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Estratégias da Organização das Nações Unidas para prevenção e recuperação dos dependentes de substâncias ilícitas.

CONSUMO DE DROGAS ILÍCITAS.

4.4 Estratégias da Organização das Nações Unidas para prevenção e recuperação dos dependentes de substâncias ilícitas.

As diretrizes propostas pela Organização das Nações Unidas (ONU), no que tange à prevenção e recuperação dos dependentes em drogas ilícitas, são sintetizadas na Resolução 46/11. Recomenda-se, basicamente, que os países membros desenvolvam estudos sobre os efeitos do uso e da dependência em substâncias psicoativas ilícitas, assim como orquestrem programas a fim de reduzir o uso de drogas entre dependentes e usuários eventuais. Além disso, a ONU propõe que sejam dirigidos esforços para a ampliação da eficácia do tratamento médico adequado e dos programas de reabilitação, o que pode ser alcançado, principalmente, com a ampliação do acesso aos mesmos. Essas metas devem ser priorizadas pelos Estados de forma que prevejam recursos orçamentários suficientes para atender a demanda nacional.

Um dos aspectos mais importantes dessa Resolução circunda a questão da efetividade dos tratamentos, já que se exige que sejam baseados em pesquisas científicas que demonstrem a efetividade dos resultados obtidos com o método utilizado nos tratamentos médicos. Em outras palavras, não basta criar unidades de tratamento, na verdade, os Estados devem fornecer recursos suficientes para que ali sejam oferecidas condições e técnicas adequadas ao trato dos pacientes. Essa preocupação possui relevância extrema já que o uso de métodos não- convencionais, como o acorrentamento de pacientes ou uso de eletro-choque, podem ocasionar à responsabilização criminal dos responsáveis pelos crimes de maus-tratos, tortura, lesão corporal, entre outros.

Observa-se, também, que a atenção ao problema das drogas ilícitas foi retomada no Relatório Anual sobre Desenvolvimento dos Países, concluído em 2005, momento em que a ONU elencou o crime e a violência como dois dos principais fatos de retardo do desenvolvimento social do Brasil, destacando os danos causados pelo crime organizado que arquiteta os esquemas de tráfico nacional e internacional de drogas.

Além do tráfico, a ONU estimou que a incidência de crimes contra o patrimônio, cometidos com ou sem violência contra a pessoa, cresceu: de acordo com uma pesquisa feita

cerca de 35% da população alega já ter sido vítima desses delitos. Constatou-se ainda um aumento da taxa de homicídios, principalmente entre habitantes de áreas mais pobres. Esses dados conduziram a seguinte conclusão:

Não é de surpreender que uma grande parcela da população se sinta insegura, o que induz a distúrbios psicológicos, redução de contatos sociais, apoio a soluções simplistas e populistas, assim como à justificação do abuso policial e da atuação de grupos de extermínio.271

Em razão dessas estatísticas, a ONU incentivou a instalação do Núcleo de Atenção Psicossocial localizado no município de Santo André em São Paulo, que objetiva a recuperação e atenção ao dependente de drogas ilícitas e álcool. Nesse núcleo, o interessado tem acesso a tratamento médico psicológico, e também pode se abrigar em um dos seis leitos disponíveis272.

Atualmente, a UNODC no Brasil, Escritório integrante da ONU, apenas divulgou um projeto dedicado à prevenção de drogas no ambiente do trabalho e da família. Esse projeto teria o objetivo de diminuir o uso de drogas entre 24 mil trabalhadores de 30 empresas localizadas no estado do Rio Grande do Sul, o que seria alcançado pela colaboração dos familiares e da comunidade273. Em última instância, o projeto visava melhorar a qualidade de

vida dos envolvidos a fim de aumentar a produtividade das empresas.274

Basicamente, era necessário que a empresa indicasse três pessoas para receberem o treinamento adequado no SESI (Serviço Social da Indústria) do Rio Grande do Sul. Após a capacitação, o Comitê Coordenador deveria organizar as atividades e palestras úteis à plena divulgação das informações sobre o uso de drogas obtidas no treinamento. Além disso, contava-se com um Comitê Reabilitador ou Orientador integrado por profissionais da saúde que iria tratar daqueles beneficiados com problemas mais graves gerados pelo consumo de entorpecentes. Salienta-se que os alvos desse projeto eram aqueles empregados que apresentassem indícios de que sofriam de algum distúrbio comportamental decorrente do uso de substâncias psicoativas, tais como faltas, queda do desempenho, atrasos e acidentes de trabalho.

271 ONU (2005). UNCT (BRASIL). Uma leitura das Nações Unidas Sobre os Desafios e potenciais do Brasil:

avaliação conjunta do país. UNCT no Brasil, agosto 2005. Disponível em: <http://www.unodc.org/brazil/pt/library_and_links.html#drogas>. Acesso em 20/01/2010

272 Fonte: http://www.unodc.org/treatment/en/Brazil_resource_centre_2.html. Acesso em 20/01/2010

273 Consta no website da UNODOC que o critério para a escolha de empresas participantes foram: atuação em

setores econômicos competitivos e com histórico de atividades voltadas à melhoria da qualidade de vida dentro e fora do ambiente de trabalho; escala hierárquica reduzida, com executivos motivados e dispostos a se engajar no projeto; quadro funcional comprometido com resultados e produtividade; detentoras de técnicas gerenciais que privilegiam o trabalho em equipe e a democratização da informação.

O aludido projeto obteve resultados avaliados como positivos pela ONU, dentre eles destacou-se a obtenção de certificado ISO 9001 pelas 39 empresas gaúchas envolvidas, a melhora da qualidade de vida dos colaboradores, com a redução de 16% no número de fumantes, queda de 12,5% no consumo de álcool e, o mais relevante para o trabalho, declínio de 28,7% do consumo de drogas ilícitas. Houve, ainda, melhora na produtividade das empresas, com diminuição de faltas (10%), atrasos (30%) e acidentes provocados pelo uso de substâncias psicoativas (34%).

À primeira vista, pode-se verificar que a atuação da ONU no campo da prevenção ao aumento do consumo de drogas ainda é reduzida e não alcança pessoas marginalizadas, já que o mencionado projeto está restrito a trabalhadores regularmente vinculados a empresas, seja por vínculo empregatício ou prestação de serviços. Critica-se em partes essa intervenção, pois, muito embora seja benéfica aos envolvidos, parece estar motivada mais por razões econômicas do que para o benefício da saúde pública.

Para se ter uma pequena amostra da capacidade econômica da ONU, cita-se que, no orçamento de 2008-2009, foram recebidos a título de doações dos países membros e de pessoas jurídicas de direito privado a quantia de US$ 191.5 milhões. Em 2008, estima-se que as doações para custeio de programas de prevenção às drogas e ao crime atingiram o total de U$ 258.5 milhões. Ressalte-se que o Brasil é um dos maiores contribuintes da ONU chegando a fornecer o total de US$ 24.667 milhões em 2008275.

Diante do vulto de investimentos do governo brasileiro, no mínimo, é questionável a aplicação desses fundos para benefício de tão restrito grupo. Acredita-se que ONU demonstra os interesses aparentemente ocultos no desenvolvimento da economia em detrimento do bem- estar daqueles envolvidos nos programas de prevenção.

A preocupação com a saúde pública não é, claramente, o foco dessa Organização que se dedica a elencar os entraves ao desenvolvimento econômico do país, esquecendo entre eles o mais importante: os graves problemas sociais sofridos pela população, tais como a pobreza, violência e exclusão social.

Encarar o uso de substâncias ilícitas, isoladamente, como um fator de atraso da economia seria ingênuo, pois esse problema já se deriva ora de uma situação social insustentável vivida, ora de uma condição psíquica de desequilíbrio do sujeito.

Sustenta-se que a dependência e o uso de substâncias ilícitas devem ser enfrentados sim pelo Estado, mas por a perspectiva de um problema de saúde pública que gera graves

efeitos no seio da sociedade. Exatamente, por isso, dedicar-se-á ao estudo das políticas públicas de saúde mental que dão suporte aos usuários e dependentes em drogas ilícitas.

4.5 Estigmatização do usuário pelo processo penal e justiça terapêutica: os contra-sensos

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