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Instrumentos tributários para a sustentabilidade ambiental

TRIBUTAÇÃO E DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL NO BRASIL: POSSIBILIDADES, INSTRUMENTOS E LIMITES

3) Instrumentos tributários para a sustentabilidade ambiental

Conforme visto, a tributação pode ser um meio para o alcance da sustentabi- lidade ambiental, através do “emprego de instrumentos tributários para gerar recursos necessários à prestação de serviços públicos de natureza ambiental (...), bem como para orientar o comportamento dos contribuintes à proteção do meio ambiente”20.

A utilização da tributação no Brasil como instrumento de proteção ao meio ambiente pode ocorrer de três formas. Primeiramente, através dos tribu- tos verdes, tributando-se condutas poluidoras ou potencialmente poluidoras de forma que a oneração da atividade possa inibir a realização de tais práticas.

Esta prática tributária, conforme vimos acima, vincula-se ao princípio do poluidor-pagador e “sinaliza no sentido de que os potenciais poluidores devem arcar com a responsabilidade pelo pagamento das despesas estatais relacionadas com a precaução e a prevenção de riscos ambientais”21.

Entretanto, o legislador não tem total liberdade para a instituição de tal instrumento tributário, tendo em vista o limite estabelecido no próprio con- ceito de tributo. Segundo o artigo 3º do CTN, só será considerado tributo a prestação que não constitua sanção de ato ilícito. Assim, o tributo não pode ser utilizado com fi ns sancionatórios, como punição à conduta poluidora. Sobre o assunto, Ferraz afi rma que “uma primeira característica fundamental da tribu- tação ambientalmente orientada é que ela deverá ocorrer, necessariamente, no âmbito das atividades lícitas, como orientadora dessas atividades, mas nunca como sancionatória”22.

Exemplo deste primeiro tipo de tributação é Contribuição de Intervenção no Domínio Econômico. Segundo Tôrres, “toda CIDE é típico instrumento que visa a alcançar um êxito específi co, qual seja, a intervenção em determinado espaço material da ordem econômica, da qual o domínio ambiental é espécie”23.

20 COSTA, Regina Helena. Apontamentos sobre a Tributação Ambiental no Brasil. In TÔRRES, Heleno Taveira (org.) Direito Tributário Ambiental. São Paulo: Malheiros, 2005, p. 312.

21 TORRES, Ricardo Lobo. Valores e princípios no Direito Tributário Ambiental. In TÔRRES, Heleno Taveira (org.) Direito Tributário Ambiental. São Paulo: Malheiros, 2005, p. 27.

22 FERRAZ, Roberto. Tributação Ambientalmente Orientada e as Espécies Tributárias no Brasil. In TÔR- RES, Heleno Taveira (org.) Direito Tributário Ambiental. São Paulo: Malheiros, 2005.

23 TÔRRES, Heleno Taveira. Da relação entre competências constitucionais tributária e ambiental: os limites dos chamados “tributos ambientais”. In: TÔRRES, Heleno Taveira (org.) Direito Tributário Am-

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Um exemplo de CIDE utilizada em favor do meio ambiente é aquela re- lativa aos combustíveis (CIDE — Combustíveis). A possibilidade de institui- ção da CIDE-Combustíveis foi prevista pela Emenda Constitucional n. 33 de 2003, que acrescentou o § 4º ao artigo 177 da CF/88. Este parágrafo dispõe que “a lei que instituir contribuição de intervenção no domínio econômico relativa às atividades de importação ou comercialização de petróleo e seus deri- vados, gás natural e seus derivados e álcool combustível” deverá prever que os recursos arrecadados sejam destinados “ao fi nanciamento de projetos ambien- tais relacionados com a indústria do petróleo e do gás”24.

No mesmo sentido, tramita no Congresso Nacional o Projeto de Lei Com- plementar n. 73/2007, propondo a criação de uma CIDE incidente sobre as emissões de gases de efeito estufa, no modelo da carbon tax, para fi ns de se alcançar a “sustentabilidade ambiental e a mitigação do aquecimento global”25.

Com relação ao IPTU (Imposto Predial e Territorial Urbano), a Consti- tuição, em sua redação original, já previa, no art. 182 § 4º, a progressividade do IPTU no tempo como um instrumento de política urbana. Ou seja, esta progressividade permite um agravamento da carga tributária ao proprietário que não promover um adequado aproveitamento do imóvel ao longo do tem- po. Este instituto tem uma fi nalidade extrafi scal, com intuito de desestimular a manutenção de imóveis sem a devida utilização e destino.

O segundo tipo de instrumento traduz-se na aplicação das receitas de determinado tributo em prol de atividades que visem à p reservação do meio ambiente. O caso mais emblemático é o do ICMS Ecológico, no qual, na dis- tribuição da quota-parte a ser entregue aos Municípios, adotam-se critérios am- bientais. A iniciativa, que foi iniciada pelo Estado do Paraná em 199126, já é implementada ou está em discussão em grande parte dos Estados brasileiros.

A terceira e mais utilizada forma de tributação em prol da sustentabilida- de ambiental é aquela traduzida em medidas de minoração e/ou concessão de benefícios fi scais às práticas ambientalmente positivas. Estes benefícios podem ser aplicados em quase todas as espécies tributárias e são traduzidos de diversas formas: redução de alíquota ou da base de cálculo, possibilidade de deduções, isenções etc. Ou seja, o objetivo destes benefícios é conceder vantagens tribu- tárias através da desoneração de práticas ambientalmente sustentáveis. Diversos são os exemplos de utilização desta forma de tributação ambiental.

24 Artigo 177, parágrafo 4º, inciso II, b da CF/88. 25 Projeto de Lei Complementar n. 73/2007.

26 No Estado do Paraná, a Lei n. 9.491/90 dispõe que a repartição de 5% do ICMS se dará da seguinte forma: 50% para Municípios que mantenham mananciais de abastecimento e 50% para aqueles com unidades de conservação ambiental

Além da progressividade no tempo acima analisada, a partir da Emenda Constitucional n° 29/2000 o IPTU passou a poder ser cobrado de forma pro- gressiva em três casos: em razão do valor do imóvel, em função da sua localiza- ção, e do modo de utilização do mesmo. Assim, os Municípios poderão estabe- lecer alíquotas diferenciadas para os imóveis que promovam alguma forma de preservação ambiental.

Além desta possibilidade, alguns Municípios, como é o caso do Rio de Ja- neiro, concedem isenções do IPTU para terrenos e prédios de interesse ecológico ou relevantes para a preservação paisagística ou ambiental, declaradas pelo poder público como reservas fl orestais ou se tiverem certa área coberta por fl orestas27.

Ainda com relação aos impostos sobre a propriedade, o ITR — Imposto Territorial Rural — é talvez o imposto mais utilizado para fi ns de se alcançar a sustentabilidade ambiental e social. Primeiramente, em razão de suas alíquotas progressivas, aplicadas em função do tamanho e do grau de utilização da terra. Trata-se de uma forma de desestimular a manutenção de grandes proporções de terras improdutivas, visando, portanto, um aproveitamento melhor da pro- priedade. A legislação do ITR ainda exclui da sua incidência, as áreas de reserva legal, de preservação permanente e de interesse ecológico, as “Reservas Particu- lares do Patrimônio Natural” e as áreas de servidão fl orestal28.

O Estado do Rio de Janeiro ainda conta com a experiência da cobrança de contribuição de melhoria, espécie tributária devida em razão da valoriza- ção de imóvel decorrente de obra pública, nos casos de “arborização de ruas e praças, construção ou ampliação de parques, proteção contra erosão, aterros e outras obras de embelezamento, bem como de execução de projeto de trata- mento paisagístico”29. Ou seja, os proprietários cujos imóveis são valorizados em decorrência dessas melhorias ambientais devem contribuir com os custos das mesmas.

No que diz respeito ao ICMS (Imposto sobre Circulação de Mercadorias), o Estado do Rio de Janeiro prevê uma redução de 18% para 12% das alíquotas incidentes sobre “operações com máquinas, aparelhos, equipamentos e veículos destinados à implantação, ampliação e modernização ou relocalização de unida- des industriais ou agroindustriais e visem à defesa do meio ambiente”30.

O mesmo Estado prevê alíquotas diferenciadas para o IPVA de veículos que utilizam combustíveis ou equipamentos renováveis31. Ainda com relação ao

27 Lei Municipal nº 691/1984 (Código Tributário Municipal do Rio de Janeiro). 28 Lei Federal n. 9.393/96.

29 OLIVEIRA, J. M. Direito Tributário e Meio Ambiente. 2.ª ed. Rio de Janeiro: Renovar, 1999. 30 Lei Estadual n° 2.055/93, do Rio de Janeiro.

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IPVA, diversos outros Estados já adotaram isenção deste imposto para veículos movidos a motor elétrico32.

Com relação ao IPI, o Decreto nº 755/93 fi xou as alíquotas incidentes sobre veículos movidos a álcool em patamares inferiores às alíquotas dos veí- culos movidos à gasolina, estimulando, portanto, a fabricação de veículos que utilizem um combustível menos poluente. Neste mesmo sentido, em trâmite no Congresso Nacional o Projeto de Lei do Senado (PLS) n. 255/2010 que concede isenção de IPI para carros híbridos e elétricos, bem como das peças e acessórios necessários para a sua fabricação.

Também em tramitação o PLS n. 510/09 que propõe reduzir a zero a alíquota do Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI) para empresas que realizam atividades de reciclagem.

A legislação do Imposto de Renda também prevê, desde a década de 60, benefícios ligados a questões ambientais. Exemplo é o § 1º do artigo 1º da Lei nº 5.106/66, revogado pelo Decreto-lei nº 1.338/74, que estabelecia o abati- mento dos valores despendidos em fl orestamento ou refl orestamento do impos- to de renda apurado pela pessoa física e jurídica.

Conforme visto, a utilização da tributação no Brasil para fi ns ambientais se restringe basicamente à concessão de benefícios e incentivos fi scais relati- vos a tributos já existentes. A utilização de “tributos verdes”, com fi nalidade prioritariamente ambiental, ainda é muito incipiente, dada todas as limitações constitucionais e legais que a tributação deve observar.