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A política pública em si é um campo complexo e dinâmico, que pode envolver universos de políticas públicas (policy universe) distintos. Tais universos são definidos por Wilks e Wright (1987 apud SANTOS, 2002) como um campo que abarca todos os atores de diferentes comunidades de políticas públicas (policy community) com interesses direta ou indiretamente em um mesmo foco de políticas. Os diferentes tipos de relacionamentos entre os agentes públicos e privados envolvidos nesses universos influenciam no processo e no resultado da política. E a abordagem de Redes Políticas (policy networks) possibilita compreender como esse aglomerado de atores, independente da convergência de interesses, influencia o sucesso ou o fracasso de uma política.

Redes Políticas podem ser definidas como um conjunto de atores (membros de uma ou mais comunidade política e/ou epistêmica nacionais ou internacionais) conectados uns com os outros através de uma variedade de relacionamentos relativamente estáveis, não hierárquicos e de natureza interdependente, envolvidos na elaboração de uma política específica. (BÖRZEL, 1998; SANTOS, 2002; KLIJN,1998). Ao redor de problemas e dos programas dessas políticas, esses atores negociam e trocam recursos para alcançar objetivos comuns e participam do processo de tomada de decisão formando, de acordo com Klijn (1998) um contexto, no qual tem lugar o processo político. Por isso, a abordagem de redes políticas apresenta possibilidades de analisar a relação entre o contexto e o processo da construção de políticas.

Note-se, entretanto, que as comunidades políticas não são necessariamente organizadas em redes. Não basta que os atores estejam se relacionando. A natureza das relações estabelecidas – não hierárquicas e interdependentes – irá definir se o processo de formulação das políticas públicas ocorre ou não via redes. Do mesmo modo, a convergência absoluta de interesses entre os atores que as compõe não é imperativa. Os interesses desse conjunto de atores podem convergir em relação a um determinado objeto da política e divergir em outros aspectos.

No processo de formulação das políticas públicas via redes, a interação entre os atores ocorre de forma descentralizada, mesmo que caracterizada por relações assimétricas. “As políticas públicas não são formuladas, e muito menos implementadas, no contexto de uma única organização. Ao contrário, os intrincados

processos decisórios em questão dizem respeito a um conjunto de organizações e a um complexo sistema de relações formais e informais que entre elas se estabelece.” (CAVALCANTI, 1991, p. 26). Isso significa que a decisão de incluir ou excluir um problema na agenda governamental e, por conseguinte, a construção de políticas públicas não depende apenas do Estado (SANTOS, 2002). É resultado de uma complexa rede de atores. Indicando segundo Thompson e Pforr (2005) uma mudança na distribuição da influência e do poder político.

Embora exista uma pluralidade de tipologias adotadas nas investigações científicas sobre redes políticas, todas partilham um entendimento comum das redes políticas como uma conexão enérgica das relações entre atores públicos e privados, na qual os recursos são trocados (BÖRZEL, 1998). E partem de três premissas básicas: (1) Poucas soluções políticas são simplesmente impostas pelas autoridades públicas. Governar envolve reciprocidade e independência entre atores públicos e não-públicos, como também de diferentes tipos de atores públicos; (2) O processo político precisa ser desagregado para ser entendido, uma vez que a relação entre o governo e os outros atores varia conforme a área política que se estiver conjecturando; e (3) Os governos continuam, em uma última instância, responsáveis pela gestão. No entanto, antes das políticas serem formuladas por agentes políticos eleitos, as escolha políticas são moldadas e refinadas na negociação entre uma variada gama de atores, incluindo os que não são governamentais. (PETERSON, 2003).

A literatura das redes políticas pode ser estruturada em duas dimensões: redes de análise quantitativa versus qualitativa; e redes políticas como uma tipologia de intermediação de interesses versus redes políticas como uma forma específica de governança.

A primeira dimensão diz respeito aos métodos, concebendo redes como um instrumento analítico. A rede de análise quantitativa centra-se na análise das estruturas das relações entre atores, em termos de coesão, equivalência estrutural, e densidade; já a qualitativa, centra-se mais no conteúdo das interações utilizando- se de métodos qualitativos, como entrevistas em profundidade e de conteúdo, e análise de discurso (BÖRZEL,1998).

Na segunda dimensão, este mesmo autor diferencia duas escolas de pensamento: a Escola de Intermediação de Interesse (rede política como uma

ferramenta analítica) e a Escola de Governança (rede política como forma de governança). A Escola de Intermediação de Interesse adota uma abordagem prática, no sentido de que o conceito de rede política é concebido como principal ferramenta analítica que pode ser aplicada no estudo e na implementação de políticas, analisando as relações entre o governo e a sociedade. Constitui-se como um conceito maior, que integra as diferentes formas de pluralismo e de corporativismo como versões específicas de redes. Já a Escola de Governança, trata-se de uma abordagem teórica que concebe redes políticas como uma forma de governança, concentrando-se em investigações que buscam explicar como as várias redes são formadas ou como se formarão no futuro através de uma determinada interação público-privada (THOMPSON; PFORR, 2005; BÖRZEL, 1998; PFORR, 2006).

Thompson e Pforr (2005) ratificam que ambas as Escolas têm feito contribuições importantes para elevar a compreensão sobre redes políticas, através do desenvolvimento de conceitos, teorias e métodos de investigação. E sistematizam, a partir de Börzel (1998), as diferenças contidas entre as duas abordagens, conforme mostra o Quadro 2:

ESCOLA DE INTERMEDIAÇÃO DE INTERESSES

(Rede Política como uma ferramenta analítica)

ESCOLA DE GOVERNANÇA (Rede Política como uma forma de

governança) DEFINIÇÃO

Um quadro geral para analisar mudanças do Estado/sociedade, em relações públicas políticas.

DEFINIÇÃO

Uma forma particular de governança, uma mudança real na estrutura de governo que reflete mudanças nos relacionamentos entre Estado e sociedade.

PODER EXPLICATIVO

Usado para explicar todos os tipos de relações entre agentes públicos e privados na definição das políticas públicas.

• Os atores fazem ligações

(negócios/preferências business-like e relacionamentos/interesses mútuos) para negociar e implementar políticas;

• Articulações compõem a estrutura da rede política;

• Articulações analisadas dentro desta estrutura (framework);

• Redes políticas refletem o status e o poder de interesses particulares;

• Influências da eficácia dos processos de decisão política e dos resultados.

PODER EXPLICATIVO

Uma combinação de teorias relevantes (metanálise – abordagem teórica) é usada para explicar tipos específicos de relações entre mediadores públicos e privados na definição das políticas públicas.

• Atores formam relacionamentos flexíveis para compartilhar recursos e ação coletiva em políticas;

• Relacionamentos flexíveis são parte de um processo contínuo de fazer políticas;

• Reconhece a dificuldade de determinar a influência das redes políticas sobre a eficácia dos processos de decisão política e dos resultados.

PERSPECTIVAS

Um modelo relativamente simples que pode eficazmente descrever as redes políticas como elas são.

•Descritiva; • Prática.

PERSPECTIVAS

Um modelo que pode ajudar a descrever como deveriam ser as redes políticas.

• Prescritivas; • Teórica. PROBLEMAS

• Estática;

• Não é possível ajudar a explicar como as redes políticas alteram-se;

• Não é possível ligar sistematicamente a natureza de uma rede política com os caracteres e resultado do processo político.

PROBLEMAS • Idealista;

• Não se constituem numa teoria próspera, portanto tem poder explicativo limitado; • Não considera a resistência à mudança e outras ambiguidades e lacunas.

Quadro 2: Duas abordagens para o Estudo de Redes Políticas. Fonte: Thompson e Pforr (2005, p. 2).

A partir da análise deste quadro explicativo, que apresenta uma visão panorâmica das duas abordagens, e com bases nas considerações de Börzel (1998), conclui-se que a existência de redes políticas, que refletem no status relativo ou no poder de interesses particulares em uma área política, influencia (mas não determina) os resultados políticos; como também ressalta que a estrutura da rede tem uma grande influência sobre a lógica de interação entre os membros das redes, de tal forma que afetam tanto no processo como no resultado da política. Nesse sentido, a rede política apresenta-se como um instrumento de análise para examinar as relações de trocas institucionalizadas entre o Estado e a sociedade.