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1 O SISTEMA CONSTITUCIONAL TRIBUTÁRIO BRASILEIRO

2.2 Princípio da igualdade

No Direito Positivo brasileiro, há valores que se delineiam pela concretização de outros valores ou limites objetivos, sendo estes os denominados “sobreprincípios”, como é o caso da igualdade.

O princípio da igualdade é um valor de sobrenível, sendo verdadeiro norteador do ordenamento jurídico e posicionando-se no topo da pirâmide hierárquica dos valores positivados.

A Constituição Federal de 1988 trata, no capítulo I, “dos direitos e deveres individuais e coletivos” e estabelece, no artigo 5º, caput, que “todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza”. Referido princípio da igualdade estabelece que todos são iguais e garante a todos o direito à igualdade.

Conforme destaca Celso Antônio Bandeira de Mello:

(...) a igualdade é princípio que visa a duplo objetivo, a saber: de um lado propiciar garantia individual (não é sem razão que se acha insculpido em artigo subordinado à rubrica constitucional “Dos Direitos e Garantias Fundamentais” contra perseguições e, de outro, tolher favoritismos.53

Em uma interpretação literal, ao tratar o artigo 5º da CF/88 da igualdade perante a lei, acaba por remeter à igualdade sob o aspecto formal, conforme anteriormente exposto, de maneira que todos os indivíduos se submetam aos ditames da lei nas mesmas condições e de maneira uniforme. Mas o que entendemos tratar o referido artigo é de uma igualdade na lei, sob o aspecto material, considerando-se um contexto sintático, aplicando-se tratamento isonômico aos indivíduos em situações iguais e de forma diferente aos desiguais.

As disposições dos artigos 3º, incisos III e IV54, 7º, incisos XXX e XXXI55, da CF/88, demonstram que o objeto da igualdade no sistema constitucional é a igualdade tida sob o

53 MELLO, Celso Antônio Bandeira de. Conteúdo Jurídico do Princípio da Igualdade. 3ª ed. 10ª Tiragem. São

Paulo: Malheiros Editores, 2002, p. 23.

54 Art. 3º Constituem objetivos fundamentais da República Federativa do Brasil: (...)

III - erradicar a pobreza e a marginalização e reduzir as desigualdades sociais e regionais;

IV - promover o bem de todos, sem preconceitos de origem, raça, sexo, cor, idade e quaisquer outras formas de discriminação.

55 Art. 7º São direitos dos trabalhadores urbanos e rurais, além de outros que visem à melhoria de sua condição

social: (...)

XXX - proibição de diferença de salários, de exercício de funções e de critério de admissão por motivo de sexo, idade, cor ou estado civil;

aspecto material, ou seja, a igualdade na lei, sendo clara a preocupação com o equilíbrio social. Referido princípio também pode ser identificado no artigo 19, inciso III,56 da CF/88, que veda a discriminação entre brasileiros.

Destacamos que o princípio da igualdade é mandamento fundamental do sistema jurídico brasileiro, ou seja, o princípio básico do Estado Democrático de Direito, estampado no artigo 1º, caput 57, da CF/88. Pelo princípio da igualdade todos os indivíduos devem ser tratados de maneira que se vejam reconhecidas suas diferenças, e estas sejam consideradas para fazer com que cada um tenha um tratamento adequado à sua condição.

Entendemos que a observância ao princípio da igualdade implica adoção de normas, critérios de discriminação entre as pessoas. Dito critério de discriminação adotado deve ter como fundamento um elemento valorado pela norma que resida em fatos; deve o fator de discriminação adotado guardar uma relação de pertinência lógica com a situação que deu origem ao fator de discriminação; deve tal fator de discriminação ter por finalidade reduzir as desigualdades existentes entre as pessoas; e devem os fatores de discriminação adotados estar de acordo com o estabelecido pela legislação.

Frize-se que os fatores de discriminação devem possuir pertinência lógica com a finalidade da discriminação, sob pena de ver violado o princípio da igualdade. Nesse sentido é que Celso Antônio Bandeira de Mello se pronuncia a respeito de que haverá ofensa ao princípio da isonomia quando:

I – A norma singulariza atual e definitivamente um destinatário determinado, ao invés de abranger uma categoria de pessoas, ou uma pessoa futura e indeterminada.

II – A norma adota como critério discriminador, para fins de diferenciação de regimes, elemento não residente nos fatos, situações ou pessoas por tal modo desequiparadas. É o que ocorre quando pretende tomar o fator “tempo” – que não descansa no objeto – como critério diferencial.

III – A norma atribui tratamentos jurídicos diferentes em atenção a fator de discrímen adotado que, entretanto, não guarda relação de pertinência lógica com a disparidade de regimes outorgados.

IV – A norma supõe relação de pertinência lógica existente em abstrato, mas o discrímen estabelecido conduz a efeitos contrapostos ou de qualquer modo dissonantes dos interesses prestigiados constitucionalmente.

XXXI - proibição de qualquer discriminação no tocante a salário e critérios de admissão do trabalhador portador de deficiência;

56 Art. 19. É vedado à União, aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios: (...)

III - criar distinções entre brasileiros ou preferências entre si.

57 Art. 1º A República Federativa do Brasil, formada pela união indissolúvel dos Estados e Municípios e do

V – A interpretação da norma extrai dela distinções, discímens, desequiparações que não foram professadamente assumidos por ela de modo claro, ainda que por via implícita.58

Para Miguel Reale, a justiça é a condição primeira de todos os valores, sendo “a tentativa renovada e incessante de harmonia entre as experiências axiológicas, necessariamente plurais, distintas e complementares”.59 E complementa o ilustre jurista que “a justiça é, em última análise, uma expressão ética do princípio de igualdade. [...] Ser justo é julgar as coisas segundo o princípio da igualdade”.60

O princípio da isonomia requer, acima de tudo, um tratamento justo e consiste em tratar desigualmente os desiguais na medida de suas desigualdades e igualmente os iguais na medida de suas igualdades. Assim, a lei irá determinar o fator de discriminação visando a aplicação da igualdade, atendidos os preceitos constitucionais e estando referido fator diretamente relacionado com o tratamento diferenciado.

E, nas palavras de Paulo de Barros Carvalho, “o intuito é garantir a tributação justa (sobrevalor)”.61

Entendemos, portanto, que o fator de discriminação é necessário ao atendimento do princípio da igualdade, não podendo haver tratamento idêntico àqueles indivíduos em situações desiguais, garantindo a todos a igualdade de possibilidades. Esta premissa será adotada no presente trabalho ao tratar da capacidade contributiva e à progressividade nos impostos, visando uma tributação justa e equitativa.

Destacamos que o princípio da igualdade não estabelece que os indivíduos sejam tratados absolutamente da mesma forma. Pelo contrário, é imprescindível que haja uma discriminação, mas sendo esta justa e adequada ao sistema constitucional.

58 MELLO, Celso Antônio Bandeira de. Conteúdo Jurídico do Princípio da Igualdade. 3ª ed. 10ª Tiragem. São

Paulo: Malheiros Editores, 2002, p. 47-48.

59 REALE, Miguel. Lições Preliminares de Direito. 3ª ed. São Paulo: Saraiva, 1976, p. 371. 60 Ibid., p. 123.

61 CARVALHO, Paulo de Barros. Direito Tributário, Linguagem e Método. 2ª edição. São Paulo: Noeses, 2008,