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Dos procedimentos metodológicos à interpretação dos dados

A) O ponto de vista dos professores(as)

No que respeita à relação da escola com a comunidade e, particularmente, com a família, alguns/umas dos/as entrevistados/as caracterizam as famílias de forma negativa, como se fossem um obstáculo ao trabalho da escola. Consideram, que de um modo geral, estas têm poucas expectativas em relação à escola, não fornecendo a ajuda necessária. Para alguns/mas professores/as, as famílias são mesmo definidas como elementos “complicados”, que prejudicam o desenvolvimento do processo de ensino/aprendizagem:

“ (...) aqui as expectativas em relação à escola são poucas, as vivências são poucas, assim como as

ajudas dos encarregados de educação” (E3);

“(...) estes miúdos em casa não têm apoio nenhum, não têm… esta escola é especial por causa disso.

Somos nós professores que temos de fazer o trabalho que devia ser feito em casa, temos uma dupla função “ (E12).

Nestes excertos está presente a ideia de que o meio social de onde provêm os alunos não só não é estimulante em relação à escola, como afecta o trabalho pedagógico. No entanto, um número significativo de professoras (cinco entrevistadas) considera que a escola tem uma relação positiva com os pais. Esse sentimento é ilustrado através dos seguintes depoimentos:

“Quando vim para cá a relação da escola com os pais não era tão boa como agora” (E4) ;

“(...) a escola procura uma aproximação aos pais, procura que os pais sejam elementos mais activos

no processo ensino/aprendizagem dos alunos.(...) Acho que os pais também já têm lugar na escola, além da associação de pais” (E10) .

Uma interpretação destes discursos permite-nos verificar que, apesar da representação negativa que alguns/mas professores/as têm da família e dos encarregados de educação relativamente aos valores, comportamentos e competências, a escola foi estabelecendo ao longo do tempo dinâmicas de aproximação com as famílias. Note-se, contudo, que esta não é ainda uma relação de verdadeira parceria.

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A leitura dos discursos dos/as 12 docentes permite concluir que, dada a representação social da comunidade educativa, o seu entendimento sobre a missão da escola passa muito por uma valorização da formação pessoal e social dos alunos:

“A escola tem de desenvolver as potencialidades do aluno. (...) Ao desenvolver essas potencialidades

tem de enriquecê-lo. Enriquecê-lo com aquilo que a sociedade, no fim de contas, vai reconhecer como louvável. Se a escola em termos académicos valoriza A, B ou C o objectivo é que os alunos consigam chegar aí. Se não chegarem aí pelo menos a outro tipo de valências que a sociedade valoriza. (...)”(E1);

“(...) a escola para além de transmitir conhecimentos, tem também a missão de transmitir valores, de provocar um desenvolvimento pessoal. Nesta escola sentimos muito a necessidade de desenvolver esse lado porque são miúdos que não possuem valores muito definidos e se me perguntares se consegues facilmente incutir valores, acho que encontras muita resistência “ (E9).

Estas expressões referem-se assim, essencialmente, ao contributo da escola ao nível dos comportamentos e dos valores, estando subjacente um entendimento da cultura escolar como a ideal, em detrimento da familiar. Os discursos revelam também a preocupação de que a escola forme no sentido de assegurar aos alunos competências que lhes permitam, no futuro, responder às necessidades da sociedade:

“a escola deve (...)transmitir-lhe o conhecimento que o vai fazer ser o homem de amanhã. Isto é, eu

acho que no primeiro ciclo todo o conhecimento que nós damos à criança é absorvido e é esse conhecimento que vai servir para desenrascar o miúdo no futuro”(E2);

“Preparar os alunos para a vida, para o país. Espero que continuem a sua vida e que consigam uma

ocupação na sociedade em que se sintam felizes e úteis. Seja qual for a profissão. Agora se for mais um para viver de rendimento mínimo fico triste (...)aquilo que eu mais gostaria de os ver é preparados para a vida futura (...) não fossem mais tarde os marginais que estamos habituados a ouvir falar que são “o C”… gostava de os ver no futuro preparados para um trabalho, com organização pessoal…era essa a finalidade que gostava de ver nesta escola” (E5) .

Podemos constatar no discurso destas entrevistadas, a inquietação que lhes provoca o facto de os alunos não se integrarem profissional e/ou socialmente. No entanto, algumas professoras valorizam uma função diferente para a escola:

“a função da escola é trabalhar para os miúdos, guiá-los. Não é só ensinar-lhes coisas dos livros mas também coisas da vida. Quando eles vêm tristes tentar explicar o porquê do pai ter dado um safanão, ou porquê que o pai…não é só o que está nos livros... (...) Somos os pais deles,… é mesmo assim” (E12);

“Fazer com que os alunos se sintam felizes nela, gostem da escola se sintam bem na escola” (E8).

Estes discursos reflectem também o cuidado, já referido anteriormente, pela dimensão afectivo-relacional que está presente nos profissionais desta escola e que é justificada não só pelo facto de os/as professores/as trabalharem com crianças, mas principalmente pela imagem que foram construindo dos seus alunos: emocionalmente instáveis, pouco acompanhadas pelas famílias, desprovidos de valores e sem modelos familiares e sociais próximos.

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Curiosamente, apenas uma docente faz referência aos resultados escolares como função da escola, o que pode revelar a primazia da preocupação pela formação humana e pessoal dos alunos, mas também a descrença na obtenção de bons resultados:

“(...) A missão da escola é combater o insucesso escolar dos meninos. (...) difícil mas concretizável.

Aliás está a conseguir-se, é complicado mas conseguir bons resultados nunca é fácil. (...) o objectivo do meu trabalho é contribuir para a diminuição do insucesso escolar na E.B.1” (E7).

No que concerne à relação com outros parceiros da comunidade, o discurso de algumas entrevistadas reflecte abertura:

“(...) Esta escola quando eu cheguei estava fechada, … mas logo em Outubro ou Novembro chegou

um projecto da Faculdade de Ciências da Educação com umas estagiárias para virem para aqui trabalhar. Construiu-se o primeiro TEIP do agrupamento, em que a nossa escola foi incorporada. Vieram trabalhar para a escola animadores socioculturais, surgiram este tipo de projectos…deu-se abertura para que o trabalho que se realiza hoje se concretize” (E5);

“Esta escola já tem relacionamento com certas pessoas da câmara há muitos anos, assim como com

a associação de pais, elementos do centro profissional que estão sempre disponíveis… Entidades com quem foram trabalhadas algumas actividades e com quem se manteve o elo de ligação (...)”

(E8);

“(...) acho que a escola está sempre a tentar fazer parcerias com o centro social, com centros profissionais, isso tudo são parcerias. (...) Há também a tentativa de aproximação com os centros de Saúde. Com os médicos e outros técnicos do centro de Saúde que lidam com os miúdos… isso são parcerias. Há uma abertura ao exterior, assim como o facto de se ligar à Escola Superior F. Tudo isso leva a uma certa dinâmica…” (E10).

Com efeito, ressalta a ideia de que a escola mantém com o tecido social envolvente uma relação de grande proximidade que é vista como optimizadora do trabalho desenvolvido. Porém, como outros discursos foram denunciando, apesar de alguns docentes parecerem estar sensibilizados para essa potencialidade outros olham também a comunidade envolvente à escola como sendo social, cultural e economicamente desfavorável e interpretam esse facto como um obstáculo à concretização da missão da escola. Os dados que apresento a seguir convergem com este pensamento.

B) Outros elementos resultantes da observação directa do quotidiano da escola e do trabalho dos/as