• Nenhum resultado encontrado

CAPÍTULO 3 – O EFEITO “VINCULANTE” NO SISTEMA JURÍDICO BRASILEIRO E O

3.2 Efeito “vinculante” no sistema jurídico brasileiro e o controle de constitucionalidade de

3.2.2. A eficácia “vinculante” no controle de constitucionalidade

3.2.2.2 Na ação direta de inconstitucionalidade

Essa referência sobre a discussão acerca da natureza dúplice da ADC e da ADIn apresenta relevância, neste estudo, na medida em que, inicialmente, o efeito “vinculante” somente foi previsto, no controle concentrado, para a ação declaratória de constitucionalidade.

Surgiu, à época do ingresso da EC 3/93, o questionamento sobre a atribuição de eficácia “vinculante” às decisões proferidas em sede de ação direta de inconstitucionalidade, nos mesmos moldes da ADC. Como a Constituição Federal atribuía eficácia “vinculante” de forma expressa apenas à ADC, e nada dizia quanto à ADIn, muitos foram os estudiosos que se posicionaram favorável ou contrariamente à vinculação da decisão prolatada em ADIn.

Aqueles que se posicionavam contrariamente entendiam que a Constituição Federal tinha estabelecido dois regimes jurídicos diversos. Para a ADIn, a decisão de procedência da ação tinha eficácia ergas omnes, sendo aplicada a todos os jurisdicionados, mas não era vinculativa, de forma que, acaso a decisão viesse a não

ser observada pelos demais órgãos do Poder Judiciário ou pela Administração, restava ao jurisdicionado buscar amparo ingressando com ação própria.

Para os que defendiam a extensão do efeito “vinculante” à ADIn, a questão mudava de figura, uma vez que a decisão teria eficácia erga omnes, mas também deveria ser compulsoriamente seguida pelos demais órgãos do Judiciário e pela Administração.

Por ocasião dos debates travados entre os Ministros do Supremo Tribunal Federal, no julgamento da medida cautelar, na Ação Declaratória de Constitucionalidade 4 212, magistral foi o voto do Ministro Sepúlveda Pertence, ao defender a extensão do efeito “vinculante” à ADIn. Confira-se um trecho de seu voto:

“Já em diversas oportunidades, Senhor Presidente, desde a primeira discussão na ADC 01, tenho enfatizado que, por serem ambas as ações tipicamente dúplices, a ação direta de inconstitucionalidade e a ação declaratória de constitucionalidade têm, na verdade, um objeto comum. E este caráter dúplice da ação direta de inconstitucionalidade é uma peculiaridade nossa e de poucos sistemas de controle de constitucionalidade, salvo engano o brasileiro, o alemão e só um outro mais (ver meu voto na AOR 166). Dela tanto pode resultar, se julgada procedente, a declaração de inconstitucionalidade, quanto, se julgada improcedente, a declaração de inconstitucionalidade. E aqui, creio que estamos sozinhos no mundo, com a criação da ação declaratória de constitucionalidade. Nela, também se tem – aí por disposição expressa da Constituição, seja qual for o sentido da decisão que nela se tome: procedente, declarando-se constitucional a lei; improcedente, declarando-se inconstitucional a lei –, que essa sentença, seja qual for o seu sentido tem eficácia erga omnes e força vinculante. Por isso mesmo – o que não está em causa – porque são ações rigorosamente dúplices, com o objeto rigorosamente idêntico e potencialidades rigorosamente comuns, é que entendo que seria ‘kafkiano’ limitar o poder vinculante a uma e negá-la a outra. Então teríamos nós, que temos tão poucos processos para decidir – e que estamos, por isso, à beira da falência, para não declará-la de logo –, que julgar duas vezes a mesma questão: declarada constitucional a lei, porque improcedente a ADIn – decisão teria eficácia erga omnes, mas seria um ‘sino sem badalo’, sem força vinculante – e, no dia seguinte, o interessado teria que vir com uma ação

212

Ação Declaratória de Constitucionalidade 4 MC/DF, Pleno, Rel. Min. Sidney Sanches, julgada em 11.02.1998.

declaratória de constitucionalidade para que acrescentássemos, nesta mesma Sala, repetindo os mesmos votos, um outro efeito à sentença já proferida.”

Com o advento da Lei 9.868, de 10 de novembro de 1999, o art. 28, em seu parágrafo único213, atribuiu, de forma expressa, efeito “vinculante” também para as ações diretas de inconstitucionalidade, ao dizer que:

“Art. 28. (...)

Parágrafo único. A declaração de constitucionalidade ou de inconstitucionalidade, inclusive a interpretação conforme a Constituição e a declaração parcial de inconstitucionalidade sem redução de texto, têm eficácia contra todos e efeito vinculante em relação aos órgãos do Poder Judiciário e à Administração Pública federal, estadual e municipal.”

A consagração da eficácia “vinculante”, no âmbito constitucional, somente foi estendida à ação direta de constitucionalidade a partir da EC 45, de 8 de dezembro de 2004, que, alterando o § 2º do art. 102, concedeu a seguinte redação:

“Art. 102. (...)

213 A constitucionalidade desse dispositivo foi questionada na Reclamação (AgR-QO) 1.880/SP, de

relatoria do Ministro Maurício Corrêa, cujo julgamento foi proferido em 07.11.2002, e publicado no

DJ em 19.03.2004, p. 17, tendo o Pleno do STF entendido pela constitucionalidade do aludido

dispositivo, conforme se constata a partir da transcrição de sua ementa:

“EMENTA: QUESTÃO DE ORDEM. AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE. JULGAMENTO DE MÉRITO. PARÁGRAFO ÚNICO DO ART. 28 DA LEI 9.868/99. CONSTITUCIONALIDADE. EFICÁCIA VINCULANTE DA DECISÃO. REFLEXOS. RECLAMAÇÃO. LEGITIMIDADE ATIVA.

1. É constitucional lei ordinária que define como de eficácia vinculante os julgamentos definitivos de mérito proferidos pelo Supremo Tribunal Federal em ação direta de inconstitucionalidade (Lei 9.868/99, art. 28, parágrafo único).

2. Para efeito de controle abstrato de constitucionalidade de lei ou ato normativo, há similitude substancial de objetos nas ações declaratória de constitucionalidade e direta de inconstitucionalidade. Enquanto a primeira destina-se à aferição positiva de constitucionalidade a segunda traz pretensão negativa. Espécies de fiscalização objetiva que, em ambas, traduzem manifestação definitiva no Tribunal quanto à conformação da norma com a Constituição Federal.

3. A eficácia vinculante da ação declaratória de constitucionalidade, fixada pelo § 2º do art. 102 da Carta da República, não se distingue, em essência, dos efeitos das decisões de mérito proferidas nas ações diretas de inconstitucionalidade.

4. Reclamação. Reconhecimento da legitimidade ativa ad causam de todos que comprovem prejuízo oriundo de decisões dos órgãos do Poder Judiciário, bem como da Administração Pública de todos os níveis, contrárias ao julgado do Tribunal. Ampliação do conceito de parte interessada (Lei 8.038/90, art.13). Reflexos processuais da eficácia vinculante do acórdão a ser preservado.

5. Apreciado o mérito da ADI 1.662/SP (DJ 30.08.2001), está o Município legitimado para propor reclamação. Agravo regimental provido.”

§ 2º. As decisões definitivas de mérito, proferidas pelo Supremo Tribunal Federal, nas ações diretas de inconstitucionalidade e nas ações declaratórias de constitucionalidade produzirão eficácia contra todos e efeito vinculante, relativamente aos demais órgãos do Poder Judiciário e à administração pública direta e indireta, nas esferas federal, estadual e municipal.”

Assim, a partir de então, as decisões definitivas proferidas em ação direta de inconstitucionalidade, além de terem eficácia erga omnes, também detêm efeito “vinculante” quando aos demais órgãos do Poder Judiciário e à Administração Pública, por ordem da própria Constituição Federal.

Documentos relacionados