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1 P RECONCEITO : ASPECTOS TEÓRICOS E METODOLÓGICOS

1.6 M EDIDAS DIRETAS DE PRECONCEITO NA PERSPECTIVA DAS NOVAS FORMAS DE EXPRESSÃO

1.6.5 PRECONCEITO SUTIL

A teoria do preconceito sutil foi desenvolvida para explicar outra forma de expressão do preconceito também inserida no hall dos novos racismos, o preconceito contra grupos exógenos. Enquanto as teorias do racismo simbólico, moderno, aversivo ou ambivalente refletem aspectos particulares da realidade inter-racial norte-americana, caracterizando-se pela discriminação de pessoas nativas do país onde as pesquisas são realizadas (ver Pettigrew & Meertens, 1998), a teoria do preconceito sutil aborda grupos

estrangeiros. O preconceito sutil foi estudado inicialmente na Europa tendo como grupo alvo minorias advindas de ex-colônias de países europeus (ver Lima, 2003).

De acordo com Meertens e Pettigrew (1997), a forma mais sutil de preconceito contra exogrupos tem emergido em anos recentes, sendo caracterizada por apresentar o preconceito de modo camuflado, diretamente oposta às formas mais tradicionais e flagrantes de preconceito. Segundo os autores, dois componentes conceituais podem definir o preconceito flagrante. O primeiro envolve a percepção de ameaça e de rejeição em relação ao exogrupo, o que inclui crenças relacionadas à inferioridade genética do exogrupo. Para o preconceituoso flagrante, tais crenças explicam as desvantagens sócio- econômicas dos exogrupos e justificam a existência da discriminação. O segundo componente do preconceito flagrante se refere à aversão ao contato íntimo com membros do exogrupo, este contato está relacionado, sobretudo, ao contato sexual ou casamento com membros do exogrupo, além de haver uma rejeição ao contato proveniente das relações de trabalho em que o sujeito seja chefiado por um membro do exogrupo. O preconceito sutil, por seu turno, envolve três componentes de ordem mais velada, sendo estes derivados das normas sociais adotadas nas sociedades ocidentais. O primeiro é a proteção dos valores tradicionais. Os preconceituosos sutis percebem os exogrupos como desviantes em relação aos valores importantes para o endogrupo. O segundo componente envolve a percepção exagerada das diferenças culturais. Ao invés de utilizar as diferenças genéticas como base, como fazem os preconceituosos flagrantes, os preconceituosos sutis atribuem desvantagem aos membros do exogrupo em função das diferenças culturais que mantém entre o seu e o outro grupo. O terceiro componente se refere à negação de respostas emocionais positivas em relação ao exogrupo. Neste caso, não necessariamente os preconceituosos sutis apresentam emoções negativas frente o exogrupo, mas negam possuir emoções positivas.

Pettigrew (1998) coloca que os afro-americanos vivenciaram dois séculos de escravidão e mais um de segregação legal e permanecem enfrentando uma diversidade de barreiras, não obstante, até mesmo os racistas os consideram cidadãos americanos, posto que compartilham o mesmo idioma, religião e cultura nacional. Mas esta situação é completamente diferente da situação enfrentada por outras “novas minorias” na Europa.

O acesso às atitudes frente essas novas minorias foi proveniente de um poderoso banco de dados, os dados do Eurobarômetro. Em 1988 o Eurobarômetro de Survey 30 analisou em sete amostras probabilísticas uma série de medidas sobre o preconceito contra várias minorias. No oeste da Alemanha, os turcos, na França, os norte-africanos e asiáticos, na Holanda, os surinameses e turcos e na Grã-Bretanha, os paquistaneses e indianos. Deste modo, Pettigrew e Meertens (1995) puderam testar seu modelo teórico utilizando como variáveis dependentes questões sobre a forma pela qual os nativos percebiam os direitos dos imigrantes, as políticas de imigração, a tolerância frente essas minorias e como analisavam o multiculturalismo derivado da imigração. As hipóteses desta investigação foram: (1) duas formas de preconceito – flagrante e sutil – podem ser diferenciadas e medidas, (2) o preconceito flagrante e sutil, como duas formas generalizadas de preconceito intergrupal, podem se apresentar moderadamente interconectadas, (3) como variáveis dependentes, o preconceito flagrante e sutil, podem compartilhar semelhanças entre si, (4) como variáveis independentes, o preconceito flagrante e sutil podem predizer diferentes respostas em relação às minorias e às políticas de imigração. Os resultados demonstraram que, de fato, o preconceito flagrante e sutil apresentam formas distintas de preconceito, considerando, sobretudo, suas formas de expressão e as atitudes frente às minorias, mas que se apresentam fortemente relacionados. Os autores verificaram que os respondentes apresentaram padrões distintos de respostas em relação às políticas de imigração e como julgam os direitos dos imigrantes. Os preconceituosos flagrantes são

avessos aos direitos dos imigrantes e sugerem a volta dos imigrantes para seus países de origem. Os preconceituosos sutis indicaram que não pretendem modificar os direitos dos imigrantes, tendem a defender a manutenção do status quo das relações intergrupais e os igualitários se apresentaram favoráveis à ampliação dos direitos dos imigrantes.

Pettigrew e Meertens (1995) puderam concluir que os países da Europa Ocidental desenvolveram um padrão normativo anti-preconceito. Consistente com seus dados essa norma tem se mostrado potente e profundamente incorporada em algumas nações. Em linhas gerias, os igualitários internalizam esta norma, enquanto os preconceituosos a rejeitam ou ignoram. Já os preconceituosos sutis aparentam concordar com essa norma e expressam sua visão negativa das minorias apenas em formatos que não firam a norma da igualdade no intuito de parecerem não preconceituosos. Desta forma, os três componentes do preconceito sutil são assimilados pelos sujeitos que aderem ao último modelo, quais sejam, uma ostensiva defesa dos valores tradicionais, o exagero das diferenças culturais intergrupais e a negação de emoções positivas frente às minorias, decorrendo disto uma maneira camuflada de exibir a antipatia e aversão dirigida aos exogrupos.

Apesar do modelo do preconceito sutil ter sido testado e confirmado em diferentes países (ver Lima, 2003), um conjunto de evidências apresentadas por Coenders, Scheepers, Sniderman e Verberk (2001) demonstraram que as diferenças entre preconceito flagrante e sutil não são tão claras, e as qualidades da medida de preconceito sutil podem ser questionáveis. Coenders e colaboradores replicaram o estudo de Pettigrew e Meertens (1995) e encontraram dois indicadores de preconceito distintos dos classicamente apontados pela teoria do preconceito sutil. O primeiro apresentou um amplo fator denominado preconceito generalizado e o segundo, um pequeno fator denominado de percepção das diferenças culturais. Enquanto o primeiro fator foi explicado por um número de características sociais (por exemplo, religiosidade, posição social, idade, interesse

político, dentre outras), o segundo fator apresentou baixo grau de explicação por essas características, além de apresentar um baixo poder discriminante. Coenders e seus colaboradores encontraram também que o fator de preconceito generalizado apresenta um forte efeito em relação a variáveis consequentes, tais como, oposição aos imigrantes, políticas de promoção à melhoria das relações entre grupos minoritários e majoritários ou de assistência às minorias, por exemplo, enquanto o fator percepção das diferenças culturais apresenta quase nenhum efeito nas variáveis desta ordem. Segundo Coenders et al. (2001), a distinção entre preconceito flagrante e sutil deve ser revista e consequentemente as conclusões que derivam desta distinção.

Não obstante, estudos realizados em larga escala, com amostras da Bélgica, Itália, Noruega, Alemanha, Portugal, Espanha e Estados Unidos apresentam mais convergências do que divergências, o que vem demonstrar a alta consistência desta teoria e de seus pressupostos (ver Pettigrew & Meertens, 2001). O que é coerente com dados mais recentes (ver Castro, 2010; Yang et al., 2010).

1.6.6 ESTUDOS SOBRE AS NOVAS FORMAS DE EXPRESSÃO DO PRECONCEITO NO CONTEXTO