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2.5 Os Modelos de Análise de Competitividade

2.5.4 O Modelo de Calgary

O modelo que será discutido neste estudo é o de Ritchie e Crouch (2003). Esse modelo é uma evolução do modelo de Crouch e Ritchie (1999) desenvolvido em conjunto por pesquisadores das universidades de Calgary, no Canadá, e La Trobe, na Austrália, com o intuito de obter uma melhor compreensão de como acontecia a competitividade dentro de uma determinada destinação turística. Os autores descrevem todo o processo que culminou na versão final do modelo que ora passa a ser analisado em seu livro publicado em 2003, no qual mostram que o mesmo é fruto de estudos iniciados separadamente por cada um dos autores em suas universidades, desde 1992. Ao longo do período, entre 1992 e 2003, foram realizadas inúmeras conferências e palestras ao redor do mundo que possibilitaram a depuração e adequação das idéias iniciais, resultando num modelo muito mais abrangente do que aquele publicado pelos mesmos autores no ano de 1999.

Ritchie e Crouch (2003) apresentam um modelo de análise da competitividade de uma destinação (figura 7) que parte do princípio que o sistema turístico é um sistema aberto e como tal está sujeito a uma série de influências tanto do ambiente global (Macro - composto de todas as variáveis econômicas, sociais, ambientais e políticas que podem auxiliar ou atrapalhar o desenvolvimento da competitividade de

uma destinação), quanto do ambiente competitivo (Micro – composto por variáveis que afetam diretamente o desenvolvimento das empresas ligadas ao setor turístico). Para os autores os fatores macroambientais, normalmente, encontram-se divididos em seis grandes categorias: economia, tecnologia, ecologia, desenvolvimento político e legal, assuntos socioculturais e as mudanças no ambiente demográfico. Eles afirmam que os fatores econômicos possibilitaram a muitas pessoas antes relegadas à condição de meros expectadores, a mudança de papel, tornando-as consumidoras de produtos turísticos e criando as condições necessárias para que muitos países desenvolvessem sua infra-estrutura de forma a suprir as demandas feitas pelos novos grupos de turistas.

A influência dos fatores tecnológicos pode ser sentida melhor quando se avalia a evolução no setor de aviação comercial, uma vez que a cada ano que passa, surgem novas aeronaves, sempre mais econômicas em termos de consumo de combustível e com maior capacidade de carga o que permite deslocar um maior volume de pessoas em menor tempo e com menor custo por passageiro.

Os fatores ecológicos são tratados pelos autores como sendo um item limitador da exploração da atividade turística, uma vez que a degradação de muitos locais turísticos causada pela poluição do ar ou pela depredação dos recursos naturais, por meio da emissão de esgotos não tratados ou ainda pela criação de lixões próximos à patrimônios da humanidade, estão na mira de grupos preocupados com a preservação ambiental e criando dificuldades para a ampliação da exploração da atividade turística.

Dentre os aspectos políticos e legais, Ritchie e Crouch (2003) destacam que a paz mundial existente nos dias atuais gerou um forte movimento de desarmamento e queda de barreiras internacionais, o que possibilitou um aumento no fluxo de pessoas ao redor do mundo, levando a uma nova regulamentação alfandegária e aeroportuária que permitisse a acomodação desse aumento de demanda. Além disso, eles citam a criação da OMC (Organização Mundial do Turismo) como um fator positivo nas relações políticas entre as nações, uma vez que esse órgão torna viável a elaboração de agendas conjuntas e discussões em âmbito mundial, algo até então impensável.

Figura 7 - Modelo conceitual de competitividade e sustentabilidade da destinação Fonte: Ritchie e Crouch (2003, p.63)

Com relação aos fatores ligados aos assuntos socioculturais pode-se perceber que os autores apontam seis principais aspectos trazidos pela pós-modernidade e que atuam como elementos alavancadores das atividades turísticas: 1) o movimento de volta à natureza; 2) o retrocesso do imperialismo cultural; 3) a valorização e o aumento do orgulho das nações aborígenes com relação à sua cultura e costumes; 4) a valorização dada a contribuição oferecida por outras culturas para o desenvolvimento da sociedade; 5) o contato de países do terceiro mundo com culturas mais avançadas, que desperta, nesses povos, novos anseios e desejos; e 6) o potencial oferecido pelo turismo para o deslocamento social.

O último dos fatores do macroambiente (ou ambiente global) destacado pelos autores refere-se ao aspecto demográfico. Para eles este é um dos aspectos mais importantes a ser analisado pelos gestores do turismo, pois pode apontar para uma série de situações que servem tanto, como oportunidades se forem bem aproveitadas, quanto, como ameaças se não receberem a devida atenção. Citam como exemplo o aumento do turismo doméstico, que fez com que houvesse uma elevação na quantidade de períodos de férias, mas com a conseqüente redução do período em que uma mesma família permanece no local das férias.

No ambiente competitivo (micro) são consideradas as relações entre as empresas que compõem o trade turístico, sejam elas cooperativas, competitivas ou complementares. Ritchie e Crouch (2003) destacam seis fatores a serem considerados na análise deste ambiente: fornecedores, intermediários ou facilitadores, consumidores, competidores, ambiente interno e o público em geral. Para os autores os fornecedores são responsáveis pelo suprimento dos itens necessários para que os visitantes tenham uma experiência satisfatória em suas atividades turísticas. Dentre esses itens eles destacam: a indústria alimentícia e de bebidas, as companhias de combustíveis e gás, o artesanato, os fabricantes de equipamentos para acampamento e outras atividades de lazer, etc.

Com relação aos intermediários ou facilitadores, Ritchie e Crouch (2003) afirmam que é por meio deles que os itens oferecidos pelos fornecedores chegam às mãos dos turistas, seja por meio das agências de viagens (que colocam à disposição, do viajante, informações sobre os melhores roteiros, fazem reservas em hotéis, restaurantes e passeios), empresas promotoras de eventos (que planejam,

organizam e executam eventos de estudos e de negócios) e agentes financeiros, embaixadas e consulados (que auxiliam no câmbio de moedas estrangeiras, fornecem informações sobre os tratados internacionais e atendem o viajante fora de seu país de origem).

Os viajantes ou turistas (consumidores) são vistos pelos autores como o foco das atenções deste ambiente, ou pelo menos deveriam ser, segundo eles. Com seus desejos cada vez mais heterogêneos exigem sempre mais e não se satisfazem com os mesmos produtos e serviços oferecidos há 10 (dez) anos atrás. Nos dias atuais muitos não aceitam mais a condição de meros expectadores e desejam ser protagonistas, participando de atividades ligadas à esportes radicais, caminhadas e outras atividades que além da contemplação exijam sua participação efetiva na experiência.

Ao tratarem os competidores, os autores destacam que a análise neste nível não envolve apenas empresas, mas sim toda uma destinação que possa encontrar oferta de atrativos similares em outra localidade e que venha a reduzir o fluxo de turistas para aquele destino. Eles afirmam que tradicionalmente os competidores são considerados como adversários, no entanto, está sendo gradativamente introduzido no vocabulário dos estrategistas um novo termo: “coopetição”. Que viria a ser um misto entre cooperação e competição, onde uma determinada destinação irá destacar suas principais qualidades sem, contudo, desmerecer seus concorrentes, fazendo certo tipo de divulgação que por sua vez será retribuída pelo seu coopetidor, fazendo com que ambas se beneficiem da situação.

Ritchie e Crouch (2003) ao analisarem o ambiente interno de uma destinação consideraram-no como sendo uma parte do microambiente competitivo, uma vez que deve existir um senso comum que conduza a uma visão compartilhada por todos os responsáveis pela gestão da destinação sejam eles públicos ou privados. Para os autores há a necessidade de objetivos conjuntos que conduzam à formulação de estratégias integradas que permitam a execução de tarefas de forma simultânea e que atenda a diferentes tipos de empresas e organizações.

Por fim os autores enfocam o público em geral como sendo o último dos fatores do micrombiente competitivo a ser considerado, não que ele seja menos importante que os outros, muito pelo contrário, pois é para o público que deverão ser remetidos os

principais benefícios advindos da competitividade da destinação. Isso ocorre porque para Ritchie e Crouch (2003) a competitividade é apenas um meio para alcançar o objetivo maior que é a melhoria das condições socioeconômicas dos residentes em determinada destinação turística. O público em geral terá influência no desenvolvimento das estratégias pensadas para aquele destino, pois a hospitalidade, a receptividade e a cooperação dos residentes, será fundamental para que se alcance o sucesso desejado.

Dentro desse contexto formado pelos ambientes global (macro) e competitivo (micro), Ritchie e Crouch (2003) definem a competitividade e sustentabilidade de uma destinação turística como sendo formada por várias camadas de componentes interligados, partindo desde a base formada por fatores de suporte e recursos, que sustentam os recursos principais e atrações, que são gerenciados pela

gestão da destinação, que define as políticas, planejamento e desenvolvimento da destinação, que levam aos determinantes, amplificadores e qualificadores da

competitividade da destinação.

A camada considerada pelos autores como a base do modelo é a dos recursos principais e atrações, devido a estarem nesta camada os fatores chave para a atratividade da destinação. Eles colocam nesta camada a geografia física e o clima da região, a cultura e história da população residente, o conjunto de atividades oferecidas aos visitantes, os eventos especiais (jogos olímpicos, copa do mundo, etc) que coincidem ou que servem de motivação para a visita do turista, as opções de entretenimento (shows, casas de espetáculos, teatros, shoppings, etc) oferecidas, a superestrutura de turismo (opções gastronômicas, de hospedagem, transporte, etc) que envolve o trade turístico, e as relações de marketing (que auxiliam na comunicação entre os residentes e os futuros visitantes, além das relações com outras destinações que podem formar laços de cooperação na divulgação de um determinado destino).

A camada dos recursos principais e atrações é a responsável pela motivação da vinda do turista a um determinado destino, mas como afirmam os autores, para que esta destinação tenha sucesso na exploração da atividade turística, é necessário que haja um conjunto de fundações que eles chamam de fatores de suporte e recursos, que envolve os seguintes itens: infraestrutura (viária, de transportes, de

comunicação, de sinalização, de abastecimento de água e energia elétrica, etc), acessibilidade (existência de rotas que conduzam ao destino com facilidade e eficiência, companhias de transporte em quantidade e capacidade suficientes para atender à demanda), recursos (educacionais, humanos e técnicos em quantidade e qualidade suficientes para dar conta de uma clientela cada vez mais exigente), hospitalidade (receptividade aos turistas, por parte dos residentes de forma a tornar mais agradável a estadia naquele destino), iniciativa (desenvolvimento de novos empreendimentos e novos tipos de negócio que venham a complementar e a tornar mais inesquecível a experiência vivida pelos turistas) e a vontade pública (ter entre as prioridades de desenvolvimento da gestão pública o turismo como uma ferramenta propulsora do crescimento).

A partir deste conjunto formado pelos recursos principais e atrações e pelos fatores de suporte e recursos, Ricthie e Crouch (2003) apontam para a necessidade da existência de um quadro de políticas, planejamento e desenvolvimento da destinação que será composto por: definições do sistema (que delimitarão qual o enfoque a ser dado pelo governo para o turismo), filosofia e valores (definição de como e de que maneira deve ser desenvolvida a atividade turística na destinação), visão (que é um caminho a ser seguido por todos dentro da destinação, apontando onde se quer chegar com a exploração do turismo, sempre em conformidade com a filosofia e valores destacados anteriormente), auditoria (inventário dos principais atributos da destinação, suas forças e fraquezas, problemas e desafios quanto ao seu desenvolvimento futuro), análise competitiva/colaborativa (estudo relacionando a destinação e seus principais concorrentes, visando adotar as best practices aplicadas por seus oponentes), posicionamento da marca (verificação de como o mercado percebe a destinação em estudo em relação a seus concorrentes), desenvolvimento (conjunto de políticas integradas que façam convergir os esforços tanto da iniciativa privada quanto do setor público) e o monitoramento e avaliação (que é a mensuração a ser realizada quanto a eficácia do planejamento realizado, com o intuito de corrigir eventuais falhas e garantir que os objetivos traçados sejam alcançados).

Para que seja possível implementar e executar as políticas, planejamento e desenvolvimento definidos pelo quadro de referência descrito acima, Ritchie e Crouch (2003) definiram que deve haver uma camada de atividades voltadas à

gestão da destinação, onde serão destacadas as características marcantes dos recursos principais e dos atrativos, fortalecidas as qualidades dos fatores de suporte e ajustadas as condições para o melhor aproveitamento dos determinantes qualificadores e amplificadores da destinação. Dentre as atividades a serem executadas pela gestão da destinação os autores destacam: o marketing (encarregado de divulgar, promover e comercializar as potencialidades e atrativos da destinação, de acordo com a filosofia e valores estabelecidos), a experiência do serviço (que garantirá ao turista vivenciar momentos únicos durante sua estada no destino, fazendo com que ele saia satisfeito e com desejo de retornar outras vezes), a informação e pesquisa (o uso de sistemas de computação para dar suporte ao atendimento, reserva e venda de produtos, além de abastecer os gestores com dados estatísticos que auxiliem na tomada de decisão), a organização (responsável por todos os aspectos associados à correta execução do planejamento elaborado e também pelo desenvolvimento da destinação de forma integrada), a gestão de finanças e capital de risco (que garantirá fontes de financiamento, públicas e privadas para criação de novos empreendimentos privados que venham a contribuir para o desenvolvimento da destinação).

Além das atividades já citadas os autores evidenciam também: o desenvolvimento de recursos humanos (que é a qualificação e capacitação do capital humano para as atividades relativas à exploração do turismo, fazendo com que haja uma profissionalização nas questões inerentes ao relacionamento com os visitantes), a gestão dos visitantes (criação de um conjunto específico de políticas e estruturas para minimizar os impactos causados pelos visitantes na destinação, visando garantir as características locais e a manutenção da cultura e do patrimônio local), a gestão de crises (definição de ações e estratégias para enfrentar situações inesperadas que venham a afetar os turistas e até mesmo os residentes, como por exemplo, os atentados de 11 de setembro de 2001, nos Estados Unidos, ou a Tsunami de 2004 na Ásia) e por último, mas não menos importante a administração dos recursos (que visa garantir a preservação dos atrativos naturais ou culturais, fazendo com que haja um programa permanente de conservação e restauração no caso de patrimônios culturais e de preservação das belezas naturais).

A última camada de fatores apresentados por Ritchie e Crouch (2003) em seu modelo é a de determinantes qualificadores e amplificadores, que poderiam também

ter sido chamados de condições situacionais (tal como fora chamado por Porter [1989]), pois tais condições e fatores têm o poder de definir ou limitar o grau de competitividade de uma destinação. Os autores afirmam que esses fatores não têm atuação direta na competitividade, tendo, porém, influência por meio dos fatores oriundos das camadas inferiores do modelo até aqui discutido.

Os fatores apontados como significativos pelos autores são: a localização (que definirá quão atrativo pode ser um destino, devido à facilidade ou à dificuldade de acesso ao mesmo em função de sua localização), a interdependência (as relações de cooperação e competição entre destinos similares ou até mesmo entre destinos complementares que venham a alavancar o desenvolvimento em ambas as partes), a proteção e a segurança (uma vez que o número de turistas que desejam enfrentar situações de perigo é muito menor do que aquele que deseja desfrutar de sua viagem sem maiores transtornos), a consciência e imagem da destinação (fatores que impactam na decisão do visitante em se deslocar de seu local de origem até determinado ponto turístico, quanto maior for à consciência da população local e melhor imagem tiver o destino maior a probabilidade de ser escolhida pelos visitantes), o valor/custo (que pode ser avaliado sobre três aspectos: 1-o custo do transporte para e dentro do destino; 2-a taxa de câmbio; 3-o custo dos bens e serviços oferecidos no destino) e por último a capacidade de carga (que pode limitar a freqüência de turistas e definir o volume máximo de visitantes, sob pena de inviabilizar a exploração do negócio).