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Capítulo 3 – Análise do impacto da participação dos GPEDs nas CGVs sobre a captura de valor

3.1. Especificação do Modelo

3.1.1. Forma funcional e variáveis de interesse

O objetivo desta seção é apresentar a forma funcional a ser estimada nas próximas seções, bem como as variáveis de interesse. A variável dependente a ser analisada é a captura de valor definida como a parcela do valor adicionado criado por cada país em relação ao valor

agregado gerado globalmente. Pretende-se testar se a maior integração do setor de um país nas CGVs se refletiu em maior participação do seu valor adicionado no VA mundial total do setor. Segundo Coe e Yeung (2015), no contexto das redes de produção globais na perspectiva das firmas, a captura de valor se refere a habilidade das organizações em reter para si o valor adicionado dos processos de produção em redes globais. Para esses autores, a captura de valor pelas corporações é questão chave para compreender trajetórias de desenvolvimento desigual entre diferentes regiões.

Na perspectiva dos países, assumiremos como melhora na captura de valor de um país quando este melhora sua posição relativa no valor adicionado global. Dessa forma, o aumento do VA do setor de um país é entendido como ganho quando acompanhado da elevação da participação da criação de valor do setor de um país na criação de valor pela economia global. Assim, o significado econômico da variável é interessante por relativizar o ganho de PIB do setor de um país em relação ao PIB mundial do setor.

Para avaliar a importância da fragmentação da produção global sobre a captura de valor do setor de um país são realizadas estimações econométricas baseadas na função de produção padrão, em que valor adicionado doméstico (VA) do país p, setor s e ano t é função do capital (K), do trabalho (L) e da mudança tecnológica (A).

𝑉𝐴𝑝𝑠𝑡 = 𝐴𝑝𝑠𝑡 . 𝐿𝑝𝑠𝑡𝛽2. 𝐾

𝑝𝑠𝑡𝛽3 (8)

Diversos autores como Taglioni e Winkler (2016), Boffa et al. (2016) e Constantinescu, Mattoo e Ruta (2017) se baseiam nessa função para estimar impactos da integração dos países nas CGVs. Assumindo-se a mudança tecnológica como uma função das medidas de integração nas CGVs, o que é consistente com a literatura e aplicando o logaritmo na equação (8), tem-se a seguinte equação básica:

𝑙𝑛𝑉𝐴𝑝𝑠𝑡 = 𝛼 + 𝛽1ln. 𝐶𝐺𝑉𝑝𝑠𝑡+ 𝛽2ln. 𝐿𝑝𝑠𝑡+ 𝛽3ln. 𝐾𝑝𝑠𝑡+ 𝜀𝑝𝑠𝑡 (9) onde VApst representa o valor adicionado do setor s do país p no ano t; CGVpst refere-

se ao indicador de participação do setor s do país p na CGV no ano t; Lpst corresponde ao pessoal

ocupado no setor s do país p no tempo t; Kpst representa o estoque de capital setor s do país p no

ano t e

ε

pst representa o termo de erro aleatório.

Este trabalho avança em relação à literatura existente, pois ao invés de estimar o impacto da integração nas CGVs sobre o valor adicionado, avalia seu efeito sobre a captura de valor. Dessa forma, as estimações econométricas deste trabalho têm por base a equação (10):

ln(𝑉𝐴𝑝𝑠𝑡⁄𝑉𝐴𝑠𝑡) = 𝛼 + 𝛽1ln. 𝐶𝐺𝑉_𝑓𝑝𝑠𝑡+ 𝛽2ln. 𝐶𝐺𝑉_𝑡𝑝𝑠𝑡+ 𝛽3ln. 𝐿𝑝𝑠𝑡+

𝛽4ln. 𝐾𝑝𝑠𝑡+ 𝐷𝑡+ 𝜀𝑝𝑠𝑡 (10)

onde VApst/VAst representa a captura de valor dada pela fração do valor adicionado

do setor s do país p no ano t sobre o valor adicionado global do setor s no ano t; CGV_fpst refere-

se ao indicador de participação do setor s do país p na CGV para frente no ano t; CGV_tpst

corresponde à integração do setor s do país p na CGV para trás no ano t; Dt representa o conjunto

de dummies anuais.

O indicador de participação na CGV para frente, na perspectiva de integração do país na CGV como exportador, segue a metodologia de Wang et al. (2016) descrita no capítulo 2, equação (6). O indicador de inserção na CGV para trás compreende as relações do país como importador, de acordo com a equação (7).

Tendo em vista os resultados da literatura empírica e teórica, conforme explicitado no capítulo 1, é de se esperar uma relação positiva entre a participação nas CGVs (para frente e para trás) e a captura de valor, devido aos ganhos de eficiência previstos. Também se espera um sinal positivo dos coeficientes de estoque de capital e pessoal ocupado, conforme função de produção convencional.

Se o coeficiente estimado para as variáveis de integração nas CGVs for positivo, pode-se concluir que a maior participação do setor do país na CGV contribuiu para ampliar a participação global do setor em termos de valor adicionado. Interpreta-se que a maior integração nas redes de produção mundial do setor desse país proporcionou maior captura de valor, melhorando sua posição relativa aos demais países em valor adicionado.

A maioria das estimações empíricas32 desconsidera como parte das CGVs a

importação de bens intermediários utilizados no processo produtivo doméstico e consumidos localmente. Essa opção descarta boa parte do comércio em CGVs conforme crítica realizada no capítulo 1.

Portanto, este trabalho avança em relação à literatura ao empregar, na análise econométrica, indicadores estimados com base em Wang et al. (2016) que incluem o comércio de bens intermediários que cruzam a fronteira nacional somente uma vez e participam do processo de produção do importador direto para posterior consumo final.

Outro diferencial da metodologia de Wang et al. (2016) em relação a abordagem convencional é que os indicadores tradicionais são medidos em relação ao total de exportações brutas, captando somente a dimensão comercial, ou seja, quanto do comércio bruto do setor de

um país é comércio em CGV, como é o caso dos índices extraídos de TiVA/OCDE e analisados no capítulo 2. Enquanto isso, os indicadores de Wang et al. (2016) são medidos em relação ao tamanho do setor no país, o que se mostra oportuno para os objetivos deste trabalho conforme mencionado no capítulo 1.

Por conta desses diferenciais, foram comparadas as estimações utilizando como variável de integração nas CGVs a abordagem convencional (segundo TiVA/OCDE) com a abordagem deste trabalho baseada em Wang et al. (2016). A inserção na CGV para frente segundo a metodologia TiVA/OCDE33, foi simbolizada como Tiva_f

pst e representa o VA

doméstico incorporado nas exportações de bens intermediários usados como insumos por outros países para produzir bens para exportação, em relação às exportações brutas do primeiro país. A participação na CGV para trás de acordo com TiVA/OCDE34 foi retratada como Tiva_tpst e

reflete o VA estrangeiro incorporado nas exportações do país analisado, em relação às suas exportações brutas.

Vale lembrar que a participação nas CGVs segundo Wang et al. (2016), simbolizada por CGV_fpst representa o VA doméstico incorporado nas exportações de insumos

intermediários do país analisado, em relação ao VA gerado na produção desse país. A integração nas CGVs para trás de acordo com Wang et al. (2016), dada por CGV_tpst,

corresponde ao VA estrangeiro35 incorporado nas importações de insumos intermediários pelo país analisado, em relação a sua produção final.

Foi testada a estimação da equação (10) utilizando as variáveis de integração nas CGVs para frente e para trás, separadamente e conjuntamente. Como os coeficientes estimados não apresentaram diferenças de sinal e as magnitudes foram semelhantes nas diferentes maneiras, optou-se por realizar todas as estimações com as variáveis de integração na CGV conjuntamente na mesma regressão.

A fim de controlar o efeito tempo foi realizada a inclusão de dummies anuais. Trata- se de uma prática frequente e recomendada em estimações com dados em painel, que permite incorporar mudanças comuns a todos os países que tenham ocorrido ao longo do tempo como, por exemplo, uma crise internacional. Além disso, todas as estimações são robustas à heterocedasticidade.

33 Índice EXGR_DVAFXSH de TiVA/OCDE. 34 Índice EXGR_FVASH de TiVA/OCDE.

35 Conforme Figura 3, o indicador de integração na CGV para trás também pode incluir VA doméstico que retorna

ao país de origem e é usado na produção de bens finais (para consumo ou reexportação), porém esse valor pode ser desprezado em relação à produção final.