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PARADIGMAS DO PRIMING: ESTRATÉGIAS DE MEDIDA DO PRECONCEITO IMPLÍCITO O termo priming foi utilizado pela primeira vez na década de 1950 por Lashley

1 P RECONCEITO : ASPECTOS TEÓRICOS E METODOLÓGICOS

1.7 A UTOMATICIDADE , ESTEREÓTIPOS E MEDIDAS DO PRECONCEITO AUTOMÁTICO

1.7.1 PARADIGMAS DO PRIMING: ESTRATÉGIAS DE MEDIDA DO PRECONCEITO IMPLÍCITO O termo priming foi utilizado pela primeira vez na década de 1950 por Lashley

para designar uma ativação interna temporal de determinadas tendências de resposta, quer dizer, um tipo de preparação mental de nossas representações em função da resposta que se deseja emitir. Posteriormente Storms, na mesma década, realizou um experimento que resultou na descoberta da forma passiva de priming. Na Psicologia Social, o primeiro estudo foi realizado por Higgings, Rholes e Jones (1977). Neste estudo, foi apresentado aos sujeitos um conjunto de atributos relativos à personalidade, no entanto, enquanto alguns participantes deveriam memorizar características positivas, outros participantes deveriam memorizar características negativas. Em seguida, era apresentada uma tarefa de formação de impressões sobre uma pessoa que apresentava uma conduta ambígua, sem que os participantes pudessem perceber que esta segunda tarefa estava relacionada à primeira. O interesse nesta investigação consistiu em averiguar se os participantes, inconscientemente, eram influenciados pelos traços de personalidade apresentados no início do estudo quando

construíam uma impressão sobre a pessoa alvo do estudo. Os resultados mostraram que sim. Os participantes que liam as características positivas tendiam a formar impressões mais positivas que negativas da pessoa alvo.

Para Mcnamara e Holbrook (2003), o estudo do fenômeno priming constata que a memória funciona por meio de processos múltiplos, pois demonstra que a apresentação prévia de um estímulo pode tornar mais acessível ou inibir um segundo estímulo. Neste sentido, o priming tem sido caracterizado como um tipo de memória implícita que não requer a recordação consciente e intencional e que depende de mecanismos diferentes daqueles envolvidos com a memória explícita, posto que seu efeito ocorre mesmo em pessoas com amnésia provocada por lesões do lobo temporal medial (ver Oliveira et al., 2010).

Em linhas gerais, o priming é utilizado para referir uma quantidade de informação dividida pelo tempo de exposição, ou seja, quando um indivíduo é preparado com uma breve exposição preliminar de um estímulo antes de ser avaliado em uma tarefa. Este tipo de pré-ativação ou priming pode ocorrer de duas formas no que se refere ao limiar perceptivo, subliminar ou supraliminar. A forma subliminar é definida pelo aumento na velocidade ou precisão de uma decisão que ocorre posterior a uma exposição de estímulo insuficiente para a consciência (apresentar imagens ou palavras por milésimos de segundos que são codificadas pelo sujeito de forma não perceptível). Já a forma supraliminar ocorre quando a estimulação é suficientemente perceptível, ou seja, atua no nível da consciência (Borine, 2011).

Segundo Lima (2003), um dos estudos mais completos sobre a liminaridade do

priming foi realizado por Wittenbrink, Judd e Park (1997). Neste estudo os autores

analisaram de que forma primes raciais ativados podem determinar estereótipos em relação a americanos negros e brancos. Preliminarmente, os autores avaliaram a subliminaridade

dos primings em intervalos de 15 milésimos de segundos. Os resultados demonstraram que aos 15 milésimos de segundos o estímulo priming é imperceptível, aos 30 milésimos de segundos é possível perceber o priming, mas não é possível identificar de que se trata, apenas aos 45 milésimos de segundos é possível perceber e interpretar o priming.

De acordo com McGovern e Baars (2007), os efeitos de primings supraliminares tendem a ser mais robustos que os efeitos de primings subliminares, posto que o tempo de exposição a um estímulo que atua no nível da consciência é superior quando comparado ao tempo de exposição subliminar, além de que um priming supraliminar tem a possibilidade de gerar a interpretação de seu conteúdo. Não obstante, em um estudo sobre as diferenças entre os dois tipos de priming no que se refere ao efeito produzido, Strahan, Spencer e Zanna (2002) demonstraram que um priming subliminar não apresenta diferenças significativas em relação a um priming supraliminar. Esse resultado encontrado por Strahan et al. segue a mesma linha do preconizado por Bargh (1992) e Wilson e Brekke (1994). Estes autores sugerem que o que é crítico em um priming não é se é subliminar ou supraliminar, mas sim se os indivíduos percebem a influência eliciada pelo priming e se possuem habilidade para responder sem essa influência. Para Strahan e seus colaboradores, não é sempre que os primings subliminares e supraliminares apresentam resultados semelhantes. É possível que o indivíduo tenha seu comportamento potencializado pelo

priming independente de ser subliminar ou supraliminar, caso não tenha tempo de refletir

sobre a interpretação do estímulo emitido, assim como, por conta da necessidade de emitir uma resposta rápida. Por outro lado, os autores apontam que pode ocorrer um efeito de reatância em relação à estimulação caso o indivíduo perceba a influência de um priming supraliminar e tenha habilidade para resistir à persuasão, neste caso o efeito do priming estaria eliminado. Porém, esse fenômeno não ocorreria com a utilização de um priming subliminar. Por conta desta característica, muitos estudos vêm utilizando priming

subliminar para analisar atitudes implícitas ou automáticas que sofrem interferência da desejabilidade social, como é caso das atitudes raciais.

O priming pode ainda ser classificado quanto ao tipo de efeito que provoca. Existem cinco tipos básicos de priming: (1) efeito de exposição – exposição de uma imagem consciente que predispõe a preferir uma imagem dentre outras; (2) efeito poetzl – palavras e imagens percebidas na consciência com alteração na resposta da imagem apresentada posteriormente após a submissão de conteúdo onírico; (3) pré-ativação afetiva – exposição de imagens de conteúdo afetivo ou emocional para a consciência supraliminar ou subliminar, causando uma resposta emocional de conhecimento; (4) pré-ativação semântica – exposição de palavras de conotação emocional causando uma resposta de conhecimento; (5) ativação psicodinâmica – exposição de imagens fantasiosas ou sugeridas por associação que podem interferir no estado de adaptação e persistência, como nos comportamentos de esperar ou de se apressar (ver Borine, 2006).

Outra distinção entre os tipos de priming merece destaque. Trata-se da distinção entre priming semântico e priming afetivo (Garcia-Marques, 2005). Garcia-Marques tomou o conceito de primação afetiva e discutiu sua interpretação como sendo a de um fenômeno afetivo versus um fenômeno cognitivo. Este autor defende que o que vimos e vemos é capaz de ativar informações específicas em nossa mente, que por sua vez, dispara o processo de ativação de diferentes conceitos e acontecimentos que de alguma forma estão associados entre si. Neste sentido, o processo de ativação a que chamamos de primação pode ser classificado em priming semântico e priming afetivo. O priming semântico recebe esta nomenclatura porque designa o fenômeno de facilitar o acesso a palavras semanticamente associadas ao conceito apresentado pela mera exposição de informações relacionadas a este conceito. O priming afetivo, por sua vez, define-se pelo impacto da valência afetiva de um estímulo, se positiva ou negativa, boa ou má, no comportamento

que sucede. Para Garcia-Marques, a representação mental de um conceito tende a ativar o afeto que lhe é associado, por isto a importância do componente afetivo nos estudos sobre

priming.

Em resumo, podemos sintetizar as principais técnicas de investigação dentro dos modelos de priming (ver Bargh & Chartrand, 2000). (1) Priming conceitual, refere-se à ativação temporal de representações mentais em um contexto determinado, de modo que exerçam uma influência passiva e sem que o sujeito perceba esta influência no contexto seguinte; (2) Mindset priming, para este tipo, não são as representações mentais que interessam ou os conceitos, mas os esquemas de processamento ou determinadas formas de pensar diante de uma dada situação.

De acordo com Lemus (2007), para os estudos interessados em investigar as redes de representações permanentes na memória a partir de estudos experimentais e na perspectiva dos processos automáticos, emprega-se o paradigma do priming sequencial. Este modelo pretende analisar a estrutura associativa da mente através da automaticidade, ou seja, analisar as conexões permanentes entre duas representações da memória, entre as quais a ativação se expande automaticamente.

Com efeito, a utilização de primings nos estudos em Psicologia Social é vasta e raramente tem seus resultados contestados. A maior parte das pesquisas sugere que um

priming tem o poder de modificar as atitudes mais automáticas dos indivíduos, pelo menos

momentaneamente, e os achados teóricos permitem essas considerações.

De acordo com Bernardes (2003), são inúmeras as razões que levam as pessoas a tentar ativamente inibir pensamentos e julgamentos estereotipados antes que eles influenciem suas avaliações e seus comportamentos, mas pesquisas recentes têm demonstrado que quando as pessoas tentam suprimir pensamentos indesejados, esses pensamentos podem, subsequentemente, reaparecer à consciência ainda com maior

insistência do que se não tivessem sido suprimidos. Tais efeitos são denominados de efeitos irônicos pelos pesquisadores interessados no controle mental, posto que as consequências dos procedimentos priming, em alguns casos, ocorrem inversamente ao esperado (Bernardes, 2003). Conforme destaca Leite (2008), um desses efeitos é o chamado efeito ricochete. Este efeito ocorre quando, influenciado por um estímulo que elicie um novo posicionamento de supressão ou dissociação de pensamentos estereotipados, o perccebedor, no momento dessa interação, encontre-se sem recursos cognitivos, sob pressão de tempo, distraído ou sem motivação psicológica para suprimir o estereótipo em questão (ver Wegner, 1994; 1997; Wenzlaff & Wegner, 2000). Neste sentido, a operacionalização do estímulo para responder sem viés não apenas falha, mas ocorre o efeito inverso, o chamado efeito ricochete. Em outras palavras, o que ocorre é que, em algumas situações, a proposta dos estímulos utilizados para suprimir associações preconceituosas acaba por surtir efeitos indesejáveis, ao invés de suprimir os pensamentos estereotipados podem torná-los mais acessíveis (Leite, 2008). Para Leite, esse efeito pode ser causado pelo tempo de exposição do sujeito à mensagem e pela justificativa contundente desta ao sujeito para não se opor em aceitar a redução de suas crenças estereotipadas.

Galinsky e Moskowitz (2000) indicam que uma alternativa viável para evitar o efeito ricochete é utilizar o paradigma da tomada-perspectiva (perspective-taking) para inibir de forma automática e controlada o preconceito. A tomada-perspectiva se refere à habilidade para acolher a perspectiva do outro, sendo fortemente associada à competência social e à auto-estima. Esses autores realizaram uma investigação que apontou que quando os indivíduos são envolvidos por fatores que tiram de foco a categorização grupal do alvo e refletem sobre a perspectiva do alvo, os estereótipos podem ser efetivamente evitados. Dado que não ocorre com a deliberada efetivação de primings que busquem suprimir