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Métodos baseados nas preferências declaradas (stated preferences) e reveladas (revealed preferences)

Objetivo 3 Contribuir para uma melhor qualidade de vida por via da preservação e da

1. Minimizar conflitos entre

4.4 Técnicas de avaliação económica de recursos florestais

4.4.1 Métodos baseados nas preferências declaradas (stated preferences) e reveladas (revealed preferences)

A literatura apresenta diferentes tipos de classificações dos métodos de avaliação económica de recursos naturais e ambientais. Convencionalmente destacam-se duas tipologias que permitem avaliar o comportamento do consumidor relativamente a alterações ambientais e que se distinguem pelas fontes de informação utilizada (Freeman III, 2003):

- os métodos de preferências reveladas (revealed preferences) em que a procura é estudada através das observações dos comportamentos dos indivíduos relativamente às aquisições realizadas no mercado (traduzidas num preço de mercado). Estes métodos quantificam o EC marshaliano mas não as medidas hicksianas. Baseiam-se na construção de uma procura de mercado marshaliana para o bem ambiental a partir da qual calculam o EC marshaliano. Para construir esta procura usam as informações obtidas a partir de bens transacionáveis em mercados, que tenham uma relação de complementaridade ou de substituibilidade com o bem ambiental.

- os métodos de preferências declaradas (stated preferences), através dos quais os indivíduos expressam as suas preferências face ao ambiente dando resposta a questões, por intermédio de questionários e experiências de campo ou laboratoriais. Estes métodos quantificam as medidas de variação hicksianas diretamente, perguntando aos indivíduos quais as suas DPP ou DPA equivalentes ou compensatórias.

O primeiro tipo de métodos parte do pressuposto que as preferências individuais relativamente a bens ou serviços ambientais, em alguns casos, podem ser reveladas através das compras efetuadas de alguns bens de mercado associados ao consumo daqueles bens ou serviços. Portanto, o valor associado ao bem/serviço ambiental é

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revelado através de um mercado que lhe é complementar (substituto ou proxy) (Pearce et al., 2002).

Um dos métodos que segue esta abordagem é o Método do Custo de Viagem (MCV) o qual assenta na premissa que o custo de viagem, por exemplo, para locais de recreio pode ser usado para inferir a disposição para pagar dos visitantes e, deste modo, obter a sua valoração desses locais e dos benefícios de recreio proporcionados. O cálculo pode considerar custos implícitos (tempo de viagem) e custos explícitos (tarifa de transporte público, valor gasto em portagens, custo do combustível gasto) (Sinclair and Stabler, 1997). Este método surge associado aos Serviços Florestais Norte Americanos e à necessidade de identificar o valor monetário implícito aos benefícios de recreio outdoor proporcionado na rede nacional de parques nacionais. Foi proposto em 1947, por Harold Hotelling, para medir os benefícios de recreio nos parques nacionais nos EUA, o qual sugeriu (Mendes, 1996: 65): “que os custos de transporte fossem usados como proxy do preço das quantidades de recreio medidas em número de visitas, e que as duas variáveis fossem relacionadas através de uma curva da procura”.

O MCV recorre habitualmente a um questionário que permite recolher dados caracterizadores do comportamento real das escolhas e consumos do indivíduo face à procura por recreio (incluindo características socioeconómicas, preferências enquanto visitantes de recreio, locais escolhidos, frequência e motivo de visita, duração da visita e da viagem, custo do transporte, alimentação, estada, entre outros). A partir destes dados, poderá ser calculado o custo de viagem e identificadas as variáveis que explicam a procura por viagens de recreio (Shrestha et al., 2007). A função procura de recreio estimada é uma função dos custos da viagem que permite calcular o valor económico do recreio, e que representa a medida indireta dos benefícios líquidos ou do excedente do consumidor marshaliano (Bateman, 1993).

Das diversas aplicações do MCV, distinguem-se essencialmente dois tipos de modelos (Hanley and Barbier, 2009; Garrod and Willis, 1999; Mendes, 1996): o modelo tradicional (que inclui uma abordagem zonal e uma individual do MCV) e o modelo de utilidade probabilística. Originalmente o primeiro modelo é desenvolvido a partir de um MCV zonal, que estima a procura de recreio de um local considerando

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as diferentes zonas de proveniência dos visitantes (correspondente ao custo das viagens realizadas pelos residentes), devendo-se a Trice and Wood (1958) e Clawson (1959) as primeiras aplicações. Mais tarde, é desenvolvida uma abordagem individual deste modelo que utiliza informações individuais acerca dos visitantes, isto é, a unidade de análise respeita às viagens anuais ou sazonais realizadas por cada indivíduo, enquanto visitante de recreio (Hailu et al., 2005). Esta versão, aplicada primeiramente por Brown and Nawas (1973) e por Gum and Martin (1974), estima o excedente do consumidor a partir da análise do comportamento individual dos visitantes e o custo suportado em termos da atividade de recreio usufruída. Deste modo é possível determinar a relação entre o número de visitantes individuais num determinado período (usualmente um ano), o custo por visita e outras variáveis socioeconómicas. Quanto ao modelo de utilidade probabilística, os primeiros contributos devem-se a Morey (1981) e Hanemann (1978, 1984b, 1985), os quais permitem explicar os fatores que determinam as escolhas dos indivíduos em relação a um local específico de recreio a partir de um modelo teórico da maximização de utilidade do visitante. Esta abordagem permite, pois, estimar o valor respeitante aos atributos dos locais de recreio ou aos efeitos da variação desses atributos sobre a procura.

São diversos os estudos que seguem esta abordagem do MCV. No campo do recreio

outdoor, são vários os exemplos, nomeadamente, o caso de Hailu et al. (2005) que

identifica constructos atitudinais (como o sentimento de pertença a locais de recreio por utilizadores habituais) que influenciam a procura de recreio e têm impactes potenciais na estimativa do excedente do consumidor. No caso de Hynes et al. (2007), a escolha das zonas fluviais para a prática de caiaque, na Irlanda, é determinada por um conjunto de atributos como o nível congestionamento, a qualidade do estacionamento e as características estéticas. Hesseln et al. (2004), por sua vez, estudam o segmento de pedestrianistas para elaborarem um modelo que confronta a procura de viagens deste segmento face ao impacte dos incêndios em áreas potenciais para a prática do pedestrianismo (neste caso, os parques nacionais de Montana e Colorado, nos EUA).

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Um outro método de preferências reveladas é o Método do Preço Hedónico (MPH), usado sobretudo para estimar o valor dos atributos naturais e ambientais que afetam diretamente os preços de mercado de bens imobiliários, como a habitação ou a venda de terrenos. O mercado imobiliário foi, aliás, utilizado na primeira aplicação empírica deste método (por Ronald Ridker, em 1967), na qual se argumentava que a variação nos níveis de poluição do ar poderia ser utilizada para inferir a variação no preço dos imóveis (Bateman, 1993). A premissa seguida para o mercado imobiliário é que o preço de um imóvel depende de um conjunto de fatores, como o número de quartos, a área ocupada, os acessos, o jardim, entre outros, onde se incluem também os atributos naturais e ambientais que caracterizam a envolvente (incluindo qualidade do ar, poluição sonora, presença de espaços verdes e de lazer, paisagem naturais aprazíveis). O MPH baseia-se na análise deste mercado para verificar se a variação sistemática dos preços dos imóveis pode ser explicada pela variação na qualidade dos referidos atributos naturais e ambientais. Portanto, as escolhas de compra de casa por parte dos indivíduos traduzem a sua valoração dos referidos atributos, visando a maximização da sua utilidade. Para estimar, em termos médios, essa valoração, o MPH infere estatisticamente entre a alteração marginal na qualidade ambiental e o preço dos imóveis. O valor (marginal) obtido corresponderá ao preço implícito do atributo qualidade ambiental (Hanley and Barbier, 2009), refletindo a disposição para pagar marginal dos indivíduos relativamente a esse atributo (Markandya et al., 2002).

Entre os vários exemplos associados ao mercado imobiliário, o MPH permitiu estimar o valor: da paisagem proporcionada pelas florestas urbanas (Tyrväinen, 1997) e do impacto estético dos diferentes tipos de copa de árvore (Markandya et al., 2002), dos efeitos das alterações climáticas no preço do alojamento turístico na costa alemã (Hamilton, 2007), dos níveis de ruído junto a aeroportos e estradas e da qualidade do ar em espaços urbanos (Hanley and Barbier, 2009). Por regra, este método recorre aos dados disponibilizados pelo mercado, isto é, no caso do mercado imobiliário utiliza os dados das transações reais e os preços praticados.

Uma das principais vantagens dos métodos de preferências reveladas é que assenta na observação de comportamentos (escolhas) atuais dos indivíduos para estimar o valor das alterações de atributos ambientais. Contudo, o facto de apenas fornecerem

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informação acerca do valor correspondente aos usos atuais, inviabiliza a sua utilização para estimar o valor dos benefícios e das perdas associadas a alterações futuras na qualidade desses atributos (Garrod and Willis, 1999). O MCV é particularmente útil para estimar o valor associado ao uso de recreio dos locais, isto é, o valor de uso direto de recreio, apenas uma das componentes do valor de uso total de recursos naturais e ambientais. Quanto ao MPH a sua utilização limita-se a contextos onde os recursos ou atributos naturais ou ambientais estão associados a bens de mercado (como a compra e venda de imóveis), em que os referidos atributos e as alterações na sua qualidade/quantidade são perfeitamente percecionados pelos indivíduos.

Quanto aos métodos de preferências declaradas, estes assentam em mercados hipotéticos ou constructed markets (Pearce, et al., 2002), destacando-se o método de avaliação contingente (MAC). Este método recorre a inquéritos para inferir sobre a reação dos indivíduos face a uma situação hipotética de alteração da quantidade e/ou qualidade de um recurso ambiental ou, de outro modo, para saber qual o montante que estariam disponíveis a pagar para usufruir de uma melhoria ambiental ou para corrigir ou evitar um dano ambiental.

A avaliação contingente começou por ser utilizada nos EUA para avaliar recursos ambientais. Foi originalmente proposto por Ciriacy-Wantrup, em 1947, associado à avaliação económica dos benefícios decorrentes das medidas de prevenção da erosão do solo. Apesar de não ter realizado uma aplicação empírica, foi o primeiro a sugerir que a melhor forma de avaliar a importância dos referidos benefícios (não traduzidos no mercado) seria perguntar diretamente às pessoas quanto estavam dispostas a pagar por eles (Venkatachalam, 2004). Davies utilizou este método, pela primeira vez, no início da década de 60, para estimar os benefícios da caça ao alce junto duma comunidade de caçadores daquela espécie. O MAC ganhou popularidade depois da economia ambiental, especialmente durante os anos 60, ter reconhecido a importância dos valores de não uso como componentes do valor económico total (Dutta et al., 2007; Venkatachalam, 2004), os quais não são capturados pelos métodos de preferências reveladas.

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Existem outros métodos de preferências declaradas para estimar a disponibilidade para pagar dos indivíduos e que se diferenciam do MAC pela forma como os valores económicos são licitados. Pearce et al. (2002) apresentam um conjunto de técnicas que assentam em modelos de escolha (choice modelling, ou análise conjunta), isto é, em rankings e classes de opções ou alternativas, a partir das quais os indivíduos poderão inferir a disponibilidade para pagar ou aceitar. Estas técnicas podem assumir diferentes formatos: choice experiments, paired comparisons, contingent ranking e

contingent (conjoint) rating6.

O maior destaque recai na Choice Experiments (Christie et al., 2007; Freeman III, 2003; Boxal, et al., 1996) – através da qual os indivíduos são confrontados com uma série de opções de escolha. As opções incidem sobre diferentes possibilidades de atributos que poderão ser criadas ou que poderão caracterizar um determinado recurso natural ou política a implementar. Teoricamente o que se defende é que, por exemplo, o valor de uma floresta ou de uma política de gestão florestal é melhor explicado em termos das suas características ou atributos. Ao utilizar as observações das pessoas relativamente a diferentes conjugações desses atributos, o Choice

Experiments, permite (Hanley and Barbier, 2009):

- identificar os atributos que influenciam significativamente as decisões individuais; - (assumindo o preço ou o custo como um desses atributos) estimar qual a DPP/DPA individual por qualquer aumento/diminuição num dos outros atributos;

- inferir o que cada indivíduo estaria DPP/DPA por uma política que altera vários atributos simultaneamente.

Para alguns autores, o Choice Experiments ao permitir que o respondente avalie um conjunto de atributos ou características alternativas e que escolha a melhor opção (isto é, a que lhe proporciona mais utilidade), representa uma mais-valia comparativamente à avaliação contingente, na qual o respondente avalia globalmente um único cenário (Nielsen et al., 2007). O Choice Experiments permite, pois, reunir mais informação que o MAC, ao estimar a DPP pelos atributos em causa (ao considerar um dos atributos o preço ou o custo implícito às opções dos restantes

6 No formato pairwise comparison é pedido ao respondente que compare pares de cenários com opções alternativas, no contingent raking é pedido ao respondente que faça uma seriação das opções apresentadas e no contingent (conjoint) rating os diferentes cenários são pontuados numa escala de 1 a 10.

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atributos, a utilidade marginal estimada pode ser convertida no valor da DPP pelas opções escolhidas pelos indivíduos) (Breya et al., 2007). Em contrapartida, esta diversidade de opções faz com que a tarefa de escolha e de avaliação seja mais complexa e mais morosa, dificultando a resposta a muitos indivíduos (criando ainda mais probabilidades de se obterem não respostas, questionários incompletos, e mais respostas enviesadas). A maior dificuldade que se coloca ao respondente é medir cada atributo isoladamente relativamente ao conjunto dos benefícios que poderão estar associados a um recurso ou espaço natural (Meyerhoff et al., 2009). Na perspetiva do investigador, questiona-se se os atributos delineados correspondem aos que cada indivíduo vê refletido no bem ambiental ou política em avaliação. Por sua vez, Hanley and Barbier (2009) interrogam-se quanto à base teórica do Choice

Experiment e refletem sobre se o valor do todo iguala o valor da soma dos atributos

que o compõem. Esta é uma questão relacionada com a forma como as pessoas assumem os bens ambientais e se os veem como um conjunto de atributos. Neste contexto, Hanley and Barbier (2009) defendem como mais pertinente e adequada a utilização do MAC, quando o objetivo é avaliar o bem ambiental ou a política/projeto/programa como um todo. Particularizando a avaliação de recursos ou espaços florestais, a mesma opinião é partilhada por Stenger et al. (2009), sobretudo quando o que está em causa é testar opções de política florestal.

Em relação aos métodos das preferências reveladas, o MAC destaca-se porque obtém, de forma imediata, resposta ao habitual problema da avaliação ambiental – a avaliação monetária das preferências dos indivíduos. Esta informação é crucial na determinação do valor económico total além de poder ser usada diretamente na avaliação custo-benefício (importante instrumento no processo de planeamento e na identificação das diferentes opções políticas). Segundo Nunes (2000), o facto de permitir obter uma avaliação relativamente a alterações ambientais que ainda não ocorreram (avaliação ex-ante) torna-o um instrumento de apoio ao processo de tomada de decisão política. Do mesmo modo, possibilita a criação de cenários futuros de política que ao serem avaliados e testados em termos de opinião pública, poderão sustentar e contribuir para a adoção do cenário mais consensual e eficiente.

Por outro lado, e comparativamente aos habituais referendos de auscultação pública, os questionários utilizados pela avaliação contingente poderão ser mais

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representativos da opinião pública, sobretudo em contextos políticos. Segundo Mitchell and Carson (2005), nos referendos, apenas vota quem quer (desde que seja eleitor) e nem sempre aqueles que o fazem representam equitativamente as diferentes fações da sociedade. Com frequência, são os grupos mais informados e com maiores interesses políticos aqueles que apresentam uma maior taxa de participação. Já no caso dos questionários de avaliação contingente, e desde que se sigam procedimentos aleatórios na seleção da amostra, cada elemento da população alvo deverá apresentar a mesma probabilidade de ser inquirido (independentemente das suas preferências pessoais ou políticas). Neste contexto, poder-se-á afirmar que a aplicação de um questionário de avaliação contingente corresponde a um processo mais imparcial de participação pública.

Num contexto de avaliação de recursos florestais, e considerando que muitos dos seus valores são valores de não uso ou valores de uso que não estão traduzidos monetariamente (por exemplo, o bem-estar obtido pelos usos de recreio florestal, como o simples contacto com a natureza, a realização de passeios a pé ou de bicicleta, de piqueniques, etc.), a utilização da avaliação contingente é uma opção que tem vindo a ser largamente usada. Apesar de tudo, Kriström (2006: 139) refere que esta poderá ser uma solução problemática: “If we abstain from including non-use values, there is some risk for underestimating the ”true” values. If we do include them via the CVM, there is a certain risk that the estimate will be biased in some direction.” Com efeito, apesar das vantagens do MAC existem alguns riscos associados à sua utilização (ver Capítulo 5).

4.4.2 Aplicabilidade dos diferentes métodos na avaliação dos benefícios

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