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1 O SISTEMA CONSTITUCIONAL TRIBUTÁRIO BRASILEIRO

4.5 Imposto sobre produtos industrializados

O Imposto sobre Produto Industrializado (IPI), de competência da União, nos termos do artigo 153, inciso IV,303 da Constituição Federal de 1988, é utilizado como forma de equalização do preço das mercadorias estrangeiras com as nacionais, incidindo sobre a

302 CARRAZZA, Roque Antonio. Imposto sobre a Renda (perfil constitucional e temas específicos). 3ª edição

revista, ampliada e atualizada. São Paulo: Malheiros Editores, 2009, p. 107-108.

303 Art. 153. Compete à União instituir impostos sobre:

produção e a circulação do produto industrializado. Trata-se de um tributo não-cumulativo304, nos termos do artigo 153, §3º, II,305 da Constituição Federal de 1988, visto que haverá a compensação do que for devido em cada operação com o montante cobrado nas operações anteriores.

Nos termos do artigo 153, §1º306 da CF/88, é facultado ao Poder Executivo, atendidas as condições e os limites estabelecidos em lei, alterar as alíquotas do referido imposto, mediante lei ordinária.

Destacamos que o referido artigo 153, §1º, da CF/88, permite ao Poder Executivo alterar as alíquotas do imposto, e não estabelecê-las, de forma a adequá-las aos critérios da justiça fiscal e, no caso do IPI, ao princípio da seletividade.

Nesse ponto uma das críticas do jurista Roque Antonio Carrazza, ao aduzir que o “Executivo não pode sequer fixar as alíquotas do imposto sobre a importação, do imposto sobre a exportação, do IPI e do IOF. O que pode é muito menos: apenas variar, entre um piso e um teto, as alíquotas já fixadas pela lei”.307

Em razão de sua função extrafiscal, de maneira a impulsionar a produção interna do País, a Constituição Federal de 1988 lhe atribui regime jurídico tributário próprio, diante da aplicação de alíquotas seletivas em função a essencialidade dos produtos. O cumprimento da seletividade no IPI se dá mediante a variação de alíquotas, conforme estabelece o artigo 153, §3º, I,308 da Constituição Federal de 1988, em função da essencialidade do produto. Isto quer dizer que o IPI deve ter alíquotas diferentes em razão da essencialidade do produto sobre o

304 Paulo de Barros Carvalho ao tratar do princípio da não-cumulatividade aduz que: “impõe técnica segundo a

qual o valor de tributo devido em cada operação será compensado com a quantia incidente sobre as anteriores, mas preordena-se à concretização de valores como o da justiça da tributação, respeito à capacidade contributiva e uniformidade na distribuição da carga tributária sobre as etapas de circulação e de industrialização de produtos”. (CARVALHO, Paulo de Barros. Curso de Direito Tributário. 23ª ed. São Paulo: Saraiva, 2011, p. 220).

305 Art. 153. Compete à União instituir impostos sobre:

(...)

IV - produtos industrializados; (...)

§ 3º - O imposto previsto no inciso IV: (...)

II - será não-cumulativo, compensando-se o que for devido em cada operação com o montante cobrado nas anteriores;

306 Art. 153. (...)§ 1º - É facultado ao Poder Executivo, atendidas as condições e os limites estabelecidos em lei,

alterar as alíquotas dos impostos enumerados nos incisos I, II, IV e V.

307 CARRAZZA, Roque Antonio. Curso de Direito Constitucional Tributário. 29ª edição, revista, ampliada e

atualizada até a Emenda Constitucional n. 72/2013. São Paulo: Malheiros Editores, 2013, p. 335.

308 Art. 153. (...) § 3º - O imposto previsto no inciso IV:

qual incide. Ou seja, as alíquotas devem ser inversamente proporcionais à essencialidade dos produtos.

Eduardo Domingos Bottallo esclarece que o IPI:

Vem sendo utilizado como instrumento de ordenação político-econômica, seja favorecendo a realização de operações havidas por necessárias, úteis ou convenientes à sociedade, seja dificultando, por meio de incidências mais pesadas, a prática de outras, que não se mostrem capazes de ir ao encontro do interesse coletivo.309

Assim, quanto mais essencial o produto, menor deverá ser a alíquota a incidir e, consequentemente, o imposto e vice-versa.

Hugo de Brito Machado310 esclarece que, para atingir esse objetivo da aplicação da seletividade em razão da essencialidade do produto no IPI, a legislação ordinária adota uma tabela de classificação dos produtos, denominada de Tabela de Incidência do Imposto sobre Produtos Industrializados – TIPI. Pela referida tabela, as alíquotas do imposto variam de 0 a 300, sendo esta alíquota mais elevada incidente sobre o cigarro. Contudo, verificamos que o princípio da seletividade nem sempre é observado, em razão da grande quantidade de produtos com alíquota zero.

As alterações de alíquotas nos produtos denunciam as vontades políticas por detrás das escolhas, que são indicadas na TIPI. Conforme destaca Paulo de Barros Carvalho, o sistema da TIPI está “aparelhado para classificar os produtos de acordo com as avaliações nacionais, em que a estimativa específica dos bens é sopesada em função do papel que seu aproveitamento representa para a sociedade brasileira, num dado momento histórico”.311

Na TIPI estão os fatores de distinção dos produtos, fundados no valor de sua essencialidade, apurado pelo mecanismo da seletividade, propiciando aferir o índice de utilidade social e pessoal do produto.

A seletividade é, portanto, aplicada na medida em que o montante exigido deve ser inversamente proporcional à essencialidade do produto. Significa dizer que a variação da

309 BOTTALLO, Eduardo Domingos. IPI – Princípios e estrutura. São Paulo: Dialética, 2009, p. 53.

310 MACHADO, Hugo de Brito. Curso de Direito Tributário. 28ª edição revista, atualizada e ampliada. São

Paulo: Malheiros Editores, 2007, p. 351.

311 CARVALHO, Paulo de Barros. Direito Tributário Linguagem e Método. 2ª Edição. São Paulo: Noeses, 2008,

alíquota no IPI se dá mediante a essencialidade do produto, não sendo, portanto, aferível e graduada pela maior ou menor capacidade contributiva do indivíduo.

Cabe destacar que ao aplicar a seletividade no IPI, não há que se falar na adequação à progressividade. Coaduna com esse entendimento Roque Antonio Carrazza, ao esclarecer:

Com exceção daqueles poucos impostos (como o ICMS e o IPI) cujas regras-matrizes constitucionais os incompatibilizam com a progressividade, todos os demais devem ser progressivos, para que se possam ter caráter pessoal e ser graduados segundo a capacidade econômica dos contribuintes.312 (grifo do autor)

Constata-se que a seletividade de alíquotas do IPI não remete a noção de capacidade contributiva, visto que não é verificável para a apuração do imposto a manifestação efetiva de riqueza do contribuinte de direito neste imposto tido como indireto, mas um enfoque puramente econômico do consumidor final (contribuinte de fato) decorrente da essencialidade do produto.

E isso em razão da seletividade do IPI não levar em conta os interesses do produtor (contribuinte de direito), mas os do consumidor final (contribuinte de fato), por favorecer os consumidores finais, que são os que, de fato, suportam a carga econômica do imposto.

Nesse sentido são as lições de Elizabeth Nazar Carrazza:

Nos chamados impostos sobre o consumo, em que o encargo econômico (do imposto) é repassado para o preço final do produto ou da mercadoria, não se leva em conta a capacidade contributiva (do contribuinte de direito).

Neles, a própria Constituição Federal busca a igualdade de todos, com a igualação das situações consideradas injustas pelo sistema jurídico, através da seletividade (que é um instrumento de que se vale para aplicação do princípio da igualdade genericamente considerado, por força do qual os mais fracos merecem a proteção do Estado e do Direito).313

No IPI, a seletividade é um mecanismo de controle da tributação de forma a não onerar o consumidor final dos produtos industrializados essenciais, atendendo à justiça tributária ao buscar a igualdade e o atendimento às necessidades básicas dos indivíduos. Por

312 CARRAZZA, Roque Antonio. Curso de Direito Constitucional Tributário. 29ª edição, revista, ampliada e

atualizada até a Emenda Constitucional n. 72/2013. São Paulo: Malheiros Editores, 2013, p. 99, nota nº 57.

313 CARRAZZA, Elizabeth Nazar. Progressividade e IPTU. 1ª edição – 3ª tiragem. Curitiba: Juruá Editora, 2000,

isso que sobre produtos essenciais deve haver um tratamento fiscal brando, ou mesmo a exoneração tributária.

Cabe ponderar as lições de Julcira Maria de Mello Vianna:

O princípio da seletividade previsto no artigo 153 parágrafo 3º, inciso I da Constituição Federal estabelece que o Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI) deverá incidir com maior ou menor intensidade, em função da essencialidade do produto, ou seja, determinando a seletividade em função da essencialidade dos produtos. Exemplo: produtos que compõem a cesta básica do trabalhador podem deixar de ter a incidência do IPI por força do princípio da seletividade que, sem dúvida, está se relacionando com o princípio da capacidade contributiva.

Logo, essa utilização de alíquotas em função da essencialidade do produto apresenta-se como traço caracterizador da capacidade contributiva, pois em função da essencialidade do IPI acaba tendo maiores alíquotas para aqueles produtos menos essenciais; “contrario sensu”, sofrem menor tributação, ou seja, terão tributação menos onerosa os produtos essenciais.314

Entendemos que a seletividade é utilizada sim para onerar ou reduzir a carga tributária dos produtos, sendo estes levados em consideração para uma tributação mais ou menos gravosa, em razão de serem supérfluos ou necessários, e não em função da capacidade econômica do contribuinte. E isso porque não consideramos a renda despendida (consumo) como forma de aferição da capacidade contributiva, conforme destacado em item específico do presente estudo.

A renda despendida, ou seja, o consumo, verificada nos impostos indiretos, não denota manifestação objetiva de riqueza como forma de critério para aferição da capacidade contributiva, visto que se verificaria a riqueza do consumidor final e não do contribuinte propriamente dito (contribuinte de direito) e, ainda, nem sempre o consumo denota riqueza.

Os impostos que incidem sobre os chamados bens de consumo, como é o caso do IPI, admitem, de certa maneira, a elevação das alíquotas de forma exacerbada, de acordo com interesses políticos e econômicos do Poder Público. Pode-se concluir que a seletividade aplicada aos tributos indiretos, como é o caso do IPI, é uma forma de atuação para obtenção do objetivo caracterizador da extrafiscalidade.

E, conforme anteriormente exposto, o IPI possui função extrafiscal por ser utilizado como forma de equalização do preço dos produtos estrangeiros com os nacionais. Também

314 VIANNA, Julcira Maria de Mello. Aspectos Constitucionais do IPVA. Dissertação de Mestrado apresentada

por sua função extrafiscal, não há que se falar na obediência ou, melhor, possibilidade de obediência ao princípio da capacidade contributiva, uma vez que referido imposto incide sobre fatos econômicos que, em razão do interesse público, tem as alíquotas agravadas ou minoradas independentemente de se aferir a capacidade contributiva do indivíduo.

Desta forma, podemos entender que o IPI deve atender ao princípio da seletividade em função da essencialidade do produto, tratando-se de um imposto com função extrafiscal e, portanto, que não se alinha ao primado da capacidade contributiva, mas que deve atendimento ao princípio da igualdade em atendimento a uma tributação justa.

4.6 Imposto sobre operações de crédito, câmbio e seguro, ou relativas a títulos ou valores