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2.1 Da escola positivista à sócio-construtivista

2.1.3 Cognitivismo

2.1.3.2 Interacionismo

Como mencionamos anteriormente, teóricos como Chomsky (2008) e Krashen (1981) afirmam que a aprendizagem de uma segunda língua acontece devido a capacidades inatas presentes nas crianças, ou seja, por ser uma característica única da espécie humana.

Entretanto, para os interacionistas não podemos dizer que seria apenas esse o fator determinante para a aprendizagem. Para eles, uma língua se desenvolve como o resultado da complexa relação entre essa capacidade genética somada à influência do ambiente. Não obstante, os interacionistas compreendem a aprendizagem de um idioma como sendo algo semelhante a outros tipos de habilidades e de conhecimento ao mesmo tempo em que é influenciada por eles. Ou seja, a aquisição de uma língua não seria uma área do conhecimento que se desenvolveria de forma especial, mas se comportaria da mesma forma que as demais aprendizagens e seria auxiliada por tudo aquilo que o indivíduo já aprendeu e vivenciou. Sendo assim, a aprendizagem de uma língua estaria extremamente relacionada não apenas às suas experiências, mas também ao seu desenvolvimento cognitivo.

Com relação ao associacionismo cognitivo, pode-se dizer que os teóricos interacionistas passaram a abrir espaço para que pudéssemos investigar a maneira como os indivíduos atribuem sentido ao mundo ao seu redor e como relacionam as suas experiências às suas novas aprendizagens.

Dentro do leque dos teóricos do interacionismo, encontramos o psicólogo e epistemólogo suíço Jean Piaget que também é tido como uma influência do construtivismo9 e o professor e estudioso do materialismo dialético Lev Semenovich Vygotsky que, por sua vez, é um autor relacionado ao sócio-interacionismo mais precisamente.

A obra de Vygotsky é repleta de insights sobre linguagem e por isso sua extrema relevância em relação aos estudos da aprendizagem de idiomas. Nascido na antiga União Soviética marxista e jovem cientista da Rússia pós-revolução de 1917, sua teoria é resultado da aplicação da análise materialista dialética às funções psicológicas humanas e às produções culturais. Ele se dedicou a estudar a aprendizagem do ponto de vista histórico e desenvolveu seu método de análise, o Método Genético, para investigar a conduta como a história da conduta.

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O construtivismo pode ser compreendido como um fundamento filosófico que tem inspirado várias outras teorias sobre o conhecimento humano e sobre aprendizagem (ROSA, 2007). Este tema será melhor explanado no subitem a seguir.

Com relação às correntes teóricas até aqui apresentadas, Vygotsky se distanciava do Behaviorismo por não entender condicionamento através de punições e recompensas como sinônimo de aprendizagem. Com relação a Piaget (apresentado mais adiante), o pensamento vygostkyano apresenta alguns pontos de distanciamento identificados no quadro a seguir:

Quadro 10 – Distanciamentos entre Piaget e Vygotsky

Por último, com relação às correntes inatistas, podemos facilmente enxergar o distanciamento entre ambos com a ressalva de que, para Vygotsky, a aprendizagem humana, apesar de sofrer a predominante interferência do meio social em que o indivíduo está inserido, tem sua base nas características genéticas, nas limitações e nas capacidades inatas herdadas em sua espécie como ele explica em seu conceito de filogênese, o qual será melhor explorado mais adiante.

Para Vygotsky, a natureza humana é resultado da interiorização, socialmente guiada, da experiência cultural transmitida de geração em geração. De acordo com Cubero e Luque (2004), para Vygotsky, a aprendizagem é o ponto de partida para que o indivíduo possa se desenvolver. Essa aprendizagem é construída a partir das formas histórico-sociais de organização da vida humana e tem a escola como lócus fundamental para a análise do desenvolvimento humano. Esse desenvolvimento se caracterizaria como saltos revolucionários, novas reorganizações mentais e seria fruto da influência de novas formas de

PIAGET VYGOTSKY

1. Foco na exploração independente da criança no meio para a ocorrência da aprendizagem;

2. Desenvolvimento como suporte para a aprendizagem;

3. Consciência como um fenômeno auto- estruturante;

4. Escola com papel secundário em sua análise do desenvolvimento humano.

1. Foco na mediação entre a criança e os símbolos ou entre a criança e os mais capazes para a ocorrência da aprendizagem;

2. Aprendizagem como suporte para o desenvolvimento;

3. Consciência construída a partir das formas histórico-sociais de organização da vida humana;

4. Escola como lócus fundamental para a análise do desenvolvimento humano.

mediação dos processos psicológicos. Segundo estes autores, Vygotsky diz que os processos evolutivos e os de aprendizagem não coincidem, nem são idênticos, ainda que constituam uma unidade. O desenvolvimento é encorajado pelos processos de aprendizagem e, em grande medida, é consequência deles. Assim, pode-se dizer que o processo evolutivo vai “a reboque” do processo de aprendizagem.

A teoria de Vygotsky é bastante inovadora e os conceitos essenciais para a compreensão da mesma seriam: Interiorização, Zona de Desenvolvimento Proximal (ZDP) e Apropriação. Interiorização seria uma atividade externa que começa a ocorrer internamente. Ou seja, o processo interpessoal se transforma em outro intrapessoal que seria o resultado de uma prolongada série de processos evolutivos.

Entretanto, o conceito de interiorização trazido por Vygotsky traz consigo algumas perguntas. Como uma pessoa pode interiorizar os conteúdos e as ferramentas psicológicas de sua cultura? Como ocorre essa transição do interpessoal para o intrapessoal?

Como resposta a esses questionamentos, Oliveira (1993) explica o conceito de ZDP como sendo uma zona na qual funciona um sistema interativo, uma estrutura de apoio criada por outras pessoas e pelas ferramentas culturais apropriadas para determinada situação. Em sua teoria, Vygotsky considera que a participação das crianças em atividades culturais, durante as quais compartilham com os colegas mais capazes os conhecimentos e os instrumentos desenvolvidos por sua cultura, permite que interiorizem os instrumentos necessários para pensar e atuar. Ou seja, são as atividades educacionais que criam a Zona de Desenvolvimento Proximal (ZDP). Sobre esse aspecto, é importante frisar que o conceito de ZDP não implica em dizer que os níveis de aprendizagem encontram-se organizados em sequência ou em algum tipo de ordem hierárquica.

A ZDP é dinâmica e se ajusta em uma construção interativa. É nela que ocorre a transição do funcionamento interpsicológico para intrapsicológico. Isso implica em dizer que o aluno é ativo no esforço em participar e compartilhar nas atividades com os outros partícipes.

Vygotsky mostra que a aprendizagem pode ser compreendida como apropriação dos recursos da cultura mediante a participação em atividades conjuntas. Nesse sentido, o conceito de mediação se associa ao conceito de ZDP apresentado anteriormente. Para ele, mediação seria o processo de intervenção de um elemento intermediário numa relação. Essa mediação poderia ser instrumental ou semiótica.

A mediação instrumental (MI) se caracteriza pelo relacionamento com as coisas presentes no mundo através de instrumentos intermediários. Os instrumentos fazem uma

mediação entre a ação concreta do indivíduo e o mundo. Por sua vez, a mediação semiótica consiste na existência dos signos, os quais são formas posteriores de mediação. O signo, para Vygotsky, é como “instrumento psicológico”, tendo como função auxiliar o homem nas suas atividades psíquicas.

Essas ferramentas psicológicas podem ser um sistema numérico, esquemas, mapas, etc. Mas, na teoria de Vygotsky, é a linguagem que se torna, ao longo do desenvolvimento humano, o instrumento mediador fundamental da ação psicológica.

A linguagem media a relação do indivíduo com os demais e, além disso, media também a relação do indivíduo consigo mesmo. Sobre isso, Vygotsky afirma que ela é primeiramente uma ferramenta compartilhada com os outros participantes em atividade sociais, para depois tornar-se uma ferramenta de diálogo interior. Ou seja, no princípio a linguagem tem uma função essencialmente comunicativa. Entretanto, mais adiante ela se torna um regulador da própria ação.

Como dissemos no início, Vygotsky traz em seus estudos uma compreensão sobre a aquisição da linguagem e enfatiza o seu importante papel na transmissão da cultura, na organização do pensamento e na facilitação da aprendizagem. Para a compreensão da aprendizagem de idiomas estrangeiros, que durante muito tempo se desenvolveu sob a forte tutela dos princípios behavioristas e sob o conservadorismo da escola positivista, o sócio- interacionismo de Vygotsky solidifica a noção de que um aluno de língua estrangeira alcançará maior competência linguística uma vez envolvido em situações de colaboração e de interação com outros falantes da língua em questão que sejam mais capazes.

Como dissemos no início, outro ícone interacionista e formador de boa parte dos conceitos atuais em educação foi Jean Piaget. Sua obra enfatiza a natureza construtivista do processo de aprendizagem e seu pressuposto central compreende essa aprendizagem como o resultado direto das nossas experiências as quais são passíveis de receber significado considerando-se os diferentes estágios de desenvolvimento em que nos encontramos ao longo de nossas vidas.

Para Piaget, as teorias até então desenvolvidas não explicavam como o conhecimento era possível, como um indivíduo passava de um conhecimento menor para um conhecimento maior e nem explicavam qual era o papel desse indivíduo no ato do conhecimento.

Assim, através da observação do comportamento e das atitudes de crianças em suas brincadeiras e em sua interação com os adultos, Piaget tentou desenvolver uma teoria explicativa sobre o desenvolvimento cognitivo humano que respondesse os seus questionamentos.