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O planejamento de projetos interdisciplinares em um clube de ciências

Para a elaboração de um projeto interdisciplinar ou multidisciplinar, é necessário que exista uma equipe disposta a trabalhar em grupo e que reconheça a importância bem como identifique as relações entre os conceitos fundamentais de cada disciplina. Isso facilita a escolha do tema inclusivo que deve ser reconhecido tanto pelo grupo que planeja quanto pelo grupo alvo do processo de aprendizagem.

Mapas conceituais facilitam o reconhecimento interdisciplinar a partir de um tema gerador. É fundamental escolher um tema que seja inclusivo e que faça sentido para todos os participantes envolvidos no processo possibilitando a diferenciação progressiva, com a inserção dos conceitos ancoras ou subsunçores, esses oriundos do conhecimento prévio de cada membro envolvido (Moreira, 1998; 2006a).

Os Parâmetros Curriculares Nacionais para Ensino Médio (PCNEM) – Ciências da Natureza, Matemática e suas Tecnologias (Brasil, 2002; Kawamura; Hosoume, 2003), as Orientações Curriculares para o Ensino Médio (OCEM) – Ciências da Natureza, Matemática e suas Tecnologias (Brasil, 2006) e Parâmetros Curriculares Nacionais (PCN) – Terceiro e Quarto Ciclos do Ensino Fundamental: Ciências Naturais (1998) colocam em destaque o ensino contextualizado e interdisciplinar a partir de eixos temáticos e temas transversais – PCN, e temas estruturadores e temas transversais – PCNEM.

No ensino fundamental o primeiro contato dos estudantes com os conceitos das ciências naturais é pela disciplina de ciências que poderia ser desenvolvida naturalmente de forma interdisciplinar. Segundo a proposta dos PCN, os eixos temáticos são: Terra e universo, Vida e ambiente, Ser humano e saúde e Tecnologia e sociedade (1998). Excelentes temas para fornecer aos estudantes explicações com fundamentos científicos sobre o cosmos, os fenômenos da natureza, condições adequadas para a vida saudável, benefícios das inovações tecnológicas e suas interações com o ser humano, sua vida em sociedade e o meio ambiente do ponto de vista indo da escala micro à macro.

De certa forma, esses documentos propõem que as Ciências Naturais – PCN ou as Ciências da Natureza – PCNEM (1998; 2002; Kawamura; Hosoume) sejam explicadas no contexto de vida dos estudantes, partindo de seu cotidiano. Portanto, considerando o mapa conceitual como uma ferramenta que pode ser usada de várias maneiras (Moreira, 2006a; 2006b), neste contexto de planejamento de projetos interdisciplinares em ciências naturais ou da natureza, a construção de um mapa conceitual usando esses temas propostos nos PCN ou PCNEM como conceito inclusivo é bastante oportuno.

Se o objetivo é a aprendizagem e o reconhecimento desta interdisciplinaridade por parte dos estudantes, então é essencial que se explore o seu conhecimento prévio com projetos adequados às suas condições de trabalho, de conhecimento e estudo. Dentro de uma perspectiva Ausubeliana, isso implica em realizar a diferenciação progressiva até os subsunçores, definir os projetos de estudo e pesquisa que explorem novos conceituas que irão se ancorar nos mesmos. No entanto, a interdisciplinaridade e a visão global da interligação entre as ciências naturais só serão reconhecidas pelos estudantes se a reconciliação integrativa for realizada no final de cada projeto ou à medida que novos conceitos sejam aprendidos (Moreira,1998; 2006a).

Para iniciar um projeto interdisciplinar usando mapas conceituais é importante analisar o contexto de trabalho, os objetivos, o grupo de trabalho e a comunidade a qual será atendida.

O desenvolvimento da proposta foi realizado no âmbito de um Clube de Ciências com estudantes de escolas públicas estaduais de cidades com baixo índice de desenvolvimento humano (IDH) do Paraná, de ensino fundamental e médio. Eles foram orientados pela equipe do projeto composta por acadêmicos de licenciaturas em física, química e biologia, e professores da Universidade Estadual de Ponta Grossa.

Em geral, durante o ano os clubes desenvolveram estudos sobre um tema escolhido pelos estudantes. A partir do tema os professores e acadêmicos elaboraram uma dinâmica de planejamento com a construção de mapas conceituais. Esta dinâmica é reproduzida com participação dos estudantes integrantes dos clubes os quais montam também seus próprios mapas conceituais sobre o tema em tela.

Assim, exposto o tema os acadêmicos listavam conceitos relacionados e então montavam o mapa conceitual usando-se os elementos de ligação. Alguns elementos de ligação fizeram surgir novos conceitos contribuindo para a coerência do mapa. Em princípio isto poderia levar a um direcionamento do mapa, todavia também poderia ser mais uma forma externar conceitos não lembrados e contribuir para a sua fixação junto aos outros conceitos. Com uma

equipe interdisciplinar os conceitos surgidos eram naturalmente dotados dessa característica, mas à medida que o processo avançava a disciplinaridade surgia em ramos específicos.

Sabe-se que a utilização dos mapas não garante a aprendizagem interdisciplinar e o reconhecimento das interligações entre os conceitos, entretanto é importante que se proceda a reconciliação integrativa, que envolve a discussão e comparação dos mapas produzidos. Por isso, com a intenção de efetivar a reconciliação integrativa, a cada reunião semanal nos clubes todos os grupos apresentavam os trabalhos desenvolvidos e no final de cada ano uma apresentação de todos os trabalhos concluídos foi feita para a comunidade onde a escola se insere.

Aquecimento global: tema em tela em um clube de ciências

No primeiro ano os estudantes e acadêmicos não tinham uma noção clara do trabalho que poderia ser desenvolvido em um clube de ciências. Assim, foi proposto pelos professores o tema “Aquecimento global”, tema que atualmente está em destaque na mídia e no cotidiano dos estudantes em virtude dos fenômenos climáticos, e mais pontualmente naquele momento um fato se destacava e reforçou a escolha pela equipe: a aventura do padre paranaense Adelir de Carli, esse tema também contempla plenamente as propostas dos PCN e PCNEM (Brasil, 1998; 2002; Kawamura; Hosoume).

Os acadêmicos desenvolveram o mapa conceitual apresentado na Figura 5. A diferenciação progressiva foi desenvolvida até o ponto em que surgiam conceitos importantes das disciplinas onde projetos de investigação poderiam ser realizados para uma aprendizagem significativa. E os acadêmicos atribuíram maior importância a projetos que envolviam experimentos visto que os estudantes dos clubes não tinham aulas em laboratórios. Todos os projetos desenvolvidos seguiram aos critérios de observação, hipótese, experimentação, análise de dados e conclusão.

Figura 5 – Mapa conceitual do tema gerador Aquecimento global.

Em uma assembleia do clube os estudantes montaram, em grupo, seus próprios mapas a partir de uma dinâmica onde eram incitados a escrever uma lista de conceitos relacionados ao aquecimento global e aos conceitos. Os grupos foram naturalmente formados com estudantes da mesma série ou faixa etária o que permitiu observar que os mais velhos construíam mapas mais detalhados e maior profundidade de ramificação. Além disso, a ramificação mais destacada por eles ocorreu nos conceitos de maior interesse de aprendizagem (Mayer et al, 2009; Veronez et al, 2009a; Silva et al, 2009).

Para observação do problema do aquecimento global os estudantes montaram um terrário e fizeram observações sobre as mudanças que nele ocorriam. Foram desenvolvidos estudos sobre: a água (estrutura molecular, tensão superficial, capilaridade, densidade e tratamento); a evolução e reprodução das plantas; crescimento de bactérias; uso do microscópio; vulcão; pressão; empuxo e clima (com a montagem de uma estação meteorológica com materiais de fácil acesso e baixo custo). E como fato pontual, destaca-se a discussão e estudo realizado sobre a aventura do padre paranaense Adelir de Carli porque os estudantes reconhecerem o erro da aventura, mas poucos compreendiam, até então, os fenômenos climáticos envolvidos, sobre GPS ou outros equipamentos tecnológicos necessários para uma aventura com essa (Veronez et al, 2009a; 2009b; Silva et al, 2009; Colmann et al, 2009).

Um convite feito aos membros de um clube de ciências: vamos viajar ao espaço?

No segundo ano, como era o Ano Internacional da Astronomia, decidiu-se pelo tema: “Vamos viajar ao espaço?”. Não é preciso dizer que o tema, além de ser atual, estava em constância na mídia e contempla tanto os PCN e os PCNEM (Brasil, 1998; 2002; Kawamura; Hosoume). A partir das necessidades essenciais para realizar uma viagem simples, os acadêmicos e depois os estudantes, montaram uma lista de conceitos que resultou no mapa conceitual da Figura 6 no qual é possível observar os elementos resultantes das dinâmicas realizadas. Evidentemente que o mapa conceitual poderia ir além e ser mais ramificado, no entanto foi construído pelo grupo no momento inicial das atividades e neste ponto atendia aos objetivos propostos. Foram identificadas necessidades relacionadas à comunicação, a vestimentas, aos transportes e aos alimentos. Tais necessidades resultaram em trabalhos sobre: calorias dos alimentos; alimentos desidratados; aquecedor solar; condução térmica; calor; temperatura; foguetes; foguete à pressão; combustíveis; satélites; o olho humano; ótica geométrica e construção de uma luneta de Galileu (Gaudêncio et al, 2010; Passoni et al, 2010a; 2010b).

Figura 6 – Mapa conceitual do tema gerador Vamos viajar ao espaço?. Energia: o princípio de conservação e as relações entre geração e utilização

No terceiro ano o tema gerador foi energia, a partir do qual os estudantes trabalharam com a proposição da montagem da maquete de um parque de diversões, forma na qual o tema estava totalmente inserido em um contexto próprio da idade dos estudantes integrantes dos clubes e em pleno acordo com os PCN e PCNEM (Brasil, 1998; 2002; Kawamura; Hosoume). Assim, Foram

desenvolvidas oficinas acerca dos principais modos de geração de energia com uma atenção especial ao principio de conservação de energia. O mapa conceitual proposicional das atividades relativas ao tema energia é mostrado na Figura 7. Para trabalhar o conceito de energia, transformações, fontes e utilização da energia, o motor simples tem um grande potencial e apelo didático para ser usado em clubes de ciências e salas de aulas do ensino formal. Tal procedimento deve-se ao fato de que em avaliação prévia foi observado que a maioria do grupo associou energia a aparelhos que funcionam usando o motor elétrico. O motor simples nada mais é do que uma bobina móvel ligada a uma bateria e próxima a um ímã permanente, utilizada para demonstrar a interação do campo magnético da bobina e do ímã. Esta interação causa na bobina um movimento rotativo, princípio básico dos motores elétricos. Na sequência das atividades foram trabalhados outros processos envolvendo formas diferentes de energia tais como processos de geração e ou transformação de formas de energia como, por exemplo: hidroelétricas, termoelétricas, baterias, geradores eólicos e geradores solares fotovoltaicos.

A construção de baterias e pilhas permitiu o estudo da energia química e conceitos como reações químicas, oxi-redução e ácidos e bases. Por outro lado, a produção de biodiesel permitiu o estudo de síntese química, calor de combustão, calorias, viscosidade e a ação poluente dos combustíveis. Foram abordados ainda aspectos relacionados à energia dos alimentos. Para finalização do projeto foi montada uma miniatura de um parque de diversões usando todas as formas de transformação de energia estudadas.

Com a realização dessas atividades percebeu-se que o ensino praticado nas escolas é calcado nos moldes tradicionais, apoiado apenas no uso do giz e quadro negro. Isto é percebido quando os alunos não conseguem entender os fenômenos físicos de um objeto tecnológico como um todo. O resultado final das atividades foi que a experimentação em clubes de ciências é um fator determinante para facilitar a compreensão mais aprofundada dos conceitos trabalhados no ensino formal.

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