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Instituto Superior de Estudos Brasileiros

1.1 Os antecedentes da Teoria da Dependência

1.1.2 Instituto Superior de Estudos Brasileiros

Os cepalinos argumentavam que o processo de industrialização não reduziria a vulnerabilidade externa, porque, se por um lado, esse processo aliviava importações, por outro impunha complexas exigências decorrentes da nova estrutura produtiva e do aumento da concentração do nível de renda.

Prebisch e Furtado compartilhavam da mesma opinião a respeito dos obstáculos para o novo estágio de difusão do progresso técnico e da tendência de estagnação estar relacionada a insuficiência dinâmica. Para eles, esses obstáculos eram resultado de duas condições da estrutura econômica da região - especialização e heterogeneidade tecnológica (COUTO, 2007, p.33) e apontavam a tendência de piora na balança de pagamento, na inflação e no desemprego.

Bielschowsky explica que a questão da insuficiência dinâmica argumentada por Prebisch estava relacionada ao fato de que a periferia adotava tecnologias importadas do centro “em condições totalmente distintas, e seu emprego implicava sobreutilização do recurso escasso, capital, em detrimento do recurso abundante, trabalho” (2000, p.40). Furtado vai derivar daí o conceito da “insuficiência dinâmica da demanda”, concluindo que o progresso aumentou a capacidade produtiva, no entanto, o padrão produtivo pouco empregador diminuiu a renda e, portanto, a capacidade de crescimento do mercado interno.

Com isso, havia tendência de redução da taxa de lucro, falta de mercado consumidor para novos itens e, consequentemente, redução do crescimento e tendência à estagnação da economia.

No entanto, a tese sobre a tendência ao “estagnacionismo” foi invalidada com o crescimento do Brasil e de toda América Latina na metade de 1960, dando lugar a outros argumentos mais densos: a tese sobre a heterogeneidade estrutural e a tese sobre a dependência. Bresser-Pereira (2010) chama a atenção para o fato de que foi no Brasil que o pensamento sobre a dependência encontrou mais acolhida, sendo o Instituto Superior de Estudos Brasileiros (ISEB) o espaço acadêmico central. Segundo Bresser, o debate envolvia dois grupos, um mais preocupado com as questões do desenvolvimento econômico e outro mais preocupado com a luta por direitos sociais.

sindicatos foram incorporados ao debate. Em torno das ideias do nacional-desenvolvimentismo reuniu-se um grupo chamado “grupo de Itatiaia” e em 1953 esse grupo criou o Instituto Brasileiro de Economia, Sociologia e Política (IBESP), precursor do Instituto Superior de Estudos Brasileiros (ISEB) criado em 1955. O ISEB se tornou uma escola de pensamento muito relevante e foi vinculado ao Ministério da Educação e Cultura. Seu objetivo era ampliar o pensamento nacional-desenvolvimentista com cursos de formação para membros dos três poderes, sindicados, associações de classe, partidos políticos entre outros (ABREU, 2020).

Os pensadores do ISEB consideravam que o desenvolvimento do Brasil, dentro do sistema capitalista, deveria ser pensando como uma condição de superação da estrutura colonial e que a industrialização seria um meio para transpor as velhas oligarquias e conformar uma classe burguesa e um proletariado identificado com um projeto de nação, mas havia duas correntes. Uma delas representada por Eugênio Gudin (1886-1986), economista liberal contrário a intervenções do Estado, defensor do agronegócio e favorável a entrada de capital estrangeiro no setor industrial. A outra corrente era representada por Roberto Simonsen (1889-1948) que defendia o planejamento e investimentos estatais para acelerar a produção nacional.

Segundo Bresser-Pereira (2010), a CEPAL e o ISEB desenvolveram uma visão crítica semelhante quanto ao liberalismo e a teoria vantagem comparativa. Também concordavam que a revolução de 1930 – quando a burguesia industrial, o Estado e a classe trabalhadora viabilizaram, sem oposição dos latifundiários, o projeto de desenvolvimento autônomo de Getúlio Vargas – poderia ser considerada como a revolução burguesa e que, portanto, o Brasil já teria rompido as amarras da subordinação promovida pelo pacto entre as elites.

Bresser-Pereira (2010) aponta ainda que o nacionalismo da CEPAL e do ISEB não implicava rejeição ao estrangeiro, assim como não se identificava com a concepção europeia de Estado-nação, porque não havia por parte desses grupos inspirações patriotas, mas uma concepção de que o Estado deveria proteger o trabalho, o capital e o conhecimento nacional, ao invés de submeter-se às potências estrangeiras.

As visões concorrentes de Gudin e Simonsen conviveram no ISEB até 1958, quando se instalou a polêmica sobre a exploração privada do setor de petróleo. Este ponto desencadeou crises de sucessão, desligamentos, mudanças no formato de colegiado e nas

prioridades do Instituto, acabando por enfraquecê-lo até ser extinto pelos militares em 13 de abril de 1964 (ABREU, 2020) no contexto do golpe militar.

A facilidade com que o golpe militar ocorreu não só no Brasil, mas também em outros países latinos entre 1960 e 1970, fez com que intelectuais que faziam interpretações no âmbito da dependência iniciassem críticas ao pensamento da CEPAL e do ISEB afirmando que teria sido uma ilusão acreditar na existência de uma burguesia nacional latino-americana capaz de liderar um movimento autônomo característico das revoluções burguesas, porque as elites locais permaneciam desinteressadas em romper com laços da subserviência que as beneficiava (BRESSER, 2010), surgindo um pensamento dissonante no Departamento de Sociologia da Universidade de São Paulo (USP).

Theotônio dos Santos (1998) detalha a origem da divergência e essa contextualização é fundamental para essa tese. Para ele, ainda na década de 1950, a CEPAL iniciou estudos sobre as particularidades do desenvolvimentismo baseado na substituição de importações de produtos de consumo para elite em 1930, depois bens duráveis e por fim maquinarias. Esse processo foi totalmente coordenado pelo Estado e os investimentos para modernizar o setor industrial foram obtidos por meio de manobras do Governo Vargas, que estatizou o comércio exterior, o que significa que o Estado controlava as divisas, pagando aos exportadores com moeda nacional e utilizando os excedentes para investimento na indústria. Isto gerava insatisfação dos agroexportadores que chegaram a denunciar essa medida como “confisco cambial”.

Para a CEPAL, essa prática explicava os limites revolucionários da burguesia industrial e o porquê não era possível abrir confronto com oligarquias agroexportadoras.

Como aponta Theotônio dos Santos, o mercado interno não era amplo o suficiente para absorver a produção, dado que não havia uma distribuição de renda que incluísse o trabalhador rural no mercado de consumo, criando limites estruturais para o desenvolvimento econômico.

Ao longo dos anos de 1950 os intelectuais da CEPAL e do ISEB desenvolveram uma visão coesa sobre a industrialização na América Latina, apoiando a intervenção do Estado no desenvolvimento, mas após os golpes militares, a estratégia nacional desenvolvimentista passou a ser alvo de duras críticas por uma parte de pensadores brasileiros que integravam o que Bresser denominou de “Escola de Sociologia de São Paulo” (2010, p.21). Enquanto a CEPAL e o ISEB defendiam o crescimento econômico ligado a ideia de construção de nação,

a escola de Sociologia da São Paulo criticava o nacionalismo e as posições desenvolvimentistas de Vargas, poupando apenas Prebisch e Furtado -, que também defendiam a ação do Estado para o desenvolvimento industrial.

Segundo Bresser, essa escola pretendia se afirmar como pensamento puro, acadêmico e fundador da sociologia científica brasileira, mas seus principais intelectuais acabaram se dedicando, assim como os intelectuais do ISEB e da CEPAL, a influenciar as políticas públicas (BRESSER, 2010, p.7). Bresser aponta que predominava nas preocupações desse grupo a luta de classes e que não estavam interessados em críticas anti-imperialistas, assim como desacreditavam de pactos nacionais (op. cit. p.8).

Essas ideias conquistaram protagonismo e foram bem-sucedidas quanto a afirmação do desenvolvimento associado, enfraquecendo a concepção de nação na América Latina e os partidos de esquerda durante 20 anos (BRESSER, 2010, p. 19).