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Os sentidos da docência: teceduras em movimento

Universidade de São Paulo (2000) É pesquisadora do GEPEFE Grupo de

2.6.2 Os sentidos da docência: teceduras em movimento

Nossas sociedades marcadas pela complexidade também complexificaram as (novas) atribuições da escola e dentro delas é que os professores e professoras realizam o seu trabalho, sendo nessa perspectiva cobrados pela sociedade. Porém, como resultado de análises apressadas e lineares da situação educacional, acabam por ser responsabilizados pelo insucesso da escola e dos sistemas de ensino. Leite (2010) lembra que em geral não são levados em conta aspectos importantes, tais como condições de trabalho, problemas referentes à formação e às próprias fragilidades do sistema educacional no que se refere às políticas públicas; esses, entre outros fatores, contribuem para o aumento da sensação de desorientação que tem ocupado o cenário educacional na atualidade. A autora chama a atenção para o equívoco em responsabilizar unicamente os professores e professoras pelo fracasso escolar. “Tal como os alunos, eles são também vítimas de uma política educacional que não promove seu desenvolvimento profissional [...] da falta de empenho da sociedade na construção de sua valorização profissional [...]”. E alerta que o processo de formação docente necessita ser pensado neste cenário complexo, especialmente se o que desejamos é uma escola exigente e democrática. “Não é de admirar que nos últimos tempos não apenas o professor, mas também as instituições educacionais passem uma sensação de desorientação que faz parte da confusão que envolve o futuro da escola e do grupo profissional,” argumenta Imbernóm (2000, p. 109). Onde há desorientação, geralmente se constata falta de sentido. E se falta sentido, é de se perguntar quais valores e princípios nutrem essas instituições e as práticas desses professores e professoras. Observando docentes, o que transparece em boa parte das falas e das práticas é o tom cauterizante da reclamação que fecha caminhos, inibe possibilidades, desejos e projetos; o que permanece é uma quase certeza de não ter feito o que deveria, o que precisaria, o que gostaria. Caracteriza-se assim uma docência cujo

100 Cf. OSTETTO, Luciana. Para encantar é preciso encantar-se: danças circulares na formação de professores. Cad. CEDES, Campinas, v. 30, n. 80, apr. 2010.

sentimento é a falta: falta de condições, falta de formação, falta de experiência, falta de desejo, falta de entusiasmo, falta de prazer, como se existisse uma espécie de pedagogia da ausência, tamanha é sua força, expressão e repercussão, especialmente nos contextos das escolas públicas. Nesse processo muitos e muitas são vítimas da “síndrome da desistência”101 que se manifesta pela consequente despersonalização gerada pela baixa valorização social e reduzida realização pessoal; a exaustão emocional decorrente do volume excessivo e cada vez mais crescente de trabalhos/tarefas é um dos principais sintomas.

Por outro lado, há aqueles e aquelas que apostam numa formação centrada nas metodologias; em prescrições no formato de receituários conclusivos sobre “como fazer para” resolver determinadas situações emblemáticas que envolvem os contextos de ensino e aprendizagem; como se existisse uma espécie de princípio fundante que explicaria a constante busca que poderia, em tese e para esses professores e professoras, ser suprida unicamente pela formação técnica. Esse olhar acaba por reduzir a docência à utilização de metodologias muitas vezes equivocadas, ao mesmo tempo em que oculta problemas que demandariam outros saberes para a sua superação. Essa é uma herança que faz parte da história da pedagogia e da docência, fortemente inscrita pelas concepções tradicionais, especialmente pela tendência tecnicista que ocupou o cenário educacional desse país por muitos anos, empobrecendo o campo da Educação Básica. Não é sem razão que tantos se debruçam nos cursos de formação em busca do “como” fazer e pedem por isso, dando a entender que o problema é de ordem metodológica. Como decorrência, vê-se ainda muitos professores e professoras educando crianças e jovens nesse mesmo princípio, ou seja, analisando o que não possuem para supri-los do que lhes falta, como se a docência fosse um preenchimento e como se isso fosse suficiente para educar alguém. Ora, essa forma de atuar indica as concepções que movem esses professores e professoras e sugere a necessidade de

101 Uma importante pesquisa sobre saúde dos trabalhadores em educação foi realizada pela Confederação Nacional dos Trabalhadores em Educação (CNTE). Esta pesquisa, intitulada Educação: carinho e trabalho – Bournout, a síndrome da desistência do educador, que pode levar à falência da educação (Brasília, CNTE, 1999), foi o mais amplo levantamento já realizado a respeito da educação em todo o mundo. Foram entrevistados 52 mil professores e funcionários de escola em 1.440 unidades das redes públicas estaduais, nos 27 municípios do Brasil. A pesquisa teve duração de dois anos.

processos formativos vivenciados, especialmente na formação continuada.

A concepção desses professores e professoras contém uma carga histórica decorrente de várias abordagens teóricas, sobretudo aquelas de origem positivista que por muito tempo foram os pilares dos processos formativos para a docência. Mas há outros fatores que concorrem à sedimentação desse sentido e de seus efeitos e que ocupa o imaginário sobre a educação. É importante trazê-los à baila para que possam ser analisados, compreendidos, tornados conscientes. Um desses fatores é a despersonalização que em geral não se manifesta em outros campos sociais. Esse, entre outros problemas, têm contribuído gradualmente na projeção de imagens deturpadas da docência e na consequente invisibilização da pedagogia e do papel do pedagogo.

Desde logo, desconfio que a superação da pedagogia da ausência ou da carência e a construção de uma pedagogia da potência102, uma pedagogia de intensidades, passe por alguns caminhos talvez ainda não percorridos. Para a análise de um deles faço uso do convite de Jorge Larrosa103 (2002) para pensar a educação a partir do par

102 Agradeço ao prof. Dr. Wladimir Garcia pela contribuição singular que trouxe a este estudo por várias razões, particularmente ao sugerir a utilização desta expressão. Sua brilhante análise e as ponderações feitas no momento da qualificação me possibilitaram redimensionar conceitos e sentidos para a própria pesquisa. Ensinou-me que “toda boa tese ouve vozes. Nesse sentido, ela é esquizofrênica.” Esta analogia entre muitas outras tive a oportunidade de escutar desde o período em que cursei as disciplinas, onde fui afetada pela potência de suas aulas, quando nos apresentou Spinoza, Deleuze, entre outros. “A potência se estende para além das condições dadas pelo conhecimento (no caso do corpo) e da consciência (no caso do espírito). O conhecimento das potências do corpo descobre, paralelamente, as potências do espírito que escapa à consciência. Ao desvalorizar-se a consciência em relação ao pensamento, descobre-se o inconsciente do corpo e do espírito. A consciência torna-se o lugar de uma ilusão. Seu método sintético de intervenção deriva da percepção da causa em direção ao efeito. [...].” (GARCIA, W. Ética e Razão Metodológica. s/d, p. 04. (texto mimeo) Este texto foi disponibilizado pelo professor em suas aulas (2008/1). No ano de 2009 o artigo foi publicado. Cf.: GARCIA, Wladimir Antônio da Costa. Ética e Razão Metodológica. In: CARVALHO, Diana Carvalho de; LATERMAN, Ilana; GUIMARÃES, Leandro Belinaso; BORTOLOTTO, Nelita (orgs.). Experiências pedagógicas com o ensino e formação docente: desafios contemporâneos. 1ª edição; Junqueira&Marin Editores. Araraquara – SP; p. 113-128.

103Jorge Larrosa Bondía é doutor em Pedagogia pela Universidade de Barcelona – Espanha, onde é professor titular de Filosofia da Educação do Departamento

experiência/sentido. Esse movimento de pensamento e ação talvez possa ser gerador de ferramentas e matéria-prima adequada para a edificação de pontes, margens e/ou de desvãos, como citei anteriormente. Um movimento construtor de pontes que interliguem teoria e prática, na perspectiva da prática teórica gerando confiança, conforto e segurança necessários à travessia, sentimento de sossego. Espera-se que seja também um movimento produtor de margens, constituindo espaços intersticiais para mediar processos de análises e possibilidade de novas criações; e que também potencialize desvãos, pelo seu efeito gerador de desassossego, por quebrar certezas absolutas. Esse movimento de pensamento e ação circular e de conjunto é construtor de pontes pela capacidade de interligar falas geradoras de diálogos; produz margens porque intensifica as relações entre saberes e sujeitos; e potencializa desvãos porque cria espaços intervalares geradores de silêncio e de escuta ativa; uma tríade entendida como experiência, no dizer de Larrosa (2002, p. 21), ou seja, “o que nos passa, o que nos acontece, o que nos toca.”

A palavra experiência vem do latim experiri, que significa provar/experimentar. Tanto nas línguas germânicas, como nas latinas, a palavra experiência contém inseparavelmente a dimensão de travessia e perigo. “A palavra experiência tem o ex de exterior, de estrangeiro104, de exílio, de estranho, e também o ex de existência.” (Idem, p. 25).

Mas como fazer essa travessia em uma sociedade que tem por base o signo da informação105? Para o autor, isso é praticamente

de Teoria e História da Educação. Realizou estudos de pós-doutorado no Instituto de Educação da Universidade de Londres e no Centro Michel Foucault da Sorbonne em Paris. Foi professor convidado em várias universidades europeias e latino-americanas. Publicou diversos artigos em periódicos brasileiros e tem dois livros traduzidos para o português: Imagens do outro (Vozes, 1998) e Pedagogia profana (Autêntica,1999). Essas entre outras publicações são utilizadas neste estudo.

104

Conforme nota do tradutor, as palavras estrangeiro e estranho em espanhol são escritas com x (extranjero e extraño).

105 Larrosa (2002) destaca que a ênfase contemporânea está na informação, em estar informados, daí toda a retórica destinada a constituir-nos como sujeitos informantes e informados. O sujeito da informação, diz o autor, sabe muitas coisas, passa seu tempo em busca de informação. O que mais o preocupa é não ter informação o bastante; cada vez sabe mais, cada vez está melhor informado, porém, com essa obsessão pela informação e pelo saber (mas saber não no sentido de ‘sabedoria’, mas no sentido de ‘estar informado’), o que este sujeito consegue é que nada lhe aconteça. Larrosa alerta para a necessidade primeira de

impossível. A experiência nessa sociedade é cada vez mais rara por excesso de opinião e de trabalho, por falta de tempo. Larrosa distingue experiência de trabalho. Para ele, o sujeito moderno se relaciona com o acontecimento na perspectiva da ação. Tudo é pretexto para sua atividade. A experiência de que nos fala, é algo outro; demanda certos movimentos aparentemente incompatíveis com esse sujeito da modernidade.

A possibilidade de que algo nos aconteça ou nos toque, requer um gesto de interrupção, um gesto que é quase impossível nos tempos que correm: requer parar para pensar, parar para olhar, parar para escutar, pensar mais devagar, olhar mais devagar, escutar mais devagar; [...] cultivar a atenção e a delicadeza, abrir os olhos e os ouvidos, falar sobre o que nos acontece, aprender a lentidão, escutar aos outros, cultivar a arte do encontro, calar muito, ter paciência e dar-se tempo e espaço. (Idem, p. 24).

Como conseguiremos esse intento nos tempos em que vivemos? Larrosa (2002) diz que o sujeito moderno não só está informado e opina,

separar a experiência da informação. E sobre o saber da experiência o autor destaca que é necessário separá-lo de saber coisas, tal como se sabe quando se tem informação sobre as coisas, quando se está informado. E o que nos dá essa possibilidade é a língua. Diz o autor que depois de assistir a uma aula ou a uma conferência, depois de ter lido um livro ou uma informação, depois de ter feito uma viagem ou de ter visitado uma escola, podemos dizer que sabemos coisas que antes não sabíamos, que temos mais informação sobre alguma coisa; mas, ao mesmo tempo, podemos dizer também que nada nos aconteceu, que nada nos tocou, que com tudo o que aprendemos nada nos sucedeu ou nos aconteceu. Além disso, seguramente todos já ouvimos que vivemos numa ‘sociedade de informação’. E já nos demos conta de que esta estranha expressão funciona às vezes como sinônima de ‘sociedade do conhecimento’ ou até mesmo de ‘sociedade de aprendizagem’. Não deixa de ser curiosa a troca, a intercambialidade entre os termos ‘informação’, ‘conhecimento’ e ‘aprendizagem’. Como se o conhecimento se desse sob a forma de informação, e como se aprender não fosse outra coisa que não adquirir e processar informação, diz Larrosa (2002, p. 21-2). Cf.: LARROSA, Jorge. Notas sobre a Experiência e o Saber de experiência. Tradução: João Warderley Geraldi. Revista Brasileira de Educação – ANPED. Jan/Fev/Mar/Abr; 2002, nº 19.

Disponível em

http://www.anped.org.br/rbe/rbedigital/RBDE19/RBDE19_04_JORGE_LARR OSA_BONDIA.pdf Acesso em 06 nov/2010.

mas também é um consumidor voraz, curioso, impenitente e eternamente insatisfeito. Que deseja estar constantemente excitado; incapaz de silenciar. Tudo o atravessa, mas nada lhe acontece. A velocidade, tanto quanto a ausência de silêncio e de memória, são inimigas mortais da experiência. Da mesma forma os aparatos educacionais têm funcionado cada vez mais intensamente no sentido de impossibilitar que algo de fato nos aconteça. Dentro dos contextos complexos das instituições educativas, principalmente das escolas, nas suas rotinas diárias, nos processos acelerados de formação continuada, na vida mesma de professor e professora, este sujeito já não tem tempo. E esse sujeito, nesse momento histórico, talvez mais do que qualquer outro, precisa ser um sujeito da experiência.

Concordo com o entendimento de Larrosa (2002) quando argumenta que esse sujeito da experiência “é um território de passagem”; um espaço onde os acontecimentos têm lugar. Ele “[...] se define por sua receptividade, por sua disponibilidade, por sua abertura. [...] uma passividade feita de paixão, de padecimento, de paciência, de atenção. [...] O sujeito da experiência é um sujeito ‘ex-posto’” (Idem, p.24-5). E nessa condição ele tem saber. Larrosa distingue também experiência de trabalho, pois para ele o saber da experiência é o resultado da mediação entre o conhecimento e a vida humana; o autor atribui à experiência uma espécie de função mediadora. Esse saber “[...] é um saber particular, subjetivo, relativo, contingente e pessoal. [...] não está como o conhecimento científico fora de nós, [...] uma forma humana singular de estar no mundo que é por sua vez uma ética (um modo de conduzir-se) e uma estética (um estilo)”. (Idem, p. 27).

Penso que Gregory Bateson (1986) segue nessa perspectiva quando diz enfaticamente que a maneira mediante a qual as pessoas adquirem conhecimentos decorre sempre da observação e da experimentação (ou de uma experiência). Nesse sentido, talvez possamos nos valer da experiência como mediadora entre o conhecimento e a vida (de e em cada professor e professora) nos processos formativos; como uma possibilidade de interlocução entre o sujeito professor e professora moderno e o sujeito da experiência, professor e professora que se volta para si mesmo. Larrosa (2010, p. 51- 2) define como sendo “uma bela imagem para um professor: alguém que conduz alguém até si mesmo. [...] alguém que, sem exigir imitação e sem intimidar, mas suave e lentamente nos conduziu até nossa própria maneira de ser: alguém, em suma, a quem poderíamos chamar de ‘professor’.” [aspas inseridas pelo autor].

Trata-se, portanto, de um desafio a quem aprende, diz Hardt (2006, p. 7), uma vez que “aprender não significa repetir, tornar-se discípulo do outro, mas encontrar sua própria forma depois da experiência obtida e vivenciada”. Pensar os processos de formação continuada de professores e professoras, nessa perspectiva de intensidade, é considerar o sentido da própria profissão em termos de “modernização”.

É de se perguntar: “como pensar uma escola capaz de romper com essa violência chamada ‘modernização’? Como não cair nas armadilhas de uma pedagogia como ciência?” Essas perguntas feitas por Marilena Chauí (1992, p. 60), no artigo “O que é ser educador hoje?”, são respondidas a partir de Platão que destaca a necessidade de recuperar a escola como arte, assim como a natureza sensível da pedagogia. “Platão pretende afastar toda pedagogia que não esteja comprometida com o conhecimento simultâneo do verdadeiro e do justo, que para ele são o próprio bem e o belo. [...]”. Para Platão, a Pedagogia seria um aspecto da Filosofia mais direcionado àquelas pessoas que não esqueceram inteiramente da verdade antes contemplada. “[...] Pedagogia e Filosofia, destinadas a liberar o espírito das sombras da caverna, pô-lo em contato com a luz fulgurante do Bem/Belo.” (Idem, p. 60).

Portanto, aprender tem sentido quando o sujeito é considerado, tanto quanto a sua história. Quando sua concepção de vida, suas expectativas, sua autoimagem e a imagem que pretende dar de si aos outros é valorizada e considerada, essa prerrogativa aplica-se a toda pessoa em processo de aprendizagem; portanto, às crianças nos contextos de ensino e aos professores e professoras em seus processos formativos.

Portanto, vale dizer que embora exista a tendência de analisar a docência e seus aspectos sob a perspectiva da falta, da ausência/carência, como citado anteriormente, o convite que fiz anteriormente nesta tese e neste momento reitero é o de adotar outra abordagem, a da intensidade. De acordo com Valla (1998, p. 197-198), essa perspectiva “[...] traz dentro de si a idéia de iniciativa, de lúdico, de autonomia”; acrescenta-se também a de potencialidade, elementos caros à sensibilidade no exercício da docência, e necessários à abordagem de educação intercultural. Essa sensibilidade pressupõe silêncio, escuta e intuição sintonizadas com a vida; pressupõe desejo e vontade de aprender.

Essa perspectiva remete operar em dobras, no dizer de Deleuze; sinaliza a possibilidade de reverberação que uma pesquisa pode

alcançar, especialmente se o foco for uma abordagem rizomática. Deleuze e Guatarri (1995) dizem que num rizoma entra-se por qualquer lado, cada ponto se conecta com qualquer outro, não há um centro, nem uma unidade presumida - em suma, o rizoma é uma multiplicidade. Mas para realizar esse intento, é preciso conclamar a universidade nas instâncias do ensino, da pesquisa e da extensão, principalmente na atual conjuntura, momento marcado pela sedimentação em nível nacional da reforma106 universitária. Valdemar Sguissardi (2000, p. 09) diz que "a educação superior no Brasil não é um desafio novo. Além de antigo, continuará sendo um enorme desafio que se desdobra em múltiplos desafios menores, todos eles de inegável e incômoda relevância”. E no âmbito da extensão, especialmente no que se refere à formação continuada de professores e professoras, parece que esse “desafio menor” adquire proporções muito maiores, uma vez que lida com algo candente nos processos formativos, ou seja, a formação continuada para a docência.

É com este olhar que faço uma breve parada para sintetizar as trilhas visitadas neste capítulo até então. Busquei, neste trecho do caminho, destacar que a docência, por sua complexidade, evidencia aspectos cada vez mais recorrentes e polêmicos nos debates educacionais das décadas contemporâneas; convoca o fazer e o ser docente para a arena dos conflitos pertinentes aos espaços de atuação e de formação. Para isso procurei contextualizar a docência e os processos formativos a ela relacionados como “territórios de passagem”, no dizer de Larrosa. Meu intento foi mostrar a importância e a necessidade de ampliar as condições aos professores e professoras para que (melhor) compreendam a sua atuação e sua formação, assim como o contexto social onde suas práticas acontecem, ou seja, a partir do contexto de seu trabalho, mesclado por distintos interesses e valores.

106 A reforma universitária consistiu um dos principais projetos da Secretaria de Ensino Superior - SESu para a educação superior, implementados no governo Luiz Inácio Lula da Silva. A reforma entrou em pauta de discussão com maior visibilidade desde que Tarso Genro assumiu a pasta da Educação no Ministério. O objetivo consistiu em elaborar uma proposta de Lei Orgânica da Educação Superior. Cabe destacar também os programas, tais como: PROUNI - Programa Universidade para Todos; Política de Cotas; Novas normas para ensino superior; Programa de Modernização e Qualificação do Ensino Superior; FIES - Financiamento Estudantil; PET - Programa Especial de Treinamento; Universidade Milton Santos; e PROEXT - Programa de Apoio à Extensão Universitária 2004. (BRASIL, 2004).

Entendo que esse processo se dá por meio da experiência porque o sujeito aprende através dela. É no coletivo que se aprende; e coletivo, neste estudo, é entendido no sentido dado por Guatarri (2008, p. 20) “[...] de uma multiplicidade que se desenvolve para além do indivíduo, junto ao socius, assim como aquém da pessoa, junto a intensidades pré- verbais, derivando de uma lógica de afetos mais do que de uma lógica de conjuntos bem circunscritos.” Por isso, o processo de formação precisa ser entendido, pensado e exercido mediante práticas individuais, mas em contextos coletivos; e estar ativamente nesses contextos de coletividade também requer aprendizagem; em outras palavras, que cada professor e professora possa empreender esse processo em si e a partir de si mesmo, tendo a si por referência para então chegar (ou não) ao coletivo. Um caminho possível é compreender sua prática e dentro dela tomar consciência do seu agir. Reconhecer a importância de uma base reflexiva, sensível e afetiva na sua atuação profissional; uma docência a partir da pessoa do professor e da professora e sua singularidade. Professores e professoras merecem e necessitam ser afetados, tocados para que se percebam como sujeitos da experiência e