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1 PANORAMA ATUAL DAS RELIGIÕES

No documento Diversidade Religiosa e Direitos Humanos (org) (páginas 170-173)

Novos movimentos religiosos e

1 PANORAMA ATUAL DAS RELIGIÕES

Neste início do terceiro milênio da era cristã podemos, de modo simplificado, definir a presença das religiões da seguinte maneira: subsis- tem as religiões tradicionais, algumas delas com milhares de anos; e exis- tem as novas expressões peculiares da atualidade, que não deixam de ter fundamento nas antigas.

Por tradicionais designamos não só as de matriz indígena, africa- na ou de outros continentes, como as que, há cerca de cinco mil anos, se originaram e desenvolveram quando se formaram as organizações políti- cas dos Impérios – Egito, Babilônia, Índia, China – e com eles as escolas, a escrita e as classes sacerdotais. Todas elas têm origens anteriores (como os livros dos Vedas), que remontam ao final da era glacial e ao início da agricultura, e todas subsistem quer em textos arcaicos (como o do livro do Gênesis, o primeiro da Torah, ou Pentateuco, que o Alcorão reinterpreta), quer em formas reinterpretadas e adaptadas como, por exemplo, os tem- plos egípcios da Antiga e Mística Ordem de Rosa Cruz (AMORC), em Curitiba.

Por novas religiões entendemos as que de algum modo têm ca- racterísticas próprias ligadas à nova mentalidade das últimas duas ou três gerações, por exemplo: mais comunicabilidade e menos dogmática, o que implica em menor grau de intolerância mútua, e menor grau de instituciona- lização eclesiástica. Nestas também se podem distinguir diferenças: há aquelas que são ramificações de outras tradicionais, como os pentecostais, e há as que são resultado de sincretismo, quase sempre de religiões locais com o Cristianismo, como a Igreja Messiânica ( japonesa) e os cultos dos índios norte-americanos (dança dos espíritos e cultos do peyote). Ainda se pode distinguir outra diferença nas novas religiosidades e religiões: as que se opõem à Nova Era (New Age) e as que contribuem para a mentali- dade da Era de Aquário.

Na convicção de seus adeptos e divulgadores, a Era de Aquário seria o resultado da atuação de forças cósmicas geradas pelo zodíaco quan- do este for presidido pela constelação de Aquário. Estas forças produzirão no universo uma era de paz e fraternidade. Tal convicção se acentuou nos anos de 1960/70 quando o musical Hair teve sucesso com a música Aquarius e a juventude mundial foi agitada por ideias e movimentos como os hippies, a revolução de maio de 1968, o festival de Woodstock (1969) e as músicas dos Beattles.

Por Nova Era entendemos, pois, em termos gerais e abrangentes, uma ampla tendência universal com múltiplas origens; não é uma religião, mas uma mentalidade potencialmente religiosa, que não é sustentada ofi- cialmente ou formalmente por ninguém, mas é partilhada por todos. Ela surgiu em parte pela atração exercida por uma grande variedade de cren- ças não ocidentais ou pré-cristãs, e como reação contra a dificuldade do Cristianismo institucional se adaptar às novas condições de vida. Há que

ter em conta, porém, que essa reação é muitas vezes subjetiva, mais devi- da à falta de formação cristã das pessoas do que aos recursos doutrinais e devocionais do Cristianismo.

A Nova Era é uma mentalidade não organizada, com elementos religiosos ou capazes de influir nas religiões, tendencialmente panteísta1

(Deus é o Todo, a Força), não autoritária (prefere pequenos grupos autô- nomos, anarquista), ecológica e cósmica (Era de Aquário). Defende a su- peração da razão lógica tradicional pela aceitação de outras racionalidades e formas de intuição. Está mais voltada para a meditação que para a ora- ção (ausência do sentido de transcendência); é, no dizer de Leila Amaral (2000), uma “cultura religiosa errante”. É um “caldeirão” de onde algo vai nascer, mas que ainda está indefinido.

Por este breve enunciado já se podem afirmar quatro questões gerais sobre as novas religiosidades/religiões nos dias de hoje: a) nunca houve tanta variedade e multiplicidade de religiões e religiosidades; b) todas elas de alguma forma têm raízes em religiões anteriores; c) quase todas têm algum tipo de sincretismo com o Cristianismo; d) no que se refere aos direitos humanos, a sua negação, tácita ou aberta, vem muitas vezes das instituições de origem ou das concorrentes, já que muitas reli- giões contemporâneas estão imbuídas de mentalidade capitalista. É jus- tamente esta lógica de concorrência que produz alguns dos discursos e práticas de intolerância, negando o direito à liberdade de pensamento, crença e religião. Mas há agravantes: algumas novas igrejas, inclusive vá- rias delas com forte presença no Brasil, desenvolveram a partir da ética do capitalismo (lembre-se Max Weber) uma Teologia da Prosperidade que incentiva a busca do enriquecimento pessoal e a obtenção de bens mate- riais como prova da proteção divina. São, porém, precisamente essas de- nominações que se mostram mais agressivas contra novos movimentos e tendências religiosas menos materialistas.

Na mentalidade religiosa contemporânea, portanto, nem tudo é Nova Era: por exemplo, nas religiões tradicionais institucionalizadas há fortes setores que resistem muito à influência desta tendência e, entre as novas religiões, as chamadas “de salvação” (que propõem a libertação de

1 Panteísmo é a doutrina que ensina ser Deus a única substância existente, o qual se

manifesta nos diversos entes visíveis. Os filósofos, no decorrer dos séculos, têm apresentado o panteísmo ora como a crença de que “tudo é Deus e Deus é tudo”, ora afirmando que Deus é a alma do mundo ou o princípio imanente que dá subsistência ao mundo. A rigor, não se pode falar em religião panteísta, pois se trata de um fenômeno que se manifesta em várias religiões (SCHLESINGER; PORTO, 1995).

condições sociais e políticas opressivas) também não têm afinidade com a nova mentalidade. De fato a Nova Era, ao contrário de muitas novas reli- giões que nasceram no seio de populações pobres e frequentemente opri- midas, circula em grande parte na classe média, como se pode constatar pelos anúncios de cursos e seminários realizados em lindas pousadas.

No documento Diversidade Religiosa e Direitos Humanos (org) (páginas 170-173)