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Parte I – Fundamentação Teórica

Capítulo 2: Liderança

2.2. Abordagens de Liderança

2.2.4. Abordagem Integrativa

2.2.4.2. Lideranças Transformacional e Transacional

liderança transformacional são conceitos recorrentes da literatura organizacional na área da liderança, constituindo, para alguns investigadores, conceitos de alguma forma sobrepostos. De acordo com Cunha e colegas (2007), as organizações necessitam de pessoas empenhadas, comprometidas, dispostas a ir “mais além” e que adotem comportamentos de cidadania organizacional. Ora, os colaboradores de uma Organização adotam-nos se se sentirem satisfeitos e justiçados, confiarem na Organização e no seu líder e se sentirem que a

Organização se preocupa com o seu bem-estar. Os autores referem ainda que existem alguns fatores que poderão atuar em sentido contrário à adoção destes comportamentos por parte dos colaboradores, tais como despedimentos, quebras de contrato psicológico, entre outros. Uma vez que as organizações precisam, progressivamente, de melhores cidadãos organizacionais e existem condições que contrariam essa necessidade, cabe à liderança transformacional

Grande parte do pensamento sobre a liderança transformacional e transacional foi influenciado por James McGregor Burns após ter escrito um best seller sobre liderança política. Burns (1978, referido por Yukl, 2013) define liderança transformacional como sendo uma liderança que apela aos valores morais dos seguidores, na tentativa de aumentar a sua consciência sobre questões éticas e mobilizar a sua energia e recursos para reformar as instituições. Melo (2004) refere que esta liderança estimula a mudança a partir do carisma e da visão do líder, incentivando as pessoas a adotar a sua forma de ver as coisas.

A liderança transformacional, segundo Cunha e colegas (2007), pode ser definida como “o processo através do qual os líderes fomentam o empenhamento dos seguidores e os induzem a ultrapassar os seus autointeresses em prol dos objetivos da Organização, assim conseguindo obter o seu empenhamento e produzindo grandes mudanças e elevados desempenhos (“p.371) A liderança transacional, por outro lado, está relacionada com a “atribuição de recompensas aos seguidores em troca da sua obediência” (Cunha et al., 2007, p.372).

Como Conger e Kanungo (1998, referidos por Judge & Piccolo, 2004) observaram, para Burns, a diferença entre a liderança transformacional e transacional é em termos do que os líderes e os seguidores oferecem um ao outro. Os líderes transformacionais oferecem um propósito que transcende os objetivos de curto prazo e se concentram em necessidades intrínsecas de ordem superior. Os líderes transacionais, por contraste, concentram-se na troca adequada de recursos. Se a liderança transformacional resulta nos seguidores a se

identificarem com as necessidades do líder, o líder transacional dá aos seguidores algo que estes querem, em troca de algo que o líder quer (Kuhnert & Lewis, 1987; Podsakoff et al., 1990). Souza e Tomei (2008) referem igualmente que na liderança transacional os seguidores se limitam a aceitar a decisão do seu líder, não havendo espaço para diálogo, não

participando na formulação dos objetivos da Organização e, portanto, não se sentem envolvidos.

Além do seu papel central na teoria da liderança transformacional, a liderança carismática tem sido a base da sua própria literatura distinta, tal como foi possível verificar no ponto anterior. A liderança transformacional e as teorias de liderança carismática têm muito em comum e, de maneira importante, ambas as literaturas se influenciam mutuamente (Judge & Piccolo, 2004; Mittal, 2015). Mittal (2015) e Yukl (2013) descrevem, desta forma, as diferenças apresentadas entre as duas lideranças. Por exemplo, a essência do carisma do líder é ser percebida pelos seguidores como extraordinária. Nesta situação, os seguidores dependem do líder para orientação e inspiração. Por outro lado, a essência da liderança

transformacional é inspirar e estimular os seguidores a se desenvolverem. Outras diferenças residem no facto de os líderes transformacionais capacitarem os seus seguidores, tornando-os menos dependentes do líder. Por outro lado, os líderes carismáticos envolvem-se, geralmente, em comportamentos que promovem uma imagem extraordinária de competência e, assim, aumentam a dependência dos seguidores. Por último, os processos de influência carismática destinam-se, principalmente, a alinhar a visão dos seguidores com a do líder. Assim, o processo de influência é unidirecional. Por outro lado, na liderança transformacional, há mutualidade no relacionamento líder-seguidor que tem implicações para ambos líderes e seguidores. Assim, o processo de influência é recíproco.

Bass, em 1985, baseou a sua teoria da liderança transformacional na proposta de Burns, com várias modificações ou elaborações (Judge & Piccolo, 2004). Primeiro, Bass não concordou com Burns de que a liderança transformacional e a liderança transacional

representam extremos opostos de um único contínuo. Bass argumentou que a liderança transformacional e transacional são conceitos distintos e que os melhores líderes são tanto transformacionais como transacionais, elaborando os comportamentos que manifestam a liderança transformacional e transacional (Judge & Piccolo, 2004). Embora a sua teoria tenha sofrido várias revisões, na versão mais recente existem quatro dimensões de liderança

transformacional, três dimensões de liderança transacional e uma dimensão de não liderança. As quatro dimensões da liderança transformacional são: (i) carisma ou influência

idealizada, (ii) motivação inspiradora, (iii) estimulação intelectual e (iv) consideração individualizada. O carisma, ou influência idealizada, é o grau em que o líder se comporta de

maneiras admiráveis que fazem com que os seguidores se identifiquem com o mesmo. Líderes carismáticos mostram convicção, assumem posições e apelam aos seguidores num nível emocional. A motivação inspiradora é o grau em que o líder articula uma visão atraente e inspiradora para os seguidores. Líderes com motivação inspiradora desafiam os seguidores com altos padrões, comunicam otimismo sobre a realização de metas futuras e fornecem significado para as tarefas em questão. A estimulação intelectual é o grau em que o líder desafia os pressupostos, assume riscos e solicita ideias aos seguidores. Os líderes com essa caraterística estimulam e incentivam a criatividade nos seus seguidores. A consideração

individualizada é o grau em que o líder atende às necessidades de cada seguidor, atua como

seu mentor e escuta as preocupações e necessidades deste (Judge & Piccolo, 2004; Bass, 1990).

Em relação à liderança transacional, esta contém três dimensões: (i) recompensa

contingente é o grau em que o líder configura trocas construtivas ou trocas com os

seguidores: o líder esclarece as expectativas e estabelece as recompensas para atender a essas expectativas. Em geral, a gestão por exceção é o grau em que o líder toma medidas corretivas com base nos resultados das transações líder-seguidor (Judge & Piccolo, 2004; Bass, 1990). Conforme observado por Howell e Avolio (1993), a diferença entre gestão por exceção-ativa e gestão por exceção-passiva reside no momento da intervenção do líder. Os líderes ativos monitorizam o comportamento dos colaboradores, antecipam problemas e tomam ações corretivas antes que o comportamento crie sérias dificuldades. Os líderes passivos esperam até que o comportamento tenha criado problemas antes de agir.

Uma forma final de liderança, na verdade não liderança, é a liderança laissez-faire. Este tipo de liderança carateriza-se por ser a ausência de liderança. Líderes que dominam a liderança laissez-faire evitam tomar decisões, hesitam em agir e estão ausentes quando necessário (Judge & Piccolo, 2004; Bass, 1990). Embora a liderança laissez-faire tenha alguma semelhança com a gestão por exceção-passiva, os investigadores argumentaram que a liderança laissez-faire, porque representa a ausência de qualquer tipo de liderança

(transformacional ou transacional), deve ser tratada separadamente das outras dimensões transacionais (Judge & Piccolo, 2004).

As componentes propostas por Bass poderão ser consultadas na tabela 12.

Tabela 12. Componentes da Liderança transacional e transformacional de Bass. (Fonte:

construído a partir de Cunha et al., 2007; Bass, 1999)

Tipos Componentes Explicação

Transformacional

Influência idealizada

O líder adota comportamentos (e.g. de respeito e elevação moral) que ativam fortes emoções nos seguidores, influenciando os seus ideais.

Liderança inspiracional

O líder comunica uma visão apelativa, usa símbolos focados no esforço do colaborador, modela os comportamentos, instila otimismo.

Estimulação intelectual

O líder incita os colaboradores à tomada de consciência dos problemas, da sua própria consciência e imaginação. Ajuda-os na identificação dos valores e crenças, estimula- lhes a inovação, a criatividade e o espírito

Tipos Componentes Explicação

crítico.

Consideração individualizada

O líder responde às necessidades dos

colaboradores, apoia-os, encoraja-os, faculta- lhes formação, treina-os.

Transacional

Recompensa contingencial

O líder clarifica ao colaborador o que este deve fazer para ser recompensado pelo esforço.

Gestão por exceção ativa

O líder monitoriza o desempenho dos colaboradores e adota ações corretivas caso não alcancem os padrões estabelecidos.

Gestão por exceção passiva

O líder aguarda que os problemas ocorram para que, então, sejam tomadas ações corretivas.

Laissez-faire O líder praticamente abstém-se de tentar influenciar os colaboradores.

Apesar de tudo, não existe ainda consenso teórico nem empírico por parte dos

investigadores. A título de exemplo, Podsakoff e colegas (1990) efetuaram um estudo em que trabalharam com seis dimensões transformacionais (identificação e articulação de uma visão, fornecer um modelo apropriado, promover a aceitação dos objetivos do grupo, criar

expectativas de elevado desempenho, promover apoio individualizado, estimulação intelectual) e uma dimensão transacional (comportamento de recompensa contingencial), sendo estas explanadas na tabela 13.

Tabela 13. Componentes da Liderança Transformacional e Transacional de Podsakoff.

(Fonte: Podsakoff et al., 1990)

Tipo de Liderança Componentes e explicação

Transformacional

Identificar e articular uma visão: o comportamento por parte do

líder que visa identificar novas oportunidades para a sua

Organização e desenvolver, articular e inspirar outros com a sua visão do futuro;

Fornecer um modelo apropriado: o comportamento por parte do

líder que estabelece um exemplo para que os colaboradores sigam e que é consistente com os valores que o próprio líder defende;

Tipo de Liderança Componentes e explicação

Fomentar a aceitação dos objetivos de grupo: o comportamento

por parte do líder que visa promover a cooperação entre os colaboradores e fazê-los trabalhar juntos com vista a um objetivo comum;

Expectativas de elevado desempenho: o comportamento que

demonstra as expectativas do líder em termos de excelência, qualidade e/ou elevado desempenho por parte dos seguidores;

Fornecer apoio individualizado: o comportamento por parte do

líder que indica que este respeita os seguidores e está preocupado com os seus sentimentos e necessidades pessoais;

Estimulação intelectual: o comportamento por parte do líder que

desafia os seguidores a reexaminar alguns dos seus pressupostos sobre o seu trabalho e repensar como este pode ser realizado.

Transacional

Comportamento de recompensa contingencial: avalia a medida em

que um líder oferece recompensas em troca do esforço dos seguidores.

Em suma, a liderança transformacional é determinada em função dos seguidores que são motivados a sentir respeito e lealdade para com o líder, mostrando-se disponíveis para executar tarefas extraordinárias, e indo, portanto, “mais além” (demonstrando, assim, CCO). A liderança transacional, por sua vez, implica um sistema de recompensas atribuídas aos seguidores, em função do grau de obediência. É de referir que Bass (1985, referido por Xenikou, 2017) não se opõe à complementaridade entre estes dois tipos de liderança, na medida em que um líder pode utilizar ambos em situações distintas ou em simultâneo, sendo que estes se complementam. Cunha e colegas (2007) referem que a liderança

transformacional é mais eficaz em períodos de fundação organizacional e de mudança, enquanto que a liderança transacional é mais eficaz em períodos de evolução lenta e estáveis. Caixeiro (2014) refere ainda que a liderança transformacional se assemelha mais ao construto de liderança per se, enquanto que a liderança transacional se assemelha mais ao construto de gestão.