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3. REVISÃO BIBLIOGRÁFICA PARTE I

3.3. A CADEIA DE SUPRIMENTOS FARMACÊUTICA NO CONTEXTO CONTEMPORÂNEO

3.3.4. REGULAÇÃO SANITÁRIA GLOBAL E REGIONAL E SEUS AGENTES

As regulações sanitárias têm por objetivo a proteção da saúde da população na medida em que impedem que os produtos de qualidade, segurança e eficácia duvidosas entrem no mercado nacional; no entanto, podem-se tornar uma barreira técnica. As diferentes regulações nacionais podem funcionar como barreiras significativas à expansão dos mercados de produtos. Regulamentações nacionais distintas criam muitas vezes impedimentos para as exportações dos países em desenvolvimento, quando estas exportações são necessárias para que as indústrias destes países realizem economias de escala e, com isso, possam oferecer seus produtos a preços internacionalmente competitivos (CEBRI, 2013).

As organizações farmacêuticas têm algumas peculiaridades. É um setor subordinado à intensa regulação, orientado por meio das Boas Práticas de Fabricação de Medicamentos (BPF), que visam estabelecer os requisitos mínimos a serem

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seguidos na fabricação de medicamentos para padronizar a verificação do cumprimento de uso humano durante as inspeções sanitárias (ANVISA, 2010). A meta é estabelecer padrões de operações, de modo a assegurar a estabilidade, permitindo apenas a variabilidade inerente dos processos, para atender aos altos requisitos de qualidade de medicamentos. Essa padronização deve ser estabelecida e formalizada, por meio de documentação que são evidencias do cumprimento das BPF, como alguns exemplos:

• Procedimento Operacional Padrão (POP): procedimento escrito e autorizado que fornece instruções para a realização de operações não necessariamente específicas a um dado produto ou material, mas de natureza geral (por exemplo, operação, manutenção e limpeza de equipamentos; validação; limpeza de instalações e controle ambiental; amostragem e inspeção). Certos procedimentos podem ser usados para suplementar à documentação mestre de produção de lote de um produto específico.

• Fórmula-mestra/fórmula-padrão: documento ou grupo de documentos que especificam as matérias-primas e os materiais de embalagem com as suas respectivas quantidades, juntamente com a descrição dos procedimentos e precauções necessárias para a produção de determinada quantidade de produto terminado. Além disso, fornece instruções sobre o processamento, inclusive sobre os controles em processo.

• Ordem de produção: documento ou conjunto de documentos que servem como base para a documentação do lote. Devem ser preenchidos com os dados obtidos durante a produção e que contemple as informações da fórmula mestra/fórmula padrão.

• Plano Mestre de Validação (PMV): documento geral que estabelece as estratégias e diretrizes de validação adotadas pelo fabricante. Ele provê informação sobre o programa de trabalho de validação, define detalhes, responsabilidades e cronograma para o trabalho a ser realizado; impurezas, produtos de degradação, reagentes, dentre outros, altamente caracterizados e da mais elevada pureza, cujo valor é aceito sem referência a outros padrões.

A OMS também definiu algumas práticas que orientam a garantia da qualidade das operações farmacêuticas e subsidiam as BPF, como:

• Qualificação: conjunto de ações realizadas para fornecer evidências documentadas de que qualquer componente de equipamentos, materiais críticos ou reagentes usados para obtenção do produto e que possam afetar sua qualidade ou segurança, funcionem realmente de acordo com o pretendido ou especificado, bem como os conduza aos resultados esperados (OMS, 2011). Segundo a RDC n° 17/2010, é um conjunto de ações realizadas para atestar e documentar que quaisquer instalações, sistemas e equipamentos estão propriamente instalados e/ou funcionam corretamente e levam aos

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resultados esperados. A qualificação é frequentemente uma parte da validação, mas as etapas individuais de qualificação não constituem sozinhas, uma validação de processo;

• Validação: conjuntos de ações utilizadas para provar que procedimentos operacionais, processos, atividades ou sistemas produzem o resultado esperado. Exercícios de validação são normalmente conduzidos de acordo com protocolos previamente definidos e aprovados que descrevem testes e critérios de aceitação (OMS, 2011). Segundo RDC n° 17/2010, é o ato documentado que atesta que qualquer procedimento, processo, equipamento, material, atividade ou sistema realmente e consistentemente leva aos resultados esperados;

• Calibração: conjunto de operações que estabelece, sob condições especificadas, a relação entre valores indicados por um instrumento de medicação ou sistema de medição, ou valores representados por uma medida material, e os valores conhecidos correspondentes de um padrão de referência (OMS, 2011). Segundo a RDC n° 17/2010, são conjunto de operações que estabelece, sob condições especificadas, a relação entre os valores indicados por um instrumento ou sistema de medição ou valores representados por uma medida materializada ou um material de referência, e os valores correspondentes das grandezas estabelecidos por padrões.

A regulação também orienta que a empresa farmacêutica deve estabelecer um sistema de gerenciamento de mudanças com o objetivo de manter sob controle as alterações que venham a ter impacto sobre sistemas e equipamentos qualificados, bem como sobre processos e procedimentos já validados, podendo ou não ter influência na qualidade dos produtos fabricados. Dentro do gerenciamento de mudanças, deve estar prevista a adoção de um procedimento que defina de que maneira as mudanças serão realizadas, bem como estabeleça as ações a serem tomadas, prevendo a necessidade e extensão da qualificação e validação a ser realizada, uma vez avaliada a necessidade das mesmas. Para a implementação de qualquer mudança, é necessário que sejam definidas e estabelecidas algumas etapas: elaboração, avaliação, aprovação/ reprovação, execução e monitoramento.

O cumprimento das BPF visa, em última instância garantir a segurança e eficácia dos medicamentos. Apesar de todo esse esforço de estandardização, as organizações já encontram dificuldade em manter um padrão de qualidade por todas as suas etapas produtivas.

A conformidade regulatória acrescenta um trade off na relação entre custos, riscos e grau de conformidade, nas companhias farmoquímicas, segundo RANK, STEVE, SCHEUERMANN, et al. (2005). Um baixo nível de conformidade pode repercutir em recolhimento de produtos, danos reputacionais, interdição de linhas

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produtivas por parte de autoridades regulatórias. Por outro lado, alto grau de conformidade pode implicar em aumento dos custos e diminuição da eficiência, que pode dramaticamente retardar a atividade empresarial da corporação: quando o nível de conformidade vai além de 80%, os custos começam a aumentar de novo e disparar quando o nível de conformidade se aproximar de 100% (FIGURA 18).

FIGURA 18: GRAU DE CONFORMIDADE VERSUS CUSTO E RISCO FONTE: RANK, STEVE, SCHEUERMANN et al. (2005)

Um grande desafio é alcançar a conformidade com a regulação sanitária, que seja advinda de processos robustos, cujos riscos sejam conhecidos e neutralizados. Mas a decisão chave deve ser determinada previamente: a organização quer gastar projetando processos adequados, investir em conhecimento das variáveis críticas e redução e controle de riscos, e a partir de aí ter uma produção consistente ou quer dispender recursos reparando danos à imagem e rejeitando lotes?

Historicamente, o campo da vigilância sanitária, veio se constituindo reativamente às questões deletérias de saúde pública. Na teoria, a regulação pode ser

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compreendida como o modo de intervenção do Estado para impedir possíveis danos ou riscos à saúde da população. Atuam por meio da regulamentação, controle e fiscalização das relações de produção e consumo de bens e serviços relacionados à saúde. Adicionalmente, a regulação sanitária contribui para o adequado funcionamento do mercado, suprindo suas falhas, dando cada vez mais previsibilidade, transparência e estabilidade ao processo e à atuação regulatória, a fim de propiciar um ambiente seguro para a população e favorável ao desenvolvimento social e econômico do país.10

(Fonte: http://portal.anvisa.gov.br/wps/portal/anvisa/anvisa/regulacaosanitaria).

O forte papel regulatório do Estado nos assuntos sanitários é geralmente compreendido pela existência de falhas de mercado no setor saúde e pela necessidade de preservar o interesse social no que concerne à produção e à inovação de produtos e serviços.