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Sempre senti bastante curiosidade sobre o modo como se pode trabalhar a escrita com crianças em idade pré-escolar porque no último contexto de educação pré- escolar em que estive isso não acontecia. Como nunca tinha experienciado a abordagem à escrita, as minhas hesitações sobre esse processo foram surgindo, levantando algumas dúvidas sobre o melhor modo de o fazer.

Ao longo da vivência nesta sala de JI, tenho vindo a descobrir que a abordagem à escrita ocorre de modo natural, já que é parte integrante das rotinas, partindo da curiosidade das crianças e das necessidades do grupo em organizar-se e comunicar. Esta semana apercebi-me de várias reações das crianças e do modo como elas vão experienciando a escrita e, portanto, parece-me um excelente tópico sobre o qual refletir.

É sabido que o contacto com a escrita e a leitura começa desde cedo na vida da criança, tendo em conta os ambientes em que esta vive. No entanto, é importante criar estratégias para que a criança não só conviva com a escrita e a leitura, mas para que se envolva realmente nestes processos, promovendo o contacto frequente e variado com estas competências e levando a criança a compreender as suas diferentes funcionalidades. Deste modo, a criança, envolvida na leitura e escrita, reconhecendo- as como processos naturais, “tem vontade, iniciativa e prazer, e sente-se desafiada a explorar e avançar” (Mata, 2008, p.46).

Na sala, o envolvimento com a escrita acontece de diversos modos ao longo do dia. Um deles é a escrita das notícias partilhadas no momento do “Contar, mostrar, escrever”. A educadora pergunta à criança se quer escrever sobre o que contou/mostrou e se sim, escreve em conjunto com a criança uma frase numa folha, com letras grandes e espaçadas. Depois a criança ilustra a notícia e, para os casos das crianças mais velhas, os adultos incentivam à escrita da notícia, copiando as palavras escritas.

As crianças também podem fazer trabalhos de texto no computador, copiando estas notícias para um ficheiro digital, onde precisam de fazer a associação entre as letras desenhadas pelo adulto no papel e as letras do teclado no computador. No computador podem também copiar palavras dos ficheiros de palavras (imagens acompanhadas de palavras).

Sempre que fazem trabalhos, as crianças são incentivadas a recorrer aos cartões com nomes (sendo que alguns dos cartões estão acompanhados da fotografia da criança, mas outros, correspondentes aos das crianças que já são capazes de identificar o seu nome, já não têm foto) para conseguirem identificar o seu trabalho. Depois, devem colocar o seu trabalho no separador que tem o seu nome.

As crianças também vivenciam a escrita como modo de comunicar com os outros quando escrevem em conjunto convites a outras salas ou pedidos às famílias, na construção dos registos das vivências da sala ou quando se inscrevem no mapa das comunicações para que o grupo saiba que querem comunicar algo.

Existem vários materiais e recursos na sala que promovem esta apropriação da escrita por parte das crianças, entre os quais: o computador, uma tecnologia didática que incentiva as crianças a interagir com símbolos escritos; livros variados; o seu próprio caderno onde podem representar o que desejarem; vários materiais de escrita; carimbos de letras; cartões com nomes; listas de nomes; mapa das presenças; mapa das tarefas; notícias e registos afixados.

As crianças são, portanto, envolvidas num ambiente onde são incentivadas a recorrer à escrita e à leitura como meio de identificação e de comunicação com o outro.

A atuação dos adultos também contribui para isto, tendo em conta que estes incentivam a criança a escrever como sabe, sem a pressionar, mas explicando-lhe o que pode fazer para melhorar; agem como modelo nas vezes que leem e escrevem em momentos conjuntos com as crianças (leitura e escrita do Diário, de recados e convites de outras salas, das receitas, dos rótulos dos produtos, de livros, de registos) e esforçam-se por manter registos escritos, expostos, sobre as vivências em grupo.

Relativamente à minha própria ação e, pensando sobre os momentos que tenho vivido com as crianças, penso ser capaz de seguir a mesma linha de ação, incentivando as crianças a escrever e a expressarem-se. No entanto, penso ser importante refletir especificamente sobre um dos momentos desta semana, com o AfS:

“O AfS estava a escrever no seu caderno há algum tempo. Quando me aproximei, reparei que tinha várias letras escritas, todas em linha. Perguntei-lhe

o que estava a fazer e ele perguntou-me logo “Podes ler o que está aqui escrito?”. Eu respondi “Mas quem é que escreveu?”. AfS: “Fui eu”. Eu: “Então, tu sabes o que está escrito. Ou não?”. AfS: “Não, não sei”. Eu: “No que é que estavas a pensar quando escreveste?” AfS:”Não sei, estava só a escrever letras” Eu: “Ah, está bem”. (Nota de campo, 20 de outubro de 2016).

Analisando o momento, penso que podia ter sido muito mais potencializado por mim, partindo da pergunta do AfS. Eu poderia ter explicado que ele tinha escrito algumas letras, mas que na verdade, aquelas letras todas juntas não formavam uma palavra e tentar perceber se existia alguma palavra que ele gostava de saber escrever. Podíamos ter conversado sobre a direccionalidade da escrita ou sobre a necessidade de separar as palavras entre si (já que as letras dele estavam todas seguidas na linha). Poderia ter incentivado a identificação de letras iguais e a sua contagem.

Estar desperta para a curiosidade das crianças e saber partir dela para criar situações desafiantes é extremamente importante para manter a sua vontade em conhecer e aprender e, por isso, preciso de responder-lhes de forma mais apropriada. Em termos do contexto da sala de atividades, julgo realmente que o ambiente proporcionado, em termos da organização da sala e do tipo de atividades incentivadas, assim como da postura dos adultos, é um amplo promotor do contacto com a escrita e leitura e da exploração destas competências (Mata, 2008).

A acrescentar a este ambiente e como modo de complementar os inventários que têm estado a ser construídos, parece-me ser importante que, agora que as crianças já conhecem os materiais da sala, pensar com elas num modo de identificá-los para que vejam escritas novas palavras – por exemplo, na zona de jogos, poderemos escrever que tipo de materiais está guardado em cada caixa (carros, comboios, ferramentas, legos, …); nas caixas da área da casinha, especificar que materiais se guardam em cada gaveta (alimentos; loiças; roupas; instrumentos dos médicos…).

Referências:

Mata, L. (2008). A Descoberta da Escrita – Textos de Apoio para Educadores de Infância. Lisboa: Ministério da Educação – Direcção-Geral de Inovação e de Desenvolvimento Curricular.

Anexo B.5. Semana 5 (24 a 28 de outubro de 2016)