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Expansão e “administrativização” do Direito Penal

3.1 Sociedade de risco, criminalidade moderna e modernização do Direito Penal

3.1.1 Expansão e “administrativização” do Direito Penal

As novas tarefas atribuídas ao Direito Penal pelo processo de modernização, que vão desde o combate à criminalidade moderna até a promoção de valores ético-sociais, resultaram na denominada “expansão” do Direito Penal. Tal movimento se traduziu, como visto, na redução da rigidez dos pressupostos gerais da intervenção penal, mas também no recrudescimento de penas e na neocriminalização.

No Brasil, esse último fenômeno consistiu na superprodução, sobretudo a partir da década de 1990, de leis penais extravagantes, com vistas à prevenção de riscos em matéria de ordem econômica, sistema financeiro, engenharia genética, proteção ambiental etc. Todavia, considerando a atual propensão à desnacionalização e internacionalização do Direito, a expansão do Direito Penal atinge o patamar de fenômeno global, o que faz com que as tendências político-criminais do Direito Penal do risco sejam acolhidas nos sistemas jurídicos em geral, tornando mais difícil a reversão desse quadro.

307 BUERGO, Blanca Mendoza. El Derecho Penal en la sociedad del riesgo. Madrid: Civitas, 2001. p. 41. 308 Dentre eles, Herzog, Seelmann e Prittwitz.

309 HERZOG, Felix. Sociedad del riesgo. Derecho Penal del riesgo, regulación del riesgo. Perspectivas más allá del Derecho Penal. In: ZAPATERO, Luis Arroyo; NEUMANN, Ulfried; MARTÍN, Adán Nieto (Org.). Crítica

y justificación del Derecho Penal en el cambio del siglo: el análisis crítico de la escuela de Frankfurt. Trad.

Adán Nieto Martín e Eduardo Demétrio Crespo. Cuenca: Universidad de Castilla-La Mancha, 2003. p. 249. 310 PRITTWITZ, Cornelius. O Direito Penal entre Direito Penal do risco e Direito Penal do inimigo: tendências

atuais em Direito Penal e política criminal. Revista Brasileira de Ciências Criminais, São Paulo, v. 47, p. 31- 45, mar. 2004. p. 31.

Ao lado do aparecimento dos novos riscos tecnológicos, Sánchez elenca como causas do movimento de expansão: a aparição de novos interesses e o aumento do valor de daqueles que existiam anteriormente; a difusão da sensação de insegurança e sua institucionalização como algo inerente à sociedade atual; o descrédito de outras esferas de proteção, mantendo-se a visão do Direito Penal como o único recurso eficaz para a proteção dos bens jurídicos mais importantes e a maior identificação social com as vítimas, em especial com as da criminalidade moderna, cujos riscos, em regra, não atingem uma clientela preferencial, mas

estão difusos na sociedade.311

Dentre as causas do expansionismo penal, duas merecem destaque. A primeira é a sensação geral de insegurança. Para Sánchez, o fator que determina a pressão pela modernização do Direito Penal não é o dado objetivo do surgimento dos novos riscos, mas a

difusão social da insegurança subjetiva312. Os novos riscos, conforme descrito por Beck,

diferentemente dos riscos próprios da sociedade de classes (fome, desemprego, analfabetismo

etc.), são invisíveis e indetectáveis à percepção comum, o que os torna mais perniciosos313.

Contudo, ainda que se aceite como premissa a ocorrência de um incremento objetivo dos riscos, há que se reconhecer que eles são amplificados, em especial pelos meios de

comunicação em massa314.

Afinal, como os riscos não são visíveis a olho nu, na “sociedade da informação”, a mídia é que assume a função de lupa. Fato é, todavia, que a imagem insistentemente repassada aos receptores é apenas uma versão parcial e dramatizada da realidade. Assim, o poder dos meios de comunicação em “transformar o ‘efêmero’ em ‘eterno’, o ‘longe’ em

‘perto’”315 e o local em global propaga no seio social o sentimento de que todos estão

entregues à própria sorte, intensificando a cobrança coletiva por mais segurança.

311 SÁNCHEZ, Jesús-María Silva. A expansão do Direito Penal. Aspectos da política criminal nas sociedades pós-industriais. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2002. p. 27-62. De fato, o atual processo de expansão do Direito Penal se relaciona com a redescoberta da vítima no discurso jurídico-penal. Se as doutrinas ligadas à tradição iluminista viam a legislação penal, na expressão de Liszt, como a “magna carta do delinquente”, o movimento vitimológico trouxe para o centro do debate a ideia de que o Direito Penal também deve garantir o direito da vítima à punição do infrator.

312 Ibid., p. 32.

313 BECK, Ulrich. La sociedad del riesgo. Hacia una nueva modernidad. Barcelona: Paidós, 1998. p. 51.

314 Fernandes, apesar de defender que a objetividade dos riscos é inegável, reconhece que podem existir defasagens entre os riscos reais e aqueles que são sentidos pelas pessoas (FERNANDES, Paulo Silva.

Globalização, “Sociedade de risco” e o futuro do Direito Penal. Panorâmica de alguns problemas comuns.

Coimbra: Livraria Almedina, 2001. p. 64).

315 GARCIA, Rogério Maia. A sociedade do risco e a (in)eficiência do Direito Penal na era da globalização.

Revista de Estudos Criminais. Porto Alegre, ano 5, n. 17, p. 77-104, jan.-mar. 2005. p. 87. Nesse sentido, a

análise de Sánchez: “[...] é incontestável a correlação estabelecida entre sensação social de insegurança diante do delito e a atuação dos meios de comunicação. Estes [...] transmitem uma imagem da realidade na qual o que está distante e o que está próximo têm uma presença quase idêntica na forma como o receptor recebe a mensagem. Isso dá lugar, algumas vezes, diretamente a percepções inexatas; e, em outras, pelo menos a uma

Em relação à segunda causa do expansionismo penal aqui ressaltada, sua exposição exige uma breve contextualização histórica. A década de 1970, na Europa, foi marcada por uma série de reformas descriminalizantes. Nesse período, de maneira geral, os partidos políticos de esquerda e os movimentos populares socialistas assumiam uma posição de desconfiança em relação ao poder punitivo, visto como braço armado das classes burguesas, destinado à repressão dos pobres e proletários. O discurso de combate ao crime era, por

conseguinte, reservado aos políticos conservadores e aos estratos sociais que os apoiavam.316

Todavia, a partir da década de 1980, há uma mudança na posição de boa parte dos grupos de esquerda, que passam a advogar o recurso ao Direito Penal na luta pela promoção de valores coletivos (direitos dos trabalhadores, das mulheres, das minorias étnicas, dos animais etc.) e na repressão a comportamentos desviantes das classes poderosas (crimes do

colarinho branco, corrupção etc.)317. Logo, o chamado “punitivismo de esquerda” fez com que

o apoio ao movimento de expansão do Direito Penal aqui retratado fosse quase unânime, tornando-o livre para se desenvolver sem uma oposição significativa que lhe garantisse o equilíbrio.

Ocorre que o mesmo discurso “populista panpenalista”318 que impulsionou as

reivindicações da “esquerda punitiva”319 não se ateve apenas à criminalidade moderna (ou dos

powerful), alcançando também a criminalidade de massa (ou dos powerless). Isso porque, no

discurso político, conforme ressaltado por Ripollés, tende-se a confundir duas fontes de riscos radicalmente distintas em sua origem, de forma que a criminalidade dos socialmente

sensação de impotência. Com mais razão, por outro lado, a reiteração e a própria atitude (dramatização, morbidez) com a qual se examinam determinadas notícias atuam como um multiplicador dos ilícitos e catástrofes, gerando uma insegurança subjetiva que não corresponde com o nível de risco objetivo.” (SÁNCHEZ, Jesús-María Silva. A expansão do Direito Penal. Aspectos da política criminal nas sociedades pós-industriais. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2002. p. 38).

316 Ibid., p. 65-67.

317 Tais grupos correspondem ao que Sánchez chama de “gestores atípicos da moral” (Idem, ibidem, p. 62). 318 O populismo não é um conceito jurídico, mas um fenômeno genuinamente político. Trata-se de uma

estratégia eleitoreira que apela às mais diversas necessidades das massas, valendo-se de oposições como cidadãos honestos vs. bandidos. Em matéria de política-criminal, o populismo lança mão dos mais diversos medos e inseguranças coletivas. Por meio de um discurso emotivo, tenta convencer que todo o mal social se resume à “explosão” da criminalidade. A partir deste diagnóstico, propõe como “cura”: a criminalização de mais condutas, o incremento das penas, o aumento do poder repressivo policial, a redução da maioridade penal, a construções de prisões etc. Contudo, tais medidas visam apenas angariar votos, pois é patente sua ineficiência para resolver todos os problemas decorrentes da falta de políticas públicas. São, por outro lado, eficazes em transmitir à população a sensação de que algo está sendo feito pelos governantes, tranquilizando-a, temporariamente. (FIGUEIREDO, Frederico. Política criminal populista: para uma crítica do Direito Penal instrumental. Revista Brasileira de Ciências Criminais, São Paulo, v. 70, p. 100-132, jan. 2008). Sobre a política-criminal populista, Cf. ALBRECH, Peter-Alexis. El Derecho Penal en la intervención de la política populista. In: CASABONA, Carlos María Romeo (Dir.). La insostenible situación del Derecho Penal. Granada: Comares, 2000. p. 471-488.

319 A expressão é utilizada em KARAM, Maria Lúcia. A esquerda punitiva. Revista Discursos Sediciosos, Rio de Janeiro, v. 1, n. 1, p-79-92, jan.-jun. 1996.

excluídos, a “delinquência clássica”, é vista como a dimensão não tecnológica da sociedade de risco. Para ele, o modelo penal de segurança cidadã, que embasa as ideologias de law and

order e a proposta do Direito Penal do inimigo320, serve-se, parasitariamente, do debate sobre

o Direito Penal do risco e a modernização do Direito Penal.321

Anota-se que Ripollés, em crítica ao diagnóstico de Sánchez, assevera que o risco de que a delinquência clássica perdesse o protagonismo dentre os objetos da jurisdição penal se encontra superado. O autor explica que o entusiasmo inicial que promoveu diversas reformas legislativas já se resignou, frente aos obstáculos, em não alcançar a delinquência dos poderosos. Assim, para Ripollés, o fenômeno da expansão do Direito Penal, na realidade, concentrou-se no recrudescimento do arsenal punitivo disponível contra a criminalidade de

massa.322

Já Acosta entende que a modernização do instrumento penal para abarcar a criminalidade moderna estimula e é estimulada pelo modelo penal securitário que avança

sobre a criminalidade de massa323. Daí a afirmação de Prittwitz de que o Direito Penal do

inimigo é consequência de um desvio na rota do Direito Penal do risco, que se desenvolveu na direção errada. Na visão do autor alemão, este já possuía uma perigosa tendência ao Direito Penal do inimigo, tendo apenas escolhido inimigo diverso. Logo, no final das contas, o

Direito Penal do risco serviu como atalho para o Direito Penal do inimigo. 324

De fato, ainda que a expansão criminal aqui tratada, destinada à incursão do Direito Penal em áreas sensíveis aos riscos tecnológicos, não se confunda com a noção de Direito Penal do inimigo formulada por Jakobs, com o movimento norte-americano do law and order ou com o “emergencialismo penal” da legislação italiana, certo é que, apesar das diferenças,

320 O Direito Penal do inimigo, enunciado por Jakobs na Conferência do Milênio em Berlim, em 1999, propõe a separação entre um Direito Penal do cidadão, no qual valem todas as garantias historicamente conquistadas e reconhecidas pelo Estado de Direito, e um Direito Penal do inimigo, no qual tais garantias são subtraídas a fim de se fazer frente aos “inimigos” (líderes de organizações criminosas, terroristas, etc.).

321 RIPOLLÉS, José Luis Díez. Da sociedade do risco à segurança cidadã: um debate desfocado. Revista

Portuguesa de Ciências Criminais, Coimbra, v. 17, n. 4, p. 547-599, out.-dez. 2007. p. 547.

322 Id., El nuevo modelo penal de la seguridad ciudadana. Revista Electrónica de Ciencia Penal y Criminología. Granada, 06-03, p. 03:1-03:34, 2004. p. 6-7. Disponível em: <http://criminet.ugr.es/recpc/06/recpc06-03.pdf>. Acesso em: 2 fev. 2015, às 17h00.

323 ACOSTA, Juan Obert Sotomayor. ¿El Derecho Penal garantista en retirada? Revista Penal, Medellín, Colombia, n. 21, p. 148-164, jan. 2008. p. 153.

324 PRITTWITZ, Cornelius. O Direito Penal entre Direito Penal do risco e Direito Penal do inimigo: tendências atuais em Direito Penal e política criminal. Revista Brasileira de Ciências Criminais, São Paulo, v. 47, p. 31- 45, mar. 2004. p. 31 et seq. Em sentido semelhante, Zaffaroni, Alagia e Slokar consideram o Direito Penal do risco uma nova forma de Direito Penal do autor, uma vez que pretende presumir os dados subjetivos, deduzindo a responsabilidade de processos de imputação baseados em expectativas normativas e não em disposições intelectuais reais do sujeito ativo. Segundo os autores, esse processo de normatização dos elementos subjetivos do tipo, ao prescindir da vontade real, marca um retrocesso à presunção de dolo (ZAFFARONI, Eugenio Raúl; ALAGIA, Alejandro; SLOKAR, Alejandro. Derecho Penal. Parte General. 2. ed. Buenos Aires: Ediar, 2002. p. 67).

todos esses fenômenos priorizam as estratégias de controle penal preventivo e acabam por

desprezar a cultura jurídica garantista conquistada ao longo dos séculos325.

A atribuição ao Direito Penal de um papel central na gestão dos riscos da vida moderna, ao aproximá-lo do modelo de intervenção típico do Direito Administrativo, levou também ao tão falado processo de “administrativização” do Direito Penal.

Sánchez elenca algumas dimensões do processo de “administrativização” do Direito Penal. A primeira diz respeito à modificação do conteúdo material e da estrutura dos tipos penais, decorrente da introdução de novos objetos de tutela de titularidade supraindividual e

da antecipação das fronteiras da intervenção penal. O autor observa que determinados

“contextos” – isto é, condições prévias de fruição de bens jurídicos individuais – são elevados, per se, à condição de bem jurídico-penal, provocando a ingerência do instrumento

penal tão logo transgredido o standard de segurança.326

O caráter “administrativizado” do Direito Penal também se manifesta na inclusão, entre os seus objetos de proteção, da própria atividade administrativa do Estado, referente ao controle de determinado setor da vida social, configurando o que Moccia qualifica como

tutela penal de funções.327 Tal dimensão do fenômeno de “administrativização” está presente

na criminalização da mera desobediência a normas administrativas, como, por exemplo, a atuação em determinada atividade econômica sem permissão e a obstrução de procedimento

de inspeção estatal.328

Segundo Puig, a hipertrofia do Direito Penal a partir da “administrativização” do seu conteúdo de tutela decorreu da excessiva primazia atribuída pelo Estado Social à perspectiva de ordem coletiva. Para ele, um direito penal “administrativizado”, cuja finalidade é buscar a máxima eficácia da intervenção estatal e que tende a considerar a proibição penal a melhor estratégia para resolver os principais problemas de uma sociedade em crise, jamais

325 ACOSTA, Juan Obert Sotomayor. ¿El Derecho penal garantista en retirada? ¿El Derecho Penal garantista en retirada? Revista Penal, Medellín, Colombia, n. 21, p. 148-164, jan. 2008. p. 149-150.

326 SÁNCHEZ, Jesús-María Silva. A expansão do Direito Penal. Aspectos da política criminal nas sociedades pós-industriais. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2002. p. 113-122.

327 MOCCIA, Sergio. Dalla tutela dei beni ala tutela di funzioni: tra illusioni postmoderne e riflussi illiberali.

Rivista Italiana di Diritto e Procedura Penale, Milano, v. 38, n. 2, p. 343-374, apri.-giu. 1995. p. 343.

328 SÁNCHEZ, op. cit., p. 125-129. A terceira dimensão analisada por Sánchez é a denominada “redescoberta da neutralização”. O autor explica que a difusão social da insegurança subjetiva e a obsessão pela segurança, nas sociedades modernas, levaram à compreensão do delito como um risco social passível de gerenciamento. Assim, recorre-se a dados estatísticos e indicadores quantitativos para emitir prognósticos de periculosidade em relação a grupos de sujeitos. Para o autor, tal contexto, aliado ao descrédito das teorias da ressocialização, mostrou-se propício à redescoberta pelo Direito Penal da neutralização fática, em substituição à comunicativa (Ibid., p. 130-135). Outras dimensões do processo de “administrativização” do Direito Penal, não aprofundadas por Sánchez, são: o recurso a penas alternativas à restritiva de liberdade, como a multa e a interdição temporária de direitos, a responsabilidade penal da pessoa jurídica e a “administrativização” da justiça penal, por meio de procedimentos de desformalização e desjudicialização (negociação, barganha, entre outros).

corresponderá a um Direito Penal mínimo. Afinal, o recurso ao Direito Penal como instrumento meramente sancionador de normas extrapenais leva a sua “prostituição”, na medida em que o reforço penal é utilizado toda vez que se pretende maior eficiência na proibição de determinado comportamento. Por essa razão, deve-se evitar cair na tentação de estender ao Direito Penal o papel promocional que corresponde a outros setores do Direito no Estado Social.329

Para Baratta, o Direito Penal “administrativizado” se caracteriza pelos seguintes aspectos: 1) intervenção penal orientada a suprir mecanismos de controle administrativo; 2) perda das características de abstração e generalidade pelos tipos penais, que passam a servir como respostas a crises particulares, emergenciais e excepcionais; 3) recurso à técnica legislativa que emprega conceitos indeterminados, cláusulas genéricas e elementos normativos em excesso, expandindo a discricionariedade judicial; 4) desprivilégio da concepção defensiva de bem jurídico, em favor da concepção promocional, como decorrência da estrutura dos novos bens jurídicos supraindividuais e 5) produção legislativa e decisões judiciais de caráter programático e político, voltadas a assumir a gestão de conflitos,

atendendo aos reclamos da opinião pública e publicada.330

O fenômeno da “administrativização” se relaciona, ainda, com a perda do interesse, sobretudo na doutrina alemã, pelas teorias que propõem uma diferenciação qualitativa entre crime e infração administrativa, em favor das teorias que estabelecem uma distinção meramente quantitativa, isto é, de gravidade do injusto. É precisamente a falta de clareza quanto aos critérios de diferenciação entre ilícito penal e ilícito administrativo que leva à

“administrativização” do Direito Penal331.

Aliás, a noção de bem jurídico-penal é o principal critério ao qual recorrem os defensores da existência de diferenças qualitativas entre os âmbitos de intervenção do Direito

329 PUIG, Santiago. El Derecho Penal en el Estado Social y Democrático de Derecho. Barcelona: Ariel, 1994. p. 154, 157 e 165.

330 BARATTA, Alessandro. Funções instrumentais e simbólicas do Direito Penal. Lineamentos de uma teoria do bem jurídico. Revista Brasileira de Ciências Criminais, São Paulo, ano 2, n. 5, p. 5-24, jan.-mar. 1994. p. 11- 13.

331 TOMILLO, Manuel Gomez. Consideraciones em torno al campo límite entre el derecho administrativo sancionador y el derecho penal. Revista Actualidade Penal, nº 4, 2000, p. 80. Em países como Brasil, Itália, França e Espanha, a doutrina, de maneira geral, entende que não há diferença substancial, mas apenas normativa, entre ilícito penal e ilícito administrativo (REALE JÚNIOR, Miguel. Ilícito administrativo e jus

puniendi geral. In: PRADO, Luiz Regis (Coord.). Direito Penal Contemporâneo. Estudos em homenagem ao

Professor José Cerezo Mir. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2007, p. 93). Isso significa que o legislador é livre para decidir, segundo seu juízo de adequação, conveniência e eficiência, entre proibir determinada conduta pela ameaça de pena ou de sanção administrativa. Essa teoria, dita unitária, tem o mérito de chamar a atenção para o fato de que não é apenas o Direito Penal, mas todo o poder punitivo que está em expansão e carente de ser contido.

Penal e do Direito Administrativo332. Logo, o descrédito das teorias diferenciadoras qualitativas se reflete na crise do conceito crítico-garantista de bem jurídico no Direito Penal contemporâneo.

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