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4. O MODELO MKS

4.1 ESTRUTURA SETORIAL DO MODELO MKS

O MKS representa uma economia industrial ligada a um sistema bancário e um mercado financeiro. O modelo conta ainda com um setor público, que arrecada tributos sobre salários, lucros, juros, dividendos e ganhos de capital financeiro, e realiza gastos com serviços da dívida pública e com salários dos funcionários públicos, um setor financeiro (com um sistema bancário e o mercado acionário) e o Banco Central.

Possui uma indústria formada por quatro setores, sendo três setores de bens finais e um de matérias-primas. Os três setores de bens finais correspondem os três departamentos do modelo de Kalecki. O setor de matérias-primas é verticalmente integrado, e fornece também matérias-primas para os outros três setores de bens finais:

i) Um setor de bens de consumo básico (correspondente ao Departamento III produtor de bens de consumo para os trabalhadores do modelo de Kalecki), e está composto por 12 firmas;

ii) Um setor de bens de consumo supérfluo, correspondente ao departamento produtor de bens de consumo para os capitalistas (o Departamento II de Kalecki), formado por 8 firmas;

iii) Um setor de bens de capital, que produz as máquinas e equipamentos demandados por todos os setores da economia, inclusive o próprio (corresponde ao Departamento I de Kalecki), e conta com 8 firmas e;

iv) Um setor de matérias primas, que fornece as matérias primas necessárias a todos os outros setores da economia, inclusive o próprio. O setor produtor de matérias-primas tem 12 firmas.

A dinâmica empresarial do modelo MKS é microeconômica. Assim, cada firma realiza um gasto com pesquisa, tem um desempenho tecnológico diferenciado em relação às demais firmas, logo, as produtividades médias de cada setor serão diferentes, assim como a relação capital produto e a produtividade do trabalho.

Os “rentistas” do MKS são proprietários de riqueza financeira e monetária, composta de ações (das empresas industriais) negociadas em bolsa, de títulos de dívida adquiridos junto ao sistema bancário e de depósitos em conta-corrente neste mesmo sistema bancário. Como todas as empresas do MKS possuem 100% de capital aberto, os rentistas são os proprietários destas empresas, mas não são responsáveis por sua gestão. Não há “empresários” no MKS, no sentido de uma classe empresarial que simultaneamente é proprietária e gestora das empresas industriais.

Assim, a redistribuição de renda entre trabalhadores e empresários ou entre empresários e rentistas, no MKS, se dá entre trabalhadores (salários) e empresas (lucros brutos da depreciação) ou entre empresas (reservas para depreciação) e rentistas (dividendos). As empresas do MKS, ao obterem seu lucro operacional, após o pagamento dos impostos, retém uma parcela deste na forma de “reservas para reposição do capital depreciado” e distribuem aos acionistas a parcela restante, líquida da depreciação. Assim, a renda agregada líquida da economia (ou seja, descontadas as reservas para depreciação) se distribui entre trabalhadores e rentistas.

Os trabalhadores têm propensão a consumir igual a 1, e portanto, gastam todo o salário, deduzidos os impostos, isto é, a sua renda disponível, no setor de bens de consumo básico. Os capitalistas do MKS são representados por agentes que atuam no sistema financeiro (os rentistas), pois todas as empresas do MKS possuem capital aberto, com suas ações negociadas na bolsa de valores. Estas empresas deduzem do lucro operacional as

reservas para reposição do estoque de capital depreciado e os lucros líquidos são distribuídos aos acionistas, na forma de dividendos.

Além da riqueza acionária proveniente da bolsa, os rentistas adquirem títulos de dívida emitidos pelo sistema bancário (o qual oferece aos seus clientes uma rentabilidade lastreada na remuneração que os próprios bancos recebem pela aquisição de títulos da dívida pública). A propensão marginal a consumir dos rentistas flutua a depender do comportamento da riqueza financeira que estes possuem, tanto em termos do seu estoque total, quanto em termos de sua rentabilidade, podendo inclusive superar a unidade em épocas de boom no mercado financeiro.

Nestes momentos, em que a riqueza financeira dos rentistas está em rápida expansão, eles tomam decisões de consumo que superam sua renda corrente e, para viabilizar estes gastos excessivos, recorrem ao crédito bancário. Desta forma, o consumo de bens supérfluos pelos rentistas não está restrito pela sua renda corrente.

Apesar de a propensão a consumir dos rentistas poder exceder a dos trabalhadores, a incidência da tributação sobre o rendimento dos rentistas é sobre o total da sua renda, sendo a sua renda disponível proporcionalmente menor que a dos trabalhadores, pois, apesar de os trabalhadores terem a propensão a consumir igual a um (1), a tributação sobre os salários incide somente sobre os ganhos reais que excederem o valor da cesta básica.

Dessa forma, uma redistribuição de renda em favor dos trabalhadores provocaria um maior impacto no consumo, mesmo quando a propensão a consumir dos rentistas for maior que a unidade, por 3 motivos:

i) Para os trabalhadores já empregados, a parcela de aumento de salário (decorrente da redistribuição de renda) que estiver abaixo do preço da cesta de consumo básico seria isenta de impostos, enquanto seria tributada (esta mesma renda) se fosse recebida pelos rentistas;

ii) O aumento do emprego provocado pela redistribuição de renda implicaria uma expansão de gastos de consumo, pois sobre o valor do salário dos novos trabalhadores contratados incidirá uma menor tributação (devido à isenção da parcela correspondente ao preço dos bens básicos);

iii) A decisão de gastos com consumo supérfluo dos rentistas não é alterada pela redução de sua renda corrente, pois no caso desta se mostrar insuficiente os

mesmos recorrem ao crédito de consumo para complementar a necessidade de poder aquisitivo.

Na ocorrência de um aumento salarial, os trabalhadores do setor de bens de consumo básico ampliarão o consumo de bens produzidos nesse setor. Porém, nem todo ganho de salário é revertido em consumo, devido aos impostos que fazem com que a renda disponível dos trabalhadores do setor de bens de consumo básico possibilite um consumo cuja receita gerada será menor do que os salários pagos pelos empresários desse setor. Isso significa que esse acréscimo na receita decorrente do consumo desses trabalhadores será menor do que o aumento de custos que a elevação dos seus salários implica.

Contudo, essa perda será compensada pelo aumento dos salários dos trabalhadores do setor produtor de bens supérfluos, do setor produtor de bens de capital e do setor produtor de matérias primas, cujo acréscimo na renda disponível possibilitará maiores gastos, expandindo os lucros do setor produtor de bens de consumo básico. Para atender a esse acréscimo de demanda, o setor de bens de consumo básico aumenta o grau de utilização de sua capacidade produtiva, contratando mais trabalhadores.

O aumento da lucratividade do setor de bens de consumo básico eleva a renda dos empresários desse setor e dos rentistas, e se reflete numa maior demanda por bens de consumo supérfluo. Tanto a maior demanda de bens de consumo supérfluo quanto de bens de consumo básico, demandam mais matérias-primas, fazendo crescer a lucratividade desse setor, e essa lucratividade também acresce a demanda por bens supérfluos. Com estes três setores, de bens de consumo básico, de bens supérfluos e de matérias-primas, produzindo mais, reduzida a capacidade ociosa irão investir mais, demandando bens de capital e elevando a produção e lucratividade do setor produtor desse tipo de bem.

O aumento da produção e da lucratividade do setor produtor de bens de capital implica no reforço dos efeitos expansivos sobre o consumo de bens de consumo básico, de bens supérfluos e de matérias-primas, retroalimentando o impacto positivo sobre os investimentos. O resultado final, além da elevação do lucro total da economia, é a expansão do investimento, da produção, do nível de emprego e do consumo totais.

Dada a estrutura do modelo, na concepção dos agentes que o integram e na relação de integração entre os quatro departamentos, são os mecanismos de transmissão descritos acima que entram em ação quando realizadas as simulações computacionais, e sob esses

mecanismos estarão sujeitos os efeitos da PVSM, introduzida no MKS, sobre o nível de emprego.