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2 FAMÍLIA, EDUCAÇÃO E DEFICIÊNCIA: UM DEBATE POLISSÊMICO

2.1 O contexto escolar na contemporaneidade

2.1.1 Relação pais & escola

Segundo Zago (2000, p. 20), “A família, por intermédio de suas ações materiais e simbólicas, tem um papel importante na vida escolar dos filhos, e este não pode ser desconsiderado.” É uma influência advinda de ações muitas vezes sutis e nem sempre intencionais ou conscientes.

Além das normas, valores, crenças, filosofias, propagadas pela vida familiar, é a família o componente que ancora a socialização das crianças no contexto escolar e também configura a educação nas instituições e, para tanto,

é influente direta na proximidade e distanciamento para com a escola. A família é o elemento essencial que engendra ligações com a educação e suas especificidades.

Prado (1986, p. 52) destaca que:

A família, como toda instituição social, apresenta aspectos positivos, enquanto núcleo afetivo, de apoio e solidariedade. Mas apresenta, ao lado destes, aspectos negativos, como a imposição normativa através de leis, usos e costumes, que implicam, muitas vezes, em elemento de coação social, geradora de conflitos e ambigüidades.

A autora propõe que, apesar dos conflitos, a família é primordial ao desenvolvimento da sociabilidade, da afetividade e da saúde dos filhos, sobretudo na infância e adolescência, período no qual se constitui a identidade do sujeito, em que a família é alicerce no processo de desenvolvimento.

Essa sociabilidade é desdobrada no espaço escolar, resultando nas relações estabelecidas entre a família e a escola. Parafraseando Medina (2002), quando a família entrega os filhos e a escola recebe os alunos, formam-se uma simultaneidade de sentimentos que edificarão essas relações.

Para Corsino (2002), a busca de uma conexão entre família e escola deve fazer parte de qualquer trabalho educativo que tenha como foco a criança.

Pinçon e Pinçon-Charlot (2002) pesquisaram a trajetória familiar de escolarização da elite francesa, dando ênfase às posições dominantes na sociedade, inferindo que os pais possuem certo controle com relação à prática pedagógica. Os estabelecimentos de ensino – públicos ou privados – que acolhem crianças oriundas da alta sociedade garantem o trabalho educacional da forma mais completa. Essa educação responsabiliza-se pela totalidade da personalidade dessas crianças e a família domina certos aspectos que estão além de suas atribuições. A escola deve estar em condições de consolidar os elementos de socialização transmitidos pela família, moldando sua conduta e seus procedimentos. Os autores discorrem que nos bairros onde dominam as elites, os professores mostram-se meticulosos demais em relação as suas práticas pedagógicas. Com efeito, em uma determinada ocasião, docentes foram levados a retirar um manual de leitura que tinha desagradado aos pais, porque eles julgaram muito populista.

A escola, por muito tempo, entendeu a presença dos pais como um desconforto. Independente de que lado viesse, a solicitação era vista como queixa ou até mesmo invasão. Atualmente, cada vez mais se faz essencial a participação dos pais na instituição escolar, visando à integração e à parceria, movida pelo coletivo, pois a educação integral da criança não se efetiva na fragmentação.

A família tem de delegar a responsabilidade da educação formal a quem de direito. Ao delegar a iniciação pública à escola, não se pode legislar sobre ela. Do mesmo modo, a escola não pode invadir o espaço privado das famílias. A relação entre família e escola acaba se tornando delicada e, na maioria das vezes, tensa, porque há uma pedagogização cada vez maior das relações familiares, paralela à familiarização igualmente crescente das relações escolares. A escola espera que os pais sejam professores particulares de seus alunos, enquanto os pais esperam que os profissionais da educação sejam ‘segundos pais’ de seus filhos. (SAYÃO; AQUINO, 2006, p. 107, grifos dos autores).

A proposição acima aponta um dos pontos de desequilíbrio da relação entre pais e professores, que é a incumbência das funções atribuídas às partes. A família pressupõe que a escola, além de ser responsável pelo desenvolvimento cognitivo dos filhos, deve ser encarregada de outras missões que a princípio não lhe dizem respeito. Em contraponto, a escola presume que os pais devem ser a extensão dos professores nas tarefas escolares de casa, pressupondo que eles não participam como deveriam na educação, sendo responsáveis pela carência cognitiva dos filhos.

Segundo Anversa (2008, p. 36), outro agravante na relação entre pais e professores é a falta de confiança mútua:

O diálogo com os pais é trazido em textos normalmente escritos por magistrados ou pedagogos, que normalmente pregam o relativo fechamento de uma parte dos professores aos desejos e às críticas dos pais. Na teoria o diálogo com os pais é fácil de ser assumido, porém, na prática inexiste a confiança e surgem preconceitos, suspeitas, críticas contínuas, fazendo com que o diálogo se esgote.

Acerca disso, reconhece-se que a iniciativa de estimular a participação dos pais deve vir da própria escola, precisamente da gestão. A organização do trabalho escolar constitui um conjunto de práticas, ancoradas em opções políticas, que viabilizam condições para assegurar o bom funcionamento da

instituição, de forma que se concretizem as metas esperadas. Esses princípios preconizam a perspectiva da gestão escolar em uma atitude gerencial, efetuada também pela esfera privada. Assim, segundo Silva e Lima (2009), esvazia-se a dimensão política da oferta da educação e, nessa processualidade, há o deslocamento da esfera dos direitos para a esfera dos serviços. O que concerne à questão da pedagogia é sujeitado às menções empresariais e mercadológicas.

A gestão escolar torna-se crescentemente permeável às atividades de gerenciamento levando para as margens as perspectivas político- pedagógicas, alimentando e legitimando no interior da escola atitudes de desqualificação à dimensão política do trabalho pedagógico por parte de seus profissionais. (SILVA; LIMA, 2009, p. 245).

O universo escolar não é concebido por práticas homogêneas, pois existem diferentes tendências de gestão escolar que se encontram ou se opõem, sublinhando, em alguns casos, as dimensões autocrática ou democrática. Na primeira, há o predomínio das práticas hierarquizadas e burocratizantes no processo educativo; a democrática, ao contrário, caracteriza-se por diferentes dispositivos gestoriais que assumem igual importância na dinâmica escolar.

Essa concepção diz respeito, em sua maioria, especificamente às instituições públicas, cuja formatação é vinculada firmemente ao processo de democratização e de integração de comunidade e família através dos grupos e/ou associações de pais criadas com o intuito de compartilhar as ações da escola.

Ainda que exista essa diferenciação, em nenhuma das instituições a relação entre pais e escola tem vigor. Isso porque os estudos e pesquisas – além de serem insuficientes – quase não apontam soluções, ou seja, avançam pouco com relação a atitudes práticas, que poderiam facilitar uma parceria, visto que a gestão escolar é a ponte entre pais e professores.

Essa atitude é essencial a todos, à família, aos professores, aos alunos, aos gestores, ou seja, a quem integra o processo de ensino e aprendizagem. No entanto, quando se trata de inclusão de alunos com deficiência, a escola que propiciar maior confiança aos pais estimulará a reciprocidade desta

conduta fiducial, porque a família escolherá sem dúvida a instituição que inclua e acolha seu filho no todo, indistintamente.

Existem situações que privilegiam determinadas classes sociais e excluem outras, porque mesmo que a inclusão seja obrigatória, em muitas instituições ela somente ocorre se a família se dispuser a custear certas necessidades, o que contradiz a inclusão, pois é a instituição que se responsabiliza a arcar com gastos neste sentido. Ainda assim, as elites possuem condições financeiras para empregar gastos a quaisquer situações que proporcionem melhores condições ao filho, mas isso é impraticável às famílias de estratos sociais inferiores, o que muitas vezes as afastam da acessibilidade às instituições privadas.

Busca-se, nesta pesquisa, averiguar se o investimento cultural e artístico é maior nas elites do que nas demais esferas socioeconômicas. No item a seguir, será abordada a classe social e sua terminologia, alinhavando com a discussão acima exposta sobre o investimento escolar nos diferentes estratos sociais.