntária e universal, onde a população pode discutir e decidir sobre o orçamento público […]” (Souza, 2001:275). Com isso, um maior índice de formalização do OP [como entendida neste estudo] seria um indicador de que é a esquerda que mais propicia que os participantes do OP realmente decidam sobre despesas a serem incluidas no orçamento público. Assim, o OP se manteria como um instrumento usado pela esquerda, principalmente, com a proposta de dar ao cidadão poder de decisão para definir que obra ou/e serviço deve compor o orçamento público. Desse modo, o OP continuaria sendo, para a esquerda, uma prática administrativa que enfatiza a democracia direta, inserida em governos democráticos representativos.

B) Outra conjectura que pode ser feita sobre o resultado de que é a esquerda que mais formaliza o OP diz respeito à possibilidade de existir uma influência histórica do OP de Porto Alegre sobre outros OPs criados por governos de esquerda em outros municípios brasileiros. Essa possibilidade existiria por ser o OP de Porto Alegre uma referência [no Brasil e no mundo] de sucesso de democracia participativa com poder de decisão, promovida por partidos de esquerda para possibilitar que cidadãos decidam sobre despesas a serem inseridas no orçamento público. Desse modo, o sucesso nacional e internacional alcançado pelo OP de Porto Alegre talvez tenha inspirado outros governos de esquerda a definirem seus OPs nos moldes daquele de sucesso. Sendo assim, seria possível que em municípios com membros de partidos de esquerda à frente do Executivo, seguindo o modelo de Porto Alegre, tenham mantido a ênfase de seus OPs na ampliação da participação direta dos cidadãos comuns em decisões sobre despesas públicas, circunstância em que a formalização do OP na LOA seria uma evidência dessa influência, por exemplo.