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2 METODOLOGIA DA PESQUISA: ESTADO DA ARTE E CONTEXTO DA

2.3 Abordagem teórico-Metodológica da Pesquisa – Ciclo de Pesquisa

2.3.4 Metodologia de Análise dos Documentos: Análise Documental Cellard

Este tópico trata de especificar o método de análise documental utilizado no processo de pesquisa. Foi estabelecida nessa pesquisa a Análise Documental elaborada por Cellard (2008). Este trata a importância do documento escrito como uma fonte preciosa e que permite acrescentar uma dimensão temporal na compreensão social. Compreende que é um método de

coleta de dados que, em parte, elimina eventualidade de qualquer influência (CELLAR, 2008, p 295).

A Análise documental de Cellard (2008) dar-se-á por dois momentos de análise: a Análise Preliminar (exame e crítica do documento) e a Análise Propriamente Dita (exemplo de análise documental).

Para Cellard (2008, p 296) “definir o documento representa em si um desafio”. A história atribuiu grande importância a essa ferramenta. No fim do século XIX, a noção de documento se aplicava quase que exclusivamente ao texto de arquivos oficiais. Com a Escola dos Anais, essa noção seria reconsiderada, tomando como documento ou fonte textos escritos, iconografias, cinematografia, registros, objetos, elementos folclóricos. Poderia ser classificado como documento relatório de entrevista, anotações de uma observação (CELLARD, 2008, p. 296-297).

O “documento” em questão, aqui, consiste em todo texto escrito, manuscrito ou impresso, registrado em papel. Mais precisamente, consideraremos as fontes, primárias ou secundárias, que, por definição, são exploradas – e não criadas –no contexto de um procedimento de pesquisa (CELLARD, 2008, p. 297).

Cellard (2008, p 297) descreve como fontes primárias aquelas “produzidas por testemunhas diretas do fato” e fontes secundárias aquelas “que provêm de pessoas que não participaram dele, mas que o reproduziram posteriormente”.

Pouco importava se os documentos eram de domínio público ou privado. Documentos públicos: os arquivos públicos, geralmente volumosos, organizados e classificados, complexos e variáveis no tempo. Documentos públicos não arquivados: jornais, revistas, periódicos, publicidades, anúncios, tratados, circulares. Documentos privados: arquivos privados e que podem ser de difícil acesso (organizações políticas, sindicais, religiosas e empresas). Documentos pessoais: autobiografias, diários, correspondências, documentos de família.

A Análise Preliminar é composta por cinco dimensões. Cellard (2008, p. 299) descreve “é impossível transformar um documento: é preciso aceitá-lo como ele se apresenta [...]”. Observa o cuidado com a prudência em avaliar adequadamente a documentação que se pretende analisar utilizando-se de um olhar crítico.

O contexto é a primeira dimensão em que o documento foi produzido, seu autor ou atores e a quem foi destinado.

O analista não poderia prescindir de conhecer satisfatoriamente a conjuntura política, econômica, social, cultural, que propiciou a produção de um documento determinado. Tal conhecimento possibilita apreender os esquemas conceituais de seu ou de seus autores, compreender sua reação, identificar as pessoas, grupos sociais, locais, fatos aos quais se faz alusão, etc. (CELLARD, 2008, P. 299).

Compreender o contexto é essencial em todas as fases de uma pesquisa documental, tanto na elaboração das etapas quanto na elaboração dos problemas e no momento da análise.

A segunda dimensão trata do Autor ou os Autores. Interpretar um texto exige ter uma ideia ou conhecer o autor ou os atores. Qual foi a motivação de escrever tal texto? Escreve em nome de quem? Pessoal? Grupo? Instituição?

É muito mais fácil entender que é a “sociedade” ou o “Estado” que se exprime por meio de uma documentação qualquer. Elucidar a identidade do autor possibilita, portanto, avaliar melhor a credibilidade de um texto, a interpretação que é dada de alguns fatos, a tomada de posição que transparece de uma descrição, as deformações que puderam sobrevir na reconstituição de um acontecimento (CELLARD, 2008, p. 300).

Cellard (2008, p. 300) questiona porque o documento chegou até o pesquisador, foi conservado ou publicado. Num passado relativo, poucos eram instruídos e podiam expressar seus pontos de vista através da escrita. É preciso ler as entrelinhas para compreender o que outras pessoas viviam além da expressão do escritor.

A autenticidade e a confiabilidade do texto é a terceira dimensão da Análise Documental de Cellard. “Não basta, entretanto, informar-se sobre a origem social, a ideologia ou os interesses particulares do autor de um documento. É também importante assegurar-se da qualidade da informação transmitida.” (CELLARD, 2008, p. 301).

É necessário observar a procedência e autenticidade do documento. Verificar a qualidade da informação contida no documento. O que o autor ou os autores descrevem? Foram testemunhas diretas ou indiretas? Qual o tempo decorrido até a descrição? Poderiam estar enganados? Estar fazendo julgamento? Pensar sobre essas questões são importantes, dependendo o tipo de documento analisado.

Compreender a Natureza do Texto faz parte da quarta dimensão de Análise Documental. Antes de tirar conclusões ou fazer análises, deve-se considerar a natureza de um texto. Qual a liberdade do autor ao exprimir-se? Em que nível hierárquico está? É um subordinado ou uma autoridade?

Efetivamente, a abertura do autor, os subentendidos, a estrutura de um texto podem variar enormemente, conforme o contexto no qual ele é redigido. É o caso, entre outros, de documentos de natureza teológica, médica, ou jurídica, que são estruturados de forma diferente e só adquirem um sentido para o leitor em função de

seu grau de iniciação no contexto particular de sua produção (CELLARD, 2008, p. 302).

A quinta e última dimensão de Análise documental de Cellard, trata dos Conceitos- chave e a lógica interna do texto. Essa dimensão busca fazer com que o pesquisador compreenda “satisfatoriamente o sentido dos termos empregados pelo autor ou os autores de um texto” (CELLARD, 2008, p 302). Muitos termos mudaram seu significado ao longo dos tempos.

Delimitar adequadamente o sentido das palavras e dos conceitos é, aliás, uma preocupação totalmente pertinente no caso de documentos mais recentes nos quais, por exemplo, utiliza-se um “jargão” profissional específico, ou nos que contêm regionalismos, gíria própria a meios particulares, linguagem popular, etc. deve-se prestar atenção aos conceitos-chaves presentes em um texto e avaliar sua importância e seu sentido, segundo o contexto preciso em que eles são empregados: como um argumento se desenvolveu? Quais são as partes principais da argumentação? etc. Essa contextualização pode ser, efetivamente, um precioso apoio, quando, por exemplo, comparam-se vários documentos da mesma natureza (CELLARD, 2008, p. 303).

As dimensões tratadas por Cellard (2008) são tratadas nessa pesquisa buscando compreender os principais conceitos dos documentos analisados. Para Minayo (2015), os Conceitos são termos importantes em um discurso científico. “Conceitos são vocábulos ou expressões carregados de sentido, em torno dos quais existe muita história e muita ação social” (MINAYO, 2015, p. 19). O conceito concentra teoria, representação e história. “Em seu aspecto cognitivo, o conceito é delimitador e focalizador do tema em estudo” (MINAYO, 2015, p. 19).

Quanto delimitado, todo conceito deve ser valorativo, pragmático e comunicativo. Valorativos, no sentido de que o pesquisador precisa explicitar a que corrente teórica os conceitos que adotou estão filiados. Pragmáticos, no que se refere a sua capacidade de serem operativos para descrever e interpretar a realidade. Comunicativos, ou seja, claros, precisos, abrangentes e ao mesmo tempo específicos para serem entendidos pelos interlocutores da pesquisa (MINAYO, 2015, p. 20).

Minayo (2015) descreve que há vários tipos de conceitos e podem classificar-se em teóricos, de observação direta ou indireta. Os conceitos teóricos compõem e estruturam o discurso da pesquisa permanecendo no nível da abstração. Os conceitos de observação direta definem os termos de trabalho do pesquisador em campo ou nas análises documentais. E o conceito de observação indireta faz a relação do contexto da pesquisa com os conceitos da observação direta (MINAYO, 2015, p 20).

Para este estudo, é tomado como referência o Conceito de Observação Direta por definir os termos para a análise documental. “[...] teorias e conceitos não são camisa de força, são camisa sim, de um tecido que adequa o corpo ao ambiente e protege o pesquisador das intempéries de seus julgamentos solitários, embora valorizando sua contribuição" (MINAYO, 2015, p 21).

Com a finalização das cinco dimensões da Análise Preliminar é realizada a Análise propriamente dita. A reunião de todas as partes da dimensão inicial permite realizar uma interpretação coerente. Nesse contexto de análise, Cellard (2008, p. 303) descreve que “como em todo procedimento que levou o pesquisador até a análise, a abordagem permanece tanto indutiva quanto dedutiva”. As questões iniciais da Análise Preliminar podem ser ampliadas e modificadas.

Definitivamente, como bem o argumenta Foucault, o pesquisador desconstrói, tritura seu material à vontade; depois procede a uma reconstrução, com vista a responder ao seu questionamento. Para chegar a isso, ele deve se empenhar em descobrir as ligações entre os fatos acumulados, entre os elementos de informação que parecem, imediatamente, estranhos uns aos outros, [...] (CELLARD, 2008, p. 304).

Cellard (2008) destaca que as ligações entre os problemas do pesquisador e as observações realizadas nos documentos possibilitam formular um leque de explicações, interpretações coerentes, e a reconstrução de aspectos da sociedade. Essas ligações são realizadas se o pesquisador extrair elementos pertinentes do texto para compará-los com outros elementos do documento. Cellard (2008, p. 305) alerta que a qualidade e a validade da pesquisa são resultados das preocupações tomadas pelo pesquisador.

De modo geral, é a qualidade da informação, a diversidade das fontes utilizadas, das corroborações, das intersecções, que dão sua profundidade, sua riqueza e seu refinamento a uma análise. Deve-se desconfiar de uma análise que se baseia numa pesquisa pobre, na qual o pesquisador só considera alguns elementos de contexto e uma documentação limitada, visando formular explicações sociais. Uma análise confiável tenta cercar a questão, recorrendo a elementos provenientes, tanto quanto possível, de fontes, pessoas ou grupos representando muitos interesses diferentes, de modo a obter um ponto de vista tão global e diversificado quanto pode ser. Além dessa necessária abertura de espírito diante dos dados potenciais também é preciso contar com a capacidade do pesquisador em explorar diferentes pistas teóricas, em se questionar, em apresentar explicações originais, etc... (CELLARD, 2008, p. 305).

Na análise documental apresentada por Cellard (2008), destaca-se a importância à busca pela diversidade de fontes, advertindo o pesquisador a realizar pesquisas em um estado de espírito orientado pela indução. “Evidentemente, é importante formular, desde o início, algumas ideias diretrizes, propondo um quadro teórico, mesmo restrito, a fim de orientar as

análises minuciosas” (CELLARD, 2008, p. 306). Esse quadro não deve perder a flexibilidade, porque novas fontes podem levar a novas elaborações, teorias, hipóteses ou a aperfeiçoamentos. É, segundo Cellard, preciso manter o espírito crítico.

3 POLÍTICA, GESTÃO, AVALIAÇÃO EM LARGA ESCALA E QUALIDADE DA