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Murilo Lemos Márcia Oliveira

6. liderança e geStão de equipeS

Especialmente para aqueles gestores ainda com pouca experiência em governo, é importante observar alguns aspectos importantes sobre as equipes de trabalho.

Na formação de uma equipe, é fundamental primeiramente um tra- balho profundo de planejamento: definir quais trabalhos serão executados pelo grupo e quais objetivos devem ser alcançados por estes trabalhos. Em seguida, deve ser feita uma divisão dos trabalhos em grupos de ati- vidades mais próximas e semelhantes entre si. Cada membro da equipe ficará responsável por realizar um ou mais blocos de atividades. Sugere-se o critério de semelhança entre as atividades para seu agrupamento, pois é muito difícil encontrar profissionais que consigam executar atividades muito distintas entre si. O próximo passo é definir – utilizando o modelo de gestão por competências ou outros modelos – qual perfil os membros de uma equipe deverão ter para bem executar cada pacote de atividades. Tudo isso passa também pelo fundamental processo de Dimensiona- mento da Força de Trabalho, em que são avaliadas as carências quantita- tivas e qualitativas da força de trabalho ante os desafios organizacionais a serem enfrentados, e traçam-se estratégias e ferramentas para suprir essas deficiências. Deste importante diagnóstico saem subsídios para as políticas de contratação, treinamento e desenvolvimento e também alocação ótima da força de trabalho.

Muitas vezes, incorre-se no erro de buscar fora da organização talen- tos que já existem dentro dela, mas que estão subaproveitados em tarefas ou áreas não condizentes com seu perfil. Daí a importância de bancos de talentos materializados na forma de sistemas onde o gestor possa ter acesso ao perfil dos colaboradores e suas ricas experiências prévias de

trabalho, facilitando o processo de movimentação e recrutamento interno não por perseguições pessoais ou conveniências de momento, mas sim por critérios objetivos voltados a maximizar o retorno para a organização e a realização profissional do colaborador.

Não se pode esquecer que o líder é uma peça de fundamental impor- tância numa equipe. Ele também deve ser avaliado e preparado quanto às competências necessárias para o bom exercício da liderança. Podemos citar como exemplos boas habilidades de relacionamento interpessoal, raciocínio rápido e crítico, capacidade de lidar com cobranças e pressão, saber recompensar e corrigir as pessoas com senso de justiça e meritocra- cia, capacidades de monitoramento e avaliação de resultados, entre outras. Um dos modelos mais consagrados e eficazes para a boa gestão e de- senvolvimento de uma equipe é o modelo da liderança situacional, definido por Hersey & Blanchard. De acordo com eles, não existe a maneira ideal de se liderar e conduzir uma equipe. Existem quatro estilos diferentes de liderança que devem ser aplicadas a cada colaborador conforme o seu nível de maturidade e conhecimento a respeito do trabalho a ser desen- volvido. Quanto mais o profissional é experiente, tem bons conhecimen- tos técnicos sobre o trabalho e é maduro psicológica e emocionalmente, mais o líder deve lhe dar autonomia, fazendo uma gestão por delegação e cobrando resultados. Por outro lado, quanto menos maduro e experiente é o colaborador, mais a atuação do líder deve ser próxima a ele, fornecen- do avaliações constantes sobre o andamento do seu trabalho, oferecendo apoio e monitorando não somente os resultados, mas também os pro- cessos. Quebra-se assim o paradigma comum no setor público de que o funcionário precisa adaptar-se ao gestor de plantão. Especialmente num contexto de estabilidade no emprego, exigem-se habilidades interpessoais avançadas do gestor para que consiga extrair de sua equipe os melhores resultados. As melhores estratégias nesse sentido são a aproximação e o diálogo aberto em torno de objetivos comuns detectados. Isso não significa ser submisso à equipe, mas atuar efetivamente como um líder e mentor de seus liderados, reconhecendo e aproveitando seus talentos, ouvindo e

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dando espaço para suas ideias e propostas e detectando oportunidades de melhoria, criando um espaço saudável e seguro para troca de ideias e pro- postas de inovação. O chefe na administração pública não consegue impor sua vontade porque lhe falta a arma da ameaça de demissão. Ele precisa tirar o melhor proveito possível da mão de obra que está à sua disposição, maximizando, por exemplo, os esforços de realocação interna e capacita- ção. Mesmo que acabe decidindo pelo desligamento de um colaborador, o processo de quebra de estabilidade ainda é extremamente longo, moroso e difícil, lembrando que a contratação por concurso público também é um procedimento lento e penoso para a reposição. Por sua vez, o subordinado concursado também não logra êxito em suas iniciativas que não contam com o respaldo superior porque os regramentos, as amarras e os controles extremamente burocráticos e rígidos impostos pelo Direito Administrativo centralizam as decisões, exigindo a autorização expressa do chefe para a execução de praticamente todos os trabalhos – do mais simples ao mais complexo. Daí, de novo, a importância do diálogo constante.

7. motivação

A motivação é um fenômeno interno ao indivíduo. Ou seja, cada um já tem suas próprias motivações, que na maioria das vezes são diferentes daquelas do colega que senta ao lado. Cabe ao bom gestor, ao líder efetivo, buscar analisar e compreender as motivações de cada um dos seus colaboradores e dar espaço para que elas tenham vazão e contribuam para o resultado da organização como um todo. Alocar tarefas mais próximas do perfil e moti- vação de cada funcionário é uma das bases do já citado modelo da Liderança Situacional. Ninguém motiva ninguém, mas pode facilmente desmotivar. E no caso específico da administração pública, essa desmotivação é muito frequente, devido principalmente ao fato de que os gestores não são líde- res de fato. Eles na maioria das vezes não foram avaliados nem preparados quanto ao seu perfil técnico e psicológico dentro de requisitos para exercer a liderança. Logo, muitas vezes um bom técnico é promovido e acaba sendo

um péssimo chefe, contribuindo para a desmotivação, desânimo e muitas vezes até mesmo doenças ocupacionais dos membros da equipe.

A função do líder no setor público é mais complexa ainda que no setor privado, pois ele precisa ter sensibilidade para conhecer seus funcionários, identificar qual tipo de trabalho se adéqua melhor ao perfil de cada um e ainda convencer o funcionário a fazer este trabalho, envolvê-lo e efetiva- mente estimulá-lo: ser seu parceiro. Quando o chefe no governo tenta usar a força e a hierarquia para mandar no funcionário, a burocracia se fecha e se volta contra ele, gerando um imobilismo nas ações de governo. É preciso ao bom líder no governo ter sensibilidade e perfil tecnopolítico (como explica Carlos Matus) e negociar constantemente com seus funcionários, buscando sempre que possível um denominador comum, um meio-termo entre os anseios do funcionário e as necessidades do governo. Quando essas negociações não acontecem, vêm os conflitos, que resultam muitas vezes em ambientes de trabalho tóxicos, de assédio mútuo, onde o chefe designa ao seu funcionário tarefas que nada têm a ver com seu perfil ou trabalhos impossíveis, tentando com isso transformar a vida do colabo- rador num inferno, até que ele “peça para sair”. O último recurso acaba sendo a transferência do colaborador para outra área, o exílio, gerando problemas organizacionais e também emocionais.

8. teletrabalho

Cada vez se torna mais importante discutir o trabalho remoto nas orga- nizações, inclusive nas públicas, especialmente desde a pandemia da co- vid-19. A grande questão é que os órgãos públicos em geral têm menos experiência prática com esta modalidade de trabalho que as empresas pri- vadas. O Governo Federal, o Governo do Estado de São Paulo e a Prefeitura de São Paulo, por exemplo, já tinham o teletrabalho regulamentado, mas de forma tímida, apenas para algumas carreiras e em casos excepcionais. Recentemente, estas três esferas do Poder Executivo emitiram regramen- tos mais detalhados sobre o tema e com maior alcance.

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Os maiores desafios estão ligados à forma de monitoramento do tra- balho – que tradicionalmente na maioria das organizações públicas é mais focado na presença do funcionário que nos resultados entregues –, falta de familiaridade das equipes com ferramentas de trabalho on-line – lembran- do que devido à baixa rotatividade, a força de trabalho pública em geral é envelhecida – e aspectos da natureza do trabalho e do perfil do colaborador.

O maior fator restritivo ao teletrabalho é o grau de informatização dos processos de trabalho. Quanto mais atividades permanecem presas ao papel, mais importante será o deslocamento físico do servidor à repartição para consultar os arquivos e documentos necessários para a execução do trabalho.

É necessário também que haja uma diretriz geral sobre o teletrabalho para a organização como um todo, mas que certos aspectos sejam delega- dos ao gestor setorial e ao imediato (secretário, diretor, etc.). Como em camadas de uma cebola, há dimensões do teletrabalho que precisam ser definidas, levando-se em conta não apenas o cargo da pessoa, mas tam- bém o ambiente organizacional onde ela está inserida. Saúde, Educação, Segurança, Transportes, cada área de atuação governamental possui par- ticularidades que precisam ser levadas em conta ao se estabelecer e cali- brar as regras para o planejamento, execução e avaliação das atividades na modalidade a distância. Uma das questões a ser avaliada localmente é o trabalho intermitente, pois é possível se estabelecer o trabalho remoto não em todos os dias, mas apenas em alguns dias da semana, por exemplo. É preciso também considerar variáveis de aspecto psicológico, individual de cada colaborador. Elas podem levar duas pessoas com o mesmo cargo e na mesma secretaria a desempenharem as mesmas atividades satisfato- riamente – mas uma no ambiente presencial e outra remotamente.

Há também que se considerar aspectos operacionais como os custos para adequação física de espaços, bem como aquisição e manutenção de mobiliário, equipamentos e conectividade à internet para quem trabalha fora do escritório. Por um lado, o empregador economiza em custos fixos na sua sede e em custos de deslocamento do colaborador. Por outro lado, pelo menos uma parte desta economia precisa ser repassada ao servidor

para que este possa arcar com os citados custos de adaptação do ambiente de trabalho em sua residência.

Há que se estruturar um amplo projeto de levantamento dos resulta- dos alcançados e prestação de contas para a sociedade. Há um preconceito generalizado de que o servidor público não gera resultados satisfatórios trabalhando presencialmente, logo trabalhando de casa estes resultados tenderiam a ser ainda piores. Já há algumas estatísticas que demonstram ganhos de produtividade do trabalho remoto em algumas atividades pú- blicas, bem como instrumentos que inspiram o aprimoramento também da gestão do desempenho presencial.

9. conSideraçõeS finaiS

É preciso pensar um amplo processo de redimensionamento da força de trabalho nos governos, levando-se em conta as reais necessidades presen- tes e futuras da sociedade. Parcerias com a Academia podem ser muito úteis e prósperas no sentido de planejar os perfis quantitativo e qualitativo dos colaboradores dentro do contexto de cada política pública. Não há solução única que atenda satisfatoriamente a todos os desafios.

É preciso fazer ajustes pontuais em cada subsistema de gestão de pes- soas, mas acima de tudo fazer com que funcionem de maneira inteligente, integrada e estratégica. Por exemplo, se penso o processo de capacitação e desenvolvimento apenas como uma lista periódica de cursos a serem aplica- dos conforme a vontade do gestor de plantão, estou rodando este processo como uma rotina operacional e sem resultados efetivos e perenes. Quando olho este mesmo processo dentro de uma lógica estratégica e articulada, posso vincular os cursos que vou oferecer aos resultados do processo de avaliação de desempenho que mapeou as necessidades de aprimoramento dos servidores no exercício da sua função e para o seu desenvolvimento dentro da carreira.

Falando sobre o concurso público, mesmo com necessários ajustes para seu aprimoramento enquanto ferramenta de recrutamento e seleção, ele provavelmente não será suficiente para prover os recursos humanos de

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que necessitamos. Organizações sociais, servidores celetistas, funcionários temporários e terceirizados, cargos de confiança selecionados com critérios técnicos, trabalhadores presenciais, semipresenciais e a distância, todos eles formam uma gama de perfis que deverão conviver e coabitar cada vez mais o ambiente das organizações públicas e dos quais necessitamos para melhores políticas públicas. O Regime Jurídico Único nunca existiu na prática e nem deve existir, assim como a privatização total é inviável, indesejável e ineficiente. O direito administrativo, que rege a Gestão Pública, não é um direito criado para subjugar os interesses ou os direitos dos cidadãos aos do Estado; é, pelo contrário, um direito que surge exatamente para regular a conduta do Estado e mantê-la afivelada às disposições legais, dentro desse espírito protetor do cidadão contra descomedimentos dos de- tentores do exercício do Poder estatal. Ele é, por excelência, o direito defensivo do cidadão. (bandeira de mello, 2019)

Partindo deste pressuposto, todas as ações que norteiam os Atos Públicos devem considerar o cidadão como o maior patrimônio. Não é possível pensar melhorias no serviço público sem pensar nas pessoas. Tanto as que prestam o serviço, como as que os recebem.

Enfim, os desafios ainda são muitos para a gestão de pessoas nos go- vernos. É necessário reorganizar o trabalho de maneira mais produtiva, gerindo o desempenho presencial e remoto com foco nos resultados, fle- xibilizando – não eliminando – a estabilidade no emprego, preparando e escolhendo bem os líderes, atraindo e desenvolvendo os melhores talentos com ethos público, transferindo as atividades rotineiras e repetitivas para os sistemas informatizados ou terceirizados. Deve-se então remanejar e ca- pacitar os servidores para trabalhos mais inteligentes e selecionar e formar bons líderes. Com o tempo, teríamos provavelmente menos servidores, mas mais bem remunerados, com mais autoestima e motivação e maior capacidade de entrega, resgatando neles o verdadeiro sentido e finalidade de seus esforços: servir o público e buscar o bem comum.

A discussão, portanto, não deve ser centrada apenas nos servidores públicos, nem sobre o estado mínimo ou máximo, mas sim sobre o estado necessário para atender as necessidades dos cidadãos com mais, melhores e menos onerosas políticas públicas de forma transparente e sustentável.

Murilo Lemos

Mestre em Gestão e Políticas Públicas (eaesp-fgv); Especialista em

Administração de Recursos Humanos (faap); Bacharel em Administração Pública (eaesp-fgv); Diretor de Recursos Humanos (Prefeitura Municipal de Guarulhos- sp). Ocupou diversas posições de assessoramento e direção em Secretarias, Autarquias, Empresas Públicas e Fundações do Governo do Estado de São Paulo e nas Prefeituras de Campinas-SP e São Paulo-SP, sempre atuando na área de Gestão de Pessoas. Foi Professor em diversos cursos na eacH-usp, faap, Escola Paulista de Direito, Anhanguera Educacional, Escola de Governo do Estado de São Paulo, ibegesp, Oficina Municipal, Centro de Liderança Pública, Escola do Parlamento da Câmara Municipal de São Paulo, Instituto Legislativo Paulista, Escola de Contas do Tribunal de Contas do Estado de São Paulo, entre outros.

Márcia Oliveira

Servidora efetiva do Município de São Paulo, desde 1987; Presidente adam - Associação do Administradores do Município de São Paulo; mba - Gestão de Pessoas- imt; Esp. Programa de formação de Gestores de Esportes na Gestão Pública - fia-usp; Esp. Programa Desenvolvimento Gerencial - imt.

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