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5. METODOLOGIA

5.1 O MÉTODO DE ANÁLISE POR SIMULAÇÕES COMPUTACIONAIS

A metodologia escolhida para alcançar os objetivos aqui propostos foi a análise por simulação computacional. Conforme definido por Valente (2008, p.09) “A simulation model is a computer program composed by data structures and computational routines acting on those structures”. Este método gera informações em termos quantitativos, porém a análise realizada se dá sob aspectos qualitativos, elegendo-se uma base teórica para interpretar os resultados das simulações.

Segundo Dweck (2006):

Processos caracterizados por mudança estrutural endógena e interação entre diferentes níveis de análise, com possíveis propriedades emergentes, são identificados não-linearidade estrutural e requerer uma análise da trajetória. Em tais processos interativos, ocorrem mudanças, não apenas nas variáveis endógenas, como também nos próprios parâmetros. Nestes casos, frente a impossibilidade de definir um resultado único e previsível, é possível obter trajetórias por simulação, que dependem das hipóteses sobre as condições iniciais e valores dos parâmetros. (DWECK, 2006, p. 124)

As simulações computacionais permitem a preservação da complexidade organizacional de sistemas constituídos por agentes heterogêneos e mudança endógena. Esta complexidade costuma ser abstraída nos convencionais modelos analíticos lineares, que foi por longo tempo a única alternativa técnica, em virtude da limitação da capacidade computacional de outrora, o que significava grandes perdas teóricas, e, em decorrência dessas perdas, resultados comprometidos, pois:

Ao simplificar a teoria para tornar o modelo tratável pelos instrumentos analíticos, eliminam -se os aspectos mais complexos da organização do sistema econômico, empobrecendo, quando não deturpando, os resultados encontrados. (CAVALCANTI FILHO, 2002, p. 41)

Disponíveis hoje novos instrumentos em decorrência do avanço das ciências computacionais, optar pelo método de solução por simulação computacional permite manter a complexa estrutura do modelo, evitando o reducionismo típico das abordagens ortodoxas e a observação da trajetória das variáveis consideradas frente ao comportamento dos agentes, o desempenho das empresas etc. Esta metodologia também possibilita a observação da sensibilidade das variáveis micro e macroeconômicas às mudanças de políticas econômicas e

a análise das trajetórias evolutivas das variáveis de interesse, tudo isto, mantendo toda a complexidade organizacional e, portanto, a consistência e robustez dos padrões encontrados.

Dessa forma, modelos de simulação computacional permitem incorporar a autonomia decisória dos agentes, e capturar a interação das decisões individuais, interdependentes e de mútua influência. A realização simultânea, consecutiva e integrada dessas inúmeras decisões possíveis produzirá a transformação do ambiente e uma infinidade de destinos serão possíveis. Portanto, essa metodologia torna possível a análise das trajetórias resultantes das transformações sofridas e induzidas pelos agentes e que são registradas durante a evolução do seu ambiente, permitindo que se estude fenômenos complexos relacionados ao ambiente em questão (no nosso caso, uma economia hipotética) (BARROS et ali, 2013).

É importante estar ciente, contudo, de que o método de simulação não permite análise assintótica, cabendo apenas a interpretação dos resultados dentro do período analisado (que não importa quão longo seja, é infinitamente inferior ao infinito) – não é possível rodar um número infinito de períodos, e quanto mais longo o período de simulação, mais imprecisos os resultados em decorrência do arredondamento numérico associado à capacidade computacional.

Para realizar este método, é necessário como ferramenta um simulador: um programa computacional apto a operar simulações a partir da modelagem de sistemas complexos, auto- organizativos e cujas trajetórias resultantes da interação dos agentes a partir de suas decisões integradas são variadas e não ergódigas. Com esta finalidade, o simulador utilizado foi o LSD, que permite a simulação de economias hipotéticas. A economia hipotética estará representada pelo modelo MKS, um modelo macrodinâmico, microfundamentado, auto-organizativo, e cujas equações estão dispostas de modo a configurar um modelo de simulação computacional. O modelo MKS foi desenvolvido partindo do método de simulações computacionais, através do uso do programa LSD. O MKS é um dos primeiros da classe de modelos macroeconômicos microfundamentados que se origina no Instituto de Economia da UFRJ, seguindo-se posteriormente pelos modelos de Dweck (2006) e Busato (2011).

Assim, a metodologia empregada contempla como instrumento as simulações computacionais, dentro das condições dinâmicas e estruturais do modelo MKS, através do simulador LSD. Os resultados, isto é, a influência da política salarial proposta, sobre as trajetórias das variáveis escolhidas, serão analisados tendo como norte as teorias de Keynes e Kalecki, e o próprio modelo MKS.

As propriedades formais do modelo MKS apresentam as três características descritas a seguir:

 simulação computacional – O MKS é formado por mais de seiscentas equações, cada uma correspondendo a uma variável econômica, que pode ser formalmente a mesma para diferentes agentes, o que implica em valores numéricos distintos a cada ponto e ao longo do tempo. Cada uma dessas equações foi também escrita no formato C++, de modo a tornar o modelo passível de ser trabalhado por meio de simuladores computacionais. Essa característica permite preservar toda complexidade do modelo, pois o torna apto a alimentar simuladores de modo a observar de forma dinâmica as relações construídas, a resposta de cada variável micro e macroeconômica a determinadas políticas, as trajetórias evolutivas dos comportamentos, tecnologias e desempenho das firmas, permitindo averiguar a sua sensibilidade a alterações nos parâmetros das equações que compõem o sistema;

 multissetorial – o caráter multissetorial é indispensável para caracterizar corretamente a dinâmica evolucionária, pois, nesta perspectiva, a economia, enquanto um sistema que evolui, é composta de sub-sistemas que são endogenamente motivados à transformação, de forma auto-organizada, sofrendo então uma mudança sistêmica, estrutural e funcional. Portanto, no modelo a economia está composta por três subsistemas cujas interações reproduzem a integração teórica Minsky-Keynes-Schumpeter, são eles: indústria – composta por quatro setores distintos; sistema bancário – composto pelo Banco Central e por um sistema bancário comercial, e; sistema financeiro – integrado por rentistas (no MKS, rentiers)40, pela administração financeira das firmas industriais e pelo sistema bancário.

 auto-organizativo – a auto-organização é uma característica comum aos processos evolucionários e pode ser demonstrada em modelos matemáticos através de simulação computacional. O sistema auto-organiza-se ao passar de uma situação caótica para uma situação ordenada. A manifestação deste fenômeno só pode ser observada na dimensão sistêmica (macroeconômica) e não em unidades isoladas (microeconômicas). O caráter auto- organizativo de um sistema significa que propriedades não observáveis ao nível dos agentes podem vir a surgir como resultado da sua complexa interação. Quando „posturas‟ especulativas são favorecidas de modo progressivo pelo mecanismo de seleção, a evolução do sistema pode seguir de um modo que a partir de certo ponto crítico a forma de seleção seja

40Em Cavalcanti Filho (2002) trata-se de pessoas físicas que detêm parte das quotas acionárias negociadas na bolsa de valores e de parte dos títulos emitidos pelo sistema bancário, cujas escolhas de portfólio são representadas por um “Fundo de Investimentos”. Acumulam riqueza financeira, e assim viabilizam o funding da dívida das firmas industriais - na aquisição de novas emissões de quotas acionárias -, e a redução da iliquidez nos passivos bancários - na aquisição de títulos. São esses agentes que consomem os bens supérfluos, os quais financiam de forma complementar ou substitutiva por meio dos dividendos e juros recebidos de seus ativos financeiros ou por meio de empréstimos bancários, de prazo mais curto que os empréstimos às firmas, sendo essa escolha entre fontes internas ou externa de recursos determinada pelo custo de oportunidade em termos das taxas de juros dos ativos e do passivo.

endogenamente alterada, traindo as previsões dos especuladores, afetando os demais agentes e, promovendo uma reversão cíclica endógena. Ou seja, à medida que cresce o grau de auto- organização do sistema, este se torna mais frágil, pois, conforme a economia se auto-organiza, torna-se mais significante a sua memória espacial - aumentando a sensibilidade dos agentes em relação ao comportamento dos demais - e a sua memória temporal - significando isto que apenas uma inovação é capaz de gerar uma crescente divergência da trajetória sistêmica ao longo do tempo.

Trata-se, pois, de um modelo computacional que busca observar a dinâmica evolucionária na economia motivada pelas inovações financeiras e tecnológicas. Estas, por sua vez, são capazes de provocar transformações estruturais manifestadas em ciclos econômicos. O principal objeto de análise é a trajetória intertemporal da economia, que vai se modificando endogenamente por meio das inovações e de sua seleção pelo mercado. O próprio objeto de análise e sua caracterização revelam que a posição teórico-metodológica adotada privilegiou as abordagens dinâmicas, em detrimento daquelas de natureza estática (particularmente a neoclássica) acerca do desenvolvimento econômico.

5.2 O MODELO DE SIMULAÇÃO COMPUTACIONAL MKS: PARÂMETROS E