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A importância dos Princípios Constitucionais penais para a delimitação das funções do Bem jurídico no Estado Democrático de Direito.

DELITOS INSERIDOS NA LEI N.º 11.343/2006.

3.4 A importância dos Princípios Constitucionais penais para a delimitação das funções do Bem jurídico no Estado Democrático de Direito.

Na doutrina nacional contemporânea, é possível identificar o esforço de autores como Prado, Bittencourt, Rogério Greco, Nilo Batista e Salo de Carvalho, no sentido de ressaltar o papel dos princípios penais fundamentais, que estariam previstos no texto constitucional. Esses princípios seriam considerados o “núcleo gravitacional do Direito Penal”208 e

cumpririam a tarefa de caracterizar e delimitar o Direito Penal209. Além disso, ressaltam a importância desses princípios, particularmente, por representarem uma conquista da sociedade expressa pela positivação de direitos fundamentais que se relacionam com os referidos ditames.

Apesar disso, é certo que muitos desses princípios fundamentais “não deixam de ter um sentido programático, e aspiram a plataforma mínima sobre a qual possa elaborar-se o direito penal de um estado de direito democrático”210.

O caráter programático de tais princípios não retira, evidentemente, a respectiva eficácia normativa e, até mesmo nas hipóteses em que a concretização das finalidades ali contempladas não seja possível, por deficiência do aparato estatal ou por qualquer outro motivo, a sua presença no texto constitucional tem inegável importância. Eis que esses direitos fundamentais possuem uma peculiar força simbólica.

Por tal dimensão simbólica ter a ambivalência como característica, ela tanto “pode exatamente servir à superação de situações concretas de negação dos direitos”, como pode servir para disfarçar a deficiência do Estado ou para incentivar a manipulação da realidade para fins políticos opostos à implementação dos mesmos direitos211.

Dentre os princípios aqui apontados como fundamentais, sob uma perspectiva de garantir ao máximo a realização da dignidade da pessoa humana, enfoca-se no princípio da ofensividade. Não se trata de mitigar o papel de outros importantes ditames igualmente

207 A exemplo de Teresa Correa Aguado e Alice Bianchini. 208 PRADO. Op. cit., p. 55.

209 BATISTA, Nilo. Introdução Crítica ao Direito Penal Brasileiro. 8 ed. Rio de Janeiro: Revan, 2002, p. 61. 210 BATISTA. Op. Cit., p. 61-62.

211 NEVES, Marcelo. A força simbólica dos Direitos Humanos. In: SOUZA NETO, Cláudio Pereira;

SARMENTO, Daniel (org.) Direitos Sociais: fundamentos, Judicialização e Direitos Sociais em Espécie. 1 ed. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2008, p. 421.

fundamentais, a exemplo dos princípios da legalidade em sua dupla faceta formal e material, da intervenção mínima, da humanidade e da culpabilidade, mas sim apenas conferir destaque aqueles princípios que serão mais destacados no desenvolvimento deste trabalho.

De acordo com esses princípios, Prado entende que existem alguns limites a serem respeitados a fim de proteger os bens jurídicos penais. Esses limites são expressos por meio do princípio da adequação social dos meios utilizados pelas instituições penais, assim como através da proporcionalidade na escolha dos meios e sanções em relação à ofensa cometida ao bem jurídico. Além disso, seria necessária a observância do interesse preponderante que significa dizer que a sanção não pode causar um dano de maior gravidade do que aquele que se pretende evitar com o mandado de proibição212.

Nesse passo, convém citar Ferrajoli que sustenta que a teoria dos bens jurídicos apenas poderá oferecer uma variedade de critérios negativos de legitimação servindo como parâmetro limitativo para justificar a criminalização de condutas e sua conseqüente punição213.

Todos os princípios penais fundamentais têm em comum a finalidade de concretizar a dignidade da pessoa humana, valor que foi elencado como um dos objetivos do Estado Democrático de Direito Brasileiro no artigo segundo da Constituição Federal de 1988.

Conforme os ensinamentos de Sarlet, a dignidade da pessoa humana não comporta uma definição fixista já que se caracteriza pelo pluralismo e, ainda é informada por uma diversidade de valores manifestados no seio de uma sociedade complexa como é a contemporânea. Nesse contexto, o conceito derivaria de um processo de construção e desenvolvimento interminável, já que a práxis constitucional, as necessidades e valores sociais conduziriam a uma demanda constante de concretização e delimitação da dignidade214.

Portanto, sustenta-se aqui que a dignidade da pessoa humana, na condição de valor fundamental, atrai o conteúdo de todos os direitos fundamentais e exige o reconhecimento e proteção dos mesmos. A realização da dignidade e dos direitos dela decorrentes funcionará como elemento capaz de legitimar toda a ordem jurídica. Portanto, é imprescindível que o Estado reconheça a dignidade da pessoa humana de forma a lhe conferir a máxima eficácia, uma vez que quando se deixa de atribuir à pessoa seus direitos fundamentais, em verdade, estar-se-á lhe negando a sua própria dignidade.

212 PRADO, Luiz Regis. Bem Jurídico-penal e constituição. 4 ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2009, p.

90.

213 FERRAJOLI, Luigi. Direito e Razão: teoria do garantismo penal. 2 ed. São Paulo: Revista dos Tribunais,

2006,p. 432-433.

214 SARLET, Ingo Wolfgang. Dignidade da Pessoa Humana e Direitos Fundamentais na Constituição

Embasados nessa perspectiva de dignidade, inspirado pelas idéias kantianas, Bettiol afirma que a pessoa humana é a prioridade no Estado Democrático de direito, desaprovando as formas de degradação e de mitigação de sua autonomia, cujo respeito seria imposto pelas regras de convivência social pacífica215.

É certo que a demanda por segurança jurídica é melhor atendida quando os valores e direitos necessários a realização da dignidade da pessoa humana estão previstos no texto constitucional. A contemplação dos valores relevantes para a sociedade pela norma constitucional não significa que o legislador ficará adstrito ao texto normativo, uma vez que já se ressaltou a importância da integração dos elementos normativos com dados culturais e sociais extraídos da realidade. Alerta-se ainda que a legitimidade do ordenamento jurídico pressupõe a existência de um consenso social em torno daqueles valores contemplados pela norma e, por isso, o acesso às esferas de poder deve abrigar um espaço para a participação democrática dos membros da sociedade civil.

A fim de corroborar a necessidade de consenso valorativo no âmbito da sociedade, convém mencionar que “a estigmatização de um comportamento como delituoso deve limitar- se à violação daquelas normas sociais em relação às quais existe um consenso praticamente ilimitado e com as quais, no mínimo, em geral, é possível as pessoas se conformarem”216.

Afora essas ressalvas, não há duvidas de que a própria Constituição contém não somente princípios fundamentais que devem guiar o Direito Penal, como também possui mandados de criminalização ou, pelo menos, expressa “as linhas substanciais prioritárias para a incriminação ou não de condutas”217.

Nesse perspectiva, o bem jurídico penal indubitavelmente possui natureza constitucional porque seu sentido é alcançado através da interpretação de normas constitucionais que, por sua vez, positivam valores éticos-culturais considerados importantes pela sociedade em dado momento histórico. De tal sorte, o bem jurídico será considerado autêntico na medida em que se relacione com um valor, que por ser considerado importante no meio social, veio a ser jurisdicizado por certa norma constitucional.

Outrossim, reconhecer o papel limitador do bem jurídico não prejudica a atividade criativa do legislador. Ao contrário do que pode parecer, a criação de tipos penais resulta de uma articulação entre a norma jurídica e os fatores reais. Ao tempo em que o legislador considera dados empíricos que comprovam a necessidade de criminalização de uma conduta,

215 BETTIOL, Giusepe. Direito Penal. Vol. 1. São Paulo: Revista dos Tribunais, p. 78-79, in apud: PRADO. Op.

cit., p. 74.

216 STRATENWERTH, G. Derecho Penal. Madrid: Edersa, 1982, p. 6 in apud: PRADO.Op. Cit., p. 86. 217 PRADO, Op. cit., p. 82.

deve verificar quais são os limites constitucionais de sua atividade, utilizando-se do parâmetro da proporcionalidade para verificar qual é a potencialidade ofensiva de certo comportamento ao bem jurídico a ser tutelado.

3.5 A importância do princípio da ofensividade para a limitação da criminalização de

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