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1 PREMISSAS METODOLÓGICAS E DELIMITAÇÃO DO OBJETO

3.3 O critério espacial – âmbito territorial da competência fiscalizatória

fiscalizatória, é muito importante ter em mente que em relação à esfera Federal, bem como à Estadual e a dos grandes Municípios, há uma divisão administrativa do órgão competente para fiscalizar e arrecadar os tributos para facilitar o atendimento ao contribuinte239. Todas as unidades que compõem o mesmo corpo institucional são competentes para expedir atos administrativos sobre a mesma matéria, de modo que a regra estipulada para a melhor gerência da res publica não pode ser alegada como limite à competência fiscalizatória240.

Fixada a possibilidade de repartição dos órgãos Fazendários da mesma pessoa política, surge a questão relacionada ao âmbito espacial da competência fiscalizatória de cada unidade da Federação e dos Municípios.

Sobre o assunto, em princípio, temos que o critério espacial da norma de competência fiscalizatória deveria ser dotado da mesma extensão da legislação impositivo-tributária do ente federativo. Conforme já deduzimos outrora, deve ser competente para fiscalizar quem tem competência para tributar. Ocorre que a identificação do sujeito competente para tributar e, portanto, fiscalizar, não é

239 Na esfera Federal, por exemplo, a lei outorgou competência fiscalizatória administrativa

aos agentes fiscais do domicílio fiscal do contribuinte: Vide Decreto-Lei nº 5.844/43, artigo 175; Regulamento do Imposto sobre a Renda, artigo 985.

240 Neste sentido, a legislação Federal prevê a extensão da competência do agente fiscal

lotado em unidade diferente daquela relacionada ao domicílio fiscal do contribuinte: “Decreto nº 70.235/72 Art. 9º A exigência do crédito tributário e a aplicação de penalidade isolada serão formalizados em autos de infração ou notificações de lançamento, distintos para cada tributo ou penalidade, os quais deverão estar instruídos com todos os termos, depoimentos, laudos e demais elementos de prova indispensáveis à comprovação do ilícito. […] § 2º Os procedimentos de que tratam este artigo e o art. 7º, serão válidos, mesmo que formalizados por servidor competente de jurisdição diversa da do domicílio tributário do sujeito passivo.”

tarefa simples. Isso porque a extensão das leis, isto é, do seu âmbito de vigência e aplicação, se identifica com a ideia de territorialidade, que é conceito estritamente jurídico, não necessariamente coincidente com os limites geográficos dos entes competentes.241

Essa circunstância de haver uma noção de território diferente dos lindes físicos das unidades da Federação e dos Municípios, mas com eles relacionada, dificulta a identificação da esfera de vigência e eficácia das normas tributárias. Exemplo típico da ausência de identidade entre o território e o espaço geográfico dos sujeitos políticos é o caso do Imposto sobre Serviços de Qualquer Natureza (ISS), que tem como fato gerador a prestação de serviço previsto na lista anexa à Lei Complementar nº 116/2003 e como critério espacial da incidência do tributo, via de regra, o estabelecimento ou o domicílio do prestador.

Nos casos de tributação no estabelecimento ou domicílio do prestador, surge a questão de que a alteração da sede dos sujeitos passivos da exação em comento enseja a legitimidade de determinado Município fiscalizar pessoas anteriormente sediadas no seu espaço geográfico e outrora fixadas em território alheio. Nessas hipóteses, o âmbito de vigência da legislação Municipal extravasa os limites físicos do sujeito fiscalizador, contudo é flagrante que os relatos dos fatos ocorridos até a alteração do domicílio ou sede do prestador estão abrangidos na ideia de território do Município em que sediado o prestador de serviço à época dos fatos jurídicos tributários.

Identicamente, os serviços que têm como critério espacial o local da prestação tornam legítima a tributação e fiscalização pelo ente político em que se

241 A ideia de território traça “as linhas definidoras do âmbito espacial de vigência, isto é, do

domínio que há de encerrar os lugares das condutas juridicamente apreciáveis num certo ordenamento” (BRITTO, Lucas Galvão de. O Lugar e o Tributo: Estudo sobre o critério espacial da Regra-Matriz de Incidência Tributária no exercício da competência tributária para instituir e arrecadar tributos. 2012. Dissertação (Mestrado em Direito) – Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, São Paulo, 2012, p. 125-126).

concretiza o fato jurídico tributário, não havendo falar-se em pretensão impositiva e fiscalizatória do Município em que sediado o prestador.

Esses exemplos demonstram hipótese em que o âmbito de vigência e aplicação da lei tributária não é fiel ao espaço geográfico do ente tributante, senão com o seu território. Nesses casos, contudo, a pretensão fiscalizatória é claramente demarcada.

Questão diferente e complexa refere-se às situações de dúvidas quanto à espécie do serviço prestado (determinante para a incidência da tributação no local da prestação ou na sede do estabelecimento prestador), ao local do estabelecimento prestador ou, ainda, ao local da efetiva prestação do serviço. A incerteza acerca desses pontos pode ensejar uma espécie de “guerra fiscalizatória”, na qual mais um ente político realiza atos investigativos acerca dos mesmos acontecimentos. Para solucionar esse conflito de interesses, o Judiciário restringe a fiscalização ao território dos sujeitos políticos242.

Ora, mas é justamente mediante a fiscalização que se torna possível a exata delimitação do território, isto é, do âmbito de vigência e aplicação da legislação fiscal, sendo que são diversos os casos em que a premissa da espécie do serviço, da sede do prestador ou do local da efetiva prestação do serviço é abalada pela fiscalização. Por um lado, o Judiciário impede que sejam exigidos documentos emitidos em favor de outro ente político, a fim de evitar possível choque de prol da sua análise. Por outro lado, contudo, caso o particular seja possivelmente contribuinte perante Município distinto daquele que no presente

242 Exemplo dessas manifestações é:

“TRIBUTÁRIO. FISCALIZAÇÃO MUNICIPAL. APRESENTAÇÃO DE LIVROS E DOCUMENTOS FISCAIS. ESTABELECIMENTOS SITUADOS EM OUTROS MUNICÍPIOS. 1. A fiscalização municipal deve restringir-se à sua área de competência e jurisdição. 2. Ao permitir que o Município de São Paulo exija a apresentação de livros fiscais e documentos de estabelecimentos situados em outros municípios, estar-se-ia concedendo poderes à municipalidade de fiscalizar fatos ocorridos no território de outros entes federados, inviabilizando, inclusive, que estes exerçam o seu direito de examinar referida documentação de seus próprios contribuintes. 3. Recurso parcialmente conhecido e não provido” (Recurso Especial n. 73.086; Ministro João Otávio de Noronha; julgado em 17.06.2003).

o fiscaliza, é patente a injustiça perpetrada pelo desvencilhamento ilegítimo da obrigação de pagar tributo.

Ao nosso ver, a sistemática da permuta de informações entre os órgãos fazendários243 funcionaria como um importante instrumento para coordenar a atividade fiscal: mediante a partilhada troca de informações fiscais, tornar-se-ia possível a adequada tributação, sem que qualquer sujeito político tivesse tolhido o seu direito de análise dos documentos instituídos pela sua própria legislação tributária, outorgando, ainda, àqueles que possuem dúvida acerca da caracterização do fato jurídico tributário, um eficaz meio para colher indícios, fundamentadores da instauração de procedimento fiscalizatório próprio. A abrangente concretização da fiscalização em sentido amplo viabilizaria o conhecimento de situações que ensejam a fiscalização estrita, cujo critério espacial se aproxima mais da ideia de vigência das normas impositivas.

3.4 O critério temporal – limites temporais do exercício da competência