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2 CONDIÇÕES DE TRABALHO DOS PROFESSORES

2.2 Impacto das políticas neoliberais

Oliveira e Assunção (2010) alertam que é preciso compreender que as condições de trabalho estão intimamente influenciadas pela lógica do sistema capitalista, que transforma matérias-primas e produtos mais elementares em produtos com maior valor agregado. Deste modo, acabam inserindo de forma contundente as relações específicas de exploração do trabalho e assim, por conta dessa via de mão

dupla, os direitos trabalhistas são os alvos principais que a exploração capitalista mais pode atacar.

De acordo com Gollac e Volkoff (2000) as condições de trabalho contemporâneas estão desigualmente disseminadas no poder de negociação dos contratos de emprego. Assim é comum que aqueles trabalhadores que possuem contratos mais flexíveis (ou até sem contrato formal) se submetam a várias situações de precarização, como o aumento da jornada de trabalho, maior exposição a riscos ambientais (barulho, calor ou frio excessivos), entraves para conseguir afastamento para tratar de doença ou fazer cursos, entre outros problemas.

Jaimovich et al (2004) descreve a situação ocorrida na Argentina por conta da derrocada do sistema Keynesiano2 até então vigente no país e suas consequências,

que infelizmente estão se tornando uma realidade cada vez mais presente em diversos países do mundo:

El desmantelamiento del Estado Keynesiano y la aplicación de las «recetas» propias del programa neoliberal sustentado por la Nueva Derecha – especialmente los organismos financeiros internacionales –, tuvieron un efecto especialmente adverso no sólo en el terreno económico, sino también en los sistemas públicos de salud, educación y asistencia social. 3(JAIMOVICH et al, 2004, p. 15).

Deste modo, com a introdução de propostas que modificam ou subtraem direitos trabalhistas, utilizando como desculpa a maior flexibilização e um suposto desenvolvimento econômico através da livre concorrência, históricas conquistas trabalhistas, como à estabilidade no emprego e planos de carreira, começam a ser ameaçadas. (JAIMOVICH et al., 2004).

Além disso, para Birgin (1999) a inflação, que é um fenômeno cada vez mais comum em vários países e já tradicional na América do Sul, corrói o poder de compra dos salários do trabalhador, de forma que a situação se agrava por conta das políticas de ajuste fiscal dos governos que dificultam aumentos salarias que poderiam amenizar esses impactos negativos.

2 Refere-se a teoria idealizada pelo economista britânico John Maynard Keynes, que foi uma alternativa

ao liberalismo econômico ao propor a intervenção do estado com vistas a garantir um padrão mínimo de vida a população através de benefícios sociais e garantir o chamado estado de bem-estar social.

3 O desmantelamento do Estado keynesiano e as próprias "receitas" da aplicação do programa

neoliberal apoiado pela Nova Direita - agências internacionais, especialmente financeiras - teve um efeito particularmente adverso, não só no campo econômico, mas também nos sistemas de saúde pública, educação e assistência social (Tradução nossa).

Por conta das situações já descritas, Toledo (2001) deixa claro a importância em garantir a conservação dos direitos trabalhistas conquistados, haja vista que lutar pela melhoria das condições de trabalho é contribuir pela manutenção da própria condição de subsistência. E o autor ainda explica:

Para esa mayoría de la humanidad el mundo del trabajo, con la nueva situación social neoliberal, se convierte en un campo potencial de lucha. Sin embargo habría que hacer la siguiente acotación: el concepto mundo del trabajo como separado de otros mundos de vida (familia, tiempo libre, estudio, etc.) es en parte uma construcción social. En las sociedades antiguas, por ejemplo, no había una separación tajante entre trabajo y religión. En esta misma medida habría que pensar que las reestructuraciones productivas, las nuevas formas de subordinación del trabajo no asalariado a la producción capitalista y las posibles articulaciones entre mundo de la producción y aquellos del no trabajo, permitirían replantear hasta dónde se extiende el espacio de acción colectiva de las organizaciones obreras 4(TOLEDO, 2001, p. 29).

Segundo Castro e Brito (2013) houve um reajuste do trabalho docente para atender as reformas dos sistemas de ensino, baseadas em um modelo mundial neoliberal, que começou a ter grande força a partir do início dos anos 90 e acabou por incorporar um novo tipo de regulação educativa. Concordando com essa ideia, Oliveira e Maúes (2012) afirmam que:

A partir de então, os professores se tornaram alvo das políticas de inspiração neoliberal, mediante surgimento de diretrizes, programas e ações orientadas para a regulação e o controle profissional por meio de aferição e remuneração por desempenho, bem como a definição de competências e de certificações profissionais. (OLIVEIRA; MAÚES, 2012, p. 67).

Para Oliveira e Vieira (2012) o trabalho dos professores tem passado cada vez mais por alterações provocadas pelas mudanças na organização e na gestão desde que se iniciaram as reformas educacionais no meio da década de 90 do século XX.

4 Para a maioria da humanidade o mundo do trabalho, com a nova situação social neoliberal, torna-se

um potencial campo de batalha. No entanto deve fazer a seguinte observação: o conceito de mundo trabalho como separado de outros mundos da vida (família, lazer, estudo, etc.) faz parte uma construção social. Em sociedades antigas, por exemplo, houve uma separação nítida entre o trabalho e a religião. Nessa medida, devemos pensar que a reestruturação produtiva, as novas formas de subordinação do trabalho não remunerado para a produção capitalista e as possíveis relações entre o mundo da produção e as de nenhum trabalho, permitem repensar o quão longe se estende o espaço de ação coletiva das organizações de trabalho (Tradução nossa).

Os autores destacam, entre os impactos causados pelas mudanças provenientes dessas reformas: a ampliação da profissão docente em quantidade em detrimento da qualidade, o aumento da heterogeneidade do trabalho docente; a ampliação da desigualdade entre os professores, além da degradação das gratificações materiais e simbólicas.

De acordo com Castro e Brito (2013, p.128) a escola foi obrigada a passar por uma reorganização que resultaram no aparecimento de novas funções docentes e no desaparecimento de outras, e ainda segundo o autor:

O trabalho docente se enaltece quando deixa de ser, apenas, cumpridor ou executor de ações, e passa a ser uma atividade de interação com outras pessoas, dando assim sentido ao que fazem. No atual contexto das reformas educacionais, essa dimensão tem sido secundarizada; a ação docente formal tem adquirido caraterísticas do trabalho flexível e codificado, autônomos e controlados, compostos de uma combinação variada de elementos contraditórios e diversificados entre si (CASTRO; BRITO, 2013, p.129).

Concordando com essa ideia, Birgin (1999) explica que a inclusão de novas funções docentes acabou intensificando o trabalho dos professores, que somados a um crescente aumento na quantidade de alunos em sala de aula, ocasionou uma ampliação no tempo que o professor já comumente destina para planejamento de aulas e correção de atividades, fora da carga horária oficial de trabalho.

Essa situação é grave porque, além de historicamente essa carga horária extra permanecer invisível, no que diz respeito a remuneração referente a jornada de trabalho, acaba por precarizar cada vez mais o ensino.

De acordo com Perez (2009) o sistema educacional mexicano passou nos últimos 30 anos por um intenso processo de precarização do trabalho docente, através de ações baseadas numa ideia de eficiência, como explicado pelo próprio autor:

Algunas transformaciones de la sociedad, correspondientes a las últimas décadas, como la crisis económica de los 80’s, que llevó al deterioro de nuestro sistema educativo y los cambios en la institución familiar, constituyen factores importantes que han impactado en detrimento de las condiciones de trabajo de los maestros/as de secundaria. Entre otros aspectos, el aumento de la matrícula, sin incremento de la planta docente en la misma proporción, ocasionó la reducción del tiempo dedicado a planear la enseñanza y tomar descansos, para ser sustituido en la atención de un mayor número de alumnos a través del incremento de los grupos por cada profesor/a, esto trajo consigo una mayor vigilancia por parte de las autoridades

escolares a los enseñantes, condiciones que generaron importantes fuentes de malestar docente 5(PEREZ, 2009, p. 9-10).

Por conta disso, Antunes (2000) explica que os estudos sobre as condições de trabalho docente não devem estar apartados da compreensão das relações diretas entre os problemas de precarização existentes no trabalho do professor e os processos de reorganização do sistema capitalista por conta de suas sucessivas crises, materializadas através da precarização das relações trabalhistas exemplificados pelos empregos terceirizados e/ou de meio período.

Já Guzmán (2012) reforça esse pensamento anterior e também complementa que na América Latina, ainda que se observe um interesse crescente nos estudos sobre trabalho do professor, é necessário que se fomentem pesquisas que visem compreender as condições da prática de ensino e as todas as interações que podem ocorrer entre os diferentes fatores.

Assim, por conta do crescente ataque ao direitos e ao trabalho docente, vários estudos começaram a ser desenvolvidos em diversas partes do mundo, procurando conhecer a real situação das condições de trabalho dos professores.