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3. A REGULAÇÃO INTERNACIONAL DE OGM

3.4. A REGULAÇÃO DE OGM NO BRASIL

3.4.4. Fomento, pesquisa, comercialização e rotulagem de OGM

As entidades de fomento, tais como a Capes, CNPq, dentre outros, respondem civil e administrativamente pelas pesquisas relacionadas aos OGMs. Os agentes públicos que autorizaram respondem criminalmente. Por isso devem exigir que as instituições de pesquisa que solicitam recursos para financiar atividades relacionadas a OGM sigam as normas federais (VARELLA, 2005).

Para Pelaez (2007), também devem condicionar o financiamento à exibição do Certificado de Qualidade em Biossegurança (CQB), emitido pela CTNBio, conforme determina o artigo 46, do Decreto Federal n. 5591, de 22 de novembro de 2005, que regulamenta dispositivos da lei de biossegurança.61

As instituições de pesquisa que desenvolvem estudos sobre OGM, tais como empresas, universidades, centros de pesquisa, dentre outros, respondem objetivamente em caso de dano ambiental. As sanções previstas na Lei n. 9.605, de

61BRASIL. Decreto no 5.591, de 22 de novembro de 2005. Regulamenta dispositivos da Lei no 11.105, de 24 de março de 2005, que regulamenta os incisos II, IV e V do § 1o do art. 225 da Constituição, e dá outras providências. Publicado no D.O.U. de 23.11.2005.

12 de fevereiro de 199862 e na Lei de Biossegurança envolvem multa e até mesmo cancelamento da atividade, além de responsabilidade criminal do responsável técnico pelos trabalhos.

O art. 17 da Lei de Biossegurança determina que as instituições de pesquisa criem Comissões Internas de Biossegurança (CIBio), que servirão como um canal de comunicação junto à CTNBio a respeito dos trabalhos desenvolvidos. Determina ainda a indicação do técnico responsável pelo experimento, o qual supervisionará toda a atividade, prestará as informações necessárias aos órgãos competentes e responderá objetivamente em caso de acidentes.

A comercialização de OGM para o consumidor final deve atender às normas consumeristas, em especial da Lei n. 8.078, de 11 de setembro de 199063, conhecida como Código de Defesa do Consumidor, que reconhece a informação como direito básico do consumidor no artigo 6º, inciso III.

Em atendimento ao direito à informação, os OGMs devem trazer nos rótulos as indicações sobre a natureza do produto comercializado.

De acordo com o Decreto n. 4.680, de 24 de abril de 200364, a identificação de OGM dá-se através de um símbolo gravado no rótulo do produto, representado pela letra “T” em um triângulo amarelo, conforme ilustra a figura 1 abaixo:

Figura 1 - Símbolo indicativo de produto transgênico

Fonte: Decreto n. 4.680, de 24 de abril de 2003.

62 BRASIL. Lei no 9.605, de 12 de fevereiro de 1998. Dispõe sobre as sanções penais e administrativas derivadas de condutas e atividades lesivas ao meio ambiente, e dá outras providências. Publicado no D.O.U. de 13.02.1998.

63 BRASIL. Lei no 8.078, de 11 de setembro de 1990. Dispõe sobre a proteção do consumidor e dá outras providências. Publicado no D.O.U. de 12.029.1990.

64 BRASIL. Decreto no 4.680, de 24 de abril de 2003. Regulamenta o direito à informação, assegurado pela Lei no 8.078, de 11 de setembro de 1990, quanto aos alimentos e ingredientes alimentares destinados ao consumo humano ou animal que contenham ou sejam produzidos a partir de organismos geneticamente modificados, sem prejuízo do cumprimento das demais normas aplicáveis. Publicado no D.O.U. de 25.04.2003.

O sinal recebeu críticas por parte da indústria de alimentação. De acordo com o entendimento deste setor, a imagem representa um signo de alerta e atenção, como se o produto representasse risco à saúde do consumidor. Foge, assim, do seu escopo inicial de apenas informar a respeito da natureza do produto. E se houve liberação do produto transgênico após um rigoroso processo de análise por parte dos órgãos competentes, em tese, há uma certificação quanto à segurança alimentar do produto, não mais cabendo discussão quanto a prováveis riscos aos consumidores (TEIXEIRA, 2011).

A legislação que determina a rotulagem condiciona a obrigatoriedade da informação apenas em produtos que contenham mais de 1% de OGM em sua composição, ou seja, caso o produto contenha um percentual menor de OGM não haverá necessidade de informação nos rótulos. O Protocolo de Cartagena fixa o percentual de 4% para a rotulagem obrigatória. Esse mesmo percentual constava na legislação anterior vigente no Brasil.65

A fixação de um percentual mínimo para a rotulagem possibilita a comercialização de gêneros alimentícios que contenham OGM sem que o consumidor seja informado devidamente a respeito. O Código de Defesa do Consumidor não impõe limites ao direito à informação, razão pela qual o percentual mínimo para a rotulagem de OGM afronta esse direito básico do consumidor.

Para a doutrina de Filomeno (2008, p. 38), o direito à informação tem a ver com “o dever de informar o consumidor relativamente às principais características dos produtos”. O direito à informação decorre do fato de que o consumidor precisa saber exatamente o que está consumindo, bem como os riscos relacionados ao consumo, na medida em que o consumidor aceita sofrer as consequências dos riscos, desde que seja informado a respeito dos mesmos.

Igual posicionamento é sustentado por Marques (2006, p. 428), segundo a qual o direito à informação envolve não só o conhecimento a respeito dos riscos relacionados a produtos ou serviços disponibilizados no mercado de consumo, mas também o simples direito de escolha do consumidor que decorre do direito de autonomia da vontade, direito de livre iniciativa do cidadão e do direito de livre

65 BRASIL. Decreto no 3.871, de 18 de julho de 2001. Disciplina a rotulagem de alimentos embalados que contenham ou sejam produzidos com organismo geneticamente modificados, e dá outras providências. Publicado no D.O.U. de 19.07.2001.

escolha no mercado de consumo. Este entendimento também é defendido por Nunes (2009), Grinover (2007) e Gama (2006).

Varella (2005, p. 51) também discorda da fixação de um percentual mínimo para rotulagem:

A fixação do limite tolerado de 1% é, no entanto, arbitrária. Não tem nenhuma razão científica, e consideramos temerário que seja apenas um limite mínimo colocado para atender às normas internacionais e acostumar a população ao consumo de organismos geneticamente modificados, para depois ser retirado da lei.

Para Machado (2009, p. 1046), “a rotulagem dos produtos que contenham OGM segue o princípio do direito à informação do consumidor”. O referido autor também critica as posturas tendentes a obstar a rotulagem (2009, p. 1046):

Não deve causar estranheza a rotulagem de alimentos. Em um país em que se procure a saúde alimentar e se assegure aos consumidores a oportunidade de saber que produto estão escolhendo, deve-se caminhar para uma rotulagem de todos os alimentos. Não há, portanto, preconceito algum, com relação aos alimentos oriundos da Engenharia Genética – os chamados “alimentos transgênicos” -, em se exigir que os mesmos tenham um rótulo contendo sua composição.

Além disso, o art. 40 da Lei de Biossegurança, que é posterior ao Decreto que regulamenta a rotulagem, determina a obrigatoriedade de informação dos produtos que contenham OGM sem impor quaisquer limites percentuais.

Apresentando posicionamento dissonante quanto à necessidade de informações aos consumidores, Nery Júnior (2002, p. 226) entende que sendo a rotulagem um ato posterior à aprovação e liberação pelos órgãos competentes, em tese não oferecem riscos à saúde do consumidor. Por esta razão, a discussão em torno da rotulagem não deve adentrar a seara dos potenciais riscos à saúde do consumidor, mas apenas o seu direito à livre escolha quanto ao consumo ou não de alimentos transgênicos.

O assunto foi objeto de apreciação judicial. Em 02 de fevereiro de 2010, a Justiça Federal do Estado do Piauí confirmou em sentença a antecipação de tutela deferida no sentido de obrigar a rotulagem de quaisquer produtos alimentícios que

contivessem OGM, independente de percentual.66 O magistrado fundamentou sua decisão apenas no direito à informação do consumidor, sem questionar os riscos à saúde humana.

Houve tentativa, sem êxito, de reforma da decisão através de agravo de instrumento e recurso de apelação à instância superior – Tribunal Regional Federal da 1ª Região. Até a presente data a decisão judicial que determinou a obrigatoriedade de rotulagem independente de limites percentuais não sofreu reforma67. Essa decisão é válida para todo o país.