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4 ANÁLISE DAS EMENDAS CONSTITUCIONAIS RELATIVAS À DRU:

4.2 DRU: o diagnóstico político-constitucional

4.2.2 Emendas da DRU no governo Luís Inácio Lula da Silva

4.2.2.1 PEC 41/2003

A PEC 41 de 2003, posteriormente transformada em EC 42 de 2003, foi de iniciativa do Poder Executivo e teve por objeto não apenas a desvinculação de receitas da União. Acompanhando um processo já iniciado no governo do ex Presidente Fernando Henrique Cardoso, a Constituição brasileira vinha passando por constantes mudanças de ordem fiscal, com escopo de adaptação ao novo cenário econômico introduzido com o Plano Real.

A análise da PEC em comento se desdobra em alterações tributárias e fiscais, pouco sendo tratado a respeito da DRU. Quando do surgimento do Fundo Social de Emergência e, posteriormente, o Fundo de Estabilidade Fiscal, sua justificativa foi a transitoriedade da desvinculação de receitas para que o Poder Executivo tivesse ferramentas para sua governabilidade.

Para tanto, a desvinculação permitiria a estabilização da economia em curto prazo, uma vez que o Executivo não precisaria emitir novas moedas ou aumentar a dívida pública, e, em contrapartida, faria reformas estruturais que possibilitassem essa harmonização das contas públicas em longo prazo.

Esse arranjo englobaria a reforma da previdência, feita através da emenda constitucional 20 de 1998 e continuada com a reforma tributária da PEC 41. Dentre as suas principais modificações, podem ser elencados a transferência da CIDE para os Estados e

Municípios, o tratamento fiscal para as pequenas empresas e as medidas que evitassem o desequilíbrio na concorrência do mercado.

A DRU foi tratada em seu art. 3º48, tendo por principal modificação a alteração do prazo de vigência da desvinculação de 20% das receitas da União, a qual passa a ser válida até o fim do exercício financeiro de 2007. Com essa nova modificação constitucional, a DRU já vem sendo utilizada como mecanismo de governabilidade por treze anos, independentemente da ideologia partidária.

Mais uma vez, constata-se que o Governo, tendo sido vencido no requerimento da validade da DRU até o exercício financeiro de 2007, elabora nova PEC apensada às reformas tributárias para alcançar a prorrogação da DRU.

Os 20% de desvinculação teriam por objeto os impostos, contribuições sociais e de intervenção no domínio econômico, atingindo também seus adicionais e acréscimos decorrentes da lei. Conforme já estabelecido nas últimas emendas, esse montante não poderia reduzir a base de cálculo dos repasses aos Estados e Municípios, isso para que não houvesse um desequilíbrio fiscal nas unidades federativas.

Na justificativa para prorrogação da DRU, o então Ministro da Fazenda Antonio Palocci, assevera que a DRU é norma de importante política econômica de governo, e, embora a econômica esteja mais equilibrada quando do surgimento do FSE, “a cautela exige que se mantenha vigente tal comando até que as condições macroeconômicas e as incertezas do cenário internacional desapareçam”49.

Acerca do discurso oficial da Casa Civil e do Ministério da Fazenda supramencionada, resta claro que embora a economia no ano de 2003 já alcançasse patamares de equilíbrio, a desvinculação de receitas havia se transformado em uma pedra basilar das propostas governamentais.

Uma medida introduzida na ADCT para fundamentar o sucesso da realização do Plano Real, treze anos após seu início, ainda era instrumento indispensável de política de governo, através do qual o Executivo se utilizava de uma burla constitucional – transitoriedade da DRU – como meio de concretização de suas políticas públicas.

48 “Art. 76. É desvinculado de órgão, fundo ou despesa, no período de 2003 a 2007, vinte por cento da arrecadação da União de impostos, contribuições sociais e de intervenção no domínio econômico, já instituídos ou que vierem a ser criados no referido período, seus adicionais e respectivos acréscimos legais.

§ 1º O disposto no caput deste artigo não reduzirá a base de cálculo das transferências a Estados, Distrito Federal e Municípios na forma dos arts. 153, § 5º; 157, I; 158, I e II; e 159, I, a e b; e II, da Constituição, bem como a base de cálculo das destinações a que se refere o art. 159, I, c, da Constituição.”

Pouco se foi analisado a respeito da DRU na PEC 41, tendo por objeto principal a remodulação do Sistema Tributário Nacional, contudo, na esteira da política de desvinculação de receitas da união, o Deputado Machado – PFL propôs, tendo sido rejeitado, a desvinculação de 20% das receitas estatais, de tal forma que os Estados brasileiros passassem a gozar da prerrogativa de utilizar 20% de seus tributos sem respeito aos mandamentos constitucionais. Proposta essa posteriormente atendida na EC 93 de 2016, criando a DRE e DRM.

Importa ressaltar que a oposição à criação da DRU nas PEC anteriores se manteve inerte a respeito da sua prorrogação, ao contrário, em seu voto, o deputado Paulo Bernardo – PT (2003, EMC 92 PEC 41/2003) defendeu a reforma tributária e a prorrogação da DRU, asseverando que:

O governo Lula terá que enfrentar um desafio enorme pela frente, que é o de assegurar recursos suficientes para atender aos programas sociais e de fortalecimento da economia nacional, sem prejudicar as metas de equilíbrio fiscal. O atual quadro fiscal impede a adoção de qualquer proposta que implique em queda da arrecadação, porém é igualmente certo que não há espaço para uma ampliação da carga tributária, dado que o esforço fiscal exigido da sociedade brasileira é bastante alto.

Conforme supramencionado, pouco foi discutido sobre a legalidade da postergação da vigência da DRU, tendo sido proposta a EMC 155 à PEC 41 pelo deputado Inácio Arruda – PCdoB para que se retirasse da desvinculação a totalidade dos impostos da União, uma vez que se a política de governo do ex-Presidente Lula era respaldada nos programas sociais, não se podiam desvincular verbas constitucionalmente destinadas à educação e saúde, proposta que não foi aceita na Câmara dos Deputados.

Contraditoriamente, os deputados Jutahy Junior e Antonio Cambraia – PSDB foram quem propuseram a diminuição da vigência da DRU até o exercício financeiro de 2004, limitando no tempo a transitoriedade da desvinculação (EMC 169 e EMC 252 PEC 41/2003). Proposta que não foi aceita, tendo sido válida a desvinculação até o exercício financeiro de 2007.

Gráfico 4 – Disciplina dos partidos em relação ao Governo Lula na votação da PEC 41

Fonte: Núcleo de Estudos Comparados e Internacionais (NECI).

Do estudo do Gráfico 4, constata-se uma forte adesão à coalizão política governamental, o que demonstra tratar-se de interesses políticos acima de questões econômicas e, principalmente, constitucionais.

O ex-Presidente Lula, no início do seu mandato presidencial, gozava de forte popularidade parlamentar, tendo uma sólida base congressista para as votações de políticas de seu governo. Importa ratificar que partidos como PT, PCdoB, PV, PDT, PTB, que foram veementemente contra a DRU nas três primeiras emendas, votaram segundo a conjuntura governamental.

Em contrapartida, o PSDB que sempre criou e defendeu a importância da DRU, vota na PEC atual contrária a sua vigência, o que demonstra ser a DRU e suas emendas apenas um aspecto de contingência do partido da situação.