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O D EVER DE P UBLICIDADE DA D OCUMENTAÇÃO

CAPÍTULO 4 O PROCEDIMENTO DE MANIFESTAÇÃO DE INTERESSE

5.1 O R ECEBIMENTO DE E STUDOS PELA A DMINISTRAÇÃO P ÚBLICA

5.1.1 O D EVER DE P UBLICIDADE DA D OCUMENTAÇÃO

Além de fundamentar a realização de estudos relativos a futuras concessões, o art. 21 da Lei de Concessões determina a necessidade de publicidade da documentação apresentada pelos interessados e das justificativas adotadas pelo Poder Público para utilizá-la ou rejeitá-la. Em seus termos, os estudos, investigações e projetos, de utilidade para a licitação, estarão à disposição dos interessados. O dispositivo legal deixa claro o dever de a Administração Pública dar publicidade à documentação, de ofício ou mediante requerimento de interessados. Para Carmen Lúcia Antunes Rocha:

No art. 21, aquela lei [a Lei de Concessões] dispõe sobre o direito do cidadão de ter acesso aos ‘estudos, investigações, levantamentos, projetos, obras e despesas ou investimentos já efetuados, vinculados à concessão, de utilidade para a licitação, realizados pelo poder concedente ou com a sua autorização’. Esses dados são importantes para o exercício do controle e fiscalização dos atos do Poder Público pelo cidadão, que somente pode participar da gestão da coisa pública, com efetividade, pelo conhecimento pleno e correto do quanto se pratique no desempenho das atividades que lhe são inerentes”.107

O art. 21 da Lei de Concessões institui o direito de qualquer um do povo ter acesso à documentação que embasa a concessão (especialmente à luz do art. 5º da referida lei, ao prever que o Poder Concedente publicará, previamente ao edital de licitação, ato justificando a conveniência da outorga de concessão).

Tal aspecto é essencial para que haja transparência e controle ao longo de todo o PMI. As justificativas para a adoção do modelo da futura concessão devem ser adequadamente embasadas nas investigações apresentadas, as quais estarão à disposição para a verificação pelos interessados. Augusto Nevez Dal Pozzo esclarece que:

[...] uma vez que o projeto é apropriado, a Administração passa a ter o dever, calcado no princípio da publicidade, de franquear acesso a seu conteúdo a tantos interessados quanto comparecerem a solicitá-lo. E quando tal projeto é

“aproveitamento ótimo” pelo Poder Concedente, podendo ser atribuída ao licitante vencedor a responsabilidade pelo desenvolvimento dos projetos básico e executivo (art. 5º, § 2º). Considera-se "aproveitamento ótimo" todo potencial definido em sua concepção global pelo melhor eixo do barramento, arranjo físico geral, níveis d’água operativos, reservatório e potência, integrante da alternativa escolhida para divisão de quedas de uma bacia hidrográfica (art. 5º, § 3º).

107 ROCHA, Carmen Lúcia Antunes. Estudo sobre concessão e permissão de serviço público no direito

brasileiro. São Paulo: Saraiva, 1996, p. 135-136. No mesmo sentido, cf., MARQUES NETO, Floriano de Azevedo. As Parcerias Público-Privadas no Saneamento Ambiental. Revista Eletrônica de Direito Administrativo Econômico, Salvador, n. 2, maio/jul. 2005. Disponível em: <www.direitodoestado.com.br>. Acesso em: 04 jun. 2014.

apresentado na publicação de um edital de concorrência pública, com tanto mais razão todos os concorrentes terão o direito incondicionado de acessar todos os elementos técnicos dele integrantes, realizar visitas técnicas, solicitar esclarecimentos, enfim, obter todas as informações que os coloquem em situação de simetria de informação em relação ao autor do projeto selecionado.108

Nunca é demasiado lembrar que a Constituição Federal institui dever de motivação109 para a tomada de decisão em âmbito administrativo e a respectiva publicidade de todos os atos praticados.110 Tal ponto é reafirmado em sede infraconstitucional, tanto em matéria de concessões quanto de processo e procedimento administrativo.

Nos termos do art. 5°, XXXIII, de nossa Carta Magna, “todos têm direito a receber dos órgãos públicos informações de seu interesse particular, ou de interesse coletivo ou geral, que serão prestadas no prazo da lei, sob pena de responsabilidade [...]”.

Em matéria de concessões, a menção à obrigatoriedade de disponibilização dos documentos – embora dispensável, tendo em vista a clareza do dispositivo constitucional sobre o dever de publicidade dos atos da Administração Pública e dos fundamentos que os embasam – é reforçada pelo art. 22 da Lei de Concessões. Este prevê ser “assegurada a qualquer pessoa a obtenção de certidão sobre atos, contratos, decisões ou pareceres relativos à licitação ou às próprias concessões”. Os documentos elaborados ao longo do PMI integram o

108 DAL POZZO, Augusto Neves. Procedimento de manifestação de interesse e o planejamento estatal de

infraestrutura. In: DAL POZZO, Augusto Neves; VALIM, Rafael; AURÉLIO, Bruno; FREIRE, André Luiz (coord.). Parcerias público-privadas: teoria geral e aplicação nos setores de infraestrutura. Belo Horizonte: Fórum, 2014, p. 67.

109“No Estado de Direito, a motivação é a pedra angular que assenta o cumprimento de todas as imposições

constitucionais à atividade administrativa. Com efeito, a submissão da administração à Lei e ao Direito só se viabilizar quando cumprido o dever de fundamentação da atuação administrativa realizada para determinar o interesse público. Através da fundamentação da decisão, será possível aquilatar o seu grau de conformidade com o sistema jurídico, incluindo a verificação da compatibilidade da obra administrativa com as exigências normativas, nestas incluídas as emanadas da razoabilidade. Em suma, a exigência de motivação permite aferir o cumprimento da legalidade substancial, viabilizando o exercício do controle jurisdicional dos atos administrativos. Não basta demonstrar a racionalidade formal no cumprimento da lei, mas também é preciso assentar, em todos os seus contornos, os caracteres da razoabilidade necessários e suficientes para a validade da atuação” (OLIVEIRA, José Roberto Pimenta. Os princípios da razoabilidade e da proporcionalidade no direito administrativo brasileiro. São Paulo: Malheiros, 2006, p. 276-277).

110 O princípio da publicidade impõe o resguardo da transparência nas atividades administrativas. O

administrador público portar-se com absoluta transparência, possibilitando aos administrados o conhecimento pleno de suas condutas administrativas. Há o dever administrativo de manter plena divulgação de seus atos, sem ocultamentos aos administrados dos assuntos a que interesse a todos e a cada um.

Cf., nesse sentido, ARAUJO, Luiz Alberto David. Curso de direito constitucional. 9. ed. rev. e atual. São Paulo: Saraiva, 2005, p. 325-326; Ademais, José Afonso da Silva coloca que “[a] publicidade sempre foi tida como um princípio administrativo, porque se entende que o Poder Público, por ser público, deve agir com a maior transparência possível, a fim de que os administrados tenham, a toda hora, conhecimento do que os administradores estão fazendo. Especialmente exige-se que se publiquem atos que devam surtir efeitos externos, fora dos órgãos da Administração” (Curso de direito constitucional positivo. 17. ed. São Paulo: Malheiros, 2000, p. 649).

procedimento de contratação da concessão e devem ser disponibilizados a qualquer pessoa que os solicite.

A Lei de Processo Administrativo também prevê que, nos processos administrativos em geral, será observado o critério de divulgação oficial dos atos administrativos, ressalvadas as hipóteses de sigilo previstas na Constituição (art. 2°, V).

O ponto é robustecido pela Lei de Acesso à Informação. Os procedimentos nela previstos destinam-se a assegurar o direito fundamental de acesso à informação e devem ser executados em conformidade com os princípios básicos da Administração Pública – dentre eles os de publicidade e motivação (art. 3°).

Em sede de PMI, o dever de publicidade poderá ser cumprido por meio da utilização de meios de comunicação viabilizados pela tecnologia da informação e pelo desenvolvimento de participação popular no procedimento.

De um lado, a documentação produzida pelos interessados, bem como os relatórios, análises e pareceres que os avaliem, poderão ser divulgados por meio da rede mundial de computadores, dando transparência a todos os atos realizados.

De outro, podem ser realizadas audiências e consultas públicas sobre a concessão a ser estruturada e sobre a documentação, em consonância com o princípio republicano e com a ampla possibilidade de participação popular.

Não se pode olvidar que é dever do Estado garantir o direito de acesso à informação, que será franqueada, mediante procedimentos objetivos e ágeis, de forma transparente, clara e em linguagem de fácil compreensão, tal como preconizado pela Lei de Acesso à Informação (art. 5°). Cabe, portanto, aos órgãos e entidades do Poder Público assegurar a gestão transparente da informação, propiciando amplo acesso a ela e sua divulgação.

Em vista do exposto, deflui do art. 21 da Lei de Concessões o dever de publicidade em relação ao PMI. Os documentos produzidos pelos interessados devem ser tornados públicos pela Administração Pública, para que a escolha por um ou outro modelo seja feita às claras, de forma transparente e devidamente motivada.

Decorre daí que o PMI, se realizado de forma adequada e republicana, reforça o dever de ampla publicidade relativa à documentação que embasa a outorga de concessões.

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