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MUDANÇAS ESQUEMÁTICAS COM IMAGENS MENTAIS Diálogo nas imagens mentais

No documento WAINER Terapia Cognitiva Focada em Esquemas (páginas 108-110)

No diálogo nas imagens mentais, o terapeuta estimula o paciente, por intermédio de um acessamento por imagem, a expressar seus sentimentos em relação às situações que geraram seus esquemas. O diálogo é útil não apenas para que o paciente possa expressar suas emoções negativas — principalmente a raiva —, mas também para fortalecê-lo e capacitá-lo a enfrentar seus esquemas. Possibilitar que o paciente expresse a raiva é uma forma primordial de defender seus direitos como ser humano.

Quando conseguem verbalizar frases como “Não vou permitir que você bata em mim”, “Eu tinha o direito de errar e de receber sua ajuda”, “Eu precisei de amor, mas você não me deu”, os pacientes se sentem mais fortalecidos e validam seus direitos, reconhecendo que receberam menos do que mereciam quando eram crianças. Conforme veremos mais adiante no caso de Clarice, é fundamental para o paciente acreditar que tem o direito de ser tratado com respeito para que a reparentalização parental seja possível.

Nessa etapa do tratamento, é imprescindível para a cura do esquema que o paciente consiga expressar a raiva que sente dos pais. Entretanto, é bastante comum que ele evite esse momento — ou porque já tentou superar isso de outras formas, ou porque se sente culpado por reconhecer as limitações de seus cuidadores e justificar suas condutas, o que se manifesta por meio de falas como

“Mas ele é o meu pai, ele fez o que podia”. Nessas situações, algo que pode auxiliar o paciente a realizar esse diálogo é explicar-lhe que a atividade proposta consiste em um exercício imagístico, o qual permitirá identificar que foram os comportamentos de um dos pais que o fizeram sentir raiva e que seus cuidadores também podem ter comportamentos que o deixam feliz.

Além disso, o diálogo nas imagens mentais possibilita que o paciente se diferencie do seu esquema, entendendo que este é a voz dos seus pais internalizada. Dessa forma, ele passa a compreender [que assume] as mensagens que seus pais lhe deixaram (p. ex., “Você não tem valor”) como uma manifestação do seu EID. Quando isso acontece, o paciente consegue se distanciar do esquema. A seguir, é apresentado o exemplo de diálogo com a paciente Ana.

EXEMPLO CLÍNICO

Ana tem 56 anos e quatro filhos. A paciente apresenta esquema de abuso e subjugação, e um de seus objetivos terapêuticos é conseguir dar limites adequados aos filhos e ao marido, bem como expressar a raiva de pessoas que dela abusaram, tanto na infância como na vida adulta. Nesse primeiro momento, será descrito o diálogo de Ana com sua mãe e, logo após, com seu marido. Os modos criança vulnerável, adulto saudável e paciente disfuncional serão evocados.

Paciente: Estou no corredor da minha casa, olhando a porta entreaberta do quarto dos meus pais. Minha mãe está sozinha, e meu pai ainda não chegou do trabalho. Ela me chama, e, quando chego, encontro-a dopada na cama; ela me pergunta pelo meu pai.

Terapeuta: E o que você sente nesse momento? Paciente: Raiva.

Terapeuta: E o que ela faz agora?

Paciente: Pede-me para ir atrás dele. Ela já está falando enrolado, me mandando procurar meu pai nos bares de sempre. Terapeuta: Você conseguiria ser ela e fazê-la dizer isso?

Paciente: [no papel da mãe] Ana, onde está seu pai? Vá atrás dele! Eu estou mandando!

Paciente: Sinto muita raiva. Ela sempre faz isso e sabe que eu tenho muito medo de sair na rua sozinha. Logo vai anoitecer!

Terapeuta: E o que você precisa dela nesse momento? Diga como precisa que ela aja como mãe, mesmo que isso não tenha acontecido na sua infância. Tente se imaginar nessa cena, como criança, dizendo a ela aquilo de que você precisa dela.

Paciente: [no papel da criança, dizendo para a mãe] É errado você me mandar fazer isso. Quem deveria fazer isso é você, mas, em vez disso, fica aí, deitada, dopada, e não se mexe para nada. Tenho medo, e você deveria me proteger. Eu sei que sente dores por causa da cirurgia, mas ainda assim é minha mãe, e preciso que cuide de mim, e não o contrário! Isso me faz sofrer porque você não me protege!

Terapeuta: E o que ela responde?

Paciente: [no papel da mãe] Eu sou sua mãe e posso mandar em você. Eu sofro muito mais que você. O que será de nós se seu pai não voltar?

Terapeuta: Agora, quero que você mantenha essa cena e se imagine com muita raiva. Você está furiosa por sua mãe tratá-la assim. O que vê? Paciente: Vejo-me gritando com ela.

Terapeuta: Eu gostaria de ouvir o que está falando...

Paciente: [com voz alta] Você é uma louca, drogada! Eu te odeio por isso! Você não cuida de ninguém e ainda acha que merece ser cuidada? Eu não tenho ninguém por mim!

Terapeuta: [assume o papel da mãe para que o paciente se mantenha conectado com o sentimento] Pare de reclamar. Você não sabe o que é ter dor. Eu sofro muito mais que você. Você que é feliz por não ter dor.

Paciente: Que mentira! Você adora ficar dopada e jogar para mim a responsabilidade de buscar o pai no bar. Você deveria me cuidar porque sou uma criança!

Nessa imagem, quando o terapeuta assume o papel da mãe, ele pode argumentar insistentemente, a fim de que o paciente vivencie intensamente a raiva pelo comportamento de um de seus pais. É

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importante que o profissional [praticamente] cite aquilo que o paciente falou enquanto estava no papel de um dos cuidadores.

Na sequência, será dada continuidade ao diálogo da mesma paciente, trazendo-o para situações com o marido, que mantém um relacionamento extraconjugal.

EXEMPLO CLÍNICO

Terapeuta: Agora, quero que você coloque seu marido na imagem depois de descobrir o relacionamento dele com outra mulher. Por favor, diga como se sente.

Paciente: [triste] Estou muito triste por descobrir que você tem outra mulher. Nós temos uma família, mas isso parece não importar para você. Sempre me dediquei aos nossos filhos e à nossa casa, e você faz isso comigo? Sinto-me desprezível.

Terapeuta: E o que ele lhe diz na imagem?

Paciente: [no papel do marido] Você é muito conservadora. Isso não muda nada porque nunca faltou nada em casa. Qual o problema? Terapeuta: Responda a ele.

Paciente: O problema é que nós somos uma família e sempre me dediquei a isso. Você me traiu e quer que eu ache que isso não tem problema? Não aceito essa situação.

Terapeuta: E o que você sente quando diz isso?

Paciente: Sinto-me melhor. Dá um alívio colocar a raiva para fora.

Quando o terapeuta estimula Ana a liberar sua raiva em relação aos abusadores, possibilita que a paciente se sinta mais fortalecida e capaz de lidar com essas situações, sem o temor do desamparo, como ocorreu na infância.

No documento WAINER Terapia Cognitiva Focada em Esquemas (páginas 108-110)