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Minha aprendizagem de Língua Estrangeira na escola regular

COMUNICAÇÃO ORAL, DA LEITURA E DA PRÁTICA ES-

Narrativa 4: Minha aprendizagem de Língua Estrangeira na escola regular

pode ser considerada como superfi cial e fragmentada. Até a 8ª série, estudei em uma escola particular, o que não me livrou do despreparo do professor. As aulas giravam em torno de gramática, principalmente dos verbos. No en- sino médio, já na escola pública, as aulas eram em cima da gramática. Havia muita troca de professores, mesmo durante o ano, o que não permitia um seqüenciamento e aprofundamento dos estudos.

Sabe-se, ainda, que em oportunidades de trabalho que se abrem para os concludentes do ensino médio (com turismo, em algumas regiões brasileiras; como recepcionista, por exemplo), o conhecimento básico de comunicação oral em Línguas Estrangeiras consta entre os requisitos para a seleção ao tra- balho. Algumas vezes, informam os levantamentos, o selecionado não chega a utilizar o conhecimento do idioma estrangeiro na rotina de seu trabalho. Mas o fato de demonstrar esse conhecimento conta favoravelmente para ele, pois é um indicador de disponibilidade para o aprendizado, de mente aberta para conhecimentos que se façam necessários para o desempenho de determinadas tarefas em determinados contextos.

Reforçamos que a proposta de ensino de Línguas Estrangeiras para o nível médio não deve restringir-se ao mercado, lembrando seu caráter educativo, de formação de alunos (indivíduos, cidadãos). Mas, ao mesmo tempo, ela não deve negligenciar o mercado de trabalho, e que muitos dos alunos que concluem esse nível de escolaridade saem em busca de trabalho. Conforme previsto pela LD- BEN, o ensino médio deve se voltar para

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a consolidação e o aprofundamento dos conhecimentos adquiridos no ensino fundamental, possibilitando o prosseguimento dos estudos; a preparação básica para o trabalho e a cidadania do educando; seu aprimoramento como pessoa humana, incluindo a formação ética e o desenvolvimento da autonomia intelec- tual e do pensamento crítico e a compreensão dos fundamentos científi co-tecno- lógicos dos processos produtivos, relacionando a teoria com a prática no ensino de cada disciplina (Art. 35, Incisos I, II, III).

A respeito da consolidação e do aprofundamento dos conhecimentos ad- quiridos no ensino fundamental, como na citação do parágrafo anterior, os levantamentos apontam que muitos educandos chegam ao ensino médio com conhecimento fragmentado da língua inglesa por uma série de razões. Por exemplo: estruturais (o número de anos em que a disciplina é oferecida nas escolas é a razão mais freqüente) e pedagógicas (o conteúdo do que é ensinado é irregular; por exemplo: há ênfases diferentes de escola para escola – no co- nhecimento gramatical, no desenvolvimento de leitura – além de repetição de conteúdo disciplinar de uma série para outra). Daí entendermos a relevância da retomada – ou introdução, para algumas escolas – de um enfoque sobre a comunicação oral no nível médio, buscando consolidar um trabalho que foi priorizado em alguns anos do nível básico ou ensinar e suprir a demanda por essa forma de comunicação.

Que conteúdo ensinar visando ao desenvolvimento da comunicação oral no en- sino médio?

Seguindo uma linha do ensino comunicativo, tendo a preocupação de preparar os alunos para a comunicação em Línguas Estrangeiras em contextos signifi ca- tivos, achamos que se deva ter um inventário desses, pois pode haver mudanças segundo necessidades/relevâncias regionais. No entanto, sugerimos que seja seguido um raciocínio como o que parte de contextos de uso graduados em termos de sua complexidade de interação. Por exemplo, podem-se contemplar desde contextos simples, como a troca de informações e apresentações pessoais, até contextos mais complexos, como aqueles necessários para oferecer ajuda e/ou orientações a turistas nas regiões do país onde tal situação é relativamente comum.

Pode-se partir de diálogos formulados para cada contexto e nível. Para cada diálogo, podem-se formular perguntas iniciais de análise, como as se- guintes:

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CONHECIMENTOS DE LÍNGUAS ESTRANGEIRAS

Qual é o contexto do diálogo? Qual a situação?

De que se está falando? Quem são os participantes?

Como essas informações se manifestam lingüisticamente nas palavras e nas expressões usadas no diálogo?

Assim, conforme o que já se sabe no ensino comunicativo, o ponto de partida para o ensino é o contexto de uso, e não a regra gramatical. O trabalho pedagógico pode ser planejado em níveis diferentes segundo as necessidades estimadas de cada contexto: pode-se partir da leitura e análise escrita de um diálogo; com isso, pode- se aprender que identifi car, analisar e usar um determinado diálogo é apenas parte de um conjunto complexo de habilidades orais em contextos diferentes.

Abaixo, sugestão de planejamento para desenvolvimento de comunicação oral:

Tema Diversidade

Tipos de material

Diálogo entre recepcionista de hotel e hóspede estrangeiro sobre costumes locais

Contextos de uso

Qual a situação? De que se está falando? Quem são os participantes? Como essas informações se manifestam

lingüisticamente nas palavras e nas expressões usadas no diálogo? Habilidades

comunicativas

Interpelação, cumprimentos, pedido de ajuda, troca de informações, despedidas

Aspectos

lingüísticos Formulação de perguntas e respostas, tempos verbais, nível de formalidade

Prática escrita como letramento

Ainda sobre as práticas de linguagem a serem desenvolvidas em Línguas Estran- geiras, mais uma vez as pesquisas nos informam que a escrita ganha relevância no aprendizado de idiomas (PAIVA, 2005). Não seria uma escrita voltada à pro- dução de textos jornalísticos, argumentativos ou acadêmicos, conforme o ensino “clássico” dessa habilidade. Seria mais semelhante a uma prática escrita confor- me a concepção já apresentada de letramento, ou seja, de usos contextualizados da língua, que desenvolve escrever e responder mensagens, corresponder-se com outras pessoas pela Internet. Por exemplo, uma escrita que representa, muitas vezes, uma “conversa escrita”. O advento da computação e da Internet demonstra ter uma grande infl uência na expansão da atividade escrita.

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Para o desenvolvimento da prática escrita, valem as explicações teóricas sobre letramento e multiletramento já expostas. Nelas, continua em vigor o sentido do ato de escrever, ou seja, a produção de uma escrita signifi cativa. Torna-se impor- tante, também, ter em mente a implementação de uma epistemologia contempo- rânea, a qual não enfatiza o conhecimento compartimentado e fragmentado que comumente se encontrava nos exercícios gramaticais escritos, mais interessados em itens lingüísticos isolados do que na comunicação contextualizada da manei- ra como ela se apresenta.

Dessa forma, em vários contextos, as atividades escritas podem ser vin- culadas às atividades de leitura, o texto de leitura servindo como estímulo à produção escrita. Em outros contextos, podem-se usar outros estímulos con- textualizados e significativos em Línguas Estrangeiras, tais como a troca de informações pessoais, pequenos relatos de passeios e eventos locais, relatos de notícias, construção de jornal mural, etc. Em outros contextos ainda, pode-se promover a interligação de habilidades, como relatar por escrito uma entre- vista oral (com professor, colegas, familiares) ou recontar por escrito a histó- ria expressa na letra de uma música.

Abaixo, sugestão de planejamento para desenvolvimento da prática escrita:

Tema Diversidade

Tipo de texto Mensagens da Internet Contextos de

uso

Qual a situação? De que se está falando? Quem são os participantes? Como essas informações se manifestam

lingüisticamente nas palavras e nas expressões usadas no diálogo? Habilidades

comunicativas Troca de informação Aspectos

lingüísticos Perguntas e respostas, nível de formalidade

5 CONSIDERAÇÕES FINAIS

Procuramos retomar a refl exão sobre a função educacional do ensino de Línguas Estrangeiras no ensino médio e ressaltar sua importância; reafi rmar a relevância da noção de cidadania e discutir a prática dessa noção no ensino de línguas es- trangeiras; discutir o problema da exclusão no ensino em face dos valores “glo- balizantes” e o sentimento de inclusão freqüentemente aliado ao conhecimento de Línguas Estrangeiras; introduzir as teorias sobre letramento, multiletramen- to, multimodalidade e hipertexto e dar sugestões sobre a prática do ensino de Línguas Estrangeiras por meio dessas teorias. Paralelamente a essas concepções,

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CONHECIMENTOS DE LÍNGUAS ESTRANGEIRAS

abordamos as habilidades a serem desenvolvidas no ensino de Línguas Estrangei- ras no ensino médio: a leitura, a comunicação oral e a prática escrita.

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CONHECIMENTOS