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PRINCIPAIS DEVERES DE CONDUTA NA FASE PRÉ-NEGOCIAL

No documento A Boa-fé objetiva no contratos benéficos. (páginas 111-115)

CAPÍTULO VI – BOA-FÉ E RESPONSABILIDADE PRÉ-CONTRATUAL

6.2. PRINCIPAIS DEVERES DE CONDUTA NA FASE PRÉ-NEGOCIAL

As múltiplas situações jurídicas possíveis ao longo do processo obrigacional não permitem enumeração taxativa dos deveres de conduta na fase pré-negocial. A doutrina trata de alguns desses deveres em caráter exemplificativo, relacionados à figura da boa-fé contratual.

6.2.1. Dever de informação

Os negociadores de um contrato devem, mutuamente, esclarecimento sobre as possibilidades e obstáculos do pretenso contrato. Qualquer fator impeditivo precisa ser desde o início avisado, para que as expectativas de contratação correspondam aos reais riscos de frustração. O esclarecimento é de circunstância relevante para o contrato. Os deveres de esclarecimento têm como objeto “uma declaração de

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PRATA, Ana Maria Correia Rodrigues. Notas sobre a responsabilidade civil pré-contratual. Coimbra: Almedina, 2005, p. 47-48.

conhecimento”.183 São de natureza declaratória, conquanto resultado do pensamento cognitivo e não volitivo.

O dever de informar abrange os elementos impactantes para a decisão de contratar. Não apenas para a compreensão concreta do contrato a celebrar, mas também acerca dos aspectos funcionais da avença, afeitos à utilidade do negócio para realização dos fins almejados pela outra parte.

A violação do dever de informar pode ser veiculada por ato omissivo ou comissivo. Viola a boa-fé objetiva a falta, a incompletude ou a intempestividade das informações necessárias. Também a descumpre aquele que presta informações falsas ou inexatas sobre elementos do contrato, características do objeto, sua utilidade, eventuais vícios, dentre outros aspectos possíveis de influenciar a formação da vontade de contratar.

Nos contratos em que as partes não possuem a mesma paridade, o dever de prestar informações ou esclarecimentos assume especial relevância. Diante de um quadro concreto de desigualdade, os deveres de esclarecimento são ainda mais necessários, de modo a capacitar a parte mais fraca da relação para uma melhor compreensão dos riscos e vantagens do contrato. Exemplo dessa maior intensidade é verificado nas normas de proteção do consumidor. Larenz destaca esse dever de esclarecimento ao possível prejudicado, quando este “no se halle em situación de

llegar a saber con seguridad la amplitud de los daños que se le hayan irrogado”.184

Nos contratos paritários, tal dever implica em troca de informações. Aspecto interessante nas negociações desses contratos é que também surge para cada um dos interessados o dever de buscar informações. A medida entre os deveres de informar e de ser informado é avaliada sempre diante das condições pessoais das partes. Mesmo sem uma parte dominante, quem melhor conhecer do negócio deve esclarecimentos. Importa um equilíbrio de conhecimentos entre os negociadores.

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SILVA, Clóvis V. do Couto e. A obrigação... op. cit., p. 75.

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6.2.2. Deveres de cooperação e de lealdade

O dever de cooperação é instrumental, distinto da obrigação principal. Implica no auxílio de uma parte à outra, no sentido de que o fim contratual depende da mútua cooperação. É conseqüência da incidência da boa-fé objetiva nas relações jurídicas, com a quebra da posição tradicional do credor. Para a realização do programa contratual, os esforços não mais recaem apenas sobre o devedor. O credor deve cooperar naquilo que couber para o adimplemento da prestação. Essa cooperação implica em condutas positivas e negativas, as últimas no sentido de não impedir ou dificultar a atividade do devedor.

A lealdade impõe às partes linhas de conduta que preservem a confiança. Exige que as partes dêem início e continuidade às negociações, quando tenham um legítimo interesse no objeto da pretensa contratação. A partir de quando as partes aproximam-se, as tratativas podem progredir, na medida do estreitamento das divergências. O processo de formação da vontade contratual avança e as partes tendem a confiar nas convergências das posições jurídicas, representadas pelas posturas dos negociantes. É a confiança gerada no avanço das negociações que mitiga o direito de desistir da celebração do contrato.

Desleal é o negociador que dispara o processo de tratativas, ciente de óbices concretos à contratação. Os processos de negociação podem demandar tempo e custos. As partes que negociam não podem, em vão, tomar tempo, provocar despesas e gerar expectativas. Apenas diante das circunstâncias concretas podem ser analisados o grau do interesse quanto ao objeto do contrato, ou as condições legais e financeiras das partes. Mas correlacionado ao dever de informação, o menor grau de interesse ou o não atendimento daquelas condições devem, necessariamente, ser objeto de advertência à outra parte.

Desse modo, lealdade e informação são interligadas como expressão de conduta de boa-fé. A distinção entre elas é que a lealdade não assenta apenas no âmbito

informativo, mas deriva do comportamento das pessoas.185 A parte sabedora (ou que por diligência normal devesse saber) do risco de insucesso do processo de negociação deve comunicar à outra parte.

A deslealdade é fortemente verificada nos casos de rompimento injustificado; ou de abandono imotivado das negociações. A desistência nesses casos representa abuso da liberdade contratual. Em tais casos, a deslealdade é conduta ilícita que implica no dever de ressarcir os prejuízos incorridos na fase de negociação, e de indenizar os lucros cessantes relacionados à frustrada contratação. A indenização é ainda mais necessária quando o rompimento imotivado acarreta a perda de chance de realizar o contrato com outra pessoa.

Os termos da responsabilidade por esse tipo de ruptura são definidos no “equilíbrio

desejável entre a manifestação da liberdade e a proteção da confiança”.186 A medida da confiança gerada é o parâmetro para tratar a situação jurídica fora dos limites dos riscos inerentes a qualquer negociação.

O dever de lealdade pode ainda ser quebrado se uma das partes, embora não desista da contratação, altere condição já negociada, de modo a desequilibrar a equação econômica do contrato, tornando-o desinteressante ou mesmo inviável para o outro negociador.

6.2.3. Dever de sigilo

Ao negociar um contrato, as partes tomam conhecimento de informações e de dados relativos ao objeto da avença e à contraparte. Senão para o fim de celebração do contrato, é vedada a divulgação de informação conhecida em decorrência da negociação, própria do objeto ou da contraparte, e que venha a causar dano com a revelação.

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CORDEIRO, António Manuel da Rocha e Menezes. Da boa fé... op. cit., p. 551.

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Em regra, o dever de sigilo é mais intenso nos processos de negociação de contratos mais complexos. Para a formação da vontade contratual, do preço e condições da avença, uma das partes necessita de informações precisas sobre o objeto do contrato, especialmente quanto a riscos. A contraparte, movida pelo interesse de contratar, expõe dados próprios, valiosos e integrantes, de modo intangível, do próprio bem da vida em negociação. A boa-fé impõe a guarda de sigilo dessas informações, não apenas durante a fase preliminar, mas também posteriormente, se o contrato não vier a ser firmado. O sigilo compõe a gama dos deveres acessórios de conduta e provém da relação de confiança que o processo de formação do contrato propicia. Quem presta as informações sigilosas, cumpre um desses deveres. Quem as recebe, deve manter o sigilo, sob pena de abuso da confiança que lhe foi depositada.

Tratando-se de informação sigilosa, o dever de confidencialidade deverá persistir, ainda que as negociações sejam interrompidas por motivo alheio à vontade do receptor dos dados. As conseqüências jurídicas de eventual rompimento das tratativas não autorizam a parte prejudicada a utilizar as informações sigilosas do infrator. Deve a ruptura ser resolvida em perdas e danos, mas o ordenamento não prescreve esse tipo de compensação.

No atual estágio do sistema capitalista, o valor da informação é elevado. Numa era em que o que sobrevive é o conhecimento, o dever de sigilo merece especial proteção do Direito. A boa-fé lastreia essa proteção.

6.3. FUNÇÃO DA RESPONSABILIDADE PRÉ-CONTRATUAL SOB A

No documento A Boa-fé objetiva no contratos benéficos. (páginas 111-115)