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CAPÍTULO II – EMPATIA

2.2. A perspectiva de Hoffman

Aceitando o aspecto evolutivo da empatia, mas a estudando de uma perspectiva, sobretudo, psicológica, Hoffman (1989, p. 285) define a empatia como sendo “a capacidade de uma pessoa para colocar-se no lugar do outro (role-taking), inferir seus sentimentos e, a

partir do conhecimento gerado por esse processo, dar uma resposta afetiva mais adequada para a situação do outro do que para sua própria situação” e, de forma semelhante ao que Kohlberg faz em relação ao desenvolvimento moral, Hoffman (1990, 2003) elenca estágios de desenvolvimento empático, que evoluem juntamente com o desenvolvimento cognitivo, conforme listado a seguir:

Empatia global: em idades muito precoces, quando a criança tem dificuldade de se distinguir do outro, ela está susceptível a vivenciar sentimentos empáticos ao testemunhar a angústia do outro, como se aquela angústia estivesse ocorrendo com ela mesma. Para ilustrar esta fase, Hoffman cita o choro do recém nascido despertado pelo choro de outros bebês, como um precursor rudimentar de angústia empática, em que a criança chora como se ela mesma tivesse sofrendo. Como dado adicional, este choro é percebido por Hoffman (2003) como uma mistura de mímica inata, que ocorre automaticamente, e de condicionamento.

Empatia egocêntrica: com o desenvolvimento da consciência sobre a permanência dos objetos (Piaget, 1932/1994), a criança torna-se capaz de distinguir sua experiência da do outro, mas ainda de forma bastante rudimentar, o que a leva a confundir, diante de uma situação adversa, quem está realmente angustiado, se ela ou o outro. Com cerca de um ano e seis meses, a criança torna-se consciente de que não é a outra pessoa, embora ainda considere os estados internos do outro como iguais aos seus (Hoffman, 1990). Para ilustrar, tem-se o exemplo de uma criança que pede para sua mãe confortar outra criança que está chorando, mesmo percebendo que a mãe da outra criança está por perto.

Angústia empática quase-egocêntrica: Mais ou menos a partir dos quatro ou cinco anos, com o desenvolvimento da habilidade de role-taking (neste caso, ainda rudimentar), a criança torna-se capaz de não mais confundir a sua angústia com a

angústia da outra criança. Porém, como ela ainda não conhece os estados internos do outro, ela procura ajudar o outro com algo que ajuda a ela própria. Ao ver uma criança chorando, por exemplo, a criança pode oferecer seu ursinho para tentar consolar a outra criança.

Verdadeira angústia empática – nesse estágio, a criança é capaz de empatizar, com mais exatidão que antes, com os sentimentos e necessidades do outro e, desta forma, pode ajudar o outro com mais eficiência. Isto se dá em função do desenvolvimento da capacidade de role-taking e com a aquisição de conhecimentos metalingüísticos e meta-empáticos.

Angústia empática além da situação ou empatia pela condição de vida dos outros: na adolescência, quando se começa a formar conceitos sociais e com o desenvolvimento da concepção de que outras pessoas possuem histórias e identidades particulares, o indivíduo torna-se capaz de empatizar não só com a dor ou desconforto imediato do outro, mas também com a tristeza crônica do outro ou com a sua desagradável condição de vida.

Note-se que a evolução de um estágio de empatia para o outro está diretamente relacionada ao desenvolvimento de um senso cognitivo sobre a existência de outras pessoas ou do processo de diferenciação do eu. Conforme Hoffman (1990, 1991), essa diferenciação ocorre em uma seqüência de quatro estágios: 1) o sujeito não é capaz de se diferenciar do outro; 2) o sujeito adquire a consciência de que o outro é fisicamente diferente de si; 3) o sujeito tem consciência de que o outro possui sentimentos e estados internos independentes dos seus; 4) o sujeito obtém consciência de que as outras pessoas possuem histórias e experiências peculiares e que os seus sentimentos continuam a existir além do aqui e agora. É nesta perspectiva que Hoffman (2003) afirma que a evolução dos estágios da empatia está

intimamente relacionada ao avanço do role-taking, o que não significa dizer que o surgimento de uma resposta afetiva empática mais evoluída representa o desaparecimento de respostas empáticas mais primitivas; e, além disso, não se pode esquecer que, para Hoffman (1991), a maior parte das respostas afetivas empáticas requer baixos níveis de processamento cognitivo.

O avanço cognitivo também está intimamente ligado com dois conceitos centrais da teoria de Hoffman (1990, 1991), o de angústia empática e o de angústia simpática. O primeiro conceito, o de angústia empática, faz referência às sensações afetivas de incômodo, desconforto ou angústia, vivenciadas no self, quando o sujeito percebe que os outros estão passando por algum infortúnio, o que não exige maiores descentrações cognitivas, já que este tipo de angústia está prioritariamente centrada no self. Esta angústia pode levar o indivíduo a procurar se libertar dela. O segundo conceito, o de angústia simpática, descreve um sentimento de compaixão ou pena pela vítima do infortúnio, que pode se transformar em uma vontade de aliviar a angústia do outro, e, desta forma pode contribuir para comportamentos pró-sociais. Note-se que, cognitivamente falando, a transformação da angústia empática na angústia simpática, depende, segundo Hoffman, do desenvolvimento do sentido cognitivo do outro e, conseqüentemente, da transferência de parte dos afetos empaticamente sentidos no

self para a imagem do outro. Especificamente em relação à angústia empática, Hoffman (1990) afirma que apesar deste tipo de afeto parecer “egoísta”, ele também tem um papel relevante para os comportamentos pró-sociais, pois, na medida em que uma pessoa procura aliviar a sua própria angústia, ela, necessariamente, está sujeita a aliviar a angústia do outro e, desta forma, a ter um comportamento pró-social.

Além dos dois sentimentos supramencionados (angústia empática e angústia simpática), Hoffman (2003) indica outros tipos de sentimentos vicários que revelam diferentes formas de empatia, a saber:

Raiva empática: é o sentimento de raiva direcionado a um agressor em defesa da vítima de uma agressão. Esse sentimento pode ocorrer, por exemplo, em uma situação em que se presencia uma criança sendo espancada por um adulto e se sente raiva do agressor em detrimento da compaixão sentida pela criança.

Compaixão empática – é o sentimento de pena desencadeado em relação à pessoa que foi agredida, isto é, em relação à vítima.

Culpa empática: é o sentimento gerado quando o observador percebe que ele não fez nada para mudar a situação da vítima, sobretudo quando a não ajuda decorre de motivos egoístas, como: evitar o envolvimento com a situação e evitar conseqüências desagradáveis. Neste caso, a culpa empática pode fazer com que o indivíduo, que não socorreu a vítima, passe a ajudar outras vítimas em situações semelhantes.

Injustiça empática: é o sentimento que emerge quando o observador vê uma pessoa considerada como boa ser submetida a um sofrimento. O observador sentirá injustiça, ao concluir que o sofrimento infligido a vítima não era merecido. A este respeito, Hoffman comenta que existe uma tendência do observador sentir, primeiramente, tristeza, raiva e talvez culpa, mas, em seguida, ao concluir que o sofrimento da vítima não era merecido, sentir injustiça (indignação).

Além destes tipos de sentimentos empáticos, outros podem ser constituídos, conforme lembra Hoffman (2003), a partir da combinação de dois ou mais destes sentimentos, em função do tipo de atribuição causal feita pelo observador, assim como do seu grau de sensibilidade empática.

Tendo em vista não tornar a tese repetitiva, outras questões da teoria de Hoffman serão abordadas e aprofundadas no Capítulo III, que trata da relação entre moral e empatia e passar- se-á, agora, para o próximo ítem, onde serão apresentadas as principais técnicas de mensuração que têm sido utilizadas para avaliar empatia.