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Das explicações para os processos de constitucionalização às interações entre as forças políticas: o ativismo judicial entre otimismo e pessimismo

DA FISCALIZAÇÃO DE CONSTITUCIONALIDADE

JUDICIALIZAÇÃO DA POLÍTICA E RESPOSTA JUDICIAL: UMA INCURSÃO PELA TEORIA POSITIVA

4.3 Das explicações para os processos de constitucionalização às interações entre as forças políticas: o ativismo judicial entre otimismo e pessimismo

A expansão mundial, nos mais diversos contextos, a criação de cortes supranacionais e o aprofundamento da judicialização da política no plano interno, com a interferência em temas tradicionalmente afastados das instâncias judiciais, exige explicações mais complexas

322 Como exemplos de cada uma das situações: (a) a "certificação constitucional", em que a Corte Constitucional

da África do Sul se recusou a aceitar um texto nacional oriundo de um corpo de representantes políticos; (b) quando a Corte da Coréia do Sul restabeleceu o presidente Roh Moo-hyun, que tinha sofrido impeachment após decisão da Assembléia Nacional; (c) no Paquistão, teve-se com a validação de um golpe político, a partir da aplicação da doutrina da "necessidade do Estado” e no princípio “salus populi suprema Lex”, para “poupar o país do caos e da falência”. HIRSCHL, Ran. The judicialization of mega-politics and the rise of political courts. Annual Review of Political Science, v. 11, p. 1-44, 2008, p. 11.

323 A decisão do Tribunal Constitucional Espanhol, de 2005, que assegurou jurisdição aos tribunais daquele país

para julgar casos relativos a genocídio e crimes contra a humanidade, independentemente do envolvimento ou vitimização de cidadãos espanhóis é considerada outro marco. Já as batalhas judiciais para reconhecimento da situação dos povos indígenas na Austrália, Canadá e Nova Zelândia e as demandas sobre as ações afirmativas nos EUA constituiriam exemplo de política de reparação. HIRSCHL, Ran. The judicialization of mega-politics and the rise of political courts. Annual Review of Political Science, v. 11, p. 1-44, 2008. Disponível em: http://ssrn.com/abstract=1138008. Acesso em: 18 mai 2010, p. 12-13.

324 A manutenção do bilinguismo e o futuro político de Quebec na federação canadense, com a apreciação da

constitucionalidade do Referendo de Secessão (1998) daquela Província; o status jurídico e a posição da Sharia no ordenamento jurídico do Egito e as decisões sobre a proibição do uso de trajes religiosos no sistema de ensino público nas cortes européias seriam exemplos dessa intrincada e complexa intervenção judicial nos temas políticos. HIRSCHL, Ran. The judicialization of mega-politics and the rise of political courts. Annual Review of Political Science, v. 11, p. 1-44, 2008. Disponível em: http://ssrn.com/abstract=1138008. Acesso em 18 mai 2010, p. 14-17.

do que as já apresentadas, especialmente quanto à deferência, pelos demais agentes políticos, ao Judiciário.

Tradicionalmente, a adoção das constituições toma relevância particular nos momentos de reestruturação institucional, talvez porque, como comenta Boaventura de Sousa Santos, “a ambiguidade da intervenção dos tribunais, decorrente de sua imprevisibilidade e fragmentaridade, revela-se particularmente útil sempre que as forças políticas não conseguem chegar a um compromisso político em questões estruturantes”325.

John Ferejohn, compartilhando da mesma opinião, sumariza os fatores que explicam a preferência pelo constitucionalismo em duas hipóteses:

(a) fragmentação política horizontal ou vertical, que limita a capacidade legislativa dos demais poderes e diminui seu potencial de constituir o local onde a política efetivamente é formulada. Põe em risco, ainda, a capacidade das demais instituições controlarem as cortes. O presidencialismo, enquanto divisão horizontal, distribui poder, pela existência de outra instância controlável pelo eleitorado – o Poder Executivo, com sua capacidade de interferência nas demais agencias de poder cria inevitáveis conflitos. Já o sistema federalista permite o exercício de poder dos estados sem controle federal, ou dota-os de capacidade de bloquear ou atrasar ações nacionais, disputas que acabarão no poder judiciário326.

(b) compreensão de que as cortes podem proteger um espectro de valores contra os abusos políticos. Na Europa, a referida idéia tomou força após a Segunda Guerra Mundial, em que a experiência negativa com os parlamentos nas décadas de 20 e 30 superou o preconceito das esquerdas, que viam a revisão judicial como um instrumento contramajoritário e, com amparo na experiência norte-americana de então, voltado à garantia da propriedade privada. A ampliação do catálogo de direitos, a desconfiança do parlamento (que não se mostrou instância apta a frear o fascismo e o nazismo) e o afastamento das constituições das instâncias (com a criação dos tribunais constitucionais), teriam facilitado a percepção das cortes como garantidoras dos direitos humanos. Sugere-se, ainda, que a possibilidade de indicação de membros pelos diversos partidos e o afastamento das cortes da magistratura ordinária teriam contribuído para a aceitação na Itália e na Alemanha. Já nos EUA,

325SANTOS, Boaventura de Sousa. Direito e democracia: a reforma global da justiça. In: PUREZA, José

Manuel, FERREIRA, António Casimiro (orgs.), A teia global. Movimentos sociais e instituições. Porto: Afrontamento, 2001, p. 125-177, p. 156.

326 FEREJOHN, John. Judicializing politics, politicizing law. Law and Contemporary Problems, v. 65, n. 3, p.

121 essa função pareceu com mais força após o famosíssimo rodapé do caso Carolene

Products, que marcou a nova posição da Suprema Corte, especialmente após as nomeações de Roosevelt327.

Referidas explicações, voltadas ao contexto norte-americano e europeu, parecem não ser suficientes para compreender a atribuição do mister de administrar, no longo e tortuoso processo de afirmação constitucional, tensões inerentes aos processos políticos de sociedades multifacetadas, como as que recentemente passam por processos de adoção e aprofundamento da judicialização.

Ran Hirschl, por exemplo, faz um inventário das teorias que justificariam estes processos e, posteriormente, lança sua hipótese.

Para o autor, as teorias classificadas de “evolucionistas” asseveram a inevitabilidade do progresso judicial e creditam o fenômeno aos “macrofatores endógenos”, como a necessidade de auto comprometimento dos atores políticos, devido à pouca confiança nos instrumentos tecnocráticos de poder.

As “explicações funcionalistas” justificariam a constitucionalização diante das necessidades sociais, eis que seus instrumentos seriam aptos a assentar a continuidade dos processos públicos e a unidade política. Enfatizam que as transformações jurídicas podem melhorar a eficiência das deliberações políticas, ao definir que os opositores monitorem os políticos e demais grupos políticos. A expansão das agências administrativas semi-autônomas e reguladoras exige um judiciário ativo, a afiançar as condições da política. Nas organizações supranacionais, um órgão judicial comum, como possui a União Européia, permite a coordenação dos ordenamentos, com a adoção dos vetores comuns na legislação interna de cada integrante. A deferência ao sistema jurídico, portanto, consistiria numa resposta orgânica às pressões do próprio sistema político328.

327 Essa fragmentação, segundo o autor, pode ser superada por um bom sistema de partidos, que coordene ações

entre as instituições, pelo menos em certas ocasiões. FEREJOHN, John. Judicializing politics, politicizing law. Law and Contemporary Problems, v. 65, n. 3, p. 41-69, 2002, p. 56-7.

328 Associa-se, assim, a adoção da revisão judicial à incerteza politica, especialmente quanto ao processo futuro.

Os custos futuros dessa opção, para os agentes, parecem interessantes porque o discurso jurídico, ainda que imprevisível, tem suas escolhas reduzidas diante dos condicionantes da interpretação jurídica e do insulamento do debate acadêmico-normativo, com suas noções de legalidade e fidelidade ao texto. GINSBURG, Tom. Judicial review in new democracies: constitutional courts in asian cases. New York: Cambridge University Press, 2003 (kindle, posição 348-358/4023). Para Stone Sweet, as explicações funcionalistas não seriam suficientes, pois não há previsibilidade na atuação judicial, pelas normas que as estruturam, pelos grupos que podem encaminhar suas demandas - das mais diversas naturezas - pela imprecisão do direito. (p.143). Mas o autor entende que há uma certa funcionalidade das cortes, que justifica sua expansão pelos mais diversos ordenamentos. Elas dispõem de meios para evitar usurpações de suas competências, mas se deve avaliar porque ou como elas conseguem que suas decisões sejam respeitadas. SHAPIRO, Martin; SWEET. Alec Stone. On law, politics, judicialization. New York: Oxford University Press, 2002, p. 144.

Já os chamados “modelos institucionais econômicos” sustentam a constitucionalização em virtude da garantia de previsibilidade da regulação governamental do mercado, pois a jurisdição converte-se num mecanismo “apolítico” de controle da atividade burocrática. Afasta-se a dependência dos investimentos econômicos do setor político, que não mais condicionariam o mercado. Os parâmetros de intervenção estatal na atividade econômica são afirmados pela legislação, que delineia a esfera de discricionariedade dos juízes no julgamento dessas ações.

Traçadas as linhas gerais de cada explicação, o autor atenta para as insuficiências e inconsistências delas. Os vetores políticos específicos de cada processo de judicializaçao careceriam de análise mais apurada, para destacar em que condições políticas surgem e, posteriormente, comparar as constatações de forma sistêmica. Essas teorias negligenciariam, ainda, as repercussões dos comportamentos individuais e dos interesses que os mobilizam, especialmente dos fatores que provocam a aceitação dos agentes que, a rigor, são prejudicados pelas limitações ínsitas a qualquer processo de constitucionalização.

A transferência de poder ao Judiciário, segundo Hirschl, não é fruto de um processo isolado, mas um acordo entre diversas forças, que possivelmente deve ir ao encontro do interesse desses atores329, que assumem os riscos desse processo porque acreditam que sua posição será melhorada numa “juristocracia”.

No esclarecimento de sua tese da “self-interest hegemonic preservation”, cogita que os demais agentes políticos são movidos pelo intento de aumentar ou manter seu poder, determinar os rumos da política geral, mas sob um discurso democrático. Os agentes econômicos, por sua vez, pretendem assegurar liberdades econômicas, em vista do reconhecimento dos direitos fundamentais. Certamente, tais interesses devem encontrar ressonância nas elites judiciais, que se animariam diante da possibilidade de aumentar sua influência política e, ainda, conquistar reputação internacional.

Mais que considerações altruísticas ou morais que favorecem tal fortalecimento, são estes interesses específicos, baseados na crença de que a atividade das cortes os espelhará, que explicam a constitucionalização dos sistemas políticos. Juntamente com os fatores internos, atualmente é enfatizada, de igual modo, a relevância dos condicionamentos externos. É sabido

329 HIRSCHL, Ran. Towards juristocracy. The origins and consequences of the constitutionalism. Cambridge:

123 que os fundos econômicos internacionais exigem a segurança e os investidores procuram por credibilidade das instituições para fazer suas opções por determinados países.330

Portanto, a judicialização condiciona a política, mas também é um instrumento desta, pois está respaldada na convergência de interesses dos diversos grupos preponderantes numa sociedade. O estabelecimento das condições destas interações, contudo, depende da análise de cada contexto, na busca do entendimento de suas origens e das suas conseqüências.

Trata-se de processo que se inicia nas condições institucionais, mas que depende da prática política para sua efetivação331, sendo necessária a constatação das interações entre os diversos agentes para sua caracterização. Em verdade, são as variantes dos relacionamentos entre os órgãos de natureza jurisdicional entre si e com os demais agentes estatais, e por fim, dos poderes públicos – em suas três esferas – com os grupos sociais, políticos e econômicos, majoritários ou não, que determinam as características e extensão deste processo332.

O conceito acadêmico de judicialização da política mostra um circuito institucional e desempenha um papel instrumental para a explicitação destas novas relações. São inevitáveis, em dadas situações, tensões entre os tribunais e demais órgãos da vida pública. Neste contexto, ganha destaque a posição das cortes frente aos desafios políticos que lhes são apresentados.

O “ciclo da judicialização” completa-se quando o Judiciário marca uma posição política antagônica àquelas predominantes nas instituições majoritárias, opondo-se às políticas por elas adotadas333. Tal dimensão substantiva deveria ser estudada, como propõe Ernani Carvalho, a partir das respostas das cortes, mediante a categoria do ativismo judicial, a confirmar a completude da judicialização334.

Em sentido diverso, Dieter Grimm identifica no ativismo judicial a principal causa do avanço dos magistrados em áreas de decisão política ou típicas da regulação social –

330Santos, por exemplo, atribui às agências de financiamento externo a adoção de judiciários fortes em toda a

América Latina SANTOS, Boaventura de Sousa. Direito e democracia: a reforma global da justiça. In: PUREZA, José Manuel, FERREIRA, António Casimiro (orgs.). A teia global. Movimentos sociais e instituições. Porto: Afrontamento, 2001, p. 125-177, p. 156.

331 O relacionamento entre o Judiciário e os demais atores políticos não resta bem esclarecido no conceito inicial

de Tate, que estaria voltado a uma concepção formal das atribuições e relações dos poderes. KOERNER, Andrei; MACIEL, Débora Alves. Sentidos da judicialização da política: duas análises. Disponível em: ‹http://www.scielo.br/pdf/ln/n57/a06n57.pdf ›, p. 10. Acesso em: 12 mar 2005, p. 17-19.

332 CARVALHO, Ernani Rodrigues de. A judicialização da política no Brasil: apontamentos para uma nova

abordagem. Trabalho apresentado no Encontro Nacional da ABCP - Associação Brasileira de Ciência Política - Área Instituições Políticas - Painel (1) – Direitos, Justiça e Controle - 21- 24 julho 2004 – PUC – Rio de Janeiro. Disponível em: ‹www.cienciapolitica.org.br/Ernani_Carvalho.pdf›, 16-17. Acesso em: 20 maio 2005.

333 OLIVEIRA, Vanessa. Elias de. Judiciário e privatizações no brasil: existe uma judicialização da política?

Dados: Revista de Ciências Sociais, v. 48, n. 3, p. 559-587, 2005, p. p. 564.

334 CARVALHO, Ernani Rodrigues de. Revisão abstrata de legislação e judicialização da política no Brasil.

fenômeno que denomina, conforme a expressão que toma emprestada de Robert Badinter, de “imperialismo judicial” 335.

Entendo, portanto, que as condições de intervenção das cortes constitucionais nas questões políticas (judicialização) estão relacionadas com as possibilidades de resposta judicial (confirmação ou não de um ativismo judicial). Seguramente, a oportunidade de sucesso na via judicial constitui um incentivo para que os interessados ajuízem suas ações. Nisso, o ativismo judicial – amparado nas condições de judicialização da política – acaba por aprofundar esse mesmo processo. Todavia, são questões distintas e que merecem abordagens diferentes.

Para os estudiosos da judicialização, a força política do judiciário se assenta em seus aspectos institucionais, como a neutralidade/imparcialidade e na sua atuação particularizada, voltada aos casos específicos. Por isso, as cortes tomariam o cuidado de fundamentar suas decisões em argumentos jurídicos. Seu processo decisório, caracterizado por ser caso a caso, técnico e com baixa visibilidade, permite-lhes agir estrategicamente, tomando pequenos passos, e testando as conseqüências futuras das decisões336.

Assim, são as escolhas posteriores das cortes que definem seu papel, pois devem fazer opções e eleger suas “batalhas” cuidadosamente, limitando os conflitos àqueles em que podem vencer ou agir de forma mais agressiva e provocar contra-ataques337. Os juízes avaliam os resultados das suas decisões na esfera política e tendem a votar estrategicamente, para torná-las aceitáveis aos grupos políticos. Suas preferências são norteadas pelo intuito de afirmar sua independência e obter uma inserção satisfatória no ambiente político, a resguardar a obediência aos julgados prolatados.

Para minimizar sua ingerência nos demais sistemas sociais e firmar-se como órgão relevante para o quadro institucional, as cortes se esmeram na formulação de mecanismos

335 Apesar desta afirmação, o autor não desconhece as possibilidades de “delegação”, quando os próprios

políticos direcionam à solução de questões controversas ao judiciário, para não se desgastar perante a opinião pública. GRIMM, Dieter. Judicial activism. In: BADINTER, Robert; BREYER, Stephen. Judges in contemporary democracy. An international conversation. New York: New York University Press, 2004. p. 17- 65, p. 17.

336 E não basta somente a retórica da neutralidade, mas os tribunais devem parecer neutros, sob pena de decair

sua credibilidade. SHAPIRO, Martin; SWEET, Alec Stone. On law, politics, judicialization. New York: Oxford University Press, 2002, p. 165-70. As respostas do judiciário, certamente, estão amparadas nas construções normativas. Por isso, as cortes se diferenciariam dos demais agentes políticos estatais porque estão encarregadas de determinar a constitucionalidade, sua função é proteger os direitos fundamentais e suas decisões são finais. Sua atividade, assim, é eminentemente jurídica.

337 No que se refere a esse desempenho do sistema, são visualizadas duas possibilidades de revisão judicial:

baixo equilíbrio, caracterizada nos primeiros anos por poucas decisões de reduzida importância; a de alto equilíbrio, caracterizada por um grande número de decisões que ensejam o cumprimento das autoridades políticas. GINSBURG, Tom. Judicial review in new democracies: constitutional courts in asian cases. New York: Cambridge University Press, 2003, (kindle, posição 2894/4023)

125 jurídicos de apaziguamento das tensões políticas, de modo a relativizar o impacto das suas resoluções. As construções jurídicas para fundamentar determinadas interpretações atingem, em alguns sistemas, alto grau de complexidade. Uma das grandes preocupações da jurisdição é precisamente a de que suas decisões sejam incorporadas à prática dos demais órgãos políticos e jurídicos sem maiores problemas, sendo absorvidas pela comunidade de agentes constitucionais.

Diante da diversidade de aspectos que envolvem essa atuação, os comentaristas se dividem entre pessimismo e otimismo quanto aos resultados e potencial democrático destes processos de judicialização da política.

Ran Hirschl, em vista de sua definição da “juristocracia”, enquadra-se entre os “pessimistas”, numa crítica voltada aos pressupostos da constitucionalização e às suas conseqüências econômicas.

A constitucionalização seria usualmente descrita como um fenômeno progressivo de mudança social e política, na confiança num governo tecnocrático e, por conseguinte, no desejo de reduzir a discricionariedade dos agentes estatais. Esses fatores justificariam um processo que é visto como a expansão da nova concepção de democracia e direitos do pós- guerra. Para o autor, trata-se de um fenômeno global de transferência de grandes decisões a agências semi-autônomas de poder, retirando-as das instâncias majoritárias – no que denomina de insulamento das escolhas políticas das pressões populares, de questionável probabilidade democrática.

O potencial transformador – de promoção de noções progressivas de justiça distributiva - também seria exagerado, considerando que a interpretação e implementação de direitos constitucionais dependem de muitos fatores – como ideologia, constrangimentos institucionais, condições econômicas e sociais – de difícil concretização, especialmente porque demandam intervenção estatal e a realização de despesas num período de avanço "neoliberal". Sua tese, em verdade, é mais radical: a constitucionalização consistiu num empecilho às tentativas de redução das disparidades econômicas, e não o inverso338.

338 A partir de situações concretas, mostra que a transferência de certas questões sociais ao judiciário decorre de

encorajamento pelos próprios políticos, que não querem correr os riscos de certas decisões. Do ponto de vista dos políticos, a delegação envolve problemas de longo prazo: erosão da imagem pública autônoma das altas cortes; como garantir que estas tomarão decisões que lhes favoreça em termos de preferências ideológicas e interesses políticos (grande questão da delegação política). Do exame de quatro contextos (Canadá, 1982; Israel, 1992; Nova Zelândia, 1990; África do Sul, 1993-1996) infere que estes tribunais raramente se diferenciam desses interesses que respaldaram seu fortalecimento. Todavia, ainda mantêm uma reputação melhor que a dos outros atores políticos. HIRSCHL, Ran. Towards juristocracy. The origins and consequences of the constitutionalism. Cambridge: Harvard University Press, 2004, p. 213-218.

Os otimistas, por sua vez, dão particular destaque às interações entre os poderes estatais e vêem na judicialização a oportunidade de um novo arranjo entre as forças políticas.

Tom Ginsburg, após analisar a Coréia do Sul, Taiwan e Mongólia, visualiza que a função das cortes na democracia, mais que a aplicação de normas pré-existentes, é justamente o desenvolvimento de uma cultura constitucional, em vista da construção do significado constitucional pela interação com outros agentes. A revisão judicial pode contribuir para os diálogos constitucionais e ter um papel chave na consolidação da democracia e no incremento a estabilidade política, no que denomina de um “ciclo virtuoso” que encoraja o cumprimento das normas constitucionais e o respeito aos direitos civis e liberdades políticas339.

Alec Stone Sweet, após o estudo do papel das cortes constitucionais na Europa – notadamente na Alemanha, também vê o processo de judicialização da política de forma positiva, sugerindo a hipótese de uma “construção coordenada”. A interação entre parlamentos e juízes faz parte da estrutura européia de poder e constitui um processo duplo, em que os parlamentares discutem “como os juízes”; e os juízes comportam-se "legislativamente" – ao emendar, vetar e “derrubar” normas340.

4.4 Uma aproximação aos estudos sobre comportamento das cortes na Judicial Politics:

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