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O surgimento dos chamados “novos danos”

No documento CURITIBA 2012 (páginas 75-81)

2. A TUTELA DOS DIREITOS E A RESPONSABILIDADE CIVIL PREVENTIVA

2.1 A RESPONSABILIDADE CIVIL FUNDADA NA NECESSIDADE DE

2.1.1 O surgimento dos chamados “novos danos”

A partir da perspectiva do Direito de Danos, caracterizada pela preocupação com a pessoa da vítima e a adequada reparação dos prejuízos por ela suportados, sobretudo diante da sociedade de riscos

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, é interessante constatar como a alteração da própria concepção do que consista exatamente o dano

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provocou grandes modificações no sistema de responsabilidade civil.

Com efeito, se em um determinado momento a compreensão de dano tinha como parâmetro essencialmente o patrimônio, classificando-se os danos, a partir disso, em patrimoniais e extrapatrimoniais, na atualidade referida compreensão toma novas dimensões, a partir de referenciais novos, voltados à mais ampla e integral tutela da pessoa.

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201 De acordo com Teresa Ancona LOPEZ, “O risco está no centro do Direito. Não se entende Direito sem risco, como não se entende sociedade moderna sem risco. Porém, é na responsabilidade civil atual que o risco vive seu maior prestígio e, dentro dela, se destaca o risco da atividade ou risco empresarial como a principaç teoria fundamentadora do direito de danos”. Princípio da precaução e evolução da responsabilidade civil. São Paulo: Quartier Latin, 2010, p. 44. Acerca do tema consultar GIDDENS, Anthony. Runaway World, How Globalization is Reshaping our lives. New York:

Routledge, 2000, p. 49-50.

202 “(...) a doutrina de toda parte tem empregado expressões como novos danos ou novos tipos de danos. A rigor, a alusão a ‘tipos’ mostra-se imprópria na maior parte dos ordenamentos, já que a tendência mundial hoje é a de se rejeitar a aplicação do princípio – ou da lógica- da tipicidade no que tange à definição dos danos ressarcíveis. Justamente por essa razão, o arrolamento destes

‘novos danos’ mostra-se tarefa das mais ingratas. Não sendo possível exauri-los, sua indicação tem como utilidade apenas a descrição ilustrativa da amplíssima expansão do dano ressarcível que vem chocando tribunais ao redor do mundo.” SCHREIBER, Anderson. Novos paradigmas da responsabilidade civil: da erosão dos filtros da reparação à diluição dos danos. São Paulo: Atlas, 2007, p. 87.

203 “Lo que el derecho tutela, el daño vulnera. Si el derecho tutela un determinado interés humano, éste puede ser atacado por un daño, que será un daño en sentido jurídico (daño jurídico), en cuanto contra él apresta el derecho la própria reacción. En consecuencia, el objeto del daño en sentido jurídico se configura como más limitado respecto al objeto del daño entendido genéricamente;

pues que, mientras el objeto del daño genéricamente entendido es cualquier situación favorable, que se refiera o no a seres humanos, objeto del daño en sentido jurídico no puede ser más que un interés humano jurídicamente tutelado. Ciertamente también, la reacción jurídica encuentra su razón de ser tan sólo frente al daño ocasionado a aquello que el derecho tutela y, por tanto, sólo el interes humano puede recibir la tutela del derecho”. Tradução livre:” O que o direito tutela, o dano vulnera. Se o direito tutela um determinado interesse humano, este pode ser atacado por um dano, que será um dano em sentido jurídico (dano jurídico), enquanto contra ele dispõe o direito a própria reação. Em consequência, o objeto do dano em sentido jurídico se configura como mais limitado em relação ao

A classificação das espécies de danos com parâmetro exclusivamente no patrimônio bem revelava a predominante preocupação com o caráter econômico das relações sociais, concepção característica do Estado Liberal.

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Contudo, um tal critério de aferição do conceito de dano, pautado eminentemente pela teoria da diferença entre a situação patrimonial anterior e posterior à sua existência

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, revelou-se insuficiente na medida em que se demonstrou demasiadamente reducionista, restringindo a reparação a mero meio de reposição in natura, ou mera reposição do patrimônio, como se não houvesse existido a lesão.

A partir do desenvolvimento da sociedade de riscos

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, pautada pela complexidade das relações sociais e existenciais, a própria noção de dano foi sendo modificada, passando-se à ampla proteção de valores essenciais da pessoa.

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A plena reparabilidade dos danos à pessoa passou a receber proteção de índole

objeto do dano entendido genericamente, pois que o objeto do dano genericamente entendido é qualquer situação favorável que se não se refira a todos seres humanos, objeto do dano em sentido jurídico não pode ser mais que um interesse jurídico tutelado. Certamente também, a reação jurídica encontra sua razão de ser tão somente frente ao dano ocasionado à aquilo que o direito tutela e, portanto, apenas o interesse humano pode receber a tutela do direito”. CUPIS, Adriano de. El daño:

teoria general de la responsabilidad civil. Barcelona: Bosch Casa Editorial, 1975.

204 Nesse sentido, como anota Judith MARTINS-COSTA, “A idéia de dano está no centro do instituto da responsabilidade civil, ligando-se muito proximamente ao valor que historicamente é dado à pessoa e às suas relações com os demais bens da vida. Se o mais relevante for a relação entre pessoa e os seus bens patrimoniais, economicamente avaliáveis, cresce em importância a responsabilidade patrimonial, na qual a pessoa é vista tão-só como sujeito titular de um patrimônio que, tendo sido lesado por outrem, deve ser recomposto. Se, ao contrário, em primeiro plano está a pessoa humana valorada por si só, pelo exclusivo fato de ser a pessoa – isto é, a pessoa em sua irredutível subjetividade e dignidade, dotada de personalidade singular e por isso mesmo titular de atributos e de interesses não mensuráveis economicamente -, passa o Direito a construir princípio e regras que visam tutelar essa dimensão existencial, surgindo, assim, a responsabilidade extrapatrimonial.” MARTINS-COSTA, Judith. Os danos à pessoa no Direito brasileiro e a natureza da sua reparação. Revista dos Tribunais. São Paulo, v. 789, jul., 2001, p. 21.

205 SEVERO, Sérgio. Os danos extrapatrimoniais. São Paulo: Saraiva, 1996. p. 4.

206 “Para entendermos a dimensão dos riscos que contemporaneamente ameaçam a sociedade, basta lembrarmos acontecimentos do passado recente e que deixaram marcas indeléveis, como as tragédias de Chernobyl e Bhopal, das Torres Gêmeas (11-set-2001), epidemia de AIDS, mortos em Columbine, ‘vaca louca’, gripe do frango, amianto, sílica. No Brasil, a explosão do Shopping Center de Osasco, em 1996, em São Paulo, que matou 42 pessoas e feriu gravemente mais de 400, além da destruição das lojas e cinemas; o acidente nuclear com Césio 137 e Goiânia em 1987, com quase 300 pessoas contaminadas; a abertura da cratera gigante na Via Marginal Pinheiros durante a construção de uma linha de metrô em São Paulo, vitimando pessoas e desalojando casas marginais à tragédia; o desastre da TAM em terra, com a explosão do Boeing no Aeroporto de Congonhas na capital de São Paulo; a epidemia de dengue ou de febre amarela ou da morte de inúmeras pessoas por aplicação de soro contaminado.” LOPEZ, Teresa Ancona. Princípio da precaução e evolução da responsabilidade civil. São Paulo: Quartier Latin, 2010, p. 28-29.

207REIS, Clayton. Os novos rumos da indenização do dano moral. Rio de Janeiro: Forense, 2002, p. 110.

constitucional,

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afastando qualquer forma de dúvida acerca da indenizabilidade dos denominados danos morais em sentido amplo.

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Ressalta-se, nesse sentido, que a expressão danos morais

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comumente é utilizada como sinônimo da expressão danos extrapatrimoniais, o que se revela inapropriado uma vez que se trata de relação entre espécie e gênero

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, como já alertava PONTES DE MIRANDA ao suscitar os problemas que a expressão “dano moral” poderia ocasionar:

A expressão dano moral tem concorrido para graves confusões, bem como a expressão alemã Schmerzengeld (dinheiro da dor). Às vezes, os escritores e juízes empregam a expressão dano moral em sentido amplíssimo (dano à normalidade da vida de relação, dano moral estrito, que é o dano à reputação, dano que não é qualquer dos anteriores mas também não ofende o patrimônio, como o de dor sofrida, o de destruição de bem sem qualquer valor patrimonial ou da valor ínfimo). Aí, dano moral seria dano não patrimonial.

Outros têm como dano moral o dano à normalidade da vida de relação, o dano que faz baixar o moral da pessoa, e o dano à reputação. Finalmente, há o senso estrito de dano moral: o dano à reputação.

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208 Artigo 5°, incisos V e X da Constituição Federal: V – “é assegurado o direito de resposta, proporcional ao agravo, além da indenização por dano material, moral ou à imagem”; X – “são invioláveis a intimidade, a vida privada, a honra e a imagem das pessoas, assegurado o direito a indenização pelo dano material ou moral decorrente de sua violação.”

209 Sintetiza Maria Celina Bodin de MORAES: “Assim, no momento atual, doutrina e jurisprudência dominantes têm como adquirido que o dano moral é aquele que independentemente de prejuízo material, fere direitos personalíssimos, isto é, todo e qualquer atributo que individualiza cada pessoa, tal como a liberdade, a honra, a atividade profissional, a reputação, as manifestações culturais e intelectuais, entre outros. O dano é ainda considerado moral quando os efeitos da ação, embora não repercutem na órbita de seu patrimônio material, originam angústia, dor, sofrimento, tristeza ou humilhação à vítima, trazendo-lhe sensações e emoções negativas. Neste último caso, diz-se necessário, outrossim, que o constrangimento, a tristeza, a humilhação, sejam intensos a ponto de poderem facilmente distinguir-se dos aborrecimentos e dissabores do dia-a-dia, situações comuns a que todos se sujeitam, como aspectos normais da vida cotidiana.” MORAES, Maria Celina Bodin de. Danos à pessoa humana: uma leitura civil constitucional dos danos morais. Rio de Janeiro:

Renovar, 2003, p. 157-158.

210 Destaca-se que comumente a construção da categoria de danos morais em sentido amplo é feita a partir da exclusão do que não seja danos patrimoniais, conforme explica Wilson Melo da SILVA: “Danos morais são lesões sofridas pelo sujeito físico ou pessoa natural de direito em seu patrimônio ideal, entendendo-se por patrimônio ideal, em contraposição ao patrimônio material, o conjunto de tudo aquilo que não seja suscetível de valor econômico.” SILVA, Wilson Melo da. O dano moral e sua reparação, p. 1. No mesmo sentido, conforme afirma Orlando GOMES, “A expressão dano moral deve ser reservada exclusivamente para designar o agravo que não produz qualquer efeito patrimonial. Se há conseqüência de ordem patrimonial, ainda que mediante repercussão, o dano deixa de ser extrapatrimonial.” GOMES, Orlando. Obrigações. Rio de Janeiro: Forense, p. 330.

211Como afirma Carlos Alberto BITTAR, “nem toda violação a direito da personalidade produz dano moral, ou somente dano dessa natureza: pode ou não haver, ou mesclar-se a dano patrimonial.

Com efeito, não se pode, verbi gratia, extrair que da lesão a componente físico (direito da personalidade) provenha dano moral.” Reparação civil por danos morais. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1993, p. 33. No mesmo sentido, SALVI, Cesare. La responsabilità civile. 2ª ed., Milano:

Giuffrè, 2005, p. 66-67.

212 PONTES DE MIRANDA. Tratado de Direito Privado. 3ª ed. Rio de Janeiro: Borsoi, 1971, § 3.107, p. 30/31.

Dessa forma, entende-se que a classificação mais coerente e adequada para abranger todas as categorias de danos que afetam diretamente e na integralidade a pessoa seria denominada de “danos à pessoa”, uma “fattispecie em construção”

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capaz de englobar qualquer indevida afetação do ser humano em sua integridade psicossomática e existencial, abrangendo o “dano biológico ou à saúde”

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, o “dano ao projeto de vida”, o “dano moral em sentido estrito”

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, o “dano existencial ou dano à normalidade da vida de relação”

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, dentre outros.

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213 MARTINS-COSTA. Judith. Os danos à pessoa no Direito brasileiro e a natureza da sua reparação. Revista dos Tribunais. São Paulo, v. 789, jul., 2001, p. 27-28.

214 Sobre o dano à saúde, que afeta a integridade física e mental da pessoa, consultar: ALPA, Guido. Responsabilità civile e danno: lineamenti e questioni. Bologna: Il Mulino, 1991, p. 506 e segs;

LORENZETTI, Ricardo Luis. La lesion fisica a la persona. El cuerpo y la salud. El daño emergente y el lucro cesante. Daños a la persona. Revista de Derecho Privado Y Comunitario. Santa Fe: Rubinzal Culzoni, 1995, p. 108 e segs e; HIGHTON, Elena I. La salud, la vida y la muerte. Um problema etico-juridico: el difuso limite entre el daño y el beneficio a la persona. Revista de Derecho Privado Y Comunitario. Santa Fe: Rubinzal Culzoni, 1995, p. 169 e segs.

215 O dano moral em sentido estrito também é denominado de “dano anímico”, vale dizer,

“que vem da alma”, conforme anota SCOGNAMIGLIO, Renato. Il dano morale (contributo alla teoria del danno extracontrattuale). Rivista di diritto civile, n. 3, 1957, p. 286. Segundo Miguel REALE é possível “distinguir claramente entre o dano moral objetivo (aquele que atinge a dimensão moral da pessoa no meio social em que vive, envolvendo o de sua imagem) e o dano moral subjetivo que se correlaciona com o mal sofrido pela pessoa em sua subjetividade, em sua intimidade psíquica, sujeita a dor ou sofrimento intransferíveis porque ligados a valores do seu ser subjetivo, que o ato ilícito veio penosamente subverter, exigindo inequívoca reparação.” REALE, Miguel. O dano moral no direito brasileiro. Temas de direito positivo. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1992, p. 23.

216 Afirma PONTES DE MIRANDA acerca do dano à normalidade da vida de relação: “O que se colima é a substituição de ritmo da vida, de prazer, de bem-estar psíquico, que desaparece, por outro, que a indenização permite”. Tratado de Direito Privado. 3ª ed. Rio de Janeiro: Borsoi, 1971, T.

XXVI, p. 31-33. O tema foi amplamento estudado e desenvolvido por ZIVIZ, Patrizia; CENDON, Paolo. Il danno esistenziale. Una nuova categoria della responsabilità civile. Milano: Giuffrè, 2000, p.

XXII. CASSANO, Giuseppe. La giurisprudenza del danno esistenziale. Piacenza: La Tribuna, 2000, p.

34 e e segs.

217 Acerca de outras modalidades de danos, tais como o nascimento injusto ou indesejado, suscita Adele M. SEGUÍ: “Las acciones por injusticias prenatales: a) Wrongful birth: ‘nacimiento injusto’, para reclamar por el nacimiento de un hijo que se podría haber evitado de conocerse la afección; b) Wrongful pregnancy: acción por ‘embarazo injusto’, para demandar por la concepción de un niño no querido; c) Wrongful life: ‘vida injusta’, para pedir reparación por tener que levar una vida disminuida.” SEGUÍ, Adele M. Aspectos relevantes de la responsabilidad civil moderna. Revista de Direito do Consumidor, n.º 52, out.-dez., 2004, p. 284-285. Tradução livre: “as ações por injustiças prenatais: a) Wrongful birth: nascimento indesejado, para reclamar pelo nascimento de um filho que se poderia ter evitado por conhecer a sua condição; b) Wrongful pregnancy: ação por gravidez injusta, para demandar pela concepção de um filho não desejado; c) Wrongful life: vida injusta, para pedir reparação por ter que levar uma vida diminuída.” Acerca do tema, consultar, ainda, MARKESINIS, Basil S.; UNBERATH, Hannes. The german law of torts: a comparative treatise. 4ª ed., Oxford: Hart, 2002, p. 44 e segs e 156 e segs. Destaca-se, nesse sentido, o caso do medicamento Talidomida que foi utilizado por gestantes do mundo todo, tendo sido desenvolvido na Alemanha para o alívio de enjôos durante a gravidez e que geraram crianças com deficiências de formações congênitas, tendo sido verificado que o medicamento carecia de base experimental. Conforme MARKESINIS e UNBERATH, “(...) the thalidomide scandal broke out leading to the birth of thousands of seriously incapacitated children and to worldwide litigation”. Tradução livre: “o escândalo da talidomida surgiu levando ao nascimento de milhares de crianças gravemente incapacitadas e a uma litigiosidade ao redor do mundo.” MARKESINIS, Basil S.; UNBERATH, Hannes. The german law of torts: a comparative treatise. 4ª ed. Oxford: Hart, 2002, p. 92. Sobre o referido caso no Brasil, consultar o julgamento proferido pelo Superior Tribunal de Justiça no Recurso Especial n.º 60129/SP,

Acerca da nova compreensão e das possibilidades abertas pelos chamados

“danos à pessoa”, ITURRASPE anota:

a) A aparição do dano à pessoa, na doutrina nacional e comparada, resulta um avanço positivo e marcante na vida do Direito; b) A nova visão da pessoa humana tem muito a ver com as correntes filosóficas personalistas e existencialistas das últimas décadas; c) Significa, eventualmente, um reconhecimento do valor

“humanidade” e a realocação da pessoa humana no centro do Direito; d) Se acentuam todos os aspectos que a pessoa humana mostra: os físicos ou somáticos e os psíquicos; individuais, sociais, familiares, reativos a capacidade de contemplação, de gozos, de projeção, sentir, amar, ao estado de saúde; e) Semelhante enfoque supera largamente o tradicional dano moral, como preço da dor, assim entendido como “dano por desgosto” ou ”dano à satisfação” ou alteração dos estados de ânimo;

f) O saber jurídico tem necessidade de uma complementação, para captar em sua totalidade a pessoa humana, e em profundidade, com outros saberes: médicos, sociológicos, psiquiátricos, antropológicos, e filosóficos; g) Pode aceitar-se que o

“dano à pessoa” acarrete consequências patrimoniais e morais ou espirituais, e que umas e outras podem ser traduzidas em uma indenização pecuniária; h) A “guerra dos rótulos” ou debate sobre a denominação que corresponde dar a tais ou quais danos, assim como a “guerra das autonomias” ou debate se esses danos integram a categoria dos danos morais ou patrimoniais, ou, pelo contrário, se tem autonomia ou formam uma categoria própria, distinta, é uma questão menor, que não vai ao fundo da questão e na qual se perde muitas vezes a visualização da questão central; i) O

“dano à pessoa” deve marchar em total harmonia com os denominados “direitos humanos” e com os “direitos da personalidade”; j) De pouco servem essas preocupações jurídicas se elas não estiverem aparelhadas, para o homem concreto, de cada comunidade, ‘uma vida melhor’; k) O denominado ‘progresso jurídico’, do qual o “dano à pessoa” é mostra acabada, nas carências materiais e espirituais que

Rel. Min. Antônio de Pádua Ribeiro, 3ª Turma, j. 20/09/2004, DJ 16/11/2004. A Lei n.º 7.070/82 regulamentou o regime de pensões para as vítimas portadoras da “Síndrome da Talidomida” e a Lei n.º 12.910/2010 dispôs sobre os danos morais das pessoas com deficiência em decorrência do medicamento. Outro caso a ser destacado é o referente ao uso do anticoncepcional Microvlar, conhecido como o “caso das pílulas de farinha”. Fabricado pela indústria Schering do Brasil Química e Farmacêutica, descobriu-se que um lote de cartelas desses comprimidos não continha o princípio ativo (hormônios), mas sim, farinha, não impedindo a gravidez indesejada. A demanda coletiva proposta, em defesa dos interesses das lesadas, foi julgado pelo Superior Tribunal de Justiça no âmbito do Recurso Especial n.º 866636/SP, Rel. Min. Fátima Nancy Andrighi, Terceira turma, j.

29/11/2007, DJ 06/12/2007, e assim ementado: “Ação civil pública proposta pelo PROCON e pelo Estado de São Paulo. Anticoncepcional Microvlar. Acontecimentos que se notabilizaram como o ‘caso das pílulas de farinha’. Cartelas de comprimidos sem princípio ativo, utilizadas para teste de maquinário, que acabaram atingindo consumidoras e não impediram a gravidez indesejada. Pedido de condenação genérica, permitindo futura liquidação individual por parte das consumidoras lesadas.

Discussão vinculada à necessidade de respeito à segurança do consumidor, ao direito de informação e à compensação pelos danos morais sofridos. (...) A responsabilidade da fornecedora não está condicionada à introdução consciente e voluntária do produto lesivo no mercado consumidor. Tal ideia fomentaria uma terrível discrepância entre o nível dos riscos assumidos pela empresa em sua atividade comercial e o padrão de cuidados que a fornecedora deve ser obrigada a manter. Na hipótese, o objeto da lide é delimitar a responsabilidade da empresa quanto à falta de cuidados eficazes para garantir que, uma vez tendo produzido manufatura perigosa, tal produto fosse afastado das consumidoras. (...) A empresa fornecedora descumpre o dever de informação quando deixa de divulgar, imediatamente, notícia sobre riscos envolvendo seu produto, em face do juízo de valor a respeito da conveniência, para sua própria imagem, da divulgação ou não do problema. Ocorreu, no caso, uma curiosa inversão da relação entre interesses das consumidoras e interesses da fornecedora: esta alega ser lícito causar danos por falta, ou seja, permitir que as consumidoras sejam lesionadas na hipótese de existir uma pretensa dúvida sobre um risco real que posteriormente se concretiza, e não ser lícito agir por excesso, ou seja, tomar medidas de precaução ao primeiro sinal de risco”.

são comuns em muitos lugares do mundo; l) O “dano à identidade”, entendido como detrimento ao patrimônio ideológico-cultural da personalidade, conjunto de atributos vinculados com a posição profissional, relligiosa, ética, política e com os riscos psicológicos de cada pessoa, é a nova meta no tema que nos ocupa. O dano fundado na dimensão do homem em sua concreta realidade. 218

Por outro lado, para além dos danos individuais, vêm ganhando cada vez maior destaque os danos produzidos em relação aos chamados direitos transindividuais (adiante analisados), cujas consequências, em termos de extensão e profundidade, certamente preocupam não apenas as comunidades nacionais, mas à sociedade global.

O que parece claro, assim, é que a reconceituação e o redimensionamento dos danos, decorrentes das naturais alterações da forma de ser da vida social, têm acarretado e ainda acarretarão profundas revisões nos sistemas de justiça, aí incluindo-se o Direito de responsabilidade civil, já a partir de uma nova concepção preventiva, ora preconizada.

Se os danos às pessoas, assim como os danos transindividuais, passam a

Se os danos às pessoas, assim como os danos transindividuais, passam a

No documento CURITIBA 2012 (páginas 75-81)