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2 POLÍTICA INDUSTRIAL: O CONHECIMENTO E A INOVAÇÃO TECNOLÓGICA COMO ELEMENTOS DINAMIZADORES DA ATIVIDADE INDUSTRIAL DO

2.2 POLÍTICA INDUSTRIAL NA PERSPECTIVA NEO-SCHUMPETERIANA

O diferencial competitivo industrial no século XXI está vinculado ao processo de busca por inovação de tal forma que a inovação se estabelece como o determinante fundamental do processo dinâmico da economia, especialmente, no atual crescimento da competitividade em nível regional e global (TAVARES; KRETZER; MEDEIROS, 2005).

Para Freeman e Soete (2008), as inovações são cruciais tanto para elevar a taxa de crescimento econômico quanto para mudar a direção do avanço econômico em busca de melhor qualidade de vida das sociedades. Tigre (2006, p.6) aponta que as empresas e setores da economia mais dinâmicos e rentáveis são justamente aqueles que geram e se apropriam de inovação que, “em vez de competirem em mercados saturados pela concorrência, criam seus próprios nichos e usufruem de monopólios temporários por meio de patentes e segredo industrial”. Aqueles, porém, que não investem em inovação tecnológica estão condenados a desaparecer do mercado.

A compreensão da essencialidade das inovações no processo de evolução e mudanças do sistema capitalista decorre da grande influência do pensamento econômico de Joseph Alois Schumpeter. Com avanços teóricos e empíricos deriva-se da teoria econômica schumpeteriana a corrente denominada de evolucionária ou neo-schumpeteriana que ganha expressão e se incorpora a teoria econômica a partir do final da década de 1970. As transformações vivenciadas pela economia mundial a partir dessa década, relacionadas a introdução de inovações de caráter revolucionário associadas aos desenvolvimentos ocorridos nas áreas da microeletrônica, da biotecnologia e de materiais, tem despertado ainda mais o interesse pelas concepções shumpeterianas. Nesse sentido, a teoria neo-schumpeteriana tem mostrado, nos anos recentes, ser capaz, com o uso de uma abordagem dinâmica, de desenvolver e responder às questões que norteiam o crescimento econômico impulsionado por inovações como “a função das mudanças tecnológicas no comportamento do sistema econômico, das firmas, dos consumidores, na estrutura do mercado, dentre outros” (TAVARES; KRETZER; MEDEIROS, 2005, p.110; COSTA, 2006). Além disso, é levado em consideração as enormes diferenças em termos de grau de desenvolvimento industrial, arranjos institucionais (historicamente construídos), contextos políticos e de política econômica que existem entre os países e regiões (SUZIGAN; FURTADO, 2010). Isso quer dizer, dentre outras coisas, que para esses teóricos, “a forma como o desenvolvimento industrial e tecnológico se projeta na economia global não é uniforme, existindo, portanto, assimetrias e especificidades importantes quando se analisa a inserção dos países em desenvolvimento”. Nesse sentido, é considerado a existência de barreiras em relação ao acesso de países em desenvolvimento ao conhecimento e ao aprendizado criado nos países desenvolvidos. Assim, essa abordagem seria compatível com um dos aspectos centrais do estruturalismo cepalino, que é o reconhecimento das condições assimétricas de que partem os países em desenvolvimento perante as nações desenvolvidas (HIRATUKA; SARTI, 2017, p.196-197).

A inovação é compreendida pelos neo-schumpeterianos como um processo dinâmico e interativo de mudança tecnológica, sendo sujeita a “um ambiente organizacional e institucional mutante, que gera a consolidação de um paradigma tecnológico”, este se configura como “uma espécie de motor de amplas transformações sociais como efeito de mudanças tecnológicas, institucionais e organizacionais nas esferas da produção, do trabalho e dos hábitos das pessoas” (CONCEIÇÃO, 2000, p.61).

Por mudança tecnológica pode-se entender como o processo de invenção, inovação e difusão de uma tecnologia. Dentro da abordagem neo-schumpeteriana, a inovação tecnológica é considerada a etapa mais importante para a mudança econômica estrutural:

Isto porque ela desencadeia intrinsecamente toda uma série de transformações, que ultrapassam os limites tecnológicos propriamente ditos, difundindo-se em novos processos e produtos e afetando os hábitos e os costumes sociais institucionalizados em toda a sociedade [...] seu efeito é crucial à conformação de novos paradigmas tecno-econômicos, que darão sustentação aos novos ciclos longos de acumulação de capital. É a inovação que permeia e modela essa nova constituição, devendo, por isso mesmo, ser entendida como um processo cumulativo e articulado, que interage com a invenção e a difusão (CONCEIÇÃO, 2000, p.59).

Para Baptiste (1997) a política industrial no contexto de mudança tecnológica deve incentivar a reconfiguração do perfil da estrutura produtiva promovendo o dinamismo da atividade industrial por meio da geração, difusão e uso de inovações. Nesse sentido, a política industrial para os neo-schumpeterianos não se limita a corrigir falhas ou imperfeições de mercado, ela é ativa, tem a capacidade de promover uma contínua “mudança estrutural na indústria no sentido de aumentar a importância relativa de segmentos de alta tecnologia”, isto é, ela tem a capacidade conduzir ao desenvolvimento econômico quando introduzida em um contexto amplo das políticas públicas de desenvolvimento nacional (ALEM; BARROS; GIAMBIAGI, 2002, p.10; GADELHA, 2001). Baptiste (1997) destaca que a necessidade de mudar o perfil da estrutura industrial, ou seja, de usar a política industrial mais ativa e abrangente, tende a ser maior em países em desenvolvimento, que se encontram mais distantes da fronteira tecnológica.

Para Barbieri e Álvares (2005, p.59), “a inovação tecnológicaé a introdução de uma invenção ou novidade de caráter tecnológico ou a introdução de produtos e processos que incorporem novas soluções técnicas”. Os autores destacam que o sucesso de uma inovação não depende unicamente de sua excelência técnica, mas também de sua aceitação pelo mercado, por isso, inovações tecnológicas se incorporam ao “binômio tecnologia-mercado”, sendo o mercado o árbitro final a que todo processo de inovação será julgado, é o espaço competitivo institucional de busca do lucro. Um mercado que gera, seleciona, difunde e absorve tecnologias em um ritmo mais intenso é considerado um mercado eficiente, é esse dinamismo que promove a competitividade no tempo presente e altera as condições estruturais produtivas futuras.

Na concepção neo-schumpeteriana um processo de desenvolvimento econômico sustentável depende do nível de crescimento da competitividade industrial, “que por sua vez, depende do sucesso das interações entre o progresso científico e tecnológico; da identificação das perspectivas e necessidades do mercado; e, da difusão e acesso às tecnologias disponíveis”.

Pode-se dizer que existe uma forte relação de dependência entre inovação tecnológica e a competitividade, por isso, a política industrial deve tratar a inovação tecnológica como seu elemento central para criar as condições favoráveis ao desenvolvimento econômico focalizado na indústria e em sua competitividade (TAVARES; KRETZER; MEDEIROS, 2005, p. 115). Segundo Baptista (1997) a política industrial seria indissociável conceitualmente da política tecnológica. Isso implica na necessidade de “compatibilização de objetivos, metas e instrumentos de política industrial e tecnológica entre si e com a política macroeconômica e investimentos em infraestrutura econômica e social” (SUZIGAN; FURTADO, 2010, p.12). Segundo Morais e Lima Jr. (2010) o desenvolvimento e o impacto da política industrial dependem desse conjunto de interdependências, como também, de articulação, colaboração e parcerias entre governo, instituições de pesquisa, universidades, empresas e entidades do setor privado. Diante do reconhecimento dessas interdependências a política industrial deve ser entendida como às ações estatais mais diretamente ligadas à dinâmica de inovações na indústria, mas isso não quer dizer que as políticas de cunho vertical devam ser escolhidas em detrimento das de cunho horizontal. Elas precisam ser usadas conjuntamente. Isso porque, na perspectiva neo-schumpeteriana o uso isolado de políticas horizontais, desconsidera as especificidades da estrutura produtiva e tecnológica e no caso das políticas verticais ignora os condicionantes não restritos à órbita setorial. Portanto, usá-las simultaneamente garante que “o caráter sistêmico do ambiente empresarial e a especificidade e diversidade dos padrões evolutivos das estruturas industriais” sejam enfatizados (GADELHA, 2001, p.152).

Diante do que foi exposto até o momento, pensar em política industrial é pensar a relação entre a ação do Estado, a concorrência e a mudança tecnológica. É por intermédio da ação do Estado nos ambientes competitivos que as empresas estão inseridas que se pode condicionar as empresas privadas a adotarem estratégias de inovação. A política industrial de inspiração neo- schumpeteriana deve ser o ponto de “articulação do Estado com a sociedade em torno dos interesses da inovação e da transformação estrutural” que para tanto, demanda do Estado uma capacidade de análise estratégica afim de “identificar as perspectivas do futuro, para lidar com as estruturas do passado e para rever, a cada momento, as estratégias de política econômica” (GADELHA, 2001, p. 169).

A visão dinâmica neo-schumpeteriana de política industrial possibilita aos mais diversos países buscarem transformar suas estruturas produtivas e assim, mudarem seus níveis competitivos, dando ênfase em: inovação e diferenciação de produto, inserção externa mais vinculada a

produtos de maior valor agregado, desenvolvimento de grandes empresas/grupos nacionais e tecnologias que tendem a mudar o perfil da produção industrial global nos próximos anos. Segundo Miguez e outros (2018), mapear as tecnologias disruptivas e identificar quais são os sistemas industriais mais promissores para introduzir novos produtos ou novas formas de produzir se converteu em uma das principais ferramentas das políticas industriais modernas. O cenário competitivo industrial atual e do futuro vai estar relacionado a um conjunto de inovações tecnológicas com alto poder disruptivo que caracterizará uma nova indústria, a Indústria 4.0. Diante disso, a política industrial de viés neo-schumpeteriano se apresenta a mais adequada para enfrentar os novos desafios competitivos, pois, como visto, ela incorpora e reconhece de maneira mais profunda as transformações em curso no sistema produtivo global.

3 INDÚSTRIA 4.0: TRANSFORMAÇÃO DIGITAL NA INDÚSTRIA