• Nenhum resultado encontrado

Um novo papel para a filosofia

À luz do que foi levantado, sugere-se espontaneamente também uma concepção distinta da tarefa da filosofia, uma vez que ela rompa a clausura do

25 É um fato bem conhecido que Dewey foi muito influenciado primeiro por Hegel e então por Darwin, e não é de modo algum uma coincidência que Pinkard (2007) se refira a Dewey na tentativa de articular um naturalismo hegeliano: “How we can get a handle, in a way that Deweyan pragmatists

have always appreciated, as to how human reason develops out of organic nature.”

26 “Requer uma suplementação por uma teoria materialista-dialética que dê conta da gênese natural

imanente dessa subjetividade humana ativa.”

27

Como nota Johnston (2013): “Engels identifies Hegel´s pre-Darwinian categorical rejection of

notions of evolution qua natural history as the major flaw, the Achilles´ heel, of his Naturphilosophie.”

humanocentrismo. A filosofia contemporânea se viu, sobretudo, enfocada em oferecer contra-exemplos ou refutações técnicas a teorias pretensamente univ ersais. Muitas vezes, o trabalho do filósofo se viu reduzido a procurar por falhas, buracos lógicos e ambiguidades nos argumentos de outros filósofos, ou a registrar e repetir as opiniões de pensadores anteriores.

Há certamente espaço para essa atividade de avaliação crítica e reconstrução histórica, mas ela não deve nos distrair da exigência mais construtiva do projeto filosófico: lançar luz sobre nossa compreensão do mundo, fabricar conceitos que tornem nossa apreensão intelectual da realidade mais clara e desenvolvida, em suma, montar, com a melhor de nossa teoria, um panorama global coerente de como as coisas se encaixam. 28

Formular uma redescrição esclarecedora de como as coisas se encaixam é o grande desafio da filosofia, a altura de sua “vocação global”. Demanda não apenas intuição, imaginação e ousadia especulativa como também disposição para o diálogo constante com as diversas áreas do saber. Não se trata mais, como no dogmatismo, de fundamentação absoluta e definitiva, mas de um esforço contínuo de síntese, que dispensa o a priorismo puro para se alimentar de empiria – e que precisa se alimentar de empiria para continuar vivo. A metafísica se torna uma hipótese. O desafio é a cada momento pintar um quadro geral que seja o mais plausível e coerente c om o que se tem disponível, mas a crítica não tem hora para acabar. Nenhum sistema poderá descansar depois de pronto.

A ideia de uma metafísica naturalista parece, em um primeiro momento, uma contradição em termos. Na história da filosofia, a pretensão met afísica foi desenvolvida pela tradição racionalista, empenhada em construir sistemas absolutos a partir de princípios primeiros. A metafísica não apenas estaria acima da física, como também seria anterior e independente. Os que acharam mais razoável abando nar o dogmatismo, desconfiados da capacidade do pensamento de apreender diretamente a estrutura profunda do ser ou da possibilidade de fundamentação última de um sistema, também preferiram abandonar igualmente as pretensões metafísicas.

28

Trata-se, claro, de um concepção sellarsiana de filosofia: “The aim of philosophy, abstractly

formulated, is to understand how things in the broadest possible sense of the term hang together in the broadest possible sense of the term” (SELLARS, 2007, p. 369).

Contudo, se fizermos como muitos autores contemporâneos e adotarmos como definição de metafísica, a partir da sugestão de Sellars, o esforço de dar conta teoricamente de como as coisas, no sentido mais geral, se encaixam, então a metafísica não só continua possível como, na verdade, é hoje mais necessária do que nunca, devido à acelerada dispersão do conhecimento. Em especial com a recuperação recente de posições realistas, no que já vem se chamando de “a virada ontológica” em filosofia, a necessidade de pensar para além apenas da relação sujeito-objeto (para além do círculo correlacionista, diria Meillassoux) é patente. A questão é então saber qual metafísica.

Uma metafísica baseada em intuições intelectuais já não parece mais uma opção atraente, embora uma boa parte da recente metafísica analítica não passe do que Dennett (1998) e Ladyman et al. (2007) apelidaram pejorativamente de “metafísica neo-escolástica”, desenvolvida com pouco ou nenhum diálogo com as ciências naturais. A outra opção é justamente partir do melhor da produção científica ao teorizar a respeito do real. São, portanto, pressupostos da metafísica naturalista que: 1) O ser é natureza; 2) Havia natureza antes de haver pensamento, antes de existirem entidades capazes de pensar a natureza; 3) O próprio pensamento tem uma história natural, emerge evolutivamente no interior da natureza e permanece sempre parte da natureza; 4) Por meio da prática científica disciplinada, o pensamento é capaz de representar a natureza a partir da produção de modelos que, se bem nun ca esgotam o ser natural em sua totalidade, fazem referência à própria coisa em si, e captam aspectos verdadeiros do real; 5) Com isso torna -se possível que o pensamento elabore empiricamente uma compreensão de sua própria gênese.

Nesse quadro, como fica a relação entre ciência e filosofia?

A filosofia não se basta. Ela não deve ser entendida como ciência primeira, que fundamenta as demais e estabelece suas condições de possibilidade. Em especial, a pretensão metafísica não deve partir apenas da razão pura , mas deve se deixar contaminar pela empiria. Tampouco, contudo, essa relação deve ser interpretada como de via única: a ciência fornecendo material e determinações para a filosofia. Ao contrário, aqui se trata de um genuíno diálogo, já que a filosofia res ignifica, interpreta, organiza e sistematiza os dados da ciência, mas também critica os pressupostos metafísicos presentes necessariamente em qualquer paradigma científico, explicita as decisões teóricas envolvidas, lança desafios e mesmo elabora,

de forma especulativa, possibilidades teóricas para as quais a ciência ainda não dispõe de possibilidade de teste. 29 Aos metafísicos analíticos, caberia, mais do que a confiança paroquial em primeiros princípios intuitivos, uma reaproximação do que havia de fértil no programa original do empirismo lógico – o respeito pela produção científica e a relação estreita, e de mão dupla, entre ciência e filosofia, já enfatizada por Russell (2009, p.377-379):

We shall be wise to build our philosophy upon science, because th e risk of

error in philosophy is pretty sure to be greater than in science […].

Philosophy should be comprehensive and should be bold in suggesting hypotheses as to the universe which science is not yet in a position to confirm or confute. But these should always be presented as hypotheses, not (as is too often done) as immutable certainties like the dogmas of religion. 30

A chave para sairmos da armadilha da estratégia defensiva, que tem suas raízes no dualismo moderno, está na retomada de um projeto siste mático de filosofia, que inclua, em diálogo com as ciências contemporâneas, uma robusta e ambiciosa filosofia da natureza. Desde uma perspectiva naturalista, uma filosofia da natureza suficientemente imaginativa pode bem servir de ontologia geral. Embora não seja fácil afirmar que cara essa ontologia deva ter para atender com sucesso às pretensões de universalidade de uma filosofia sistemática, é plausível considerar que ela acabe se revelando uma versão atenuada da proposta de Hegel: uma dialética deflaci onária, que seja ambiciosa o suficiente, sem, contudo, ser totalitária31.

O que envolve, entre outras coisas, dissolver a barreira entre o objetivo e o subjetivo, reconhecendo que já na natureza está presente a idealidade. Essa espécie de animismo iluminista parece estar em frontal desacordo com a tradição da ciência moderna, já que subverte o que a ciência considerava ser sua missão fundamental: desantropomorfizar o mundo e, se possível, o próprio homem. Estranhamente, contudo, é coerente com as intuições mais radicais da ciência contemporânea.

29

Nem a ciência, em si, já é filosofia, nem, muito menos, é filosoficamente neutra. Como afirma Dennett (1998, p. 21), “não existe ciência livre de filosofia; existe a penas ciência cuja babagem filosófica é embarcada sem passar pela vistoria.” Fazer essa vistoria, tornar explícito os pressupostos metafísicos das teorias científicas, é parte importante da tarefa da filosofia.

30

“Devemos ser sábios de construir a nossa filosofia sobre a ciência, porque o risco de erro na filosofia é quase certo de ser maior do que na ciência [...]. Filosofia deve ser abrangente e deve ser ousado em sugerir hipóteses quanto ao universo que a ciência ainda não está em condições de confirmar nem de refutar. Mas estes devem ser sempre apresentadas como hipóteses, e não (como é muitas vezes feito) como certezas imutáveis, como os dogmas da religião.”

Para estar à altura dos desafios que a própria ciência contemporânea nos lança e reconstruir um animismo racional, é preciso perder o medo da acusação de “antropomorfismo”, e reconhecer que já na natureza não-humana se encontram em operação princípios que o dualismo moderno havia reivindicado como exclusivos ao polo do sujeito. Dessa perspectiva, como nos lembra Latour (2010 , p.481), é o “inanimismo”, a tese de que a natureza é composta essencialmente de matéria inerte, sem poder criativo e incapaz de se auto -organizar, que é o verdadeiro escândalo:

The accusation of anthropomorphism is so strong that it paralyzes all the efforts of many scientists in many fields—but especially biology—to go beyond the narrow constraints of what is believed to be “materialism” or

“reductionism.” It immediately gives a sort of New Age flavor to any such

efforts, as if the default position were the idea of the inanimate and the bizarre innovation were the animate. If there is one thing to wonder about in

the history of Modernism, it is not that there are still people “mad enough to believe in animism,” but that so many hardheaded thinkers have invented

what should be called inanimism and have tied to this sheer impossibility their definition of what it is to be “rational” and “scientific.” Call it

“animism” if you wish, but it will no longer be enough to brand it with the

mark of infamy. We need to have a much more material, much more mundane, much more immanent, much more realistic, much more embodied definition of the material world if we wish to compose a common world . 32

A nova dialética, ao passo que se mantém fiel à pretensão de universalidade e sistematicidade, abre mão de qualquer dogmatismo para abraçar o falibilismo característico das ciências naturais, e se mantém em um constante esforço, aberto, de interpretar o real e deixar-se surpreender pela experiência. Faz isso, contudo, identificando padrões comuns e analogias nas diversas ciências particulares, quebrando as rígidas separações entre as disciplinas e contribuindo para tecer uma teia de consiliência. Como chama atenção Ladyman et al. (2007, p. 28), esse não é um trabalho que se espera das ciências particulares: é, ao final, um trabalho de metafísica, ainda que se trate de uma metafísica naturalista, que se alimenta da produção científica:

32 “A acusação de antropomorfismo é tão forte que paralisa todos os esforços de muitos cientistas em muitas áreas, mas especialmente na biologia, para ir além dos limites estreitos do que se acredita ser o “materialismo” ou “reducionismo”. Ele imediatamente dá uma espécie de sabor New Age a tais esforços, como se a posição padrão fosse a ideia do inanimado e a inovação bizarra fosse o animado. Se há uma coisa a se admirar sobre a história do Modernismo, não é que ainda existem pessoas “loucas o suficiente para acreditar em animismo”, mas que tantos pensadores teimosos tenham inventado o que deve ser chamado inanimism o e ter amarrado a esta pura impossibilidade sua definição do que é ser “racional” e “científico”. Pode chamar de “animismo”, se quiser, mas não será mais suficiente para marcá -lo com a marca da infâmia. Precisamos ter muito uma definição do mundo material muito mais material, muito mais mundana, muito mais imanente, muito mais realista, muito mais corpórea, se quisermos compor um mundo comum”.

However, evaluating the global consilience network is not a task assigned to any particular science, partly because important efficiency considerations recommend disciplinary specialization. Metaphysics, as we will understand it here, is the enterprise of critically elucidating consilience networks across the sciences. 33

O projeto de combinar metafísica, naturalismo e dialética não deixa de soar estranho, mas é exatamente do que se trata aqui. Contra o privilégio idealista do “Eu”, afirmamos a precedência da natureza. Contra as tendências reducionistas do naturalismo tradicional, enfatizamos o poder criativo da matéria, sua capacida de de auto-organização e produção histórica de novas formas. Contra as filosofias da finitude, apostamos na capacidade do pensamento de produzir modelos que capturam aspectos do real: a razão pode, e deve, produzir um quadro geral do mundo, assim como uma narrativa de como as coisas vieram a ser como são – ainda que se trate, sempre necessariamente, de uma quadro falível, de uma narrativa revisável.

O resultado é uma ontologia naturalista universal, ainda que indefinidamente passível de modificações, integrando a experiência subjetiva na existência objetiva, integrando o ser humano no contexto de uma efetividade e de uma história que o precede e o excede – fazendo com que o homem possa sentir-se novamente em casa no universo.

33 “No entanto, a avaliação da rede consiliência global não é uma tarefa atribuída a qualquer ciência particular, em parte porque as considerações importantes de eficiência recomendam especialização disciplinar. Metafísica, como vamos entender isso aqui, é a empresa de elucidar criticamente redes consiliência através das ciências.”

2 KANT E O PROPÓSITO NATURAL

“But in order to regard a thing cognised as natural product as purpose also – consequentely as a natural purpose, if this is not a contradiction – something more is required. I would say provisionally: a thing exists as a natural purpose, if it is both cause and effect of itself”.

(Immanuel Kant) “One of Kant’s greatest services to philosophy was in drawing the distinction between relative or external purposiveness and internal purposiveness; in the latter he opened up the concept of life, the idea, and with that he positively raised philosophy above the determinations of reflection and the relative world of metaphysics.”

(Friedrich Hegel) “It is already amazing that Kant had given a visionary accountof self - organization that anticipates the definition o f autopoiesis almost literally, but within the bounds of a transcendental analysis.”

(Francisco Varela)

Desde o final da década de 90, as ideias apresentadas por Kant a respeito da vida na Crítica do Juízo figuram com destaque cada vez maior nas discussões acerca do conceito de “organismo”. O centro do interesse está nas passagens que trazem os termos “propósito natural” e “auto-organização”. Weber e Varela (2002), ao reivindicarem a “herança kantiana” para o projeto de reformulação da filosofia da biologia, foram pioneiros nessa tendência. Varela já era então um biólogo de renome e pesquisador destacado, famoso sobretudo por sua teoria da autopoiese e suas explorações do conceito de autonomia em áreas tão disversas como a imunologia e as ciências cognitivas. A retomada de interesse da filosofia contemporânea, em diálogo com as ciências naturais, pelas considerações sobre teleologia na Crítica do Juízo se dá tanto entre os que prosseguem o projeto de Varela de uma biofenomenologia, como Thompson (2007), e outros biólogos teóricos (KAUFFMAN, 2008; DEACON, 2012), como entre estudiosos da obra kantiana ( GINSBORG, 2001; STEIGERWALD, 2006; ZAMMITO, 2007).

O papel do conceito de finalidade na compreensão dos sistemas vivos é um dos pontos centrais das discussões recentes em filosofia da biologia. Não por acaso, o objetivo declarado de Varela ao aproximar-se de Kant era contribuir para a

“redescoberta do pensamento teleológico”. O problema fundamental de Kant na terceira crítica era o de compatibilizar apreciação teleológica da natureza, que se oferece à experiência no caso dos seres vivos, com o procedimento da ciência de buscar, para qualquer fenômeno, causas eficientes. O modelo de explicação natural para Kant era a física newtoniana, na qual efetivamente não resta espaço algum para a teleologia. A universalização da explicação mecânica, sua aplicação generalizada a toda a natureza, incluindo os seres vivos, parecia, contudo, problemática para Kant.

Como Kant acreditava que jamais seria possível à consciência humana explicar a vida inteiramente pelo mecanismo natural, invocava como complemento explanatório o conceito de “propósito natural”. Mecanismo e teleologia expressam dois modos de pensar irredutíveis, mas ambos são, no entanto, necessários. A tensão, expressa na antinomia do juízo teleológico, encontra-se na necessidade de utilizar a causa final na explicação dos seres vivos, ao passo que a máxima que orienta a busca de conhecimento científico da natureza afirma que todas as coisas materiais devem ser ajuizadas em termos apenas de “leis meramente mecânicas”.

Embora Kant negue a possibilidade de entender a vida em termos puramente mecanísticos, não vê como a noção de “propósito natural” poderia ser compatível com a própria ideia de natureza, cujo modelo é d ado pela física newtoniana. A partir desse impasse, Kant estabelece a impossibilidade de uma ciência completa do organismo. A própria ideia de organismo é para ele não um princípio objetivo, mas apenas de uma heurística da investigação, e por isso mesmo não participa de uma ontologia da natureza.

Sobre qual é de fato a ontologia da vida, Kant se mantém agnóstico, pois avalia que a questão está para além do alcance de nossas capacidades cognitivas. Para Kant, portanto, o conceito de “propósito natural” é apenas regulativo, e não constitutivo: serve para guiar e regular a investigação científica. O conceito, irredutível ao domínio da física, é baseado na analogia com nossa experiência subjetiva de propósito. Sob tal semelhança remota, torna-se útil para orientar a pesquisa a respeito dos objetos naturais organizados (o domínio próprio da biologia).

Argumentamos que o limite da concepção kantiana de vida encontra -se em não ser capaz de pensar a finalidade dos organismos senão como analogia com a finalidade das operações mentais dos sujeitos humanos. Acaba recaindo assim em uma espécie “teologia-física” como modelo de aplicação do princípio regulativo.

Esse limite já havia sido apontado por Hegel, que em sua filosofia da natureza ao mesmo tempo aplaude Kant pela retomada da noção de teleologia interna, presente em Aristóteles, mas perdida na filosofia moderna, e critica a ambivalência de Kant, que, ao se aferrar a concepção habitual que compreende a teleologia por analogia à intencionalidade consciente, acaba por n ão desenvolver o que Hegel considera sua grande inovação filosófica, regredindo assim ao modelo do design.

Tanto Hegel quanto Schelling enxergavam, como Kant, essa tensão entre a ideia de vida e o modelo mecânico de natureza, mas ambos apostavam em uma solução imanentista ao problema, sugerindo uma reforma da f ísica (uma física organicista). O que o idealismo alemão requer é desenvolvimento de uma “nova física”, ampla suficiente para acomodar o fenômeno vivo e tornando possível assim pensar o que seria anátema ao projeto kantiano: a continuidade entre subjetividade e natureza. O idealismo alemão nesse sentido inverte Kant, pois já não é o sujeito que projeta na natureza orgânica seu modo de atuação guiado por fins – ao contrário, é o próprio sujeito que só é capaz de experimentar intelectualmente a finalidade porque ele mesmo é, objetivamente, um “propósito natural”.

2.1 Conceito de propósito natural

Em sua analítica do Juízo Teleológico, Kant deixa claro que para julgar um objeto como um “propósito” não é necessário apenas um critério de utilidade. Assim como os animais, o ser humano faz uso de fenômenos da natureza para seus próprios desígnios: utiliza animais para transporte ou carga, usa plumas de pássaros e seivas de árvores para fins estéticos etc., mas nada isso existe para cumprir essas finalidades. O uso feito de tais coisas pelos seres humanos não é a razão pelas quais essas coisas existem – o ser humano impõe sua finalidade aos objetos da natureza, os toma como meio e os torna funcionais, mas não é essa finalidade atribuída que explica a existência material.

Tal “finalidade” é, portanto, para Kant, apenas relativa, ou contingente: é a racionalidade humana, pela liberdade de sua causalidade, que encontra utilidade no que é apenas dado de forma contingente, e confere às coisas da natureza uma