Capítulo II. O Ensino Religioso no Colégio Santa Cruz: aspectos históricos
2. Projeto Educacional do Colégio Santa Cruz: linhas básicas
Os padres canadenses traziam consigo um ar de liberdade, de um novo estilo de educação e de vivência religiosa. E, exatamente por isso, foram aceitos rapidamente pela sociedade de São Paulo e requisitados por serem menos rígidos e menos tradicionais.
Em uma entrevista, Padre Corbeil dissse:
Em primeiro lugar devo dizer que sou das Américas, não sou da Europa. Quando eu cheguei ao Brasil, não tinha 30 anos de idade, eu cheguei aqui e vi que o clero daqui era de uma formação europeia, romano, batina em cima de batina e usavam o beijar-mão, benção, padre e santinho e tudo. Então eu senti que o clero era muito separado do povo, talvez eu esteja errado no que estou falando, mas senti isso.
Agora, não fui educado assim, fui educado em um colégio católico de padres, padres de Santa Cruz, que jogavam hóquei conosco, jogavam beisebol, eram nossos amigos. A gente tinha uma liberdade com eles muito grande. Quando nós chegamos aqui, a gente sentiu imediatamente uma afinidade muito grande com este povo latino.
Sentíamos que o povo daqui é muito parecido com o meu povo do Canadá francês, que é latino. (HADDAD, 1982, p. 65)
Pois, como vimos no Capítulo I, a Revolução Francesa acabou por separar em dois grupos os sacerdotes católicos, os que se entregaram à constituição do clero, “perderam” sua vivência evangelizadora e ficaram longe do povo e, aqueles que não se entregaram, morreram e viveram clandestinamente sua vocação, perto do povo. Assim, a visão que se tem dessa
“formação europeia” é mais distante, mais “seca”, com mais separação entre as pessoas (comuns) e os sacerdotes.
Assim, chegaram para modificar e “modernizar” uma educação que não existia nem nas escolas públicas, nem nos colégios católicos tradicionais, mas sem deixar de lado, é claro, a mensagem cristã e os valores que vêm dela.
Em 1959, chega ao Colégio o Padre Paul-Eugène Charbonneau, que colaborou para que se consolidasse o projeto pedagógico de formação integral proposta pelo Padre Corbeil, seu fundador e que o dirigiu por 40 anos. Padre Charbonneau teve uma trajetória intelectual e pedagógica importante no Brasil:
foi professor de filosofia no Santa Cruz, escreveu 45 livros sobre os mais variados temas, como: “Cristianismo, Sociedade e Revolução” em 1967, “A escola moderna, uma experiência brasileira: o Colégio Santa Cruz” em 1973, “Da Teologia ao Homem: ensaio sobre a Teologia da Libertação” em 1985, “Educar:
de ontem para amanhã” em 1985, e assumiu a vice-direção em 1965, cargo que exerceu até 1987, ano de sua morte.
Desse modo, já como parceiros e amigos, seguem nessa trajetória de transformação da educação até então exercida no país. Em 1966, o Conselho Federal de Educação autoriza o Colégio a funcionar como Escola Experimental com currículos, métodos e períodos escolares próprios, pelo Parecer CFE nº 107/66. O relator do Parecer, Conselheiro José Borges dos Santos, escrevia entre outros argumentos:
Além de outros requisitos, o Colégio Santa Cruz goza de excelente reputação não só na cidade de São Paulo, mas em todos os meios educacionais do país. Pode-se ver que é uma Escola inspirada, movida e dinamizada pelo propósito de aprimorar, mediante experiências incessantes, os meios, instrumentos materiais e humanos destinados à educação42.
Também no ano de 1966, o Colégio começou a publicar seus Planos Diretores dos cursos ginasial e colegial, dos quais constavam, além da Palavra do Diretor, que sempre lembrava a evolução dinâmica das experiências pedagógicas e pastorais, os objetivos gerais, bem como os específicos de cada curso, sua metodologia e a programação de cada matéria curricular (Padre Corbeil, 1992). Esses Planos Diretores são publicados a cada ano, até hoje, e são remetidos a todas as famílias de alunos.
42 Publicação interna: Padre Corbeil, “Memórias”, Colégio Santa Cruz, 1992, p. 90.
E, nesse mesmo ano ainda, acontece a publicação do livro: “Educação Brasileira e Colégio de Padres”, escrito pelos Padres Gilles Beaulieu, C.S.C. e Paul-Eugène Charbonneau, C.S.C., com a colaboração do Dr. Luís Arrôbas Martins, que escreveu, segundo CORBEIL (1992, p. 91), um “magnífico capítulo sobre a evolução da escola secundária no Brasil a partir de 1549”.
Os outros dois padres trataram, de uma maneira mais particular, da
“democratização”, “desclericalização” e “sacerdotalização”, especialmente do Colégio Santa Cruz.
A intenção precisa do presente trabalho é a de nos “situar como sacerdotes” no problema da educação brasileira.
A tendência atual é tornar a dar aos leigos seu lugar na Igreja.
Isto significa que os padres recuarão em muitos domínios, onde, sob a pressão de circunstâncias fortuitas, tiveram que exercer inúmeras tarefas supletivas. O acidental que se prolonga não se transforma facilmente em essencial e em definitivo? Esta confusão deu-se na Igreja que, pouco a pouco, se clericalizou.
Os padres conciliares subscreveram em conjunto a vigorosa fórmula do Monsenhor Wright, bispo de Pittsburg: “é preciso que a Igreja apareça como sacerdotal e não como clerical;; como sacerdotal pelo fato de que todos, leigos e padres, estão unidos na participação ao sacerdócio único do Cristo, se bem que os padres participem dele, de maneira especial e insubstituível;; e não como clerical, porque é preciso que, na Igreja, tudo não se resuma à influência e à iniciativa dos padres”.
De acordo com a teologia do sacerdócio, é preciso afirmar que, mesmo como educador, a tarefa específica do padre é a Evangelização. Essencial e exclusivamente, a fim de que, por seu intermédio, prossiga a mediação do Cristo entre os filhos dos homens.
Por ora, nossa reflexão inicial se aplicou ao seguinte esquema, forçosamente incompleto: 1. o retorno aos pobres, com o problema central, para nós, da democratização da escola;; 2. o retorno aos leigos, com a consequente desclericalização da escola;; 3. o “aggiornamento”, com a questão central para nós, da sacerdotalização das tarefas.
(BEAULIE, CHARBONNEAU, ARROBAS-MARTINS, 1966, p. 91, 112, 119, 122)
A “desclericalização” deveria acontecer em sua estrutura, integrando leigos em todos os níveis, e deixando claro que para ser uma escola cristã, não é preciso, de forma alguma, ser clerical (BEAULIEU, CHARBONNEAU &
ARRÔBAS MARTINS, 1966). Dessa forma, isso se fez, pela falta de padres -
não haviam mais sacerdotes se formando na Congregação, nem no Canadá e nem aqui no Brasil -, e pela mudança a que se pretendiam fazer;; assim, em 1966 houve a nomeação de professores leigos como diretores pedagógicos e assistentes da direção dos cursos ginasial e colegial: 525 alunos, 7 padres e 32 professores leigos. Em 1969, as duas diretorias de curso eram compostas, cada uma, por três professores leigos.
Por desclericalização da escola, entendemos a decisão lúcida e corajosa de devolver gradualmente aos leigos cristãos todas as tarefas acidentais e supletivas que até agora exercia o padre-educador na escola:
a. vigilância e disciplina;;
b. esportes, artes, coral, etc;;
c. ensino de matérias profanas;;
d. quadros superiores de direção acadêmica ou formação geral:
prefeitos, sub-prefeitos de estudos ou de disciplina, orientador pedagógico, psicólogo escolar, orientador profissional, etc;;
e. quadros superiores de administração: secretaria, economato, procuradoria, etc;;
f. direção do estabelecimento. (BEAULIE, CHARBONNEAU, ARROBAS-MARTINS, 1966, p. 125-126)
A “democratização”, seria fazer um esforço para que a escola fosse efetiva e amplamente aberta a todos, sem discriminação de espécie alguma (BEAULIEU, CHARBONNEAU & ARRÔBAS MARTINS, 1966). E se fez rapidamente, pois, em 1973, o Colégio tinha 1115 alunos e 50 professores. No entanto, o ano marcante da “democratização” se deu em 1974, quando se completou o curso primário de quatro séries. Abriram-se matrículas para ambos os sexos e iniciou-se o curso supletivo de 1o grau noturno, gratuito para adultos.
O número de alunos e alunas passou para 1818, sendo 1518 no ensino regular
diurno e 300 no noturno, com 108 professores. E, em 1992, o curso supletivo já tinha o 2o grau e alunos e alunas em todas as séries dos cursos regulares e supletivos, e contava com 2500 alunos, sendo 1800 dos cursos regulares diurnos e aproximadamente 700 nos cursos supletivos noturnos, e 165 professores e professoras.
Quanto à “sacerdotalização” das tarefas dos padres, significaria que eles deveriam exercer um cargo unicamente sacerdotal, ou seja, que eles fossem apenas os portadores do Evangelho, nada mais (BEAULIEU, CHARBONNEAU
& ARRÔBAS MARTINS, 1966).
O “aggiornamento”, ou seja, a sacerdotalização das tarefas é entendida aqui como sendo o resoluto esforço para devolver ao padre, que trabalha em escola e na educação em geral, seu papel próprio e insubstituível de ministro de Deus, de pastor e apóstolo, de evangelizador dos homens. Ela exige:
a. que os Colégios de padres, “colégios de diáspora”, não sejam mais fechados sobre si mesmos, mas completamente abertos e dando testemunho à imensa maioria de colégios públicos e leigos separados de Deus e privados da presença sacerdotal;;
b. a constituição de equipes sacerdotais de educadores, operando não somente no plano local de um colégio, mas também nos planos mais vastos de bairro, de setor, de diocese, de país;;
c. a penetração nos setores de educaçãoo, onde a ausência dos padres é imperdoável: todo o ensino técnico e normal, a alfabetização das massas, o ensino elementar;;
d. a renovação dos métodos de trabalho:
- no plano do grupo:
o adaptação, conforme os casos, da pastoral da catequese, comunicação da mensagem evangélica;;
o adaptação da pastoral litúrgica para desenvolver o sentido do sagrado e a presença do Cristo;;
o renovação do ensino religioso sistemático (no sentido habitual do termo). Esta tarefa pode também ser exercida por leigos cristãos;;
o despertar e formar jovens para o apostolado (ação católica, movimento missionário, etc).
- no plano do indivíduo:
o administração dos sacramentos;;
o revisão do conceito de “direção espiritual”;;
o animação cristã da orientação educacional junto às famílias, professores, alunos.
e. a criação de um espírito comunitário: este espírito não se inventa, ele se aprende, quando o vemos vivido pelos outros. Donde a necessidade para os padres-educadores de darem testemunho, em sua própria vida, deste espírito comunitário. (BEAULIE, CHARBONNEAU, ARROBAS-MARTINS, 1966, p. 127-129)
Mas, mesmo o livro valorizando muito o papel do sacerdote na pastoral educacional, Padre Corbeil disse:
Não posso concordar plenamente com a conclusão de um dos autores de que o padre deve exercer um cargo essencial e exclusivamente sacerdotal, sendo apenas portador do Evangelho. Como se o padre que recebeu de Deus este dom, não pudesse ser um excelente educador e não menos excelente professor de uma disciplina, que lhe servirá para passar a mensagem evangélica através de seu amor, competência e testemunho.
(CORBEIL, 1992, p. 91)
Mas, a grande questão sobre a “sacerdotalização” trazida pelos autores, era sobre o distanciamento que acabou acontecendo dos padres com sua missão evangelizadora.
Apesar do Colégio ter colocado em novos termos as relações entre o padre-educador e seus alunos: a amizade, a franqueza, a confiança e a abertura entre um e outros, que pode ter ajudado a mudar a imagem que os jovens tinham dos sacerdotes e, inclusive, aproximando-os a ponto de poderem conversar sobre questões religiosas e espirituais de forma mais aberta e fácil. Em que a preocupação social e apostólica de muitos alunos, a prática religiosa de outros tantos, enfim, uma vivência cristã mais natural, grupos sobre espiritualidade e retiros espirituais pudessem ter sido renovados;; trouxe, também, uma percepção de que toda essa mudança pode ter feito com que os padres tivessem deixado de lado a sua finalidade primeira e essencial que era a evangelização (BEAULIEU, CHARBONNEAU & ARRÔBAS MARTINS, 1966). Por isso, fazer com que voltassem a ser “somente” sacerdotes estava se tornando importante naquele momento.
O Ensino Religioso tinha ficado em segundo plano e, quantitativa e qualitativamente, estava deficiente. Para eles, a percepção de que poderiam ter feito uma inversão de valores, ou seja, terem dado mais importância ao lado intelectual do que o lado espiritual estava deixando-os preocupados por não estarem cumprindo a parte evangélica de sua missão.
Nossa equipe sacerdotal: no plano jurídico, formamos uma comunidade (a Congregação de Santa Cruz);; no plano profissional, somos um grupo unido de educadores;; no plano humano, vivemos como bons amigos. Mas no plano espiritual, temos conseguido sempre, enquanto grupo, por em comum a nossa vida propriamente sacerdotal e apostólica? Neste plano, não nos teremos isolado uns dos outros, levando vida solitária em comunidade? Atrás disto, não se esconderá um individualismo espiritual?
A tomada de consciência destes problemas nos levou a assumir, em conjunto, a animação pastoral do Colégio e a fazer semanalmente uma revisão de vida, tentando, dessa maneira, estar unidos entre nós “por uma fraternidade íntima que espontânea e livremente se manifesta no mútuo auxílio, tanto espiritual como material, tanto pastoral como pessoal, em reuniões e comunhão de vida, trabalho e caridade” (Lumen Gentium, 28). (BEAULIEU, CHARBONNEAU & ARRÔBAS MARTINS, 1966, p. 158)
Assim, no próprio ano de 1966, começa uma intensificação das atividades de orientação e animação espiritual, formando-se para tal objetivo, “Equipes de Espiritualidade”, com padres e professores leigos como membros, atuando como um “braço” da pastoral do Colégio.
Em 1967, o Padre Charbonneau deixa o seu cargo de Diretor de Curso para assumir a animação espiritual do mesmo, e a disciplina de Educação Religiosa que, pelo menos desde 1962, contava inclusive com aulas de Cultura Religiosa no Colegial e era obrigatória para todos os alunos fazendo parte do currículo regular, passa a ser facultativa, uma vez por semana, na Capela e ministrada por professores leigos e sacerdotes, que acharam vantajoso, naquele momento, poderem “unir o ensinamento à vivência litúrgica e sacramental”
(Plano Diretor de 1967).
A Educação Religiosa permanece em transformação nos anos seguintes e sempre à frente dos pensamentos e reflexões dos padres de Santa Cruz, que já eram visionários, e além das Leis Educacionais Brasileiras nesse setor. Muito antes de estar na Constituição, nas LDBs (Leis de Diretrizes e Bases para o Ensino), já era tratada como disciplina curricular.
Em seu Projeto Educacional43 atual, a Instituição deixa clara esta marca:
“O Colégio Santa Cruz é constituído historicamente por uma filosofia humanista, de abertura à diversidade de ideias e, consequentemente, ao respeito a credos religiosos diversos, ou à ausência deles”. Algo que para um colégio católico talvez não soasse tão bem. Seus verbos mobilizadores são aprender, cuidar, conviver e atuar. Tem como princípios e ideais que “o homem inteligente é um ser livre, e a criança, desde o começo de sua existência racional, deve aprender que o acesso à liberdade é legítimo. Mas o homem só pode ser livre se for responsável. A vida escolar deve permitir aprender essa lição indispensável”. E, como valores, a educação como um “processo de humanização que aspira à caprichosa construção de um sujeito que faz escolhas e que se responsabiliza pela transformação – de si mesmo e do mundo em que vive”.
O Projeto Educacional do Colégio Santa Cruz apresenta sua história como uma herança que é ensinada pelos exemplos, pela experiência e ação. Num
43 Publicação interna: Projeto Educacional do Colégio Santa Cruz, 2015, p. 9, 11, 12.
Figura 11: Padre Charbonneau em seu escritório no Colégio
Santa Cruz. Fonte:
http://www.cei.santacruz.g12.br/~50 anos/revista/fotos/corbeil%20e%20 charbonneau/pe%20charbonneau%
20escrevendo.jpg. Acesso em 12 de novembro de 2017.
movimento que vai ao passado pensando no futuro, entre a “tradição e a revolução”.
Desse valor essencial do amor nascem os demais, que precisamos construir na escola, nesse lugar privilegiado de troca de experiência e conhecimento do mundo e dos outros. (...) Na escola, aprendem-se a separação e a insegurança, mas também se vivem o encontro e sustentação por meio do outro;; vivem-se a disputa e o conflito, mas também se adquire o conhecimento das próprias capacidades de superar a frustração por meio da palavra e do convívio;;
vivem-se a competição e o medo, mas também a experiência da colaboração e da coragem adquiridas pela amizade e pela solidariedade;; vivem-se o desconhecimento e a fragilidade, mas também a alegria de aprender e a força do conhecimento construído pela pergunta e pela resposta do outro.
(...) O valor máximo de pertencer à espécie humana supõe nessa capacidade de amar e de nos identificar a partir do outro, de uma coletividade. Capacidade de ser solidário. A solidariedade pressupõe uma comunidade. Na escola, aprendemos a ser solidários pertencendo a um mesmo conjunto e partilhando uma mesma história.44
O Projeto traz também a citação dos dizeres do fundador da Congregação de Santa Cruz, o Padre Basile Moreau, em sua Carta Circular 36, de 1849, citada no Capítulo 1: “Não queremos que nossos alunos sejam ignorantes de qualquer coisa que devam saber...”, como uma linha mestra e base de toda a educação do Colégio Santa Cruz, ou seja, que consegue conciliar a doutrina católica que orienta a instituição e a sua concepção educacional pluralista, que defende e respeita a liberdade de pensamento e os direitos humanos, refletidos no currículo de cada curso, nas atividades, nos projetos interdisciplinares, na atuação voluntária e nos eventos culturais. Numa formação multidimensional junto a proposições humanistas, como a razão e o intelecto, a moral e a ética, a emoção e a sensibilidade, a memória e a criação do futuro.
Herança de toda uma história e trajetória voltada a um olhar para si de maneira a enxergar o outro, de conviver com o outro, quer quem seja ou onde
44 Publicação interna: Projeto Educacional do Colégio Santa Cruz, 2015, p. 13.
esteja, de maneira ser possível o conviver. Como nos deixou escrito Charbonneau:
O próprio homem deverá travar a luta que lhe permitirá viver simultaneamente em seu corpo e em seu espírito, isto é, viver integradamente sua vida de ser humano. Isto ele não pode delegar a quem quer que seja;; tem que tomar em mão suas esperanças e transformá-las em realidades, à força de luta. Esta é a consequência direta da liberdade que lhe é outorgada em sua natureza espiritual. É o que nos lembra Foucault: “é na medida em que é livre e racional...
que o homem é, na natureza, o ser que foi investido de responsabilidade de cuidar de si mesmo”. A Teologia da Libertação, portanto, como a Revelação na qual se baseia, se torna uma provocação. Lança ao homem um desafio decisivo: se queres a Justiça, é a ti que cabe instaurá-la.
(...) Diante da Injustiça e das injustiças não há resignação que se justifique. Poder-se-ia até dizer que nesta matéria, resignação é culpabilidade. Em nenhum outro plano são mais verdadeiros os dizeres de Dostoievski: “Cada um de nós é culpado diante de todos, por todos, e por tudo”. Isto tem que levar-nos a refletir muito e nos mostra como as teses essenciais da Teologia da Libertação não admitem contestação. Quando a Injustiça gera Pobreza, é preciso que os pobres se deem as mãos para acabar com a Injustiça. Tal proposta nada tem de subversivo;; simplesmente exprime com simplicidade, mas de maneira explícita, o que a Palavra de Deus, de um lado, e a própria natureza do homem, de outro, impõem a todos os que são presas deste Mal que envolve toda a humanidade: a Injustiça que impede os homens de viverem como homens.
Este combate será a contribuição do Homem ao seu devir. Pois não há parada no caminho do seu devir. Ele está sempre a caminho:
por vezes avançando, outras vezes retrocedendo e se desumanizando, muitas vezes hesitando na procura do seu caminho em meio a todas as dúvidas. Segundo uma expressão de Sartre, que não é senão celebração de um tema conhecido hoje por toda a antropologia, “a humanidade não é, senão que está em devir”. E é ao próprio homem que cabe promover seu futuro, lutando contra tudo o que for de molde a imobilizá-lo ou a fazê-lo retroceder no ser. O que reduz – como acontece no caso da pobreza e da miséria, tais como as conhecemos neste momento da nossa civilização – a viver como sub-homem, é um
mal. Como tal é preciso aliar-se contra ele, e impedir que ele destrua ainda mais seres humanos que vivem de maneira bem pouco humana.
(...) Mas será preciso compreender que tratar do homem, do seu devir, do seu futuro, do seu processo de Evolução, é operar uma síntese entre dois discursos: um antropológico, o outro teológico, que se completam para descobrir os caminhos que ele deverá percorrer a fim de continuar a crescer e a ser mais homem do que nunca.
(CHARBONNEAU, 1985, p. 182-185)
3. O Ensino Religioso do Colégio Santa Cruz a partir dos Planos Diretores
3.1. Os Planos Diretores
O Plano Diretor apresenta como será o ano letivo, permanências e mudanças, novidades, o calendário escolar, o componente curricular de cada série e seus conteúdos programáticos, organização didática, administrativa, Pastoral e o Projeto Pedagógico. Dando atenção especial aos objetivos amplos, como meta geral da escola e objetivos específicos a serem alcançados pelos alunos. E é preparado pela Direção Geral, pelas equipes de direção e coordenação de cada curso. Além de informar sobre a organização da estrutura física e sua equipe de educadores e funcionários gerais.
3.2. Fases da Educação Religiosa do Colégio Santa Cruz
Após um levantamento de documentos históricos, os Planos Diretores, foi possível observar algumas fases da Educação Religiosa praticada no Colégio Santa Cruz, desde a sua fundação.