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2. Enquadramento Biográfico: Do Abstrato à vontade concreta 5

2.3. Entendimento do Estágio Profissional: Do choque com a realidade à (re)

O estágio foi, do meu ponto de vista, a passagem de uma perceção do meu "eu" no papel de estudante para um "eu" detentor de outro papel construí- do não somente sozinha mas coletivamente, o papel de professor. O papel de professor sempre foi visto por mim como uma função que encerra uma alta responsabilidade, desempenhado por alguém necessariamente com um conhecimento superior, com a obrigação de ser um especialista na temática que abordasse e um conselheiro e farol de valores para os seus alunos. O EP corresponde ao que Veenman (1984) define como "choque com a realidade". Esta expressão pretende transmitir o sentimento que o professor alberga no momento em que inicia a sua prática, onde os seus ideais e expetativas (r)evolucionárias são postos em causa face à realidade que se lhe apresenta. Este choque com a realidade acontece devido à preponderância teórica da FI

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de professores. Um menor importância e tempo de ensino é adjudicado à práti- ca em contexto simulado próximo da realidade. Assim, no início do meu EP não sabia se estava completamente preparada para iniciar esta nova fase, esse "choque com a realidade" teve preponderância na minha tomada de decisões. Uma vez que o "medo" do erro fazia parte do meu dia-a-dia, a perceção das minhas convicções e a confiança em mim eram diminutas, pois considerava que não estava à altura do desafio, não estava à altura da minha turma, nem das minhas colegas. O conceito de identidade é genericamente definido assim, como a “Perceção que cada indivíduo tem de si próprio". A identidade constrói- se na relação e interação dialética que se estabelece entre o “eu” e o “outro”, na similitude e na diferença” (Fernandes, 2001. p. 102). Significa isto que, seria nas relações com os outros e nas respostas dos meus alunos em relação à minha prática onde eu me avaliaria enquanto legítima detentora do papel de ‘professora’.

No decorrer deste ano desempenhei o papel que sempre considerei ser de outra pessoa. Tal como defende Pacheco (1995), ao falarmos do conheci- mento do professor entendemo-lo como um saber, ou conjunto de saberes, contextualizado por um sistema concreto de práticas escolares, que correspon- de ao conceito de sabedoria, refletindo as suas conceções, perceções, expe- riências pessoais, crenças, atitudes, expectativas, dilemas. Pelo que as nossas capacidades, destrezas, habilidades, valores e atitudes, são adquiridos ao lon- go da nossa vida pessoal, académica e profissional. Não existem pessoas que “nascem ensinadas” em nenhuma área e, os professores, não são exceção. Como tal, Peterson (2003. p. 67), afirma que, “Não existem indivíduos nascidos professores. Não existe um professor predestinado e possuidor de capacidades pedagógicas inatas. É preciso um conjunto de exercícios ou de aprendizagens para se tornar um bom professor”.

O EP foi isso mesmo, um palco, uma forma de aprender a ensinar e como o aluno aprende e permite preparar-nos para o futuro pois, o estágio é, segundo Peterson (2003. p. 67), “um meio eficaz que conduz o aluno ao saber, ao saber fazer e ao saber ser do futuro profissional”. Este fornece-nos conhe- cimento que nenhum manual nem nenhum professor nos podem ensinar. São

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necessários um conjunto de exercícios ou de aprendizagens para que alguém se torne um bom professor. Este foi sem dúvida um palco repleto de vivências enriquecedoras que me ajudaram a construir um caminho empolgante, motiva- dor, exigente, mas acima de tudo ajudaram a construir um papel enquanto pro- fessora muito vincado, estruturado e refletido. Assumindo o EP como marco fundamental na construção da IP, na medida em que possibilita a reflexão e a análise crítica de diversas representações sociais historicamente construídas e praticadas na profissão, como refere Guimarães (2004).

Neste ano, eu cruzei a linha do aprendiz com a do transmissora e facili- tadora de conhecimentos, e penso que me tornei uma pessoa capaz de colocar em prol da sociedade em que estou inserida um conjunto de competências que fui adquirindo ao longo dos meus anos de formação. Para mim esta etapa foi vista como evolução que tende a melhorar momento após momento, sem nun- ca esmorecer perante as dificuldades. Nesta etapa, tal como afirma Ribeiro (1989), que a FI e a formação contínua (FC) são duas peças que se comple- mentam no processo de desenvolvimento do professor. Este autor chama ao processo de FI de “indução profissional”. Apela à responsabilidade do professor iniciante para o sentido de comprometimento e que se encontra de forma comum nos professores mais experientes. Esta formação levou-me a acreditar cada vez mais em mim, no meu potencial e a evidenciar o porquê de ter esco- lhido esta área, o porquê deste sonho. A formação foi um marco fundamental para a minha chegada até esta meta.

Desta forma, o EP foi muito importante para a aquisição de uma nova visão sobre a prática profissional, onde tive a oportunidade de incorporar novas atitudes e práticas e de adquirir uma nova visão crítica sobre a minha área pro- fissional. Durante este período tive a oportunidade de aprender a resolver os problemas e entender a grande importância que o professor/educador tem na vida e na formação dos alunos. A conceção que estava presente num plano um tanto ou quanto inconsciente materializou-se na prática da docência na escola. Assim, minha identidade enquanto futura professora caminhou para a mudan- ça. O assumir do papel de professora, de verdade, quando fui requisitada para desempenhar cargos e funções de maior responsabilidade. Albuquerque (2005)

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refere que se dá o primeiro grande impacto dos estudantes com a prática, sen- do este um momento crucial no processo de FI, por via do "choque com a reali- dade" e com a responsabilidade total dos papéis inerentes à função de profes- sor.

Este aspeto é extremamente importante, pois como afirma Gómez (1992), existe um “abismo que separa a teoria da prática", e deve ser então proporcionada uma prática aplicada no contexto escolar, o aprendido, de forma a desenvolver competências, capacidades e atitudes profissionais. Deve anali- sar, atuar e refletir sem a inteira responsabilidade do prático sobre os efeitos geralmente irreversíveis das suas ações”.O saber fazer e saber explicar o que se faz (o conhecimento e as capacidade que cada um utiliza na ação) são duas capacidades intelectuais distintas e muito importantes.A escola ajuda na cons- trução da identidade do ser (professor) e do sentido de pertença, nela cons- troem-se modelos de aprendizagem e adquirem-se princípios éticos e morais que permeiam a sociedade. É assim, importante refletir sobre a melhor maneira de ensinar procurando meios mais eficazes para transmitir e atingir objetivos. É necessário e muito importante que haja então uma prática reflexiva, como refe- re García (1992). O mesmo autor (1992) refere esta ação reflexiva como sendo "o exame ativo, persistente e cuidadoso de todas as crenças ou supostas for- mas de conhecimento, à luz dos fundamentos que as sustentam e das conclu- sões para que tendem". Por isso, torna-se importante que na formação de pro- fessores que estes reflitam sobre a sua prática, fazendo desta reflexão “um instrumento de desenvolvimento do pensamento e da ação” (García, 1992, p. 60).

Através desta ação de reflexão pude constatar a importância que o EP evidenciou na minha forma de ver a escola e os alunos, e a importância de um bom professor para o desenvolvimento dos seus alunos. Inicialmente o medo persistiu em cada ação que realizava a falta de confiança era evidente, porém ao vivenciar todos este momentos considerei que o EP é pertinente, pois pos- sibilita o contacto direto para um melhor conhecimento acerca da realidade, permite um desenvolvimento pessoal e profissional pois desenvolvem-se conhecimentos, capacidade, competências e atitudes, proporcionando o seu

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aperfeiçoamento e viabiliza a construção de uma identidade pessoal. Tudo isto é possível através da reflexão como sugere Nóvoa (1992), num triplo movimen- to: “conhecimento na ação, reflexão na ação e reflexão sobre a ação e sobre a reflexão na ação”. Desta forma pretendesse atingir um desempenho mais cor- reto de forma a alcançar uma profissionalidade de qualidade.

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