• Nenhum resultado encontrado

RESULTADOS ANUAIS CD

4. QUADRO TEÓRICO

4.2. TEORIA ANTROPOLÓGICA DO DIDÁTICO (TAD)

A Teoria Antropológica do Didático (TAD) foi criado pelo francês Ives Chevallard (1992), com origem em seus estudos sobre a Teoria da Transposição Didática. Chevallard (1991) indica que o processo de passagem do Saber Científico para o Saber a Ensinar é o que configura a Transposição Didática:

um conteúdo de saber que é designado como saber a ensinar sofre, a partir de então, um conjunto de transformações adaptativas que vão torná-lo apto a ocupar um lugar entre os objetos de ensino. O “trabalho” que transforma um saber a ensinar em um objeto de ensino é denominado transposição didática (CHEVALLARD, 1991, p.45 – tradução nossa, grifos do autor).

Kummer (1999) diz que o Saber Científico se trata de um saber produzido numa forma bem estruturada e segue um rigoroso método de investigação. Já o Saber a Ensinar é constituído numa instituição chamada Noosfera, formada por pesquisadores, professores, especialistas etc., ligados a Universidades, Ministérios da Educação e diversas Redes de Ensino, mediante o processo transpositivo, proposto por Chevallard (1991). Na sala de aula, os estudantes, passam a se relacionar com o Saber Ensinado pelo professor. A distinção entre os saberes, através da noção de transposição didática, coloca o saber matemático no cerne da origem na totalidade dos problemas didáticos.

A TAD estuda, então, o homem diante do saber matemático. Ela situa as atividades matemáticas dentro do conjunto de mobilizações humanas e nas instituições sociais, por isso a utilização do termo antropologia15 (CHEVALLARD, 1991). Além disso, destacamos como noções fundamentais de teoria, para que possamos compreender os fenômenos que ocorrem na educação, nesse viés, as quatro que seguem: objeto, relação pessoal, pessoa e instituição.

A primeira noção é de que tudo é objeto, o qual Chevallard (2018, p. 23) define como “qualquer entidade, material ou imaterial, que existe, ao menos, individualmente”. Conceitos matemáticos são objetos, tal qual pessoas, ideias, símbolos ou qualquer outro produto da atividade humana (CHEVALLARD, 2018). Logo, observamos que o objeto não é apenas material nessa teoria, mas também os intangíveis fazem parte desse conjunto.

O conceito de relação pessoal constitui a segunda noção, que implica na relação entre um indivíduo X com um objeto O, denotada por ܀ሺ܆ǡ ۽ሻ, com todas as interações que X pode ter com O (CHEVALLARD, 2018). Além disso, afirmamos que “O existe para X, se a relação pessoal de X a O é “não vazia” que denotamos ܀ሺ܆ǡ ۽ሻ ് ׎” (CHEVALLARD, 2018, p.23).

O terceiro conceito se refere à noção de pessoa X. Nesse sentido, Chevallard (2018) afirma que:

Uma pessoa é um par formado por um indivíduo X e um sistema de relações pessoais

R(X, O), em algum momento, na história de X. A palavra pessoa, como utilizada aqui,

não deve ser elusiva: todo indivíduo é uma pessoa, inclusive uma criança. A criança (etimologicamente é aquela que não fala ainda). É claro que, ao longo do tempo, o sistema de relações pessoais de X a O evolui: os objetos que não existem para ele começam a existir; outros deixam de existir. Para outros, enfim, a relação pessoal de X a O muda. Nesta evolução, o invariante é o indivíduo, o que muda é a pessoa (CHEVALLARD, 2018, p. 23, grifo nosso).

15 A antropologia é uma ciência que se dedica ao estudo do ser humano de forma holística. O termo é de origem

grega e é a junção de anthropos (“homem” ou “humano”) e de logos (“conhecimento”). A antropologia é uma ciência integradora que estuda o homem no âmbito da sociedade e da cultura a que pertence, combinando perspectivas das ciências naturais, sociais e humanas. (https://conceito.de/antropologia, acesso em 28/01/2019)

O autor destaca então que podemos classificar qualquer ser humano como pessoa, mas a evolução propiciada a ele, particularmente no sistema de ensino, o torna indivíduo X. Para tanto, precisam ocorrer as diversas relações entre esta pessoa X e os objetos do saber ensinados

O durante sua trajetória nesse ambiente. Logo, isso posto e efetivado, torna uma pessoa em um

indivíduo apto a transformar-se e à sociedade a qual faz parte.

Chevallard (2018, p. 23) ainda pontua que “um objeto O existe para uma pessoa X, dizemos que X conhece O, a razão de ܀ሺ܆ǡ ۽ሻ especificando a maneira como X conhece O”.

Isso posto, ele expõe a que chama de universo cognitivo de X, e denota por ܃۱ሺ܆ሻ ൌ ሼሺ۽ǡ ܀ሺ܆ǡ ۽ሻȀ܀ሺ܆ǡ ۽ሻ ് ׎ሽ (CHEVALLARD, 2018).

Concluindo as informações sobre as noções fundamentais da TAD, temos a definição posta de instituição I, dada por Chevallard (2018), como sendo:

Uma instituição é um dispositivo social, “total”, o que certamente pode ter apenas de forma muito limitada no espaço social (existem “micro instituições“), mas que permite e impõe a seus sujeitos, isto é, para as pessoas que vêm a ocupar diferentes posições p oferecidas em uma instituição I, o envolvimento, a maneira de fazer e próprias de pensar (CHEVALLARD, 2018, p. 24, grifo nosso)

Dessa forma, uma instituição I pode ser entendida como um grupo familiar, uma escola, um curso, uma disciplina, uma sala de aula etc. Para uma instituição, como uma sala de aula ou uma disciplina lecionada em determinado curso superior, por exemplo, a posição p, ocupada pelos sujeitos ou pessoas X, é atribuída tanto para o professor como para o estudante.

Diante das noções explicitadas, podemos trazer à tona as principais relações possíveis entre esses elementos da TAD, na perspectiva de Chevallard (2018). O autor destaca que, numa determinada instituição I, uma pessoa X, assumindo uma posição p, possui uma relação institucional a O em posição p, denotada por ܀ሺ࢖ǡ ۽ሻ. Se ܀ሺ܆ǡ ۽ሻ ؆ ܀ሺ࢖ǡ ۽ሻ, dizemos que ocorre uma conformidade da relação pessoal de X à relação institucional que ocupa em posição

p em I, indicando que X é um “bom sujeito” na instituição (Chevallard, 2018). Considerando

uma relação em conformidade ܀ሺ܆ǡ ۽ሻ, diremos que a pessoa X reconhece o objeto O na instituição I. Por outro lado, Chevallard (2009) também informa quanto a relação entre o objeto

O e a instituição I:

Um objeto O existe para uma pessoa X se existe uma relação pessoal, denotada ܀ሺ܆ǡ ۽ሻ, da pessoa X ao objeto O. Isto é, a relação pessoal a O determina a maneira como X conhece O. Analogamente, se define uma relação institucional de I a O denotada ܀ሺ۷ǡ ۽ሻ significando que o objeto O é reconhecido pela instituição I (CHEVALLARD, 2009, p. 3, tradução nossa, grifo nosso)

A seguir, ilustramos a situação narrada no esquema da Figura 16, para o estabelecimento dessas relações elencadas, entre os elementos: instituição I, indivíduo (ou

sujeito) X e objeto O, considerando uma relação em conformidade ܀ሺ܆ǡ ۽ሻ, tal que esse indivíduo X reconheça o objeto O na instituição I.

Figura 16 – Relações: Instituição, Objeto e Pessoa

Fonte: Elaboração do Autor

Agora, trazemos o significado da relação instituição-instrumento. Sendo possível atrelar a utilização de tecnologias ao estudo de determinado objeto O, que se relaciona com uma determina instituição I, podemos estabelecer uma relação entre o instrumento i, que possui relação direta com o objeto O e essa instituição I, denotada por ܀ሺ۷ǡ ܑሻ. Henriques, Attie e Farias (2007) destacam o seguinte posicionamento acerca disso: “No que diz respeito à integração de novas tecnologias no ensino da matemática, também é possível nos questionarmos sobre o reconhecimento dos instrumentos tecnológicos pelas instituições” (HENRIQUES; ATTIE; FARIAS, 2007, p. 59). Henriques (2006) ainda infere na ligação que pode ocorrer entre o modelo SAI da AI e os elementos (I, O, X) da TAD, desde que em torno do mesmo objeto O:

O objeto O referido por Chevallard seja o mesmo objeto do saber que Rabardel faz referência no modelo SAI, e que o instrumento denotado por i, seja reconhecido oficialmente pela instituição I onde existe o objeto O. Se o ensino, a aprendizagem do objeto O e o instrumento i se encontram em I, e que nesse encontro exista intenções de I que se traduzem por práticas existentes nessa instituição, através de técnicas instrumentais de i, então, pode-se falar da relação institucional e pessoal a um instrumento i. (HENRIQUES, 2006, p. 15)

Com isso, atrelando as duas teorias (TAD e ABIN) em torno de um mesmo objeto do saber a ensinar, podemos inter-relacionar seus principais elementos, incluindo a relação entre a instituição I e o indivíduo X, assumindo um papel p, de acordo com o esquema da Figura 17.

Figura 17 – Inter-relação: Elementos da TAD com o modelo SAI

Fonte: Elaboração do Autor

Em nosso trabalho, temos como elementos, baseando-nos nos conceitos até então observados na TAD, que a instituição I de investigação específica é o CDI1002, do Curso de Engenharia Civil; o indivíduo X ora é o professor ao estabelecer relações com o instrumento i, seja ele o ambiente computacional GeoGebra ou os Modelos Concretos, ora é o estudante de engenharia, vinculado ao CDI. O objeto O vinculado a esse processo é o Centro de Massa. Com isso, vamos investigar as relações que ocorrem entre esses elementos, levando em consideração a análise institucional, nos documentos oficiais, nos livros didáticos, nas tecnologias propostas para o trabalho e nas autoanálises de erros dos estudantes em torno do CM.

A análise praxeológica de um determinado objeto O é um ponto crucial da TAD, pois possibilita conhecer práticas educacionais em torno deste, onde os atores participam das atividades que ocorrem em uma determinada instituição I, assumindo um papel p, e são os indivíduos X, que estabelecem ܀ሺ܆ǡ ۽ሻ.

Para Chevallard (2018), essa noção de praxeologia é o coração da TAD, pois generaliza distintas noções culturais: de saber e de saber-fazer, permitindo observar sem prejuízo de valores à estrutura do conhecimento. A estrutura mais simples, chamada de pontual, indicada por Chevallard (2018), consiste em:

um tipo de tarefa T, uma técnica ૌ, maneira de executar as tarefas t de tipo T, de uma tecnologia ી, discurso fundamentado (logos) sobre a técnica (tekhnê) que é suposto tornar t inteligível como um meio para realizar as tarefas do tipo T, enfim – por último, mas não menos importante – uma componente teórica દ, que rege a tecnologia em si (e, portanto, todos os componentes da praxeologia). Uma determinada praxeologia pontual (o “ponto” aqui é do tipo de tarefas T) se nota [T / ૌ / ી / દ]. Ela comporta uma parte prático-técnica મ ൌ ሾ܂Ȁૌሿ , ou práxis (o qual pode, se for o caso disso, ser chamada de “saber-fazer”) e uma parte tecnológica-teórica ઩ ൌ ሾીȀદሿ, ou logos (que podemos identificar como um “saber” no sentido usual do termo).(CHEVALLARD, 2018, p. 26, grifo nosso)

A tarefa T, conforme explicita Chevallard (2018), representa de forma precisa um conjunto que contém tarefas t, específicas em torno dessa tarefa T. Em nosso trabalho, indicaremos as tarefas t, como subtarefas de T, e denotaremos por St. Para realização dessas tarefas ou subtarefas, teremos técnicas ૌ que são necessárias para execução de cada uma delas (a maneira de fazer a tarefa), sendo essas atreladas a uma tecnologia ી que representa um teorema, uma definição, uma proposição e que justifica a técnica usada na estrutura praxeológica, e a teoria દ justificando e dando compreensão à tecnologia. Esses quatro componentes formam a praxeologia pontual completa, como podemos destacar na Figura 18.

Figura 18 – Estrutura Praxeológica

Fonte: Elaboração do Autor

Na pesquisa, destacamos a seguinte tarefa T relativa ao nosso objeto matemático, cujo objetivo é o de estabelecer as coordenadas do CM entre dois corpos de massas indicadas, para que ocorra uma melhor compreensão da estrutura praxeológica pontual: