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Norma jurídica primária dispositiva, primária sancionatória e secundária

CAPÍTULO 1 – PREMISSAS FUNDAMENTAIS

1.7 Norma jurídica em seus diversos aspectos

1.7.1 Norma jurídica primária dispositiva, primária sancionatória e secundária

Vimos que a estrutura sintática de todas as normas jurídicas é a mesma, organizada em um juízo hipotético condicional. Todavia, é necessário que em cada uma delas haja um conteúdo mínimo de significação, que oportunize o cumprimento da finalidade para a qual se propõe o direito, ou seja, a norma jurídica deve exprimir um comando que altere a conduta humana com vista a atingir o fim desejado.

Dessa forma, a organização interna da norma jurídica será sempre a mesma, o que varia é tão-somente o seu conteúdo semântico. Dizemos, com Paulo de Barros Carvalho,44 que as normas jurídicas apresentam “homogeneidade sintática e heterogeneidade semântica”.

A imposição de uma sanção45 para o caso de descumprimento da norma jurídica é o que a juridiciza. A norma jurídica, para ser completa, exige a conjunção da norma primária e da norma secundária. Estamos com Lourival Vilanova46, influenciado pela Teoria Pura do Direito, segundo o qual

“a norma jurídica apresenta composição dúplice: norma primária e norma secundária. Na primeira, realizada a hipótese fáctica, i.e., dado um fato sobre o qual ela incide, sobrevém, pela causalidade que o ordenamento institui, o efeito, a relação jurídica com sujeitos em posição ativa e passiva, com pretensões e deveres (para nos restringirmos às relações jurídica em sentido estrito). Na segunda, a hipótese fáctica, o pressuposto é o não-cumprimento, a inobservância do dever de prestar, positivo ou negativo, que funciona como fato jurídico

44 Op. cit., p. 76.

45 O vocábulo sanção pode ser utilizado em diversas acepções. Eurico Marcos Diniz de Santi elucubra

sobre esse problema, oferecendo as seguintes opções: “sanção pode denotar (i) a relação jurídica consistente na conduta substitutiva reparadora, decorrente do descumprimento de um pressuposto obrigacional (de fazer, de omitir, de dar genericamente prestações do sujeito passivo Sp); (ii) relação jurídica que habilita o sujeito ativo Sa a exercitar seu direito subjetivo de ação (processual) para exigir perante o Estado-juiz Sj a efetivação do dever constituído na norma primária; e (iii) a relação jurídica, conseqüência processual deste ‘direito de ação’ preceituada na sentença condenatória, decorrente de processo judicial. Esta última, expressão da vontade jurisdicional do Estado condiciona a ‘coação’, assim entendida como o poder de órgão do Estado de fazer cumprir por meio do uso da força (direito subjetivo público monopolizado pelo Estado-juiz) a sanção expressa na condenatoriedade de seu ato (sentença)” (Lançamento tributário, p. 45).

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(ilícito, antijurídico), fundante de outra pretensão, a de exigir coativamente perante órgão estatal a efetivação do dever constituído na norma primária.”

Daí se infere que a norma primária tem caráter material. É por meio dela que se veiculam os comandos endereçados à conduta humana, permitindo, proibindo ou obrigando o sujeito a realizar um ato ou dele se omitir. É norma de direito substantivo, oriunda do direito tributário, administrativo, civil, penal, ambiental et coetera.

A norma secundária, por outro lado, caracteriza-se como uma norma de caráter processual, uma vez que expressa em seu conseqüente uma relação de cunho jurisdicional, em que o titular do direito47 comparece ao Estado-juiz para dele obter o cumprimento do dever não cumprido. É norma de direito adjetivo, oriunda do direito processual.

Enfatizamos que é a existência da norma secundária que juridiciza a norma primária. Isso porque o ordenamento jurídico considera o descumprimento da norma primária como um ilícito ensejador da aplicação de uma sanção, disposta na norma secundária48.

Convém, ainda, subdividir a norma jurídica primária em dispositiva e sancionatória. A primeira carrega em sua hipótese um ato ou fato lícito; a segunda tem por pressuposto o não-cumprimento de deveres ou obrigações. Ela veicula um ato ou fato ilícito em sua hipótese, porém lhe falta eficácia coercitiva própria da norma secundária.

À guisa de exemplo, tomemos a norma que institui a obrigatoriedade de pagamento do imposto por aquele que aufere renda. Consideremos como norma

47 A norma secundária (processual) pode não ficar à disposição do sujeito titular ativo da norma

primária. Tome-se como exemplo a limitação legal das pessoas competentes para ajuizar ações diretas de inconstitucionalidade e ações declaratórias de constitucionalidade.

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Lourival Vilanova já advertia que, “se de uma norma jurídica suprime-se a norma secundária sancionadora da norma primária, fica a norma primária desprovida de juridicidade” (Causalidade e

primária dispositiva aquela que descreve o fato de auferir renda, que resultará na obrigatoriedade de se pagar o imposto sobre a renda. A norma primária sancionatória, por outro lado, impõe que o não cumprimento da norma primária dispositiva implicará uma sanção de ordem administrativa, como a imputação de multa ou juros moratórios.

Paulo de Barros Carvalho49, ao elucidar a norma primária sancionatória, explica que são

“‘sanções administrativas’, concebidas para reforçar a eficácia dos deveres jurídicos previstos em outras normas primárias, estabelecendo multas e outras penalidades. Podem ter, como de fato muitas têm, finalidade punitiva, agravando o valor cobrado a título de tributo. Nada obstante, essa condição, por si só, não é suficiente para outorgar-lhes o caráter de norma sancionatória no sentido estrito, vale dizer, norma jurídica secundária (perinorma, em Cóssio), exatamente por faltar-lhes a presença da atividade jurisdicional na exigência coativa da prestação, traço distintivo na sua identificação normativa.”

Essa distinção será relevante para o presente trabalho por ocasião da demonstração da norma jurídica que confere o efeito vinculador ao enunciado de súmula “vinculante”.

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