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Quem é o aluno a distância – o mito do aluno autônomo

4.2 O aluno a distância e suas necessidades

4.2.1 Quem é o aluno a distância – o mito do aluno autônomo

Partindo-se do pressuposto de que o aluno é o centro de qualquer processo educativo de qualidade, tal deve ser o caso na EAD. O aluno a distância é figura central do processo de ensino-aprendizagem e todo o curso é desenhado visando a otimização do seu desempenho. Uma das regras de ouro para o sucesso de um programa de EAD (GARCIA ARETIO, 1996; PRETI, 1996; MOORE;

KEARSLEY, 1996) é o conhecimento do público-alvo para o qual se está planejando. Quem é este aluno? Quais as suas expectativas? O que ele busca/necessita? Responder estas questões, ainda que de forma ampla e genérica, é uma tarefa primordial para as instituições de EAD.

Para compreender um aluno “autônomo”, é necessária uma compreensão clara dos significados do termo autonomia e da autonomia do aluno a distância. Preti (2000, p. 130), coloca que autonomia tem um significado etimológico.12

Segundo Preti (op. cit. p.131), numa relação pedagógica, autonomia implica em um reconhecimento da capacidade do outro, respeitando-o e compartilhando com ele a construção do conhecimento. Há aí um caráter político inegável. O outro lado é o lado do responsabilizar-se pelo próprio conhecimento, pela sua formação, objetivos e fins: “tornar-se sujeito da formação para si mesmo”.

O autor mostra que a autonomia tem diversas dimensões, como a dimensão ontológica (faz parte do ser; todo ser traz em si esta possibilidade); política (tem objetivos, faz parte de um projeto maior, de vida); e uma dimensão afetiva, onde é preciso existir prazer, motivação, pois aprende quem está motivado para a aprendizagem. Só desenvolve sua autonomia potencial quem sabe o que quer.

Quando um estudante recebe informações que o levem a pensar que o seu sucesso (...) se justifica pela conjugação das suas capacidades com o dispêndio de esforço (...) desenvolve a sua percepção de auto-eficácia, melhora a qualidade de sua execução e, de acordo ainda com a teoria cognitivo-social, eleva o seu estado de motivação (CERDEIRA, 1995, apud PRETI, op. cit., p.4).

Cranton (1996) destaca como características da autonomia a cooperação, o respeito mútuo, a criatividade individual, a flexibilidade, o criticismo racional e a independência. Segundo a autora, estas características são fundamentais para o educador, especialmente de indivíduos adultos, que busca promover um processo autônomo de aprendizagem.

Segundo Lebel (1994), a autonomia do estudante é altamente desejável, mas nem sempre é uma realidade. Deschênes (apud LEBEL, op. cit., p. 3) destaca

12 Do grego. Palavra composta do pronome reflexivo, com posição atributiva, autos (próprio, de si mesmo) e do substantivo nomos (lei, regra, norma)

que nem todos os adultos estão preparados para a autonomia no aprender e podem inclusive, sentirem-se pressionados em situações de aprendizagem que exijam deles o controle de limites e recursos. Hostler (1986) critica os sistemas tradicionais de ensino, os quais não permitem o desenvolvimento e não educam para a autodireção, o autocontrole.

Wedemayer (apud KEEGAN, 1992, p.77), partia também de uma visão do estudante a distância como autônomo e defendia que o sistema de EAD deveria pôr grande parte da responsabilidade pela aprendizagem no próprio estudante. Para Wedemayer, a autonomia do estudante em cursos a distância está relacionada a três questões: os programas deveriam ser flexíveis, permitindo aos estudantes determinarem seu próprio ritmo, individualizados e ofertarem liberdade na determinação dos objetivos. A flexibilidade dos programas implica que os estudantes podem determinar seu ritmo de estudo de acordo com as circunstâncias pessoais e necessidades. A individualização do aprendizado implica que o estudante deve ter liberdade para seguir um ou vários cursos. A autonomia do estudante também implica que ele tenha liberdade na definição de seus objetivos de aprendizagem, atividades e avaliação de seu desempenho.

Na concepção de Wedemayer, o tutor também desempenha um papel fundamental. Ele é visto como “o monitor e motivador diário da autonomia do estudante a distância” (apud KEEGAN, 1992, p.78).

A proposta da autonomia do aprendiz é que este irá assumir responsabilidade pela regulação e disciplina e desenvolver a capacidade de aprendizagem autodirigida, que é a afirmação da maioridade de uma pessoa educada (KEEGAN, 1992, p. 78).

Moore (apud LEBEL 1995) define um aprendiz autônomo como:

uma pessoa que identifica uma necessidade de aprendizagem ao se deparar com um problema, uma habilidade que precisa adquirir ou uma informação que ele não possui. Ele é capaz de formular sua necessidade de aprendizagem em termos de objetivos gerais e específicos e de fixar, de modo mais ou menos explícito, os critérios de realização.

Ou seja, o estudante autônomo, a partir de uma dimensão/interpretação didática da autonomia (HOLMBERG, 2000), é professor de si mesmo e assume uma

postura de auto-docência. Este modelo também vai desafiar o professor a abandonar o modo expositivo de ensino e adotar uma postura que respeite a autonomia do aluno.

Pesquisas e publicações diversas (INGLIS et. al., 1999; POTTER, 1998; RUMBLE, 2000), indicam que, para que uma abordagem educacional realmente possa ser vista como ‘centrada no aluno’, sérias pesquisas e recursos devem ser focados nos aspectos críticos que afetam a disposição do aluno para estudar a distância, fatores que podem impedir o aluno de se matricular e progredir, assim como os aspectos motivacionais, além do que devem ser consideradas também as questões econômicas, disponibilidade de tempo, características pessoais, etc. (RYAN, 2001, p. 76).

Qureshi et. al. (2002) também destacam estas questões e apontam que o aluno a distância normalmente é muito influenciado pelo seu meio.

Os estudantes que buscam cursos a distância representam, segundo Peters (2001, p. 37):

(...) uma clientela especial. Ela é diferente da do (sic) estudo com presença, porque por via de regra se trata de adultos um pouco mais velhos. Sua idade média situa-se entre 20 e 30 anos, sendo que para cima dificilmente se coloca um limite.

Peters (op. cit.), também vai destacar as mudanças no “ponto de partida didático” destes alunos adultos, em cursos a distância, em seis aspectos principais:

1. Experiência de vida muda a forma de encarar e avaliar os benefícios dos estudos.

2. Harmonizar estudo e trabalho profissional é um desafio, pois a maioria dedica-se aos estudos em tempo parcial.

3. Vêem oportunidade como uma segunda chance, uma vez que não puderam estudar quando mais jovens.

4. Buscam um status socioeconômico mais elevado, em um contexto social cada vez mais competitivo.

5. São mais qualificados, pois muitos já estudaram antes e com sucesso, o que reflete na sua motivação e na atitude que apresentam em relação ao estudo.

6. Para o aluno adulto, o estudo tem função diferente, estando inserido de forma clara e definida em seus planos de vida, atuais ou futuros. Ou seja, os alunos que estudam a distância normalmente são adultos, preparados para fazer escolhas e tomar decisões, sendo motivados e com um foco específico definido. Estes sabem porquê e para quê estão realizando determinado curso. Assim sendo, a escolha do curso, freqüentemente, está relacionada com objetivos específicos, como uma promoção no trabalho ou adquirir determinada habilidade que será importante na realização de suas atividades no trabalho, entre outras (MOOD, 1995).

Para o aprendiz adulto, o mais importante é incorporar novos conhecimentos aos que já possui, quer respostas às suas necessidades e não está interessado em aprender por aprender. Ele está mais inclinado a desafiar professores e colegas com experiências da vida real que contradizem estudos hipotéticos.

“Estudantes adultos trazem uma grande variedade de interesses e experiências para a sala de aula. O processo de instrução que aproveita esta riqueza torna-se mais profundo e envolvente para todos” (CAFFARELLA, Apud, AL-ASHKAR, 2000).

Ao apontar para as razões que levam os alunos a distância a optarem por esta modalidade de estudo, Mood (1995) destaca que estas são relacionadas a questões como o tempo disponível para os estudos, a localização geográfica das instituições que oferecem o tipo de formação que o aluno procura, em relação ao seu local de residência e trabalho, responsabilidades na família ou trabalho, e até condições climáticas adversas, onde o próprio deslocamento até o local de estudos pode colocar em risco a segurança física do aluno.

Mood (op. cit., p. 102), também destaca que mesmo “estudantes altamente motivados que se matriculam em um curso a distância por iniciativa própria consideram esta experiência solitária, difícil e, muitas vezes, assustadora”. A sensação de isolamento, ou distância social (GUNAWARDENA; ZITTLE, 1996) ou

transacional (MOORE, 2002), aparece como uma característica da EAD que está relacionada diretamente com a ausência de serviços básicos de apoio ao aluno, como o aconselhamento e acompanhamento pré e pós-matrícula (MOOD, 1995; LEWIS, 1995).

Não importa qual o sistema de contato oferecido ao aluno a distância, correspondência, telefone, ou comunicação mediada por computador, ainda é muito mais fácil para o aluno on-campus ficar alguns minutos após a aula e discutir com o professor, procurá-lo na sua sala em horários preestabelecidos, ou solicitar uma consulta especial. Até mesmo os estudantes que comutam até o campus têm mais acesso aos professores que o aluno a distância (MOOD, 1995, p.102).

Esta constatação “fatalista”, apresentada pela autora, vem sendo desmistificada pelas possibilidades oferecidas pelas novas tecnologias de comunicação e informação aplicadas à EAD. A oferta de oportunidades extensivas de momentos de interação/comunicação do estudante com o professor, colegas e instituição, acredita-se, deve mudar esta concepção.

Além destas dificuldades, existem outros “fatores externos” que devem ser considerados, pois também podem atuar como desmotivadores e levar o estudante a abandonar seu curso. A grande influência de fatores externos ao curso, como trabalho e família, que para os estudantes vêm em primeiro lugar e são considerados como compromissos mais importantes, é apontada em vários estudos na área, entre os quais pode-se destacar Garland (1992) e Brindley (1987), citados por Mood (1995). Ambos os trabalhos mostram que trabalho e família são causas importantes de desistência em cursos a distância.

Fiúza (2002), também conclui em seu trabalho que a família, também, é um dos principais agentes motivadores dos alunos a distância. Da mesma forma que a família atua como motivadora, as questões familiares também podem levar ao abandono de um curso a distância, como reforça Evans (1994).

Fatores técnicos como o acesso à tecnologia e o domínio desta, também podem ser vistos como uma dificuldade a mais pelos estudantes, por isso a importância de uma estrutura de suporte técnico eficiente, além da preparação anterior do estudante para a utilização das mídias adotadas (DEKKERS; RAHMAN, 2000; KVAVIK; HANDBERG, 2000; van DUREN et. al., 1999). Todas estas ações

devem visar a construção da autonomia por parte do aluno, pois esta conquista será facilitadora do seu processo de aprendizagem a distância.