• Nenhum resultado encontrado

Inclinação ideológica partidária de partidos do Brasil

CAPÍTULO II – IDEOLOGIA PARTIDÁRIA: ESQUERDA, CENTRO E DIREITA – BASE

II.5 Inclinação ideológica partidária de partidos do Brasil

Atualmente, decorridas mais de três décadas da redemocratização do Brasil, já não é incomum perceber-se, no país, o interesse de cientistas políticos e sociais em estudar algum aspecto do sistema político nacional que envolva a classificação esquerda-direita. Embora sejam ainda poucos os estudos em nível acadêmico, são recorrentes as reportagens jornalísticas acerca do

74

tema. Como exemplo, pode-se citar o recente artigo veiculado no Jornal Folha de São Paulo15,

de 30 de outubro de 2016, de autoria de Leandro Colon, Diretor da Sucursal de Brasília. Segundo Colon, nos resultados das eleições para prefeito das 26 capitais estaduais, “a direita, definitivamente, venceu a esquerda em 2016. E não foi por pouco.” Entende-se aqui como compreensível a escassez de estudos que abordem essa clivagem ideológica partidária no Brasil, pois enquanto Lipset (1967), dentre outros cientistas políticos, no plano internacional, já se dedicava a estudar a influência da ideologia nas relações políticas após a Segunda Guerra Mundial, havia, no Brasil, alguma dificuldade na realização de estudos dessa natureza em razão do caráter fortemente repressor do governo militar que se instalou no País, de 1964 até 1985, com a pretensão de “tomar as urgentes medidas destinadas a drenar o bolsão comunista” (Ato Institucional – AI n.º 1/1964, de 1º de abril). Tais medidas repressoras, como também as que foram impostas pelo AI n.º 5/1968, de 13 de dezembro, por meio do qual foram suspensos os direitos civis e foram concentrados os poderes na figura do militar presidente, por certo cercearam a propagação de estudos sobre ideologia partidária, o que justificaria a carência de literatura sobre o tema. Mas há na literatura classificações ideológicas que permitem perceber quais partidos estão posicionados à esquerda, ao centro e à direita do eixo. E são essas classes ideológicas [esquerda, centro e direita] que usaremos como referencial para testar a hipótese básica, segundo a qual a ideologia partidária não influência na decisão política de formalizar o OP na LOA. A variável explicativa [ideologia] encontra-se formulada no capítulo empírico a partir de fonte secundária, apresentada e justificada neste capítulo, especificamente com base no estudo realizado por Tarouco e Madeira (2015), no qual os autores organizam uma classificação ideológica de partidos do Brasil, no eixo esquerda/direita, com base em resultado de um expert survey aplicado pela Associação Brasileira de Ciência Política – ABCP a cientistas políticos do Brasil.

Antes de abordar o estudo de Tarouco e Madeira (2015) acima mencionado, mostramos a seguir: 1) o entendimento de Singer (2002) sobre a importância das primeiras eleições, após a redemocratização, para escolher o Presidente do Brasil, para estabelecer a clivagem esquerda/direita no sistema político do Brasil; 2) Outro estudo de Tarouco e Madeira (2013) no qual, com base em análise de conteúdo de documentos programáticos de partidos brasileiros, buscam apurar uma classificação ideológica de partidos brasileiros no eixo esquerda/direita; e 3) o estudo de Zucco (2009) que foi sobre a percepção de parlamentares da

15http://www1.folha.uol.com.br/poder/eleicoes-2016/2016/10/1827871-segundo-turno-confirma- guinada-a-direita-e-conservadora.shtml

75

Câmara Federal quanto ao posicionamento dos partidos em que estão filiados e localização de outros partidos nas classes ideológicas esquerda/direita. Os estudos realizados por Singer (2000), Tarouco e Madeira (2013) e Zucco (2009), esclareça-se, não serão usados como base para a definição da classificação ideológica operacional a ser desenvolvida nesta investigação.

1) Singer (2000), com base em eleições para escolher um representante político para ocupar o cargo de presidente do Brasil, ilustra a presença das classes ideológicas esquerda e direita no cenário político nacional. Segundo o autor, desde a primeira eleição para escolher de forma livre um presidente para Brasil, em 1989, houve acirrada disputa entre partidos de esquerda e de direita. Essa disputa persistiu nas eleições seguintes, que ocorreram em 1994, 1998, 2002, 2006, 2010 e 2014. Como observa Singer (2000:17), essa competição contribuiu para desenhar, no cenário político nacional, os contornos da ideologia político-partidária esquerda-direita na esfera política e administrativa do país.

Singer (2000) observa que o PT disputou as eleições presidenciais nos anos de 1988, 1994 e 1998 liderando coligação de partidos de esquerda, que não saiu vitoriosa. As eleições seguintes, 2002, 2006, 2010 e 2014, foram vencidas pelo PT [como já observado, não é possível, no Brasil, candidatura avulsa de candidatos sem filiação partidária] que, apesar de representar a esquerda, teria incluido na aliança vitoriosa partido tido como sendo de direita, como o PL. Mesmo assim, até porque à época [1998] o PT só havia se coligado com partidos de esquerda para disputar eleições presidenciais, Singer (2000) atribui ao fortalecimento do PT, enquanto partido considerado de esquerda, o fato de desenhar-se a disputa eleitoral a partir da dimensão ideológico-partidária, dentro do contínuo esquerda-direita.

Ainda segundo Singer (2000), a eleição presidencial de 1989 foi vencida pela direita, representada por Fernando Collor de Mello. Aquele governo seria marcado por privatizações no setor público e abertura do mercado interno para o mercado externo. Essas políticas públicas seriam vistas de forma favorável pelo mercado em geral, mas o confisco de dinheiro de pessoas e empresas, que veio a seguir, causaria desgastes no governo. Acusado de corrupção, no final de 1992, Fernando Collor foi afastado do cargo e proibido de se candidatar a qualquer cargo político por um período de 8 anos. Assumiu então a presidência o vice-presidente da chapa que havia sido encabeçada por Collor, Itamar Franco, que governou nos anos de 1993 e 1994. A maior realização do governo de Itamar Franco foi a edição de um plano econômico que derrubou a inflação galopante e deu maior estabilidade à economia do País, o Plano Real. (Singer, 2000).

Muito do sucesso do “Plano Real” foi atribuído ao Ministro da Fazenda à época, Fernando Henrique Cardoso. Esse fato, para Singer (2000), poderia ter tido mais influência nas

76

eleições de 1994 do que a identificação ideológica dos partidos que competiram pelo cargo de presidente do Brasil naquele ano, mas, segundo esse autor, isso não se verificou, haja vista que a identificação ideológica na escala esquerda-direita teria sido o principal motivo para a captação dos votos suficientes para a eleição de Fernando Henrique Cardoso filiado ao PSDB, um partido de centro que fez aliança com partidos de centro e de direita para sair vitorioso. Isso porque, antes mesmo do sucesso do Plano Real, as pesquisas eleitorais já mostravam a preferência dos eleitores por partidos posicionados à direita. A intenção de voto para partidos com orientação ideológica de direita “superava em cerca de duas vezes os que se colocavam à esquerda. E tal como no pleito que elegeu Collor, a autolocalização no espectro esquerda-direita foi um forte preditor do voto, mesmo numa eleição em que a discussão econômica substituiu o debate ideológico como tema central” (Singer, 2000).

O PT saiu vitorioso nas eleições presidenciais de 2002 e 2006 com Luiz Inácio Lula da Silva, e em 2010 e 2014 com Dilma Rousseff. Em 2016, Dilma Rousseff foi afastada do cargo. A esquerda perdeu o poder político conferido ao mais alto cargo político do país, o cargo de Presidente da República. Com a saída de Dilma Rousseff, assumiu o vice-presidente Michel Temer, que é filiado ao PMDB, partido de centro de acordo com Singer (2000) e Carreirão (2006), por exemplo.

2) Tarouco e Madeira (2013) procuraram definir uma classificação ideológica de partidos brasileiros com base na análise de conteúdo de programas partidários registrados no TSE, com objetivo de verificar se a classificação obtida por esse método seria convergente com outras usualmente conhecidas. A metodologia desse estudo de Tarouco e Madeira (2013) não será aqui explorada na sua integralidade, uma vez que pode ser conhecida diretamente no estudo desses autores. Apresentamos alguns aspectos somente para dar uma percepção do que foi realizado e sobre o resultado alcançado.

O critério para a seleção dos partidos no estudo de Tarouco e Madeira (2013) foi a “estabilidade ao longo do tempo combinada com o desempenho eleitoral.” Dessa forma, foram selecionados partidos que “obtiveram votos em todas as oito eleições para a Câmara de Deputados desde 1982: PT, PDT, PMDB, PDS/PPR/PPB/PP e PTB. A essa lista, acrescentamos ainda o PFL/DEM e o PSDB, criados após 1982, pela importância do seu papel nas coalizões de governo e de oposição nas últimas duas décadas. Ambos obtiveram cadeiras em todas as eleições que disputaram para a Câmara” (Tarouco e Madeira, 2013:155). Foi a partir de categorias adaptadas do Manifesto Research Group (MRG) que os autores buscaram, nos documentos pesquisados, “isolar categorias que, referindo-se às acepções econômicas contemporâneas de esquerda e direita, não deixem de incluir questões políticas e históricas, ou

77

seja, aquelas que dizem respeito à relação entre Estado e mercado e também aquelas que refletem as especificidades políticas e históricas brasileiras”. As categorias adotadas foram: 1) direita: “menções positivas às forças armadas, livre iniciativa, incentivos, ortodoxia econômica, limitação do Welfare State e referências favoráveis à classe média e grupos profissionais (para contrastar com as referências à classe operária)”; 2) esquerda: “regulação do mercado, planejamento econômico, economia controlada, análise marxista, expansão do Welfare State e referências positivas à classe trabalhadora”. A posição de um partido na escala esquerda-direita seria dada pela diferença entre a proporção de texto nos programas dedicada a categorias de direita e a proporção dedicada a categorias de esquerda. Sobre o resultado desse estudo os autores concluíram que eles mostraram “um quadro que guarda poucas relações com a classificação usual dos partidos brasileiros.” (Tarouco e Madeira, 2013: 154, 159, 160 e 161). Desse estudo de Tarouco e Madeira (2013) não resultou uma classificação considerada, pelos próprios autores, como reveladora das classes ideológicas ocupadas por partidos brasileiros. Portanto, como o objetivo deste capítulo é apresentar fundamentos para definir, a partir de fonte secundária, uma classificação operacional nas classes esquerda, centro e direita, esse estudo específico de Tarouco e Madeira não foi o utilizado na nossa classificação operacional, mas entendemos que foi útil para mostrar a complexidade de se classificar ideologicamente partidos brasileiros com base em seus documentos programáticos.

3) Zucco (2009), por sua vez, apresenta resultado de pesquisa sobre o posicionamento ideológico de partidos brasileiros a partir da autodeclaração de deputados da Câmara Federal, no período compreendido entre 1999 e 2009. Segundo esse autor, essa pesquisa empírica, que foi proposta por Power e Zucco (2009), teria mostrado que há uma certa “estabilidade na forma como os parlamentares se veem, e como veem os seus pares”, conforme mostra a figura abaixo reproduzida.

6Figura II.1 – Classificação ideológica de partidos brasileiros com base em auto declaração de deputados da Câmara Federal

78

Fonte: Zucco (2009).

Os autores explicam em nota: “partidos empilhados, em qualquer ano, indicam que as diferenças entre suas posições estimadas não são significativas ao nível de 0.05”.

Sobre esse estudo, Zucco (2009) chama atenção para o deslocamento do PSDB e do PPS para a direita e observa que “a maioria tanto dos partidos de direita quanto dos de esquerda estão hoje mais próximos do centro”. Acrescenta Zucco que os parlamentares reconhecem uma estrutura ideológica partidária, mas, apesar desse reconhecimento, em regra, os partidos são diferenciados pelos parlamentares como aqueles que estão no governo e aqueles que estão na oposição (Zucco, 2009:17/18).

II.6 Classificação ideológica partidária utilizada como fonte secundária para a construção da