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4 POSSIBILIDADES DE MEDIAÇÃO

4.3 O leitor e o espaço

[...] no microcosmo da sala de aula [...] talvez não sejamos nós, professores, o melhor informante para nossos alunos. Rodízios de livros entre alunos, biblio- tecas de sala de aula, biblioteca escolar, freqüência a bibliotecas públicas são algumas das formas para iniciar este circuito. (GERALDI, 1985, p. 87).

Como possibilitar que a escola se transforme em espaço propício para trocas literárias, transformando-a numa efetiva comunidade de leitores? (Entendemos que, na perspectiva dos letramentos, essa discussão se vincula a outras de caráter mais

Textos curtos, com densidade poética, são instrumentos poderosos

para sensibilizar o aluno, ainda que muitos

professores observem a resistência ...

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conteudístico e não pode fi car de fora. Incluem-se aqui tanto a existência de espaços de leitura quanto a necessidade de composição de acervos que permitem o acesso contínuo a publicações, inserindo a comunidade no contexto mais abrangente do mercado editorial, colocando-a em contato, inclusive, com lançamentos).

Na perspectiva do letramento, que implica o enfoque sobre a “inserção nas práticas sociais de leitura e escrita” (SOARES,1998, p. 83), o letramento literário permite compreender os signifi cados da escrita e da leitura literária para aqueles que a utilizam e dela se apropriam nos contextos sociais, o que aponta para ou-

tro aspecto que se deve destacar aqui: o dos espaços de leitura na escola. O projeto pedagógico com vistas à for- mação do leitor da Literatura deve in- cluir a estruturação de um sistema de trocas contínuo, sustentado por uma biblioteca com bom acervo e por ou- tros ambientes de leitura e circulação de livros. A ampliação dos espaços es- colares de leitura resultará, com certeza, na ampliação dos tempos, diga-se de passagem, exíguos de aulas de Literatura, além de possibilitar trocas menos arti- fi ciais, já que colaboram para a criação de uma comunidade de leitores tão im- portante para a permanência da literatura, sobretudo em contextos sociais que não dispõem de uma biblioteca pública e/ou livraria.

Como sabemos, para muitas comunidades de leitores, as práticas da leitura se efetivam quase exclusivamente na escola, podendo, a partir dela, projetarem-se para o universo familiar dos alunos e propiciar, assim, as experiências estética e ética de que fala Benedito Nunes quando lemos o texto literário:

[...] da adesão a esse “mundo de papel”, quando retornamos ao real, nossa ex- periência, ampliada e renovada pela experiência da obra, à luz do que nos re- velou, possibilita redescobri-lo, sentindo-o e pensando-o de maneira diferente e nova. A ilusão, a mentira, o fi ngimento da fi cção aclara o real ao desligar-se dele, transfi gurando-o; e aclara-o já pelo insight que em nós provocou. (NU- NES,1996, p. 3).

É importante também criar um ambiente propício à leitura na escola, com espaços e atividades estimulantes.

... o letramento literário permite compreender os

signifi cados da escrita e da leitura literária para aqueles que a utilizam ...

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CONHECIMENTOS DE LITERATURA

As bibliotecas escolares têm papel fundamental no sucesso desse trabalho de ini- ciação literária e de formação do gosto. É preciso que existam, que tenham acervos signifi cativos, que estejam disponíveis para todos, que o acesso ao livro seja direto, que as técnicas biblioteconômicas de catalogação e armazenagem dos livros sejam adequadas a leitores em formação e sejam a eles explicadas, quando necessário. Mais importante que tudo, talvez, é que a escola crie, como parte de suas ativida- des regulares, demandas autênticas de leitura, capazes de fazer da biblioteca um lugar de freqüência praticamente cotidiana. (RANGEL, 2003, p. 143).

O acesso livre a uma biblioteca com bom acervo é fundamental. Esse espaço pode ser utilizado também para eventos relacionados à leitura, como a conversa com um escritor convidado (os alunos fi carão contentes em receber um escritor vivo, já que a maioria dos que eles estudam estão mortos), a semana do livro, etc.

Em muitas escolas, atualmente, ao lado da biblioteca escolar há outros espa- ços instituídos, como a sala de informática e a sala de vídeo, que conjugam lin- guagens diversas e ajudam a criar um movimento cultural na escola; há também os passeios culturais, estudos do meio, etc. dos quais as escolas podem e devem lançar mão para desenvolver no aluno a relação com os diferentes aspectos, ní- veis e ritmos da cultura. Sem essa vivência não é possível comparar, estabelecer padrões, aguçar a sensibilidade – aprender, enfi m. Lembrar também que nesse movimento cultural devem estar inseridos os próprios professores, para que pos- sam dar respostas à altura das inquietações dos alunos.

Práticas de leitura e de metaleitura responderiam a uma dupla dimen- são da Literatura na escola: por um lado, a fruição individual do texto, que é o modo como se lê Literatura fora da escola, revela uma autêntica prática

social, que, de regra, o professor não consegue mensurar (a não ser que ele

esteja efetivamente próximo de seus alunos e atento ao perfil da comunidade escolar e da sua turma); por outro lado, a reflexão e a análise, a leitura como instrumento de aprendizagem e ensino, revelam a prática escolar, esta sim já apresentando uma certa possibilidade de mensuração por parte do professor, já que mobiliza um saber institucionalizado, previamente definido. Essa du- pla dimensão jamais pode ser esquecida, não só na leitura como em qualquer outro conteúdo escolar, já que a escola não é um microcosmo fechado. Qual- quer conteúdo na escola é um instrumento de aprendizagem, mas ao mesmo tempo deve persistir a dimensão social desse conteúdo, uma vez que se forma para o mundo, para fornecer ao aluno recursos intelectuais e lingüísticos para a vida pública.

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