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O governo Dilma Rousseff: crise e desmonte da coalizão política

Gráfico 7: Importação de sistemas de armas pelos países da América do Sul

Capítulo 4: As relações Brasil-EUA durante os governos do PT (2003-2016): autonomia heterodoxa e resignação

4.2 O governo Dilma Rousseff: crise e desmonte da coalizão política

As mudanças na segunda gestão de Lula, combinadas ao crescimento econômico e à geração de emprego, contribuíram para que o presidente terminasse seu mandato mantendo altos níveis de popularidade e conseguindo fazer a sucessão, transferindo votos para sua ministra da Casa Civil, Dilma Rousseff, que foi eleita em outubro de 2010, na terceira vitória presidencial consecutiva do PT. A posse de Rousseff, em 2011, pode ser vista como um dos

pontos auge da era dos governos petistas, gerando esperança de continuidade do crescimento econômico com diminuição da pobreza.

A expectativa, no entanto, foi frustrada. Os fatores estruturais que auxiliaram Lula a alavancar a economia agiriam no sentido contrário das necessidades de sua sucessora. Essa situação, unida a erros de política econômica, levaram à diminuição da taxa de crescimento, insatisfação popular, polarização e instabilidade política. Em 2013, a explosão de protestos de rua evidenciou as fraturas do modelo de reformismo fraco com conciliação ao capital. No ano seguinte, 2014, as denúncias de corrupção voltaram à tona, quando uma força-tarefa do Ministério Público apelidada de Lava Jato ganhou força, denunciando desvios de recursos envolvendo a gestão da Petrobrás.

Mesmo nesse cenário desfavorável, Rousseff logrou ser reeleita em 2014, com estreita margem frente ao segundo colocado e com uma correlação de forças desfavorável no Congresso. Os derrotados não aceitaram a situação, dando combustível à continuidade de protestos contra corrupção focados no PT. Essa conjuntura, combinada à deterioração da economia e às dificuldades em manter uma coalizão no legislativo, levou ao impeachment/golpe parlamentar em 2016. A derrocada de Rousseff corresponde à debacle da coalizão política que havia garantido suporte aos governos do PT, sinalizando o fim de um ciclo político do país e a ascensão da “nova direita” (SAAD-FILHO; BOITO, 2016). O caminho que levou a esse resultado foi permeado por disputas políticas e econômicas, mudanças estruturais e erros cometidos pela presidência.

Os governos de Rousseff podem ser divididos em dois momentos: o primeiro, de 2011 a meados de 2013, caracterizado pela continuidade do projeto de mudança social, embora com menos sucesso em promover conciliação, e o segundo, de junho de 2013 a maio de 2015, marcado pelo colapso do modelo e pela derrocada da liderança petista. Durante todos os anos de seu governo, a mandatária encontrou maiores dificuldades que seu antecessor em manter o dinamismo da economia. A oposição política também foi maior, com intenso questionamento ao uso dos recursos públicos.

O cenário externo é um dos fatores centrais para explicar essa mudança: o boom das commodities chegou ao fim, diminuindo as exportações brasileiras e empurrando o crescimento do PIB para baixo. O preço de mercadorias exportadas pelo Brasil, como ferro, soja e petróleo, estancou em 2008, caindo ligeiramente em 2011, e fortemente a partir de 2014. Essa situação teve significativo peso em uma economia que vinha se desindustrializando e cujo dinamismo havia sido puxado pelos setores de serviços e da agropecuária (BRESSER-PEREIRA, 2016).

O fim do ciclo favorável não explica tudo, pois foram feitas mudanças na política econômica que impactaram negativamente no dinamismo da economia brasileira. Desde o primeiro ano do governo Rousseff, o incremento dos investimentos públicos foi revertido para uma política de incentivos fiscais às indústrias, que levava a exonerações e diminuição da capacidade de arrecadação do governo (CARVALHO, 2018). Como pontuado por Carvalho (2018, p. 32), entre 2011 e 2014, “[...] o fim do ciclo de expansão dos investimentos públicos em infraestrutura e sua substituição por uma política de redução de impostos, concessões e outros estímulos ao setor privado retiraram da economia brasileira um de seus principais motores”.

Há que se ressaltar que os incentivos fiscais eram combinados à uma tentativa do Banco Central em reduzir a taxa de juros, que durou de 2011 a 2013, e que tinha a intenção de contribuir para o aumento da produção industrial, já que os lucros provenientes de rendas seriam diminuídos. Nesse aspecto, Rousseff confrontou o capital financeiro, o que foi amplificado pela diminuição da disciplina fiscal, causada pelas isenções (SINGER, 2015; BRESSER-PEREIRA, 2016). A adoção de políticas de represamento de preços na área de energia, conduzida pelas empresas estatais, também pressionava o orçamento federal. Nesse contexto de menor arrecadação, a austeridade fiscal ficava comprometida, levando a maiores críticas à presidente por parte da mídia, da classe média e de representantes da burguesia financeira. Como pontuado por Singer:

[...] o aumento das críticas [...] por parte das agências internacionais de risco, das instituições oficiais de controle econômico (FMI, Banco Mundial etc.), dos bancos estrangeiros, das corporações multinacionais, de inúmeras vozes nos grandes meios de comunicação ao longo de 2013 e 2014 alimentava a desconfiança dos investidores quanto aos rumos do país. [...] articulistas e editoriais [...] reportagens em veículos nacionais e estrangeiros [...] foram dedicados a mostrar o quanto era preciso cortar os gastos ineficientes e “descontrolados” do governo e deixar o mercado funcionar para reordenar o país e retomar o crescimento (SINGER, 2015, p. 50).

Como Dilma Rousseff arriscava romper com a austeridade fiscal, especialmente pela menor arrecadação, sua capacidade de conciliação com os empresários rentistas diminuía, provocando relutância. A diminuição do crescimento era um constrangimento às políticas de conciliação, pois já não era mais possível garantir ganhos a todos os segmentos sociais. Como apontado por Boito e Saad-Filho (2016, p. 227, tradução nossa) “[...] quando a maré econômica virou, a incompatibilidade fundamental entre as políticas neoliberais e neodesenvolvimentistas gerou confusão e crise política, contribuindo para uma confluência de insatisfações”. Nesse sentido, a queda do crescimento é um fator relevante para explicar a fratura da coalizão política que sustentava os governos do PT.

Do ponto de vista da Política Exterior, as críticas às gestões petistas também cresciam. Havia reprovação à escassez de acordos comerciais assinados durante as três gestões, o que estaria, segundo os críticos, levando a um isolamento do país no cenário internacional. Criticava-se também a proximidade do governo com países do eixo bolivariano na América do Sul – Venezuela, Bolívia e Equador – assim como as relações com Cuba. Outro ponto de julgamento foi a política de abertura de embaixadas, especialmente na África, que ampliou os gastos da pasta. De forma mais direta, crescia a retórica de que a política exterior do PT havia sido contaminada por ideologia, deixando de ser pragmática57.

Assim como na economia, a gestão da política exterior conduzida por Rousseff teve maiores turbulências em comparação com a de seu antecessor. Durante seu primeiro governo, dois ministros ocuparam a pasta: Antônio Patriota (2011-2013) e Luiz Alberto Figueiredo (2012-2014). A nomeação de Patriota, que havia sido embaixador em Washington D.C., prometia continuidade na política de conciliação com os Estados Unidos e, inclusive, maior acomodação. Houve continuidade da política de valorização das relações com os países em desenvolvimento e da busca de ampliar graus de autonomia.

Patriota teve sua gestão interrompida por um episódio ocorrido em maio de 2012. Na ocasião, o encarregado de negócios da Embaixada na Bolívia, Eduardo Saboia, decidiu transportar clandestinamente para o território nacional um asilado político que estava vivendo na representação brasileira. O transporte ao Brasil foi feito sem autorização de seus superiores, ou salvo-conduto do governo da Bolívia. Frente a uma situação de insubordinação e após reunião com a presidente, Patriota entregou sua carta de renúncia. Posteriormente, assumiu Figueiredo, o qual fez uma gestão de baixo perfil, reativa e sem grandes marcos (DESIDERÁ NETO, 2019).

No ministério da Defesa, Rousseff optou inicialmente pela permanência de Jobim, o qual foi removido ainda no primeiro ano de governo. Sua substituição se deu após Jobim declarar à mídia que havia votado no concorrente de Rousseff e tecer críticas à gestão da petista, especialmente às nomeações para a Casa Civil e para as Relações Institucionais (LIMA, 2015).

57 Parte dessas críticas foram resumidas por José Serra na cerimônia de posse como Ministro das Relações

Exteriores. Na ocasião, Serra prometeu a volta de uma política externa pragmática não guiada por “preferências ideológicas”, e afirmou que “o Brasil [...] manteve-se à margem da multiplicação de acordos bilaterais de livre comércio [...] vamos vencer esse atraso e recuperar oportunidades perdidas”. Serra também prometeu “ampliar o intercâmbio com parceiros tradicionais, como a Europa, os Estados Unidos e o Japão” e afirmou que a cooperação brasileira com a África havia sido feita “com finalidades publicitárias, escassos benefícios econômicos e grandes investimentos diplomáticos”. Tratava-se de uma crítica à abertura de embaixadas no continente durante a gestão de Amorim (MINISTÉRIO DAS RELAÇÕES EXTERIORES, 2016).

Com a queda de Jobim, a pasta foi assumida pelo ex-ministro das Relações Exteriores, Celso Amorim, o qual obteve forte respaldo político e permaneceu até o fim do governo.

Cabe ressaltar que, após 2014, a crise econômica gerou consequências para o ministério, que teve seu orçamento contingenciado constantemente, impactando nos projetos estratégicos e na promessa de revitalização da indústria de defesa (LIMA, 2015). A presidente também promoveu medidas para aumentar a transparência governamental, que eram contrárias aos interesses dos militares. Em 18 de novembro de 2011, a mandatária promulgou a lei que instituía a Comissão Nacional da Verdade (CNV) e a Lei de Acesso à Informação (LAI) (LIMA, 2015). A CNV não tinha a intenção de punir militares da reserva que cometeram violações de direitos humanos durante o regime autoritário. Apesar disso, havia busca de construção de memória em relação ao período ditatorial, o que foi visto pelos militares como revanchismo.

Rousseff chegou ao ano eleitoral, 2014, em um contexto permeado por críticas e oposição. O ano anterior havia sido marcado por protestos numerosos, que resultaram em queda de sua popularidade (BRESSER-PEREIRA, 2016). O ano eleitoral foi marcado pela divulgação de um escândalo de corrupção, que comprometia o governo. Havia denúncias de desvios de dinheiro público e benefícios ilegais recebidos por afiliados do PT, tendo como centro a gestão da Petrobras e benefícios recebidos por empresas de construção. As denúncias, lideradas pela força-tarefa denominada Lava-Jato, foram fortemente divulgadas pela mídia tradicional.

Nesse contexto, o pleito de 2014 foi polarizador. A campanha do PT prometia a contenção da tendência recessiva, assim como a preservação de direitos e a não adesão a uma política neoliberal, de forte ajuste fiscal. Tal discurso, assim como a preservação de níveis de emprego pleno, atuou em favor da reeleição. Rousseff foi eleita “[...] diante de forte oposição de toda a burguesia [...]”, contando com o apoio dos mais pobres (BRESSER-PEREIRA, 2016, p. 380). A eleição de 2014 evidenciava, assim, a fratura da coalizão política que até então havia garantido sustentação aos governos do PT.

Ao assumir a presidência pela segunda vez, a decisão de Rousseff foi acenar à burguesia, nomeando Joaquim Levy, um economista ortodoxo ligado ao mercado financeiro internacional como ministro da Fazenda. O aceno não foi favorável à sua popularidade, levando a acusações de estelionato eleitoral. Além disso, a gestão de Levy não foi suficiente para recuperar a confiança dos investidores e o ministro não foi capaz de impedir o aprofundamento da recessão, deixando o cargo no final de 2015. Com sua saída, Rousseff nomeou o economista Nelson Barbosa, de vertente heterodoxa, dando uma guinada à centro-esquerda.

No que se refere à área de Relações Exteriores, Rousseff nomeou Mauro Vieira, que prometia uma política exterior mais pragmática, focada em resultados comerciais. Em artigo

escrito para a Folha de S. Paulo, o ministro afirmava que “[...] cifras e números respaldam uma diplomacia de resultados. É sobre essa base que se constrói uma política externa de qualidade” (VIEIRA, 2015). Vieira mostrava que, assim como na economia, a administração de Rousseff estava disposta a ouvir e ponderar as críticas da burguesia, dentro de certos limites. Apesar de admitir o foco no comércio, o ministro também defendia o legado de Amorim e a abertura de embaixadas em países em desenvolvimento, na África, Ásia e Oriente Médio. A defesa desse legado encerrou-se com o início da gestão Temer.

Para o Ministério da Defesa, Rousseff escolheu o ex-governador da Bahia, Jaques Wagner, que seria posteriormente substituído pelo político filiado ao PCdoB, Aldo Rebelo. Em seu segundo governo, a mandatária realizou uma manobra que desagradou os militares. Em outubro de 2015, extinguiu o status ministerial do Gabinete de Segurança Institucional (GSI), pasta que havia sido ocupada por militares desde a redemocratização. O GSI é responsável pela segurança presidencial e pela inteligência de Estado, uma vez que a Agência Brasileira de Inteligência (ABIN) é subordinada ao gabinete. Com a mudança feita por Rousseff, o órgão e a agência de inteligência passaram a integrar a secretaria de governo. Na ocasião, o ex-ministro divulgou nota, expressando insatisfação com a mudança presidencial58 (MATOSO, 2015).

Durante o segundo mandato de Rousseff, as críticas ao PT e a força das denúncias de corrupção cresceram. Ao mesmo tempo, a popularidade da mandatária caía e os protestos a favor de um impeachment ganhavam força, aparecendo em diversas capitais e congregando milhares de pessoas. Em uma manobra na qual o vice-presidente, Michel Temer, alinhou-se com o presidente da Câmara, Eduardo Cunha, o processo de destituição da presidente teve início em finais de 2015 (BRESSER-PEREIRA, 2016). O processo foi permeado por polarização. Enquanto a burguesia e a classe média conservadoras clamavam pelo afastamento, a esquerda e os apoiadores da presidente eleita argumentavam que se tratava de um golpe parlamentar, uma vez que Rousseff não havia cometido crime de responsabilidade, que é a única base legal para o impeachment59.

58 Como um exemplo mais recente do ressentimento dos militares com as mudanças promovidas por Dilma

Rousseff na área de inteligência, destaca-se que o atual ministro do GSI, o general Augusto Heleno, declarou em seu discurso de posse que a ex-presidenta havia “derretido o sistema de inteligência”. Rousseff respondeu afirmando que a inteligência brasileira é ineficiente, citando as falhas em detectar grampos desautorizados ao telefone da presidência e em detectar espionagem internacional promovida por agência estadunidense. Ver: https://g1.globo.com/politica/noticia/2019/01/02/general-heleno-diz-que-sistema-de-inteligencia-foi-derretido- por-dilma-rousseff.ghtml

59 Recentemente, ganhou força na literatura sobre estratégia militar a noção de guerra híbrida, definida pelo autor

russo Andrew Korybko (2015) como um novo método de guerra indireta levado a cabo pelos Estados Unidos, em regiões estratégicas, com destaque para a Eurásia. Em tais situações, existe uma forma de guerra indireta, sem o uso de forças militares convencionais. O objetivo dos EUA é promover a mudança de regime através de desestabilização política e acentuação da polarização interna (KORYBKO, 2015). Uma das formas iniciais

Tendo perdido o apoio necessário no Congresso, o afastamento da presidente consolidou-se em fevereiro de 2016. Seu sucessor, Michel Temer, promoveu uma impactante mudança de agenda, exercendo um governo explicitamente neoliberal. O ajuste fiscal teve novo início, mas não foi suficiente para garantir a retomada da economia, que continua desacelerada até 2019. O cenário econômico fez com que os avanços na redução da pobreza fossem parcialmente revertidos, embora o Bolsa Família, marco da gestão Lula, continue. A ascensão de Temer significou a construção de uma nova coalizão política que congregava a burguesia, com destaque ao setor financeiro, e frações da classe média.

Também no que se refere à política exterior, a ascensão de Temer teve um significado relevante. Rousseff havia mantido os princípios de política exterior iniciados por Lula, embora de forma menos ativista, como será detalhado na próxima subseção. Temer, por sua vez, colocou ponto final na estratégia de cooperação sul-sul e na retórica autonomista e iniciou uma agenda de priorização da assinatura de acordos de livre comércio. Figuras vinculadas ao PSDB foram nomeadas para liderar a pasta: primeiramente José Serra e, em um segundo momento, Aloísio Nunes.

No que se refere às relações com os militares, Temer desfez a reforma ministerial que havia extinguido o GSI. Em 12 de maio de 2016, o órgão foi novamente elevado ao status ministerial e a ABIN voltou à sua alçada (AGÊNCIA BRASILEIRA DE INTELIGÊNCIA, 2016). Não foi apenas no GSI que os militares voltaram a ter protagonismo no governo interino, mas também na área de Defesa, sendo que, em 27 de fevereiro de 2018, o general da reserva Joaquim Silva e Luna tornou-se o primeiro militar a comandar a pasta desde sua criação, em 1999. A partir de então, o protagonismo militar na liderança do governo apenas cresceu.

No plano político, o processo de impeachment/golpe levou a intensa polarização e fortalecimento das direitas. A rejeição ao PT e o discurso anticorrupção promoveram coesão a

assumidas pela guerra híbrida são as ‘revoluções coloridas’ descritas por Koryko (2015), nas quais há interferência externa e guerra de informações para influir nas disputas políticas internas e gerar mudança de regime. Tendo em vista a semelhança entre tal estratégia e o ‘golpe parlamentar’ sofrido no Brasil, tem-se especulado sobre a mudança política brasileira ter sido promovida pelos EUA. Essa hipótese é corroborada por fatos empíricos como a existência de colaboração entre a Lava Jato e o Departamento de Justiça, com compartilhamento de informação, e o fato de a Embaixadora Liliana Ayalde ter sido designada para postos no Paraguai e Brasil em momentos de mudança política, e posteriormente movida para o Comando Sul. Em que pese haver alguma corroboração para essa hipótese, não é possível verificá-la. Ademais, é difícil inferir que a oposição à Dilma Rousseff e a demanda por impeachment tenham sido criadas externamente quando havia intensa insatisfação popular decorrente da crise econômica, gerada também por decisões de política econômica do governo petista. De toda forma, cabe reconhecer que os resultados do golpe foram a volta de uma política de clientelismo forte, colocando ponto final à estratégia de autonomia heterodoxa brasileira. Esse resultado atendia, portanto, a interesses dos EUA. Assim, parece sensato especular sobre influência externa, mas seria um exagero falar em determinação.

uma frente política de direita, cuja ascensão é possível rastrear a partir das eleições de 2014. Tal coalizão política representa os interesses da burguesia financeira internacional, de frações das classes médias e de parte da classe trabalhadora que possui valores religiosos e moralistas (SAAD-FILHO; BOITO, 2016). Seus objetivos eram retomar a política econômica fortemente neoliberal e realinhar a política exterior, além de promover valores conservadores em setores da vida cotiadiana, opondo-se a avanços em temas como o casamento igualitário ou o direito de escolha das mulheres grávidas. Essa articulação encontrou força eleitoral na figura de Jair Bolsonaro, que ganhou as eleições presidenciais de 2018, com uma plataforma eleitoral neoliberal do ponto de vista econômico e conservadora e moralista do ponto de vista da organização social. A vitória de Bolsonaro representou o início de um novo ciclo político no Brasil. Essa mudança na correlação de forças políticas internas levou à mudança da Política Exterior e maior aproximação com os Estados Unidos.

Em síntese, pode-se concluir que os 13 anos de gestão do Partido dos Trabalhadores significaram um ciclo de construção e colapso de uma coalizão política que congregava segmentos da burguesia interna, partes da classe média, os militares e o subproletariado, que se beneficiou dos programas de transferência de renda e do aumento do salário mínimo (BRESSER-PEREIRA, 2016; SINGER, 2012). A principal estratégia era a conciliação com o capital, promovendo um programa de reformismo lento, que mostrou desgaste quando as condições econômicas se deterioraram. Tal coalizão fraturou-se ao longo do primeiro mandato de Dilma Rousseff, quando houve menor crescimento econômico, maior instabilidade política e a burguesia e os militares uniram-se em bloco contra a presidente, opondo-se a sua reeleição e, posteriormente, demandando seu impeachment.